Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4192/19.7T8VCT.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
NULIDADE DE SENTENÇA
CLASSIFICAÇÃO E AVALIAÇÃO DA PARCELA
SOLO APTO PARA CONSTRUÇÃO
DEPRECIAÇÃO DA PARTE SOBRANTE
REPOSIÇÃO DE VEDAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/30/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO DOS EXPROPRIADOS IMPROCEDENTE. APELAÇÃO DA EXPROPRIANTE IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Não pode ser classificado como “apto para construção” um terreno em que, de acordo com as leis e regulamentos em vigor, não é permitida a construção e relativamente ao qual não existe qualquer expectativa legítima e concreta de tal construção vir a ser autorizada, ainda que tal terreno se encontre nas situações previstas no art. 25º, n.º 2, als. a) e b), do CE.
II - Se apenas parte do terreno tem capacidade construtiva, deve neste caso a parte restante do mesmo ser classificada como solo para outros fins.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

A X – Administração dos Portos do ..., ... e ..., S.A., requereu a expropriação por utilidade pública, com carácter de urgência, da parcela n.º 4, com área de 21684 m2, pertencente ao Seminário Diocesano de ..., a desanexar do prédio situado na freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz predial rústica, sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º .../20011122, que confronta a norte com caminho público, a sul com caminho público, a nascente com estrada nacional e a poente com caminho público, necessária à execução da obra de “Acesso Rodoviário ao Setor do Porto de ...”.
Por despacho da Ministro do Mar publicado no Diário da República n.º 78, II Série, de 20 de abril de 2018, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação, da parcela supra referida.
Em 26 de junho de 2018, foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam.
Em 10 de janeiro de 2019, a X – Administração dos Portos do ..., ... e ..., S.A., tomou posse administrativa da fração expropriada.
Em 21 de novembro de 2018 a X – Administração dos Portos do ..., ... e ..., S.A., depositou à ordem do expropriado o montante de € 242.281,58.
Em 24 de setembro de 2019, os árbitros elaboraram acórdão onde concluem, fixar o valor da indemnização a atribuir ao proprietário da parcela a expropriar em € 542.333,22.
A X – Administração dos Portos do ..., ... e ..., S.A., remeteu os autos a Tribunal, requerendo que lhe fosse adjudicada a propriedade da referida parcela.
Por decisão datada de 09 de dezembro de 2019, tal parcela foi adjudicada à entidade expropriante.
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Da decisão arbitral recorreram os expropriados e expropriante, tendo sido admitidos ambos os recursos.
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Efectuada a avaliação judicial, vieram os peritos a atribuir à parcela expropriada, por maioria, o valor de € 654.254,87 (cfr. fls. 167 a 236).
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O expropriado reclamou e pediu a prestação de esclarecimentos pelos srs. peritos, prestados a fls. 247 a 251, 254 a 262, 268, 269 e 273 a 275.
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Notificados nos termos e para os fins do disposto no art. 64º, n.º 1, do CE, quer o expropriado, quer a entidade expropriante apresentaram alegações (fls. 282 a 291 e 292 a 298).
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A final foi proferida sentença que decidiu “[f]ixar o valor da indemnização, a pagar pela entidade expropriante A X – Administração dos Portos do ..., ... e ..., S.A. ao expropriado Seminário Diocesano de ..., em € 654.254,87 (seiscentos e cinquenta e quatro mil duzentos e cinquenta e quatro euros e oitenta e sete cêntimos), valor esse, devidamente atualizado, nesta data, de acordo com a evolução dos índices de preços no consumidor, com referência à data da declaração de utilidade pública, nos termos do artigo 24º, n.º 1, do C. Expropriações” (fls. 299 a 302).
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Inconformados, quer o expropriado, quer a expropriante, interpuseram recurso de apelação dessa sentença (fls. 303 a 311 e 312 a 335).

A terminar as respetivas alegações, o expropriado formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«I – O Expropriado suscitou a questão da necessidade da indemnização por força da Depreciação da Parte Sobrante em sede de Recurso da Decisão Arbitral a qual não mereceu qualquer decisão por parte do Tribunal a quo estando, por isso, a Sentença em crise inquinada de um vício de nulidade por omissão de pronúncia nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615º do Código do Processo Civil.
II – O Tribunal a quo deu como provado os factos constantes nos pontos 4, 5 e 6 da Sentença em crise não tendo, contudo, retirado as devidas ilações dos mesmos ao aderir de forma automática e mecânica ao Relatório Pericial Maioritário que é, inclusive, contraditório a estes.
III – Ilações que estão expressamente referidas na VAPRM quanto à classificação do solo da parcela expropriada a qual por não ter sido contestada por nenhuma das Partes é válida para todo o sempre, formando Caso Julgado quanto às matérias nela constantes e aceites.
IV – A Sentença em crise é a manifestação de uma mera adesão automática e mecânica ao Laudo Maioritário o que conduziu a que o Tribunal a quo não se pronunciasse quanto à classificação e avaliação do solo pese embora a isso estivesse obrigado.
V – Ao não efetuar uma análise crítica de todas as provas constantes nos autos e mesmo dos próprios factos dados como provados nos pontos 4, 5 e 6 da douta Sentença em crise o Tribunal a quo fez uma aplicação contra legem do Direito, violando de forma gritante, designadamente, o disposto nos artigos 25º e 26º do Código das Expropriações.
VI – Nos pontos 4 e 6 dos factos dados como provados na douta Sentença é possível aferir a descrição da localização, caraterísticas e infraestruturas existentes in loco as quais ao subsumirem-se ao artigo 25º do Código das Expropriações apenas poderiam levar a que a parcela objeto da presente ablação fosse classificada na totalidade como “solo apto para construção”.
VII – Circunstância que tinha ficado assente desde a VAPRM quando esta na resposta ao quesito 18 apresentado pelo Expropriado refere que a parcela expropriada «…encontra-se inserida em Solo Urbano, com a classificação de Zonas Urbanas de Aplicação de PMOT…».
VIII – O Laudo Maioritário optou por avaliar parte da parcela expropriada como “solo apto para outros fins” contradizendo, assim, a VAPRM e violando as disposições e regras previstas para o Processo Expropriatório, designadamente, o artigo 25º do CE que se sobrepõe aos Instrumentos de Gestão Territorial em vigor.
VIX – E ainda violando o Princípio da Justa Indemnização consignado no artigo 23º do CE ao desvalorizar de forma anómala o terreno expropriado.
X – Vícios de que a Sentença em crise também padece por não ter procedido a uma análise da realidade factual da parcela e envolvente e a um juízo judicativo da prova pericial realizada (como lhe era legalmente imposto) conduzindo, assim, à aplicação errónea e ilegal dos artigos 25º e 23º do Código das Expropriações.
XI – Pois tendo dado os factos constantes nos pontos 4, 5 e 6 da Sentença em crise como provados e atento o teor da VAPRM o Tribunal a quo não poderia ter entendido outra coisa que não seja que toda a parcela se devia classificar como “solo apto para construção” com todas as consequências daí advenientes.
XII – Acresce que os Peritos subscritores do Laudo Maioritário na parte da parcela expropriada que classificam como “solo apto para construção” aplicam um valor a título de custo de construção irrisório e sem qualquer fundamento.
XIII – O qual tem na sua génese o critério que determinava a fixação do custo de construção em função dos valores fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada nos termos da Portaria n.º 353/2013 de 4 de dezembro aplicável por força do Decreto-Lei n.º 329-A/2000, de 22 de dezembro que foi revogado pela Lei n.º 80/2014 de 19 de dezembro.
XIV – Momento a partir do qual o único critério aplicável para o cálculo do custo de construção das parcelas expropriadas passou a ser o dos valores médios reais e correntes de mercado que apenas foi consultado e tido em linha de conta pelo Perito indicado pelo Expropriado subscritor do Laudo Minoritário que não foi tido em consideração pelo Tribunal a quo.
XV – Com efeito, o Tribunal a quo ao aderir ao Laudo Maioritário sem mais não só chegou a um valor irrisório a título de justa indemnização e que viola o disposto no artigo 26º e 23º do Código das Expropriações como ainda aplicou normas de Direito revogadas.
XVI – Conduta que não poderia ter adotado e com a qual o Expropriado não pode compactuar pois atento o disposto no artigo 23º e 26º do Código das Expropriações o Tribunal a quo não poderia ter aplicado um valor a título de custo de construção que não fosse o do valor de mercado que se encontra explicito e documentado no Laudo Minoritário subscrito pelo Perito indicado pelo Expropriado.
XVII – O Tribunal a quo, tal qual supra referido no ponto I das Conclusões, não se pronunciou quanto à questão da Depreciação da Parte Sobrante pese embora a tal estivesse obrigado.
XVIII – Com o Processo Expropriatório o prédio ficou com duas partes sobrantes as quais passaram a ser oneradas com uma servidão non aedificandi que limita sobremaneira a capacidade construtiva das mesmas, impedindo o Expropriado de contruir equipamentos que até então eram permitidos à luz dos Instrumentos de Gestão Territorial.
XVIX – Acresce que a expropriação criou uma barreira inultrapassável no prédio ao dividi-lo com uma via, isolando-o quando até então o mesmo era uno.
XX – Este facto só por si só e para além dos prejuízos decorrentes da diminuição da área edificativa aumenta os custos associados à manutenção e exploração das parcelas sobrantes, designadamente, com deslocações entre as mesmas que passarão a ter de ser efetuadas de veículo automóvel.
XXI – Todos estes ónus e custos apenas impendem sobre o Expropriado em razão do Processo Expropriatório tendo por isso o mesmo o direito de ser indemnizado.
XXII – Circunstância que o Laudo Maioritário e, consequentemente, a Sentença em crise (por se limitar a aderir ao mesmo sem qualquer juízo critico) não atendeu violando o Princípio da Justa Indemnização previsto no artigo 23º do CE.
XXIII – Face à ausência de valores apontados no Laudo Maioritário a título de indemnização pela Depreciação da Parte Sobrante cabia ao Tribunal a quo analisados os demais meios de prova constantes nos autos (em particular o Laudo Minoritário subscrito pelo Perito indicado pelo Expropriado) e recorrendo aos Princípios de Equidade atribuir uma percentagem a esse título.
XXIV – Ao não o fazer a Sentença em crise prejudicou o Expropriado violando o disposto no artigo 23º do Código das Expropriações o que não é legalmente admissível.

TERMOS EM QUE,
- DEVE o presente Recurso de Apelação apresentado pelo Expropriado ser julgado procedente com todas as consequências legais advenientes.
COMO É DE INTEIRA E DA MAIS ELEMENTAR
JUSTIÇA!»
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Por sua vez, a expropriante rematou as suas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem, também):

«1. A justa indemnização é uma finalidade do processo expropriativo, encontrando-se expressamente consagrada nos artigos 1.º e 23.º do CE, sendo ainda um imperativo decorrente do art.º 62, nº 2 da CRP.
2. Visa ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal.
3. O PDM tem relevância na classificação e valorização do terreno pois condiciona o tipo de aproveitamento económico que o proprietário pode dar ao terreno e vai influir directamente no valor de mercado do mesmo.
4. O CE/99, no seu art.º 26, n.º 1 diz-nos que a avaliação do solo deve ser efectuada “de acordo com as leis e regulamentos em vigor, num aproveitamento economicamente normal,”.
5. O PDM de ... em vigor classifica o prédio em zonas Urbanas de Aplicação de PMOT, zonas florestais de protecção e espaços agrícolas.
6. Quanto às condicionantes, apenas os espaços agrícolas se inserem em zona de Reserva Agrícola.
7. Ás zonas urbanas de aplicação de PMOT aplica-se o PUC de ..., inserindo-se as áreas urbanas em zona de enquadramento paisagístico.
8. A Planta de Condicionantes relativa ao PDMFCI, que complementa o PDM, classifica parte do terreno expropriado como Faixa de Gestão de Combustível.
9. A categoria de Faixa de Gestão de Combustível sobrepõe-se a outras categorias de espaço, não sendo possível contruir em terrenos com esta classificação.
10. A parcela expropriada ocupa, parcialmente, solo classificado como Zonas de Enquadramento Paisagístico, Zonas Florestais de Protecção e, ainda, Zona de Faixa de Protecção.
11. A parcela expropriada subdivide-se em 3 tipos de zonas:
- Zonas Urbanas de Aplicação do PMOT, com 7.344 m2
- Zonas Florestais de Protecção, com 6.900 m2
- Faixa de gestão de combustível: com 7.440 m2
12. A posição do Perito indicado pela Expropriante é a única que permite alcançar os desígnios da justa indemnização e ressarcimento do prejuízo que efectivamente advém para o expropriado.
13. A subparcela classificada como apto para construção insere-se numa zona periférica, com características rurais, sem se incluir em terrenos confrontantes ao mar ou rio.
14. Nos custos de construção deve ser atribuída a percentagem de 8%, a acrescer às atribuídas pelos demais peritos do Tribunal, no total de 18%.
14. Na contabilização das despesas necessárias ao reforço das infraestruturas existentes, o índice muito baixo aliado à dimensão mínima dos lotes implica um custo relativo maior para as infraestruturas necessárias à possível edificação implica que as mesmas não podem ser contabilizadas em valor inferior a 30%.
15. O factor correctivo pela inexistência de risco e esforço inerente à actvidade construtiva a aplicar deve considerar que a dimensão mínima do lote onde se pode construir uma moradia uni ou bi-familiar, a qual, aliada aos custos de infraestruturação, implica um valor de comercialização necessariamente alto, para um local que não oferece acesso directo ao mar.
16. O risco é bastante alto e deve-se cifrar em 15%.
17. Na determinação do custo de construção, deve se atender ao valor do preço de habitação durante o ano de 2014, para efeitos do cálculo da renda condicionada, constantes da Portaria n.º 353/2013, de 4 de Dezembro, actualizados para o ano de 2018.
18. Atribuiindo 85% ao factor de conversão de preço da construção de Área Útil para Área Bruta, resulta o preço para área bruta de construção aplicável de 691,20.
19. Na zona de enquadramento paisagístico existem 2 zonas onde não é permitida a edificação, vulgo as zonas ameaçadas pelas cheias e faixa de gestão de combustível.
20. Nas primeiras está interdita construção do tipo habitação ou semelhante em zonas deste tipo e nas segundas não é possível contruir.
21. O valor unitário do solo apto para construção cifra-se em 14,81/m2
22. Atento a área apta para construção (7.344 m2), o valor deste tipo solo computa-se em 108.764,64.
23. O valor do solo da subparcela classificada como apta para outros fins, inserida em área de protecção florestal, calcula-se em 1,75/m2.
24. Somando a área de 6.900 m2 (Zonas Florestais de Protecção) com a de 7.440 m2 (Faixa de gestão de combustível), o solo apto para outros fins totaliza 14.340 m2.
25. Aplicando o preço unitário de 1,75/m2, o valor desta subparcela ascende a 25.095,00.
26. Apenas as espécies arbóreas identificadas na vistoria aprm, por serem
produtos da exploração florestal, devem ser consideradas.
27. Foram quantificados 1.874,61 toneladas.
28. A multiplicar pelo preço de 35,00/ton, totalizamos 64.940,40
29. A perda de videiras não devem ser quantificadas, dado que o solo foi classificado como apto para construção e não como vinha instalada, assim como os troncos das videiras cujo valor comercial é irrelevante ou nulo.
30. Apenas deve ser paga indemnização que suporte a reconstrução dos muros ou vedações destruídos, os quais têm de ser idênticos aos demolidos ou aos subsistentes.
31. A construção de novos muros e vedações que eram inexistentes na parcela sobrante, apenas é admissível nas situações em a comprovada necessidade surgiu em virtude da expropriação.
32. As características deverão ser adequadas à área a vedar, atendendo aos existentes na zona envolvente.
33. Carece de necessidade a construção de um muro a delimitar a parcela apta para construção, dado que a edificação de vedação contende com o aproveitamento económico possível e será demolido para que a potencialidade construtiva seja realizada.
34. Subsiste, apenas, a necessidade de vedar a parcela sobrante que, pela sua dimensão, aptidão, necessidade de salvaguarda da privacidade e manutenção da situação original, o exige.
35. Não se justifica a construção de um muro de vedação, quando não existe a possibilidade de devassa da privacidade.
36. A verificar-se a necessidade de construção de vedação, as dimensões e as características do muro poderão ser idênticas ao que o prédio já possui à face da EN, de altura bastante inferior, com uma altura média máxima de 1,20m, uma espessura média máxima de 0,50 cm e cujo valor ascende a 131,64 /m3.
37. O que resulta numa indemnização, a este título, que não poderá exceder o montante de 68.637,10.
38. Não existe qualquer depreciação das partes sobrantes e não há lugar à atribuição de qualquer indemnização a este titulo.
39. As duas partes sobrantes resultantes do atravessamento do prédio mantém, proporcionalmente, os mesmos cómodos, a mesma capacidade de edificabilidade prevista à que existia, beneficiando, com a nova via, de acesso melhorado para escoamento de produtos
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve a apelação ser julgada procedente e, alterar-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância em conformidade e na precisa medida do presente recurso, mantendo-se a mesma no restante, fixando-se a indemnização a atribuir à parcela em montante máximo que não poderá exceder 278.068,98.
Assim se fará a sã e costumeira Justiça!»
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Contra-alegou o expropriado, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela expropriante (cfr. fls. 323 a 335).
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Os recursos foram admitidos como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 336).
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s) – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:

1.ª - Da nulidade da sentença com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC (recurso do expropriado);
2.ª - Da classificação e avaliação da parcela expropriada (comum a ambos os recursos);
3.ª - Do valor da indemnização devida ao expropriado (comum a ambos os recursos);
4.ª - Da depreciação da parte sobrante (recurso do expropriado);
5.ª – Da (não) reposição ou construção de vedações (recurso da expropriante).
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III. Fundamentos

IV. Fundamentação de facto

A. A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

1– Por despacho da Ministra do Mar publicado no Diário da República n.º 78, II Série, de 20 de abril de 2018, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela n.º 4, com área de 21684 m2, a desanexar do prédio situado na freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz predial rústica, sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º .../20011122, que confronta a norte com caminho público, a sul com caminho público, a nascente com estrada nacional e a poente com caminho público, pertença do expropriado.
2 – O prédio onde se destaca a parcela 4, encontra-se inscrito no artigo ... da freguesia de ..., concelho de ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o n.º .../20011122, na freguesia de ..., com uma área total de 449 747,00 m2; cuja parcela a expropriar tem uma área de 21.648,00 m2.
3 – O prédio em causa possuiu vários edifícios de apoio à Diocese de ..., ocupando cerca de 5% da área do prédio incluindo áreas de logradouro e espaços de apoio ao edificado; no envolvente do conjunto de edifícios e numa faixa de cerca de 100m de largura ao longo da marginal, a norte apresenta ocupação efetiva agrícola com cerca de 22% da área; a parte restante encontra-se ocupada com aproveitamento florestal, em cerca de 73%.
4 – O prédio encontra-se numa zona urbana, próxima de zonas balneares de qualidade e de equipamentos desportivos e complementares, tais como hotéis, parques de campismo, apartamentos turísticos, escolas, igreja, centro pastoral, restauração, comércio e habitação.
5 – A nível de inserção nos Instrumentos de Gestão Territorial, designadamente o Plano Diretor Municipal de ..., classifica o prédio em zonas urbanas de aplicação de PMOT, zonas florestais de proteção e espaços agrícolas; apenas os espaços agrícolas se inserem em zona de reserva Agrícola; parte da parcela expropriada ocupa solo classificado em “Zonas de Enquadramento Paisagístico” com cerca de 14 784,00 m2 e a outra parte ocupa solo classificado em “Zonas Florestais de Proteção” com cerca de 6.900,00 m2.
6 – O prédio em questão, encontrava-se totalmente murado nas suas confrontações com muros em alvenaria de granito de pedra aparelhada numa das faces e todas confrontações do prédio dispõem das seguintes infraestruturas:
- acesso rodoviário pavimentado, - passeios ao lado da parcela; - rede de abastecimento de águas; - rede de saneamento com coletor em serviço com ligação a estação depuradora; - rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão; - rede de drenagem de águas pluviais com coletor de serviço; - rede de distribuição de gás; - rede telefónica; - iluminação pública; - transportes públicos à face do prédio, designadamente Avenida do ... e Avenida ... ( EN 13 ); -Estação de caminho de ferro de ... – Areia, a cerca de 1 Km do prédio.
7 – A parcela expropriada, com uma área de 21.684,99 m2, em formato semelhante a um retângulo alongado, no sentido norte/sul, atravessa todo o prédio numa extensão com cerca de 900 metros.
8 – A parcela expropriada possui um solo de constituição arenosa com profundidade e sem afloramentos rochosos visíveis, dada a proximidade do Rio Lima e zona costeira, sem inclinações, com aproveitamento agrícola – 13% e florestal – 77%.
9 – A parcela expropriada na parte norte, numa extensão de cerca de 110 metros atravessa solo com diversas ocupações agrícolas organizadas em pequenos talhões; numa faixa intermédia com cerca de 210,00ml posiciona-se uma exploração eucaliptal em regime de plantio ordenado, tendo sido objeto de corte há cerca de 2 anos; a restante faixa da parcela expropriada encontra-se em regime de aproveitamento florestal de crescimento espontâneo, constituído maioritariamente por pinheiros bravos e eucaliptos de pequeno, médio e grande porte, apresenta ainda pinheiros mansos, sobreiros, carvalhos e austrálias disseminados por toda a área e coberto vegetal contínuo denso de matos e silvedo ao nível do solo.
10 – Em 24 de setembro de 2019 foi elaborado acórdão arbitral relativo à parcela expropriada em causa nos autos, em que os árbitros fixaram um quantum indemnizatório no valor de € 542 333,22.
11 – No relatório pericial elaborado nos autos, os peritos indicados pelo tribunal, atribuíram a indemnização a conceder ao proprietário da parcela expropriada em causa nos autos, o valor global de € 654.254,87; o perito indicado pelo expropriado, atribuiu à indemnização global a conceder ao proprietário da parcela expropriada nos autos, o valor de € 1 250 738,20; o perito indicado pela expropriante, atribuiu à indemnização global a conceder ao proprietário da parcela expropriada nos autos, o valor de € 240.100,04.
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B. Ao abrigo do disposto no art. 662º, n.º 2, al. c) (por interpretação a contrario) do CPC – tendo como fundamento o auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam (1), os relatórios e laudos da arbitragem (2) e da peritagem (3) e as respostas aos quesitos dos peritos (4) –, amplia-se a matéria de facto, aditando-se o seguinte facto:
12. Do destaque da parcela do prédio, resultam duas parcelas sobrantes: uma, a nascente, com área de cerca de 352.737 m2 (78%) e outra, a poente, com área com cerca de 75.326 m2 (17%).
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V. Fundamentação de direito (5)

1. Nulidade da sentença recorrida com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
1.1. Como é consabido, é através da sentença, conhecendo das pretensões das partes – pedido e causa de pedir –, que o juiz diz o direito do caso concreto (arts. 152º, n.º 2 e 607º, ambos do CPC).
Pode, porém, a sentença estar viciada em termos que obstem à eficácia ou validade do pretendido dizer do direito.
Assim, por um lado, nos casos em que ocorra erro no julgamento dos factos e do direito, do que decorrerá como consequência a sua revogação, e, por outro, enquanto ato jurisdicional que é, se atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou ainda contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, caso este em que se torna, então sim, passível do vício da nulidade nos termos do art. 615.º do CPC (6).
As nulidades de decisão são, pois, vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando), seja em matéria de facto, seja em matéria de direito (7).
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão (art. 613º, n.º 3 do CPC) são as que vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do art. 615º do CPC.

Nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, a sentença é nula, entre o mais, quando:

- “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Como vício de limites, a nulidade de sentença/decisão enunciada no citado normativo divide-se em dois segmentos, sendo o primeiro atinente à omissão de pronúncia (o que está em causa nos autos) e o segundo relativo ao excesso de pronúncia ou de pronúncia indevida. O juiz conhece de menos na primeira hipótese e conhece de mais do que lhe era permitido na segunda.
Esta causa de nulidade decorre da exigência prescrita na 1ª parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC, nos termos do qual o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Verifica-se a omissão de pronúncia quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada (8).
Questões, para o efeito do disposto na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, são, “em primeiro lugar, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, qualquer que seja a forma como são deduzidas (pedidos, excepções, reconvenção)”, podendo ser ainda considerados para esse efeito “os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos (controvertidos ou questionados) entre as partes” (9).
Doutrinária (10) e jurisprudencialmente (11) tem sido entendido de que só há nulidade quando o juiz não se pronuncia sobre verdadeiras questões não prejudicadas invocadas pelas partes, e não perante a argumentação invocada pelas partes. Por questões não se devem considerar as razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas sim as pretensões (pedidos), causa de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer. O que “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido (…)” (12).
O juiz não tem, por isso, que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente (13).
No caso em apreço, o recorrente/expropriado invocou a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, «designadamente, quanto à indemnização (…) por força da depreciação da Parte Sobrante (…)».
Para tanto funda a sua argumentação no facto de, «com o Processo Expropriatório, o prédio propriedade do Expropriado ficou com duas partes sobrantes, dividindo o mesmo através de uma barreira inultrapassável (implantação de uma via rápida (com imenso trânsito em especial camiões trailer de e para o Porto de Mar de ... que foi a razão da construção desta nova via) a interpor-se entre o terreno que era uno antes desta ablação).
Circunstância que além de muitos outros prejuízos que urge contabilizar irá aumentar os custos da manutenção e conservação dos terrenos sobrantes para o Expropriado.
Além disso, o prédio ainda passou a ser onerado com uma servidão non aedificandi (em ambas as Partes Sobrantes) o que desvaloriza sobremaneira o mesmo porquanto qualquer futura edificação terá que recuar algumas dezenas de metros da faixa de rodagem o que implica, em alguns casos, não se poder sequer edificar no sobrante atenta a exiguidade da área com nexo de causalidade à aludida s.n.a.
Todos estes ónus e custos foram diretamente derivados do Processo Expropriatório e como tal o Expropriado tem o direito de ser indemnizado pelo prejuízo sofrido.
Tendo, por isso, o mesmo, em sede de Recurso, suscitado a necessidade da indemnização nesta sede», sendo que, «ainda assim a Sentença é omissa quanto a esta questão».
Analisada a sentença impugnada constata-se que, depois de tecidas considerações sobre o instituto jurídico da expropriação, bem como dos princípios a que está sujeito o acto expropriativo (de legalidade, da utilidade pública, da proporcionalidade e da justa indemnização) e da necessidade do cálculo da justa indemnização dever ser efetuado de harmonia com os critérios constantes do Código das Expropriações, tal como consta do laudo pericial junto aos autos, dando-se igualmente nota de, na situação vertente, não ter havido unanimidade entre os peritos, a Mmª Juíza “a quo”, no seguimento do entendimento jurisprudencial dominante que preconiza que, na falta de elementos precisos, há-de atender-se ao laudo e relatório dos peritos (conferindo-se prevalência ao laudo dos peritos nomeados pelo tribunal, pela melhor garantia de imparcialidade que oferecem e existência da competência técnica que lhes é reconhecida), decidiu atender ao laudo pericial maioritário apresentado pelos peritos nomeados pelo tribunal, por considerar que este se encontrava devidamente fundamentado, tendo aderido integralmente ao cálculo efetuado e correspondentes valores apresentados.
Pois bem, ao assim decidir a Mmª Juíza “a quo”, ainda que não expressamente, não deixou de se pronunciar sobre a questão colocada pelo expropriado – atinente à valorização da depreciação da parte sobrante –, posto que, ao aderir por inteiro aos fundamentos e aos cálculos do laudo maioritário, concluiu pela improcedência dessa pretensão indemnizatória.
Bem ou mal, acertadamente ou não (isso será questão a apreciar ulteriormente, quando se analisar o mérito da causa), a verdade é que a Mm.ª Juíza “a quo” não deixou de se pronunciar (implicitamente) sobre a questão em apreço, julgando-a improcedente.
Por conseguinte, podendo estar-se perante um erro de julgamento (error in judicando), não é possível surpreender e, consequentemente, reconhecer nessa sede a comissão de qualquer vício gerador de nulidade da sentença (error in procedendo).
Trata-se de circunstâncias, de vícios e de regime completamente diversos do da nulidade da sentença.
Em suma, não se verificando omissão de pronúncia sobre questão de que o Tribunal tivesse de apreciar, resta concluir pela improcedência da invocada nulidade da sentença com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC).
*
2. Da classificação e avaliação da parcela expropriada (comuns a ambos os recursos).

Considerações gerais.
Questão preliminar: a lei reguladora da expropriação é a vigente à data da publicação da declaração de utilidade pública (14).
Conforme determina o art. 24.º, n.º 1, do Código das Expropriações (CE, abreviadamente), o «montante da indemnização calcula-se com referência à data da declaração de utilidade pública, sendo actualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação».
No caso “sub judice”, a declaração da utilidade pública da expropriação da parcela em causa resultou do despacho n.º 4062//2018, de 3 de abril de 2018, da Srª. Ministra do Mar, publicado no DR., n.º 78, II Série, de 20 de abril de 2018.
Por conseguinte, o cálculo da indemnização devida deverá ser efectuado de acordo com as leis e regulamentos em vigor à data dessa declaração, designadamente o Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de setembro, com as sucessivas alterações, por ser esse o diploma então em vigor (art. 266º CRP e art. 12º CC).
A expropriação por utilidade pública é, doutrinariamente, entendida como a «relação jurídica pela qual o Estado, considerando a conveniência de utilizar bens imóveis em um fim específico de utilidade pública, extingue os direitos subjetivos constituídos sobre eles e determina a sua transferência definitiva para o património de pessoa a cujo cargo esteja a prossecução desse fim, cabendo a esta pagar ao titular dos direitos extintos uma indemnização compensatória» (15).
Preceitua o art. 62º da Constituição da República Portuguesa (CRP) que "a todos é garantido o direito à propriedade e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição".
De acordo com a posição assumida pelos Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira (16), o direito de propriedade, embora se traduza no direito de não ser privado dela, "não goza, porém, de protecção constitucional em termos absolutos, estando garantido apenas um direito de não ser arbitrariamente privado da propriedade e de ser indemnizado no caso de desapropriação". É, aliás, o n.º 2 do citado artigo que prevê a requisição e a expropriação por utilidade pública como formas de desapropriação do direito de propriedade.
Nessas situações, em homenagem ao art. 18º, n.º 2, da CRP, a constitucionalidade da expropriação está apenas dependente da existência de uma base legal. Existindo essa base legal, resta ao Tribunal averiguar acerca da justeza da indemnização.
Estipula o n.º 2 do art. 62º da CRP que "a requisição e expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas na base da lei, e fora dos casos previstos na Constituição, mediante o pagamento de justa indemnização".
Nesta matéria, a Constituição não impôs qualquer critério objetivo de fixação ou método direto de avaliação da indemnização a aplicar, remetendo para o legislador ordinário a sua definição. Em todo o caso, "os critérios definidos por lei têm de respeitar os princípios materiais da Constituição (igualdade, proporcionalidade), não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas à perda do bem requisitado ou expropriado" (17).
Também no art. 1308º do Código Civil (CC) se estabelece que "ninguém pode ser privado, no todo ou em parte, do seu direito de propriedade senão nos casos fixados na lei".
Nesses casos, porém, tem o lesado direito a uma indemnização adequada (art. 1310º (18) do CC).
E, como princípio geral, o art. 1.º do CE dispõe que os “bens imóveis e os direitos a ele inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública compreendida nas atribuições, fins ou objeto da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização, nos termos do presente Código”.
A indemnização visa, portanto, restabelecer a igualdade perdida, colocando o expropriado na precisa situação em que se encontravam os seus concidadãos que, tendo bens idênticos, não foram atingidos.
Com efeito, é só através de uma justa indemnização que se poderá compensar o expropriado pelo sacrifício suportado com a perda do bem.
Nessa medida, parece que será a partir do prejuízo que a expropriação causa ao expropriado que encontraremos o montante adequado.
O critério mais adequado ou mais apto para alcançar uma compensação integral do sacrifício patrimonial infligido ao expropriado e para garantir que este, em comparação com outros cidadãos não expropriados, não seja tratado de modo desigual e injusto, é o do valor de mercado, também denominado valor venal, valor comum ou valor de compra e venda do bem expropriado, entendido não em sentido estrito ou rigoroso, mas sim em sentido normativo, na medida em que estamos perante um “valor de mercado normal ou habitual”, não especulativo, isto é, um valor que se afasta, às vezes substancialmente, do valor de mercado resultante do jogo da oferta e da procura, já que está sujeito, frequentes vezes, a correcções (que se manifestam em reduções e em majorações legalmente previstas – arts. 29º, n.º 2, 30º e 31º do CE), as quais são ditadas por exigências da justiça (19).
Ora, o conceito de “justa indemnização” é-nos fornecido através do art. 23º, n.º 2, do CE, no qual se preceitua que “a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”.
Em termos gerais, deve entender-se que a «justa indemnização» há-de corresponder ao valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda que a transferência do bem que lhe pertencia para outra esfera dominial lhe acarreta, devendo ter-se em atenção a necessidade de respeitar o princípio da equivalência de valores: nem a indemnização pode ser tão reduzida que o seu montante a torne irrisória ou meramente simbólica nem, por outro lado, nela deve atender-se a quaisquer valores especulativos ou ficcionados, por forma a distorcer (positiva ou negativamente) a necessária proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua reparação” (20).
Ter-se-á, pois, de averiguar o valor do bem à data da expropriação por utilidade pública, o que implica “jogar” com elementos conjunturais e variadas circunstâncias que podem conduzir à valorização ou desvalorização do prédio. Só assim se poderá, com alguma segurança, encontrar o preço que um interessado estaria disposto a pagar, atendendo à localização, características e rendimentos que a parcela é passível de produzir.

Como se refere no Acórdão do TC n.º 641/2013 (relatora Maria de Fátima Mata-Mouros):
«Sem prejuízo da liberdade de escolha deixada ao legislador, a imposição da “justa indemnização” inserida na norma constitucional não pode ser vista como uma fórmula vazia, antes se apresentando como carregada de sentido limitador da discricionariedade legislativa.
(…) «na valoração dos vários critérios legais aplicáveis, de acordo com a natureza e situação do bem expropriado, o Tribunal [Constitucional] tem perfilhado consolidadamente a orientação geral de que “tal indemnização tem como medida o prejuízo que para o expropriado resulta da expropriação”, na sintética, mas rigorosa, formulação do Acórdão n.º 52/90. Pondo de lado fatores especulativos, muitas vezes artificialmente criados (Acórdão n.º 381/89), a “justa indemnização” há de tomar como ponto de referência o valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo “princípio da equivalência de valores”, como se extrata do Acórdão n.º 11/2008. O princípio da justa indemnização impõe uma compensação integral, tendencialmente correspondente ao valor venal do bem, de acordo com a sua cotação no mercado. A função da indemnização é a de fazer entrar, na esfera do atingido, o equivalente pecuniário do bem expropriado, de tal modo que, efetuada a expropriação, o seu património ativo muda de composição, mas não diminui de valor» (Joaquim de Sousa Ribeiro, ob. cit. p. 39).
Assim, «a indemnização deve corresponder à reposição no património do expropriado do valor dos bens de que foi privado, por meio de pagamento do seu justo preço em dinheiro. Por isso se diz que a expropriação vem a resolver-se numa conversão de valores patrimoniais: no património onde estavam imóveis, a entidade expropriante põe o seu valor pecuniário» (Marcello Caetano, in Manual de Direito Administrativo, em colaboração com Freitas do Amaral, 9.ª edição (reimpressão), revista e atualizada por Diogo Freitas do Amaral, Almedina, tomo II, p. 1036)».
Como tem sido assinalado pela doutrina da especialidade (21), «o conceito constitucional de “justa indemnização” leva implicado três ideias: a proibição de uma indemnização meramente nominal, irrisória ou simbólica; o respeito pelo princípio da igualdade de encargos; e a consideração do interesse público da expropriação».

Do art. 62º da CRP, conjugado com os arts 1º e 23º do CE, decorrem, pois, quatro importantes corolários (22):
a) Não pode haver expropriação sem o pagamento de uma justa indemnização;
b) A justa indemnização tem por natureza compensar o expropriado pelos danos sofridos.
c) A justa indemnização é devida desde a prolação do acto expropriativo, impondo-se o seu pagamento contemporâneo;
d) O direito de propriedade e o direito à indemnização traduzindo-se em direitos de natureza análoga à dos direitos fundamentais são directamente aplicáveis, vinculando as entidades públicas e privadas, nomeadamente o expropriante e o beneficiário da expropriação (cfr. arts. 17º e 18º da CRP).

Assim, e em conclusão, a indemnização será justa quando o prejuízo sofrido pelo expropriado seja compensado com essa quantia equivalente à que receberia se tivesse procedido à venda do objecto da expropriação em condições normais de mercado, observados que sejam os critérios legais previstos nos arts. 24º e segs. do CE.
A expropriação, no tocante à definição dos critérios de justa indemnização, está sujeita ao princípio da igualdade, tanto no domínio das chamadas relações internas – obrigando a um tratamento igual dos diversos expropriados –, como no das relações externas – procurando colocar os expropriados em igualdade de circunstâncias com os não expropriados – cfr. art. 13º da C.R.P. e art. 2º do CE.
Segundo F. Alves Correia (23), “no campo da relação interna da expropriação, confrontam-se as regras de indemnização aplicáveis às diferentes expropriações. Neste domínio, o princípio da igualdade impõe ao legislador, na definição de regras de indemnização por expropriação, um limite inderrogável: não pode fixar critérios de indemnização que variem de acordo com os fins públicos específicos das expropriações (v. g., critérios de indemnização diferentes para as expropriações de imóveis destinados à abertura de vias férreas, ao rasgo de auto-estradas, à execução dos planos urbanísticos, etc.) com os seus objectos (v. g., critérios diferenciados de indemnização para as expropriações de imóveis e móveis, prédios rústicos e prédios urbanos, solos agrícolas e solos urbanizados, etc.) e com o procedimento a que elas se subordinam. O princípio da igualdade não permite que particulares colocados numa situação idêntica recebam indemnizações quantitativamente diversas ou que sejam fixados critérios distintos de indemnização que tratem alguns expropriados mais favoravelmente do que outros grupos de expropriados. Aquele princípio obriga o legislador a estabelecer critérios uniformes de cálculo da indemnização, que evitem tratamentos diferenciados entre os particulares sujeitos a expropriação.
No domínio da relação externa da expropriação, comparam-se os expropriados com os não expropriados, devendo a indemnização por expropriação ser fixada num montante tal que impeça um tratamento desigual entre os dois grupos. A observância do 'princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos' na expropriação por utilidade pública exige que esta seja acompanhada de uma indemnização integral (…) ou de uma compensação integral do dano infligido ao expropriado. Aquele princípio impõe que a indemnização por expropriação possua um 'carácter reequilibrador' em benefício do sujeito expropriado, objectivo que só será atingido se a indemnização se traduzir numa 'compensação séria e adequada' ou, noutros termos, numa compensação integral do dano suportado pelo particular, em termos de o colocar na posição de adquirir outro bem de igual natureza e valor”.
Por último, constitui entendimento pacífico dos nossos Tribunais superiores de que, atenta a especificidade técnica que em sede avaliativa o processo expropriativo implica, tanto que a peritagem é obrigatória (art. 61º, n.º 2, do CE) (24), que, “ainda que a prova não seja vinculativa, mas tratando-se de um problema essencialmente técnico, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal quando haja unanimidade destes” (25).
Ponto é que se observem os critérios legais, sendo certo que o juiz decidirá segundo a sua convicção, formada sobre a livre apreciação das provas (apreciará livremente os elementos de prova, sem estar sujeito ao laudo dos peritos) (26).
Assim, não podemos deixar de ter presente o referido entendimento em matéria de determinação do valor da indemnização, tanto mais que a problemática central do presente recurso incide sobremaneira nos critérios seguidos na sua fixação.
Tendo presentes estes considerandos jurídicos, importa particularizar ao caso concreto.

No tocante à classificação e avaliação da parcela expropriada, o apelante/expropriado insurge-se contra o decidido na sentença impugnada, aduzindo os seguintes argumentos:

- Nos pontos 4 e 6 dos factos dados como provados é possível aferir a descrição da localização, características e infraestruturas existentes in loco, as quais, ao subsumirem-se ao art. 25º do CE, apenas poderiam levar a que a parcela objeto da presente ablação fosse classificada na totalidade como “solo apto para construção”, com todas as consequências daí advenientes.
- Circunstância que tinha ficado assente desde a VAPRM quando esta, na resposta ao quesito 18 apresentado pelo Expropriado, refere que a parcela expropriada «…encontra-se inserida em Solo Urbano, com a classificação de Zonas Urbanas de Aplicação de PMOT…».
- O laudo maioritário optou por avaliar parte da parcela expropriada como “solo apto para outros fins” contradizendo, assim, a VAPRM e violando as disposições e regras previstas para o Processo Expropriatório, designadamente, o art. 25º do CE que se sobrepõe aos Instrumentos de Gestão Territorial em vigor e, ainda, violando o princípio da justa indemnização consignado no art. 23º do CE ao desvalorizar de forma anómala o terreno expropriado.
- Tendo dado como provados os factos constantes nos pontos 4, 5 e 6 e atento o teor da VAPRM, não poderia o Tribunal “a quo” ter entendido outra coisa que não seja que toda a parcela se devia classificar como “solo apto para construção” com todas as consequências daí advenientes.
- Acresce que os Peritos subscritores do laudo maioritário na parte da parcela expropriada que classificam como “solo apto para construção” aplicam um valor a título de custo de construção irrisório e sem qualquer fundamento, o qual tem na sua génese o critério que determinava a fixação do custo de construção em função dos valores fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada nos termos da Portaria n.º 353/2013, de 4/12, aplicável por força do Decreto-Lei n.º 329-A/2000, de 22 de dezembro, que foi revogado pela Lei n.º 80/2014 de 19/12, momento a partir do qual o único critério aplicável para o cálculo do custo de construção das parcelas expropriadas passou a ser o dos valores médios reais e correntes de mercado que apenas foi consultado e tido em linha de conta pelo Perito indicado pelo Expropriado, subscritor do Laudo Minoritário, que não foi tido em consideração pelo Tribunal “a quo”.
- Ao aderir ao laudo maioritário o Tribunal “a quo” não só chegou a um valor irrisório a título de justa indemnização e que viola o disposto nos arts. 26º e 23º do Código das Expropriações, como ainda aplicou normas de Direito revogadas.

Em contraponto, a apelante/expropriante também se manifesta contra a sentença recorrida, aduzindo em seu favor a seguinte linha argumentativa:

- O PDM tem relevância na classificação e valorização do terreno, pois condiciona o tipo de aproveitamento económico que o proprietário pode dar ao terreno e vai influir directamente no valor de mercado do mesmo.
- O PDM de ... em vigor classifica o prédio em zonas Urbanas de Aplicação de PMOT, zonas florestais de protecção e espaços agrícolas.
- Quanto às condicionantes, apenas os espaços agrícolas se inserem em zona de Reserva Agrícola.
Às zonas urbanas de aplicação de PMOT aplica-se o PUC de ..., inserindo-se as áreas urbanas em zona de enquadramento paisagístico.
- A Planta de Condicionantes relativa ao PDMFCI, que complementa o PDM, classifica parte do terreno expropriado como Faixa de Gestão de Combustível.
- A categoria da Faixa de Gestão de Combustível sobrepõe-se a outras categorias de espaço, não sendo possível contruir em terrenos com esta classificação.
- A parcela expropriada ocupa, parcialmente, solo classificado como Zonas de Enquadramento Paisagístico, Zonas Florestais de Protecção e, ainda, Zona de Faixa de Protecção.
A parcela expropriada subdivide-se em 3 tipos de zonas:
- Zonas Urbanas de Aplicação do PMOT, com 7.344 m2
- Zonas Florestais de Protecção, com 6.900 m2
- Faixa de gestão de combustível: com 7.440 m2.
- A posição do perito indicado pela expropriante é a única que permite alcançar os desígnios da justa indemnização e ressarcimento do prejuízo que efectivamente advém para o expropriado.
Delineadas as posições em confronto impõe-se, antes de mais, classificar o terreno onde se situa a parcela a expropriar do ponto de vista da sua aptidão para a construção ou para outros fins, uma vez que tal é determinante do cálculo da indemnização, nos termos previstos no art. 25º, n.º 1, do CE.
Para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o citado preceito legal classifica os solos em "solo apto para a construção" (al. a) e "solo para outros fins" (al. b).

E, o n.º 2 do mesmo artigo, considera solo apto para construção:

a) O que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir;
b) O que apenas dispõe de parte das infra-estruturas referidas na alínea anterior, mas se integra em núcleo urbano existente;
c) O que está destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a adquirir as características descritas na alínea a);
d) O que, não estando abrangido pelo disposto nas alíneas anteriores, possui, todavia, alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da declaração de utilidade pública, desde que o processo respectivo se tenha iniciado antes da data da notificação a que se refere o n.º 5 do artigo 10.º”.
Por sua vez, o seu n.º 3 considera “solo para outros fins o que não se encontra em qualquer das situações previstas no número anterior”.
Conforme se observa no Ac. do STJ de 16/03/2017 (relatora Maria dos Prazeres Beleza), in www.dgsi.pt., “[…] a introdução da distinção entre solos aptos para construção e solos para outros fins teve como objetivo alcançar uma forma mais adequada de fixação do valor dos terrenos expropriados, em obediência aos princípios constitucionais da justa indemnização (nº 2 do artigo 62º da Constituição) e da igualdade (artigo 13º, nº 1, também da Constituição), e tomando em consideração “a jurisprudência do Tribunal Constitucional a propósito do artigo 30º do Código” então “revogado”.[…]
Pretendeu-se, assim, consagrar na lei a relevância da “potencial aptidão edificativa dos terrenos expropriados e localizados fora dos aglomerados urbanos ou em zona diferenciada de aglomerado urbano”, ressalvando, no entanto, eventuais “restrições ou até mesmo proibições ao direito de construção”, resultantes, por exemplo, de servidões ou de regulamentos”.
Fernando Alves Correia (27) refere que para a determinação das espécies de terrenos que integram a classe de solo apto para construção, “[n]ão adotou o legislador , na linha do Código de 1991 […] um critério abstrato de aptidão edificativa – já que, abstrata ou teoricamente, todo o solo, mesmo o de prédios rústicos, é passível de edificação -, mas antes um critério concreto de potencialidade edificativa. Na definição do solo apto para construção, teve o legislador em conta, […] elementos certos e objetivos[…]”.
Não podem, porém, ser classificados como aptos para construção, apesar de poderem preencher alguma das alíneas do n.º 2 do art. 25º, os solos que apresentem (28):
- falta de condições materiais que permitam a edificação;
- servidões non aedificandi;
- proibição de construção imposta por lei ou regulamento.
Quanto a este último ponto importa ter presente que o CE atribui relevância aos instrumentos de gestão territorial para a classificação de um solo como apto para construção.
Isto porque na qualificação jurídica do prédio não se podem desconsiderar as condicionantes de ordem regulamentar que existiam e que decorriam do Plano Diretor Municipal (PDM) (29) de ... (30).
De facto, a aptidão para a construção não prescinde jamais dos instrumentos jurídicos de cariz urbanístico aplicáveis a cada caso. Em potência, todo o solo pode ser apto para construção: basta que alguém se proponha construir e que a construção seja licenciada pelas autoridades competentes. Mas não é a essa potencialidade edificativa abstracta que deve atender-se, antes à que resultar da integração em alguma das previsões do art. 25º do CE, conjugada com os instrumentos urbanísticos vigentes na data da DUP.
Apesar de não se encontrar consagrado no Código atual um preceito análogo do n.º 5 do art. 24º do Cód. das Expropriações de 1991 – que dispunha que o solo onde não seja possível construir devido a proibição legal ou regulamentar é equiparado a solo para outros fins –, entende-se que se deve continuar a aplicar a tese nele defendida.
Depreende-se da leitura da jurisprudência constitucional que não existindo uma expetativa razoável de um terreno vir a ser desafetado da RAN e destinado à construção, não se pode invocar o princípio da justa indemnização, de modo a valorizar-se o solo com base numa potencialidade edificativa legalmente inexistente.
Só quando a expropriação tenha como fim a edificação de um prédio urbano (escolas, bairros sociais, etc.) é que a valorização do solo como “para outros fins” ofende os princípios constitucionais da justa indemnização e igualdade (31).

No caso presente, na sentença recorrida a Mm.ª Juíza “a quo” aderiu na íntegra ao laudo maioritário – subscrito pelos peritos nomeados pelo Tribunal –, no qual, atenta a classificação urbanística do solo do prédio, foi considerada a seguinte repartição de classificação de solos:
- Parte em zonas urbanas de aplicação de PMOT: 14 784,00 m2
- Parte em zonas florestais de proteção: 6 900,00 m2.
Dessa posição divergiram quer o perito indicado pelo expropriado, quer o indicado pela expropriante, sendo que as partes ancoram-se nas posições dos respetivos peritos para dissentir da classificação adoptada na sentença recorrida.

Concretizando:
- o perito indicado pelo expropriado, atendendo a que a área da parcela objeto da expropriação confronta parcialmente no seu limite nascente com a zona florestal de proteção, constatando-se que na v.a.p.r.m, designadamente na resposta ao quesito n.º 18 – “a presente parcela de expropriação encontra-se inserida em solo urbano, com qualificação de Zonas urbanas de Aplicação de PMOT, …” –, ou seja, em zona de enquadramento paisagístico”, considerou-a, na sua totalidade, como “solo apto para construção”, classificação esta reclamada pelo expropriado.
- o perito indicado pelo expropriante, por sua vez, efetuou a seguinte distinção:
- Parte em zonas urbanas de aplicação de PMOT: 7 344,00 m2;
- Parte em zonas florestais de proteção: 6 900,00 m2;
- Parte em zonas com faixas de gestão combustível: 7 440,00 m2.

Com relevo mostra-se provado que:
- O prédio donde se destaca a parcela expropriada possuiu vários edifícios de apoio à Diocese de ..., ocupando cerca de 5% da área do prédio incluindo áreas de logradouro e espaços de apoio ao edificado; no envolvente do conjunto de edifícios e numa faixa de cerca de 100m de largura ao longo da marginal, a norte apresenta ocupação efetiva agrícola com cerca de 22% da área; a parte restante encontra-se ocupada com aproveitamento florestal, em cerca de 73% (ponto 3 dos factos provados);
- O prédio encontra-se numa zona urbana, próxima de zonas balneares de qualidade e de equipamentos desportivos e complementares, tais como hotéis, parques de campismo, apartamentos turísticos, escolas, igreja, centro pastoral, restauração, comércio e habitação (ponto 4 dos factos provados);
- A nível de inserção nos Instrumentos de Gestão Territorial, designadamente o Plano Diretor Municipal de ..., classifica o prédio em zonas urbanas de aplicação de PMOT, zonas florestais de proteção e espaços agrícolas; apenas os espaços agrícolas se inserem em zona de reserva Agrícola; parte da parcela expropriada ocupa solo classificado em “ Zonas de Enquadramento Paisagístico “ com cerca de 14 784,00 m2 e a outra parte ocupa solo classificado em “ Zonas Florestais de Proteção “ com cerca de 6.900,00 m2 (ponto 5 dos factos provados);
- A parcela expropriada, com uma área de 21.684,99 m2, em formato semelhante a um retângulo alongado, no sentido norte/sul, atravessa todo o prédio numa extensão com cerca de 900 metros (ponto 7 dos factos provados);
- A parcela expropriada possui um solo de constituição arenosa com profundidade e sem afloramentos rochosos visíveis, dada a proximidade do Rio Lima e zona costeira, sem inclinações, com aproveitamento agrícola – 13% e florestal – 77% (ponto 8 dos factos provados);
Iniciando a nossa análise pelo argumento (aduzido pelo expropriado) do caso julgado dos factos assentes na v.a.p.r.m, dir-se-á, sem quebra do devido respeito por opinião contrária, que o mesmo não poderá proceder.
Como é sabido, a v.a.p.r.m é um meio de prova pericial destinada a fixar os elementos de facto susceptíveis de desaparecerem e cujo conhecimento seja de interesse ao julgamento do processo (art. 20º, n.º 1, al. c) do CE).
Apesar de possuir um valor probatório especial face ao dos outros meios de prova constantes do CPC, não tem a força de documento autêntico. A especial força probatória do relatório da v.a.p.r.m advém da circunstância de, a partir de certo momento, já não ser possível uma nova apreciação das características do bem objeto de expropriação, em virtude deste já poder ter sido ocupado pela entidade expropriante.
O auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam deve conter uma descrição pormenorizada não só da parcela a explorar como também do local onde ela se insere. Caso a expropriação seja parcial, deverão igualmente ser vistoriadas as áreas sobrantes, posto constituírem elementos susceptíveis de influírem na determinação da justa indemnização, nos termos do critérios constantes no CE [art. 21º, n.º 4, al. b)] (32).
Ora, no caso em apreço, não obstante na v.a.p.r.m, designadamente na resposta ao quesito n.º 18 o perito avaliador ter respondido que “a presente parcela de expropriação encontra-se inserida em solo urbano, com qualificação de Zonas urbanas de Aplicação de PMOT, conforme já referido no ponto 4 do presente Auto de Vistoria” (33), certo é que essa menção carece de ser lida e interpretada em função do explicitado no ponto 4 do referido auto, onde se consignou que (34):
“Conforme se poderá verificar na Planta de Ordenamento do PDM, (…), o prédio está inserido em Solo Urbano, com a qualificação de Zonas Urbanas de Aplicação de PMOT numa faixa situada a poente, e em zona Rural, com a qualificação de Espaços Agrícolas numa zona situada junto ao vértice norte/nascente e com a qualificação de Zonas Florestais de Proteção numa zona intermédia”.
Quer isto dizer que, contrariamente ao aduzido pelo expropriado, no que tange ao seu enquadramento urbanístico ou à classificação do solo a v.a.p.r.m não restringe a inserção da parcela expropriada a solo urbano, já que faz a diferenciação que ulteriormente viria a ser acolhida, quer em sede de arbitragem (35), quer em sede de peritagem, nesta pelo laudo maioritário (36).
Acresce que a classificação do solo consubstancia matéria de direito, pelo que a resposta aduzida no v.a.p.r.m não é vinculativa, não estando subtraída à apreciação do Tribunal.
Donde não se subscreva a afirmação de que o laudo maioritário contradiga a VAPRM e o caso julgado dos factos dados como assentes nessa lide.
Acresce que a divisão das áreas feita no laudo maioritário respeita a carta de PDM de ..., na qual o prédio está classificado em zonas urbanas de aplicação de PMOT, zonas florestais de protecção e espaços agrícolas.
Por sua vez, a área classificada no PDM como zonas urbanas de aplicação de PMOT está abrangida pelo Plano de Urbanização da cidade de ... (PUC) na classificação de Zonas de enquadramento paisagístico.
No caso, face aos elementos indicados, tendo-se verificado que a parcela dispõe das infraestruturas referidas na alínea a) do n.º 2 do citado art. 25.º do CE – acesso rodoviário pavimentado, passeios ao lado da parcela, rede de abastecimento de águas, rede de saneamento com coletor em serviço com ligação a estação depuradora, rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, rede de drenagem de águas pluviais com coletor de serviço, rede de distribuição de gás, rede telefónica, iluminação pública, transportes públicos à face do prédio, designadamente Avenida do ... e Avenida ... ( EN 13 ) e Estação de caminho de ferro de ... - Areia, a cerca de 1 Km do prédio (ponto 6 dos factos provados) –, mostra-se preenchida a previsão constante da alínea a) do preceito.
E, mesmo que dispusesse apenas de parte das mencionadas infraestruturas, uma vez que se integra em núcleo urbano existente, poder-se-ia ainda considerar que se encontra na situação prevista na alínea b) do n.º 2 do art. 25.º do CE.
Assim, e numa interpretação literal e isolada dos preceitos em causa, o referido solo teria que ser considerado como “solo apto para construção”.
Mas será que a verificação de uma das circunstâncias previstas na citada disposição determina, necessária e automaticamente, a classificação do solo como “apto para construção” (como pretende o recorrente/expropriado)?
Parece-nos claro que não.
Na verdade, a classificação de um solo como “solo apto para construção”, para efeitos de fixação da justa indemnização, não decorre, necessária e automaticamente, da verificação das situações previstas no citado art. 25º, n.º 2, do CE, não podendo ser assim classificado um terreno que, embora se encontre naquela situação, não tem, na realidade, qualquer potencialidade edificativa devido à impossibilidade – decorrente das leis e regulamentos em vigor – de nele proceder a qualquer construção (37).
Como se refere no acórdão no Ac. do STJ de 08/02/2011 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt., “a classificação do solo como apto para construção, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 25.º do Código das Expropriações de 1999, não é automática, ainda que verificado qualquer dos requisitos do n.º 2, devendo ceder se a lei geral ou o PDM impedir a sua utilização (o normal “jus aedificandi”) para aquele fim”, acrescentando que “não podendo ser visto numa perspectiva abstracta, o “jus aedificandi” depende de autorização genérica da lei para poder considerar-se haver potencialidade edificativa, que terá de ser efectiva e não eventual por não ter consagração possível nos planos municipais de ordenamento”.
Temos, pois, como assente que não pode ser classificado como “apto para construção” um terreno em que, de acordo com as leis e regulamentos em vigor, não é permitida a construção e relativamente ao qual não existe qualquer expectativa legítima e concreta de tal construção vir a ser autorizada, ainda que tal terreno se encontre nas situações previstas no art. 25º, n.º 2, als. a) e/ou b) do CE.
Ora, como decorre da matéria de facto provada, de acordo com o instrumento de gestão territorial (PDM de ...) o prédio em causa está classificado em zonas urbanas de aplicação de PMOT, zonas florestais de proteção e espaços agrícolas; apenas os espaços agrícolas se inserem em zona de reserva Agrícola; parte da parcela expropriada ocupa solo classificado em “Zonas de Enquadramento Paisagístico”, com cerca de 14 784,00 m2, e a outra parte ocupa solo classificado em “Zonas Florestais de Proteção”, com cerca de 6 900,00 m2.
Para as Zonas Urbanas de Aplicação de PMOT, o Regulamento do PDM caracteriza essas áreas através do art. 94.° e regulamenta o regime de edificabilidade através do art. 95.° (38).
A área classificada no PDM como “Zonas Urbanas de Aplicação de PMOT” está abrangida pelo PUC (Plano de urbanização da cidade) de ..., segundo a classificação de “Zonas de Enquadramento Paisagístico” (39).
Para as Zonas de Espaços Agrícolas, o Regulamento do PDM caracteriza essas áreas através do art. 13.° e regulamenta o regime e a edificabilidade através dos arts. 14.° e 15.° (40).
Para as Zonas Florestais de Protecção, o Regulamento do PDM caracteriza essas áreas através do art. 21.° e regulamenta o regime através do art. 22.° (41).
Neste contexto, contrariamente ao propugnado pelo expropriado, não vemos como possa avançar-se para uma classificação, para toda a parcela expropriada (21 684m2), como “solo apto para construção”, quando se constata que o instrumento urbanístico essencial nega a possibilidade dessa utilização nalgumas dessas áreas, mais concretamente nas “Zonas de Espaços Agrícolas” e “Zonas Florestais de Protecção”, que não são consideradas urbanas e/ou urbanizáveis. Com efeito, parte do solo da parcela não está destinado de acordo com o instrumento de gestão territorial, ou seja, de acordo com o Plano Director Municipal de ..., a adquirir as características adequadas para permitir a construção, nos termos do disposto no art. 25º, n.º 1, al. c) do CE.
Como se disse, a qualificação como “solo apto a construção” não pode ser feita de modo abstracto, antes considerando a regulamentação urbanística aplicável. Não pode, através de uma tal qualificação, superar-se algum impedimento legal, quer o que emana dos regimes da RAN ou da REN, quer o que respeita a servidões administrativas ou outras restrições urbanísticas (v.g. envolvente de edifícios classificados), quer ainda, como é o caso, o que emerge do PDM que constitui o instrumento que a nível municipal serve de guião quer aos particulares, quer aos serviços municipais competentes (42).
Por outro lado, no tocante à pretensão da expropriante no sentido de serem atendidas as restrições ou condicionantes decorrentes de parte do terreno expropriado estar inserido em “faixa de gestão de combustível” (43), dir-se-á que da matéria de facto provada não se conclui que essa faixa retira de forma significativa a aptidão construtiva no prédio onde se inseria a parcela (na parte não abrangida), por não abarcar inteiramente o prédio e se verificar que nem sequer preenche a totalidade da parcela. Assim, não é possível concluir que, por via dessa restrição, aquele e esta não podiam ou podem comportar construções e que estas restrições lhe retiram capacidade construtiva.
A referência aos fins múltiplos atribuídos ao prédio pelo instrumento de gestão territorial, conjuntamente com as estruturas referidas na alínea a) do n.º 2 do citado art. 25.º do CE de que a parcela beneficia e integrando-se em núcleo urbano existente, concedem-lhe potencialidade edificativa com suficiente proximidade para que se considere tal capacidade na sua classificação. Em suma, não se encontram ali plasmados condicionamentos à construção de tal forma graves, porque não atingem a totalidade do prédio e da parcela objeto da expropriação, que se possa afirmar que não havia uma séria e justa expetativa de nela poder construir pelos seus beneficiários (44).
Considerando, pois, que apenas parte do terreno tem capacidade construtiva, deve neste caso a parte restante do mesmo ser classificada como solo para outros fins.
Como tal, entendemos que se mostra adequada a classificação bipartida do solo da parcela expropriada efetuada pela 1.ª instância (tal como preconizado na arbitragem, bem como no laudo maioritário da peritagem), pois que respeita o instrumento urbanístico aplicável, pelo que improcede, nesta parte, a apelação intentada quer pelo expropriado, como pela entidade expropriante.
Em consequência, mostra-se prejudicada a apreciação dos critérios de cálculo do valor da indemnização indicados pela entidade expropriante com fundamento na classificação tripartida do solo, em que às zonas urbanas de aplicação PMOT (7.344 m2) e às Zonas Florestais de Protecção, (6.900 m2) pretendia ver ainda reconhecida a Faixa de gestão de combustível (7.440 m2).
*
Passemos de seguida ao cálculo do valor do solo.

Dispondo acerca do cálculo do valor do solo apto para a construção, prescreve o art. 26º do CE que:

«1 - O valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23.º
2 - O valor do solo apto para construção será o resultante da média aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições, ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados, efectuadas na mesma freguesia e nas freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com média anual mais elevada, relativamente a prédios com idênticas características, atendendo aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial, corrigido por ponderação da envolvente urbana do bem expropriado, nomeadamente no que diz respeito ao tipo de construção existente, numa percentagem máxima de 10%.
3 - Para os efeitos previstos no número anterior, os serviços competentes do Ministério das Finanças deverão fornecer, a solicitação da entidade expropriante, a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na zona e os respectivos valores.
4 - Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no n.º 2, por falta de elementos, o valor do solo apto para a construção calcula-se em função do custo da construção, em condições normais de mercado, nos termos dos números seguintes.
5 - Na determinação do custo da construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.
6 - Num aproveitamento economicamente normal, o valor do solo apto para a construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção, devidamente fundamentado, variando, nomeadamente, em função da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
7 - A percentagem fixada nos termos do número anterior poderá ser acrescida até ao limite de cada uma das percentagens seguintes, e com a variação que se mostrar justificada:
a) Acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente junto da parcela - 1,5%;
b) Passeios em toda a extensão do arruamento ou do quarteirão, do lado da parcela - 0,5%;
c) Rede de abastecimento domiciliário de água, com serviço junto da parcela - 1%;
d) Rede de saneamento, com colector em serviço junto da parcela - 1,5%;
e) Rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão com serviço junto da parcela - 1%;
f) Rede de drenagem de águas pluviais com colector em serviço junto da parcela - 0,5%;
g) Estação depuradora, em ligação com a rede de colectores de saneamento com serviço junto da parcela - 2%;
h) Rede distribuidora de gás junto da parcela - 1%;
i) Rede telefónica junto da parcela - 1%.
8 - Se o custo da construção for substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ou adicionado ao custo da edificação a considerar para efeito da determinação do valor do terreno.
9 - Se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixado nos n.ºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas.
10 - O valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos n.os 4 a 9 será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação.
11 - No cálculo do valor do solo apto para a construção em áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, legalmente fixadas, ter-se-á em conta que o volume e o tipo de construção possível não deve exceder os da média das construções existentes do lado do traçado do arruamento em que se situe, compreendido entre duas vias consecutivas.
12 - Sendo necessário expropriar solos classificados como zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada”.

Sendo considerado o solo apto para a construção, o presente normativo estabelece “os parâmetros para o método de cálculo do seu valor, reforçando o n.º 1 o entendimento vertido no artigo 23º, n.º 1, de acordo com o qual o valor do solo apto para construção é apurado por referência à construção que no mesmo seria possível efectuar caso não tivesse sido expropriado, numa situação de aproveitamento económico normal do imóvel. Aproveitamento, esse, entendido no sentido de ser o praticado ou passível de o ser na parcela e sua envolvente ou ainda o enquadrável no artigo 23º, n.º 5” (45).
O laudo maioritário (integralmente acolhido na sentença recorrida) considerou não aplicável ao caso presente, por falta de elementos, o critério estabelecido no n.º 2 do referido art. 26.º, o que vem questionado no recurso interposto pelo expropriado (46).
Contrapõe este que os peritos subscritores do laudo maioritário na parte da parcela expropriada que classificam como “solo apto para construção” aplicam um valor a título de custo de construção irrisório e sem qualquer fundamento, o qual tem na sua génese o critério que determinava a fixação do custo de construção em função dos valores fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada nos termos da Portaria n.º 353/2013, de 4 de dezembro, aplicável por força do Decreto-Lei n.º 329-A/2000, de 22 de dezembro, que foi revogado pela Lei n.º 80/2014 de 19 de dezembro, momento a partir do qual o único critério aplicável para o cálculo do custo de construção das parcelas expropriadas passou a ser o dos valores médios reais e correntes de mercado que apenas foi consultado e tido em linha de conta pelo perito indicado pelo expropriado subscritor do laudo minoritário que não foi tido em consideração pelo Tribunal “a quo” (cfr. conclusões XII a XIV).
Como é sabido, apesar do critério previsto no n.º 2 do art. 26º – que privilegia o recurso à média aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisição – constituir o principal critério referencial para o cálculo do valor do solo apto para construção é frequentemente substituído pelo critério supletivo referente ao custo da construção em condições normais de mercado previsto no n.º 4 do mesmo normativo, por impossibilidade ou dificuldade de funcionamento em determinados casos concretos, por falta de elementos necessários à sua correcta aplicação.
Como reconhece Salvador da Costa (47), “este critério de cálculo só pode funcionar adequadamente se os árbitros e os peritos tiverem acesso aos referidos elementos fiscais, se estes forem completos, incluindo a área, o volume da construção e o valor unitário do solo, e se as avaliações fiscais forem idóneas à correcção das declarações de preço das transacções”.
Também Pedro Elias da Costa (48) se pronuncia no sentido de não ser aplicável o método em causa quando falhe algum dos apontados elementos, designadamente quando os serviços do Ministério das Finanças não forneçam as listas das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados, efectuados na mesma freguesia ou em freguesias limítrofes nos últimos cinco anos.
Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no n.º 2, por falta de elementos, resulta dos n.ºs 4 e 5 do art. 26º que na determinação do custo unitário da construção a lei fornece um critério referencial que consiste em recorrer aos valores fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.
A respeito da natureza do critério apontado, Pedro Elias da Costa refere (49) que: “[e]ste critério tem de ser visto conforme é, ou seja, como uma regra orientadora do cálculo, com carácter meramente referencial, tal como as percentagens do nº 6 e 7 do art. 26º, que também poderão não ter correspondência com as verificadas em dada situação concreta.
Assim, importante será que o resultado da avaliação seja o valor real e corrente da parcela expropriada.
Considerando-se, justificadamente, que os valores fixados administrativamente não permitem alcançar o valor de mercado de determinado solo, pode recorrer-se a outros elementos, como, por exemplo, as estimativas orçamentais elaboradas pela …… (…) ou dados estatísticos publicados em revistas especializadas ou em jornais diários”.
Como tem sido defendido por alguma doutrina (50), o n.º 5 do art.º 26.º do CE “não impõe uma correspondência do preço por metro quadrado e construção, para efeitos de expropriação, ao preço por metro quadrado de construção fixado administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, mas apenas uma obrigação de consideração destes preços como padrão de referência ou como factor indiciário do custo do metro quadrado de construção para o cálculo da indemnização por expropriação”.
Ou seja, sendo o critério do cálculo do custo de construção meramente referencial, é possível atender a outros critérios, entre os aplicáveis previstos no art.º 26.º do CE (51).

Na jurisprudência seguindo a orientação exposta e reforçando a natureza de critério referencial, entre outros, pronunciaram-se:
- Ac. da RL de 08/10/2009 (relator Granja da Fonseca), in www.dgsi.pt:
O custo da construção respeita à edificação propriamente dita, devendo, por isso, atender-se às despesas de mão-de-obra, materiais, equipamentos, subempreiteiros, às despesas relativas ao estaleiro da obra e às despesas com pessoal administrativo e técnico da obra, isto é, ao custo directo de produção.
Quando uma fracção é colocada em venda, além das despesas relativas ao custo de produção, haverá que tomar em atenção outras despesas, com grande repercussão sobre o custo final da obra, como sejam os encargos administrativos e que respeitam às despesas com projectos, licenças, taxas, gestão da obra, sua fiscalização, responsabilidades financeiras, consumíveis, equipamentos, promoções imobiliárias, lucros do promotor, etc, despesas essas relativas ao custo indirecto de produção.
Donde se conclui que o valor da construção, ou seja, o preço final de venda ao público de uma fracção, reflecte o somatório do custo directo da produção (objectivo) com o custo indirecto da produção (subjectivo).
Calcular a indemnização com base no valor de mercado da construção seria violar o princípio da igualdade no âmbito da relação interna da expropriação, porquanto a ampla subjectividade, que encerra, permitiria tratamentos diferenciados entre os particulares sujeitos a expropriação que o legislador quis evitar.
Acresce que, visando a justa indemnização ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, não seria aceitável incluir no seu cômputo prejuízos que o expropriado não teve.
Por essa razão, o artigo 26º, n.º 5 do CE estabelece o critério legal para a determinação do valor do solo apto para a construção, nos termos do qual deve atender-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados.
Tais montantes não são, porém, vinculativos porque, além de versarem apenas a habitação, fixam o custo unitário da construção relativo à área útil que é sempre superior ao da área bruta. No entanto, os mesmos só não deverão ser atendidos se, comprovadamente, não corresponderem ao custo da construção na zona onde se localiza a parcela”.
- Ac. da RL de 09/02/2010 (relatora Maria Amélia Ribeiro), www.dgsi.pt.:
O valor do solo edificável calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal.
Como primeiro critério referencial do custo da construção, manda a lei que (perante a inaplicabilidade do critério estabelecido no nº 2 do art. 26º) se ponderem os montantes fixados administrativamente no âmbito do regime de habitação a custos controlados ou de renda condicionada (art.º 26º/5).
- Ac. da RP de 11/10/2012 (relatora Judite Pires), in www.dgsi.pt.:
Sendo referencial, o critério do regime de habitação a custos controlados ou de renda condicionada não é vinculativo para o tribunal, que, oficiosamente, ou a requerimento das partes, pode recorrer a outro para esse efeito avaliativo, nos termos do nº 4 do artigo 23º do Código das Expropriações.
- Ac. da RC de 12/03/2013 (relatora Catarina Gonçalves), in www.dgsi.pt.:
Do n.º 5 do art. 26º o que se determina não é a aplicação automática dos valores fixados administrativamente, mas sim a sua consideração como valor referencial; não é imposta uma correspondência do preço por metro quadrado de construção, para efeito de expropriação, ao preço por metro quadrado de construção fixado administrativamente para efeito da aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, existe apenas uma obrigação de considerar estes valores como padrão de referência ou como factor indiciário do custo do metro quadrado de construção para o cálculo da indemnização por expropriação.
Ou seja, os referidos valores fixados administrativamente servem apenas como critérios orientadores e referenciais e como forma de obter o valor real e corrente dos bens, até porque aqueles valores reportam-se ao metro quadrado de área útil de construção e não ao metro quadrado de área bruta.
- Ac. da RP de 09/12/2014 (relator Vieira e Cunha), in www.dgsi.pt.:
Os peritos subscritores do laudo maioritário, considerando a ausência dos elementos referidos no n.º 2 do art. 26º do CE, designadamente no que diz respeito aos preços unitários de aquisições, ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados, a disponibilizar pela Entidade expropriante, adoptaram o disposto no n.º 4 do art. 26º do CE, ou seja, o valor do solo apto para construção em condições normais de mercado, nos termos dos números seguintes.
- Ac. da RP de 08/05/2017 (relatora Ana Paula Amorim), in www.dgsi.pt.:
A utilização dos valores fixados administrativamente, nos termos do art. 26º, n.ºs 4 e 5 do CE, para efeitos de fixação da renda condicionada não viola o direito do expropriado à justa indemnização, uma vez que o mesmo apenas é utilizado como um critério referencial, no sentido de apurar o valor real e corrente de mercado, sem considerar critérios especulativos.
No caso sub judice, com vista à determinação da avaliação do solo com aptidão construtiva os peritos que subscreverem o laudo maioritário tomaram em consideração os seguintes factores:
Por falta dos elementos referidos nos n.ºs 2 e 3 do art. 26.º, designadamente no que diz respeito aos preços unitários de aquisições ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados, a disponibilizar pela entidade expropriante, consideraram não aplicável ao caso em apreço o critério estabelecido no aludido normativo.
Ulteriormente, em sede de esclarecimentos (52) os srs. peritos explicitaram as razões por que se viram impedidos de adoptar o referido critério, fazendo menção à inexistência duma base de dados de transações efectuadas na envolvente, o que «não permite comparar valores indemnizatórios calculados no laudo de peritagem ou intervalo de valores para nível de confiança».

Por referência ao n.º 6 do art. 26º do CE, ponderaram:
- Em termos de localização, o prédio misto de onde se destaca a parcela confronta a nascente com a EN 13 e a norte com a Avenida do ..., ambas com boas acessibilidades;
- Em termos de qualidade ambiental, são inexistentes quaisquer focos de poluição, com proximidade do estuário do rio Lima e da praia do ... como zona balnear e de prática de desportos de vela;
- Em termos de equipamentos, a parcela dispõe junto a ela e na sua proximidade de um conjunto de serviços públicos, culturais e recreativos.
Assim, de acordo com o disposto no n.º 6 do art. 26.º, entenderam atribuir ao valor do solo apto para construção a percentagem de 12,0% dos custos de construção.

A que acrescem as seguintes percentagens nos termos do n.º 7 do mesmo artigo:
a) Acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente junto da parcela - 1,5%;
b) Passeios em toda a extensão do arruamento ou do quarteirão, do lado da parcela -0,5%;
c) Rede de abastecimento domiciliário de água com serviço junto da parcela ¬1,0%;
d) Rede de saneamento, com coletor em serviço junto da parcela - 1,5 %;
e) Rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão com serviço junto da parcela - 1%;
f) Rede de drenagem de águas pluviais com coletor em serviço junto da parcela ¬0,5%;
g) Estação depuradora, em ligação com a rede de coletores de saneamento com serviço junto da parcela - 2%;
h) Rede distribuidora de gás junto da parcela - 1%;
i) Rede telefónica junto da parcela - 1 %.
Totalizando o índice de localização, qualidade ambiental e infraestruturas no valor correspondente a 22,0% do custo de construção (53).
E, ao nível do n.º 9 do art. 26º do CE, tais peritos referiram que, de acordo com a vaprm, o prédio é servido pelas infraestruturas públicas em serviços prescritas no n.º 7 do art. 26º do CE, contudo o aproveitamento urbanístico requer infraestuturação contabilizada em 25% (54).
Quanto ao n.º 10 do art. 26º do CE, considerando que no caso de um processo expropriativo não se verificam os mesmos riscos inerentes à atividade construtiva, já que nesta a promoção imobiliária envolve sempre incertezas e viabilidade incerta, entenderam ser de deduzir para esse efeito 10% de factor de risco (55).
Relativamente aos custos de construção, atenderam aos valores da Portaria n.º 353/2013 de 4 de dezembro (Valores do preço da habitação durante o ano de 2014, para efeitos do cálculo da renda condicionada) - Zona 1- 801,06€ por m2 de área útil, atualizados para o ano de 2018, tendo obtido o valor de 813,18€/m2 de área útil.
E, como factor de conversão de preço da construção de Área Útil para Área Bruta, atribuíram 85%, do qual resultou o preço para área bruta de construção aplicável de 691,20€/m2 (área bruta) (56).
Assim, quanto ao valor da subparcela em “Solo apto para construção” alcançaram o valor de 303.496,88€ (14,784,00m2 x 20,53€/m2)
Respondendo às objecções colocadas pelo expropriado dir-se-á, em primeiro lugar, que não se mostrando comprovados nos autos os elementos a que alude o art. 26º, nºs 2 e 3 do CE, tornava-se inviável aos peritos efetivarem a avaliação da parcela em conformidade com o referido normativo.
Inexistindo, pois, tais elementos nos autos, afigura-se-nos adequado que os peritos se tenham socorrido, nos termos do disposto no art. 26º, n.º 5, do CE, dos custos de construção fixados anualmente pelo Governo, para aplicação do regime de habitação a custos controlados ou renda condicionada (57).
Por outro lado, ainda que os peritos tenham tomado em consideração os valores resultantes da Portaria n.º 353/2013, de 4/12 (valores do preço da habitação durante o ano de 2014 para o efeito do cálculo da renda condicionada), e não por exemplo a Portaria n.º 236/2015, de 10 de agosto (58), a verdade é que não foi exclusivamente com base naquele critério referencial que foi alcançado o valor do solo da parcela expropriada, o que afasta o argumento aduzido pelo expropriado.
Como se disse, neste domínio particular, importa não esquecer que, apesar de o juiz não estar vinculado aos laudos apresentados pelos peritos e apesar de estar obrigado a proceder à sua análise crítica para verificar a sua conformidade com os critérios legais, a verdade é que a natureza técnica das questões que lhes estão inerentes – e que, muitas vezes, escapam aos que não possuem conhecimentos específicos na matéria, como será o caso dos juízes – nem sempre permitirá ao julgador aferir se o laudo se aproxima ou não daquele que é o justo valor da indemnização.
Daí que, existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz elementos e conhecimentos que lhe permitam infirmar as conclusões técnicas que neles foram vertidas, se imponha ao juiz a necessidade de aderir ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal. É que, apesar de todos os peritos terem, em princípio, iguais conhecimentos e competências, o juiz (que, por regra, não possui conhecimentos específicos na matéria), quando colocado perante diversos laudos divergentes, não consegue infirmar as conclusões técnicas que neles foram vertidas e não consegue, por isso, avaliar qual é o laudo que melhor se adequa ao objectivo que se pretende alcançar: a determinação do valor da justa indemnização. E, nessas circunstâncias, não podendo deixar de decidir e de fixar o valor da indemnização, não terá outra solução que não seja a de aderir ao laudo maioritário (por presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos terão maior aptidão para atingir aquele objectivo) ou a de aderir ao laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal (por presumir que estes, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização) (59).
Ora, a verdade é que três peritos (habilitados a responder a estas questões de carácter técnico e, certamente, conhecedores da envolvente do solo expropriado) consideraram que aquele valor era o adequado, utilizando os critérios legais que, em princípio, são idóneos para alcançar o valor da justa indemnização e não dispomos de quaisquer elementos que nos permitam, de forma fundada e justificada, discordar dessa opinião técnica que, como tal, merece o nosso acolhimento.
E, ao contrário do que considerarão os apelantes, isto não corresponde a qualquer adesão ou aceitação acrítica ao referido laudo, sucedendo apenas que não dispondo o Tribunal de quaisquer elementos que lhe permitam discordar da opinião dos peritos em questões de natureza técnica, terá que ser dada prevalência à opinião adoptada por três peritos (ao invés das opiniões diferenciadas que foram adoptadas por cada um dos outros dois peritos), por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo um consenso mais alargado, terão maior aptidão para atingir o objectivo pretendido: a fixação da justa indemnização.
Afigura-se-nos, pois, em face do exposto, que nada justifica a alteração do valor do custo de construção que foi considerado na sentença recorrida.
Termos em que improcede este fundamento da apelação (quer do expropriado, quer da expropriante).
*
3. Da depreciação da(s) parte(s) sobrante(s).

Na decisão arbitral, tendo em conta a dimensão das parcelas e manutenção das acessibilidades, considerou-se não existir depreciação das sobrantes, pelo que não foi atribuída qualquer indemnização para esse efeito (60).
O expropriado veio-se insurgir-se contra esse segmento da decisão arbitral, afirmando não aceitar a desconsideração da “clara” depreciação das partes sobrantes, contabilizando o seu valor em 1.252.800,00€
A sentença impugnada seguiu o critério de avaliação do laudo pericial maioritário, que nessa componente (também) não atribuiu qualquer valor (61).
Do assim decidido discorda o expropriado, pretendendo que no cálculo da desvalorização da sobrante se tome em consideração a posição do laudo minoritário do perito por si indicado.
Vejamos como decidir.

Nas situações em que por efeito da expropriação ocorre a divisão do prédio, por se verificar uma situação de expropriação parcial, o art. 29º do CE, sob a epígrafe “Cálculo do valor nas expropriações parciais”, determina o critério a atender, para efeito de cálculo da indemnização, nos seguintes termos:

1 - Nas expropriações parciais, os árbitros ou os peritos calculam sempre, separadamente, o valor e o rendimento totais do prédio e das partes abrangidas e não abrangidas pela declaração de utilidade pública.
2 - Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou às subsistentes, especificam-se também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada.
3 - Não haverá lugar à avaliação da parte não expropriada, nos termos do n.º 1, quando os árbitros ou os peritos, justificadamente, concluírem que, nesta, pela sua extensão, não ocorrem as circunstâncias a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 2 e o n.º 3 do artigo 3.º”.

José Osvaldo Gomes, por referência ao Código das Expropriações de 1991 (art. 28º), considerava que a indemnização, por depreciação da parcela sobrante, englobava a seguinte divisão tripartida (62):
- Em 1º lugar, as depreciações e os prejuízos diretamente resultantes da divisão do prédio ou da expropriação parcial, enunciando as seguintes situações:
- Alteração do destino do prédio, o que se verificará, nomeadamente quando a parte sobrante de um terreno apto para construção perder a capacidade de ser utilizada para esse fim, em virtude da sua reduzida área, por ter ficado encravada e sem acessos, por se localizar em zona sujeita a servidão administrativa ou a qualquer restrição de utilidade pública que impeçam a construção por qualquer outro motivo;
- Redução dos índices de ocupação ou implantação ou de construção da parte sobrante;
- Encrave, redução do número de acessos ou criação de dificuldades na acessibilidade à parte sobrante;
- Inexistência de interesse económico da parte sobrante para o expropriado ou redução desproporcionada dos cómodos que oferecia todo o prédio.
- Em 2º lugar, outros prejuízos ou encargos resultantes da expropriação, incluindo o custo das novas vedações; e
- Em 3º lugar, as depreciações e prejuízos indirectamente resultantes da expropriação ou da afectação da parcela expropriada ao fim determinante da expropriação, dando conta das seguintes situações:
- Inutilização ou desvalorização da parte sobrante, ou alteração das suas boas condições ambientais e resultantes da instalação na parte expropriada de actividades tóxicas, incómodas ou insalubres, v. g. lixeiras, aterros sanitários, estações de tratamento de resíduos;
- Implantação na parte sobrante de cabinas subterrâneas, de postos de transformação, de redes de saneamento, electricidade ou água, etc., que depreciem o seu valor;
- Impossibilidade de utilização nas partes sobrantes de minas e águas existentes na parte expropriada;
- Constituição de servidões administrativas ou de restrições de utilidade pública sobre a parte sobrante e resultantes da afectação da parte expropriada ao fim determinante da expropriação (incluem-se neste caso as situações decorrentes de realização na parte expropriada de certos tipos de obras ou de empreendimentos, tais como auto-estradas, estradas nacionais e itinerários principais).
Em comentário ao n.º 2 do art. 29º do Código das Expropriações refere Fernando Alves Correia (63) que nele se prevê “a indemnização de um conjunto de danos patrimoniais subsequentes, derivados […] ou laterais, isto é, prejuízos que são uma consequência direta e necessária da expropriação parcial de um prédio, a qual acresce à indemnização correspondente à perda do direito […] ou à perda da substância […] do bem expropriado (a parte expropriada do prédio)”.

No comentário ao Ac. da Rel. Évora de 30.03.2000 e Ac. do STJ de 01.03.2001
(64), o mesmo autor desenvolve a análise da natureza dos prejuízos a considerar neste domínio e refere (65):

Todavia, exige-se que tais prejuízos patrimoniais subsequentes, derivados ou laterais sejam uma consequência direta e necessária da expropriação parcial de um prédio. Só eles é que podem ser incluídos na indemnização e não já também aqueles que têm com a expropriação parcial do prédio apenas uma relação indireta, porque encontram a sua causa em factos posteriores ou estranhos à expropriação”.
Considera o mesmo autor (66) – alicerçando-se na jurisprudência e doutrina francesas – que “o prejuízo direto é um dano que apresenta um laço de causalidade estreita com a medida expropriativa, um dano cuja origem resulta do ato de desapossamento forçado imposto ao expropriado”.
Com relevância para a questão em apreço mostra-se apurado que, do destaque da parcela do prédio, resultam duas parcelas sobrantes: uma, a nascente, com área de cerca de 352.737 m2 (78%) e outra, a poente, com área com cerca de 75.326m2 (17%).

No tocante ao ponto em discussão – depreciação da parcela não expropriada –, ressalta do laudo maioritário a seguinte explanação:
Parte sobrante do prédio a nascente
A parte sobrante do prédio a nascente representa cerca de 81%, não sendo afetado o solo classificado em espaços agrícolas do prédio. As subpartes restantes, sejam em espaço urbano, seja em área de floresta de proteção, mantêm os mesmos cómodos de modo proporcional, beneficiando de acesso melhorado para escoamento de produtos com a nova via.
Parte sobrante do prédio a poente.
A parte sobrante do prédio a poente representa cerca de 17%, mantém a mesma capacidade de edificabilidade prevista de modo proporcional aquela que existia, conforme simulação de aproveitamento urbanístico (…) desta área cerca de 75 326,00 m2, admitindo-se que possa comportar cerca de 15 000,00 m2 de área bruta de construção, respeitando o índice máximo previsto de 0,20, não obstando que possa ser aumentado, em futura revisão do PDM.
Em face do exposto, considerando que não existe depreciação das sobrantes, os Peritos entenderam não haver lugar à atribuição de qualquer indemnização para este efeito.
Por sua vez, o perito indicado pelo expropriado explicitou a seguinte posição:
Trata-se de uma expropriação parcial da qual resultam duas partes sobrantes, a maior a nascente e a menor a poente.
A parte sobrante a nascente deixa de ter o acesso direto a norte, podendo manter praticamente os mesmos cómodos da Quinta de …, nos termos da utilização atual que lhe é dada.
Já no que respeita à parte sobrante a poente, que corresponde, de acordo com a v.a.p.r.m. a uma faixa com uma largura variável entre cerca de 85 ml e 45 ml, fica sem qualquer acesso do prédio principal, criando uma barreira inultrapassável e isolando o sobrante com graves prejuízos, não só ao nível de circulação entre as áreas {que a montante da expropriação era una} como ao nível das disponibilidades comunicacionais que doravante se encontram largamente diminuídas, em termos comparativos.
No sobrante a nascente e numa numa faixa aproximada de 319 metros, e a poente numa faixa aproximada de 890 metros, o solo urbano fica onerado pela servidão non aedificandida nova via.
De acordo com o Plano Rodoviário Nacional, aplica-se para esta via (Rede Primária Nível 2) a servidão non aedificandi, correspondente a 20 metros para cada lado do eixo da estrada ou dentro da zona de servidão de visibilidade e nunca a menos de 5 m da zona da estrada.
Resultante do Plano Rodoviário Nacional em vigor, e de acordo com o extrato da planta parcelar, foi possível aferir aproximadamente a área non aedificandi de cada uma das partes sobrantes, que se apresentam no quadro seguinte:
Descrição Área non aedificandi
Sobrante nascente 3000,00 m2
Sobrante poente 7300,00 m2
TOTAL 10300,00 m2
Tendo em conta que o índice de construção previsto para as partes sobrantes é de 0,20 m2/m2, o Perito admite que o índice construtivo poderá ser absorvido pela área restante da servidão non aedificandi, contudo, o solo na área da servidão non aedificandi, fica desvalorizado pelo facto de não se poder construir qualquer equipamento complementar, de lazer ou de escassa relevância nesta faixa, nomeadamente piscinas, parques infantis, campos de ténis, churrasqueiras, anexos, entre outras. Neste pressuposto, admite considerar uma desvalorização correspondente a 50% do valor unitário do solo.
Assim, a desvalorização da parte sobrante será de,
Desvalorização da parte Sobrante = 10 300,00 m2 x 33,90 €/m2 x 50% = 174 585,00€

Por fim, o perito indicado pela expropriante expressou a seguinte posição (67):
A parte sobrante do prédio a poente representa cerca de 17%, mantém a mesma capacidade de edificabilidade prevista de modo proporcional aquela que existia, conforme simulação de aproveitamento urbanístico desta área cerca de 29.191 m2, admitindo-se que possa comportar cerca de 5.838 m2 de área bruta de construção, respeitando o índice máximo previsto de 0,20 não obstando que possa ser aumentado em futura revisão do PDM.
Pois bem, por referência à factualidade concretamente apurada constata-se que os fundamentos erigidos pelo expropriado com vista a alicerçar a sua pretenso recursória não acolhem nela o necessário amparo.
Desde logo não resulta que, por força da servidão “non aedificandi”, as parcelas sobrantes tenham visto diminuídas as suas capacidades construtivas.
Isto mesmo foi salientado pelos peritos subscritores do laudo maioritário os quais explicitaram que, na parte sobrante do prédio a nascente, não foi afetado o solo classificado em espaços agrícolas do prédio, sendo que as subpartes restantes, sejam em espaço urbano, seja em área de floresta de proteção, mantêm os mesmos cómodos de modo proporcional, beneficiando de acesso melhorado para escoamento de produtos com a nova via.
E, no tocante à parte sobrante do prédio a poente, que representa cerca de 17%, salientaram que mantém a mesma capacidade de edificabilidade prevista de modo proporcional àquela que existia e as zonas de servidão non aedificandi não obstaculizam a implantação das construções.
Mais esclareceram que, além de não haver necessidade de atravessamento da via, a impossibilidade da concretização de qualquer construção na área onerada pela servidão non aedificandi não afecta a capacidade construtiva possível (em termos de PDM) correspondente ao índice 0,202m2.
Por outro lado, e não obstante a diferenciação ou divisão das duas parcelas sobrantes, não resulta demonstrado que tal circunstancialismo acarrete um custo acrescido de deslocações.
Termos em que, acolhendo o critério propugnado no laudo maioritário, que nos oferece maior valia probatória face à posição de imparcialidade dos peritos que o subscreverem e à garantia de uma melhor objectividade por eles oferecida, julga-se improcedente este fundamento aduzido pelo expropriado.
*
4. Da reposição ou construção de vedações (recurso da expropriante).
No tocante à reposição de vedações, pugna a expropriante pela atribuição de um valor indemnizatório não excedente a 68.637,10€
Impõe-se aqui um breve parêntesis para salientar que, embora na resposta ao recurso da expropriante, o recorrido/expropriado afirme não puder aceitar a quantia atribuída às benfeitorias por tal violar os respetivos direitos e interesses, ao ponto de o Tribunal não poder levar em consideração tal valor, sob pena de se violar o princípio da justa indemnização, ao que acresce o facto de os Peritos indicados pelo Tribunal e pela Expropriante não terem em linha de consideração os frutos pendentes da parcela expropriada, designadamente, quanto à perda de videiras em plena produção e em produção, a verdade é que tais considerações são manifestamente inócuas e inatendíveis, quer porque tais questões não fazem parte da apelação (independente) interposta pelo expropriado, quer porque, no tocante ao recurso interposto pela expropriante, aquele não procedeu à ampliação do âmbito do recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 636º, n.º 1, do CPC.
Feita esta breve ressalva, vejamos então como decidir a questão colocada pela expropriante.
A entidade expropriante não coloca em causa o valor de 64.940,40 € arbitrado a título das espécies arbóreas identificadas na vistoria aprm (expressas no mapa de cálculo n.º 1 do laudo), por serem produtos da exploração florestal.
No tocante à reconstrução dos muros ou vedações destruídos defende carecer de necessidade a construção de um muro a delimitar a parcela apta para construção, dado que a edificação de vedação contende com o aproveitamento económico possível e será demolido para que a potencialidade construtiva seja realizada.
Subsiste, apenas, a necessidade de vedar a parcela sobrante que, pela sua dimensão, aptidão, necessidade de salvaguarda da privacidade e manutenção da situação original, o exige, não se justificando a construção de um muro de vedação, quando não existe a possibilidade de devassa da privacidade.
A verificar-se a necessidade de construção de vedação, as dimensões e as características do muro poderão ser idênticas ao que o prédio já possui à face da EN, de altura bastante inferior, com uma altura média máxima de 1,20m, uma espessura média máxima de 0,50 cm e cujo valor ascende a 131,64 /m3, o que resulta numa indemnização, a este título, que não poderá exceder o montante de 68.637,10€.
Como já vimos, a possibilidade de reconstrução de muros ou vedações dar direito a indemnização mostra-se expressamente consagrada no art. 29º, n.º 2 do CE.
Deve ser paga indemnização que suporte a reconstrução dos muros ou vedações destruídos, caso se mostre necessário, ou de construção de novos muros e vedações que eram inexistentes na parcela sobrante, mas cuja necessidade veio a surgir por força da expropriação.
De acordo com o citado normativo, têm de ser idênticos aos demolidos ou aos subsistentes. Caso não existissem anteriormente, terão de ter caraterísticas adequadas à área a vedar, atendendo aos existentes na área envolvente (68).
Ora, secundando o explicitado nas contra-alegações do expropriado, com a passagem da nova via em toda a extensão norte-sul do prédio torna-se essencial repor as vedações em ambos os lados sobrantes para privacidade, proteção e segurança do expropriado.
Trata-se de um encargo que o expropriado não teria de suportar se não houvesse expropriação e como tal deve ser ressarcido pela expropriante.
Por outro lado, independentemente da intenção do expropriado em construir (ou não) nas parcelas sobrantes impõe-se repor as vedações para proteção da propriedade privada que tem de ser salvaguardada.
Nessa medida, improcedem os fundamentos aduzidos pela expropriante.
*
A sentença recorrida merece, assim, plena confirmação, improcedendo ambas as apelações.
*
5. Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 527º do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que lhes tiver dado causa, presumindo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção.
No caso em apreciação, como improcedem ambas as apelações, as respetivas custas são da responsabilidade de cada um dos recorrentes.
*
Síntese conclusiva:

I - Não pode ser classificado como “apto para construção” um terreno em que, de acordo com as leis e regulamentos em vigor, não é permitida a construção e relativamente ao qual não existe qualquer expectativa legítima e concreta de tal construção vir a ser autorizada, ainda que tal terreno se encontre nas situações previstas no art. 25º, n.º 2, als. a) e b), do CE.
II - Se apenas parte do terreno tem capacidade construtiva, deve neste caso a parte restante do mesmo ser classificada como solo para outros fins.
*
VI. DECISÃO

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedentes as apelações, confirmando a sentença recorrida.
Custas das apelações a cargo dos respetivos apelantes.
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Guimarães, 30 de junho de 2022

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)


1. Cfr. fls. 50 a 70.
2. Cfr. fls. 10 a 21.
3. Cfr. fls. 167 a 219.
4. Cfr. fls. 21 a 25 e 220 a 237.
5. As questões colocadas nas apelações serão apreciadas em conjunto, dado estar em causa essencialmente a mesma matéria a reapreciar: classificação da parcela e critério para a sua avaliação, onde se compreende o valor a atribuir pela depreciação da parcela sobrante. Apenas se autonomiza, em relação à apelação do expropriado, a questão da nulidade da sentença e, quanto à apelação da expropriante, a questão da reposição ou construção de vedações (caraterizada como benfeitorias), se bem que, em bom rigor, esta última tenha atinência com a depreciação da parcela não expropriada.
6. Cfr. Ac. da RP de 24/01/2018 (relator Nélson Fernandes), in www.dgsi.pt. e Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, in Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2ª ed., 2014, Almedina, pp. 598/601.
7. Cfr. Ac. do STJ de 17/10/2017 (relator Alexandre Reis), Acs. da RG de 4/10/2018 (relatora Eugénia Cunha) e de 5/04/2018 (relatora Eugénia Cunha), todos disponíveis in www.dgsi.pt. e Ac. do STJ de 1/4/2014 (relator Alves Velho), Processo 360/09, Sumários, Abril/2014, p. 215, https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/sumarios-civel-2014.pdf.
8. Cfr. Ac. do STJ de 28/02/2013 (relator João Bernardo), in www.dgsi.pt.
9. Cfr. Antunes Varela, R.L.J., Ano 122, p. 112.
10. Cfr., entre outros, Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. II, 2015, Almedina, p. 371 e António Júlio Cunha, Direito Processual Civil Declarativo, 2ª ed., Quid Juris, p. 364.
11. Cfr. Ac. do STJ de 8/11/2016 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt.
12. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p, p. 713.
13. Cfr. Ac. do STJ de 30/04/2014 (relator Mário Belo Morgado), in www.dgsi.pt. e Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, 6ª ed., Coimbra Editora, pp. 69/70.
14. Cfr. José Osvaldo Gomes, Expropriações Por Utilidade Pública, Texto Editora, p. 328; Prof. Meneses Cordeiro, in CJ, Ano XI, Tomo V, 24.
15. Cfr. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Volume II, 10.ª ed., Almedina, p. 1020.
16. Cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, artigos 1º a 107º, 4ª ed., Coimbra Editora, p. 805.
17. Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, obra citada, p. 809 e os Acórdãos do TC n.ºs 408/2008 e 641/2013, in www.dgsi.pt.
18. Sob a epígrafe “Indemnizações”, dispõe o citado normativo que, “[h]avendo expropriação por utilidade pública ou particular ou requisição de bens, é sempre devida a indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos outros direitos reais afectados”.
19. Cfr. F. Alves Correia, A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999, in Revista de Legislação e Jurisprudência (RLJ), 132º, p. 233 e ss.
20. Cfr. Ac. do TC n.º 52/90, de 7/03/1990 (relator Vítor Nunes de Almeida), in www.dgsi.pt.
21. Cfr. Fernando Alves Correia, A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999, in RLJ, 132º, p. 232.
22. Cfr. José Osvaldo Gomes, obra citada, p. 145.
23. Cfr. A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999, RLJ, 132º, pp. 232 e segs. e O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, Almedina, 1990, p. 532 e segs..
24. Na expropriação litigiosa a prova pericial constitui meio probatório não só necessário, porque legalmente imposto, mas também essencial à determinação da referida “justa indemnização”, já que, pela sua natureza técnica, é o que melhor habilita o julgador a apurar o valor da coisa expropriada - cfr. Acs. da RC de 29/06/2010 (relator Fonte Ramos), de 30/11/2010 (relator Carlos Moreira) e de 6/12/2011 (relatora Judite Pires), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
25. Cfr. Ac. da RC de 07/02/2012 (relator Jorge Arcanjo), Ac. da RP de 16/09/2014 (relator Rui Moreira), Ac. da RG de 02/02/2017 (relator José Fernando Amaral), Ac. da RG de 08/12/2016 (relator Fernando Freitas) e, ainda, Ac. da RG de 11/06/2017 (relatora Maria Purificação Carvalho), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
26. Cfr. Ac. da RC de 29.06.2010 (relator Fonte Ramos) e F. Alves Correia, “A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações (…)”, RLJ, Ano 133º, p. 16, notas 87 e 88.
27. Cfr. “A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações (…)”, in RLJ, Ano 133 – 2000-2001, Nºs 3911-3912, p. 50.
28. Cfr. Pedro Elias da Costa, Guia das Expropriações Por Utilidade Pública, ob. cit., p. 273 e ss.
29. O PDM constitui o instrumento pelo qual se devem orientar tanto os particulares como as entidades públicas quando se trata de propor ou de apreciar projectos de construção ou, como na situação vertente, quando se trata de formular uma qualificação do solo para efeitos de avaliação expropriativa.
30. Na data da DUP, o concelho de ... possuía um PDM, que foi aprovado pela Assembleia Municipal de ... em 13 de março de 2008 e publicado na 2.ª Série do Diário da República n.º 67, de 4 de abril de 2008, pelo Aviso n.º 10.601/2008. Posteriormente foi aprovada pela Assembleia Municipal em 6 de janeiro de 2014 e publicada na 2.ª série do Diário da República através do Aviso n.º 1.817/2014, de 6 de fevereiro de 2016, uma alteração ao Regulamento. Foi também aprovada pela Assembleia Municipal em 17 de fevereiro de 2017 e publicada na 2.ª série do Diário da República através do Aviso n.º 4.754/2017, de 2 de maio de 2017, uma nova alteração ao Regulamento. E o PUC de ... foi aprovado pela Assembleia Municipal de ... a 21 de junho de 1998, homologado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 92/99, de 22 de julho de 1999 e publicado no Diário da República, I-Série-B, n.º 188, de 13/08/1999, com as sucessivas alterações até à dada da DUP (Aviso n.º 20245/08, publicado no D.R. n.º 136/08 Série II, de 16 de julho de 2008, alterado pelo Aviso n.º 4077/2017, publicado no D.R. Série II, de 17 de abril de 2017).
31. Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência citando-se, entre outros, os Acs. do STJ de 16/03/2017 (relatora Maria dos Prazeres Beleza), de 16/11/2017 (relator Abrantes Geraldes) e de 11/05/2017 (relator Abrantes Geraldes), todos disponíveis em www.dgsi.pt.; na doutrina, Pedro Elias da Costa, ob. cit., p. 277 e 281.
32. Cfr. Pedro Elias da Costa, obra citada, p. 117, cuja fundamentação seguimos de perto na explanação antecedente.
33. Cfr. fls. 69 v.º.
34. Cfr. fls. 66 v.º.
35. Cfr. fls. 15 a 17.
36. Cfr. fls. 185 a 188.
37. Cfr. Ac. da RC de 06/11/2012 (relatora Catarina Gonçalves), in www.dgsi.pt.
38. «SUBSECÇÃO VI; Zonas Urbanas de Aplicação de PMOT; Artigo 94.º; Caracterização; Estas áreas encontram-se delimitadas na Planta de Ordenamento e localizam-se em zonas do território municipal para as quais existem PMOT em vigor. Artigo 95.º; Regime; 1 - Encontra-se definido por cada um dos planos em causa, devendo ser observadas as disposições previstas nos respetivos regulamentos. 2 - Em tudo o omisso aplica-se o disposto no presente Regulamento».
39. “SECÇÃO III; ZONAS DE ENQUADRAMENTO PAISAGISTICO ;Art. 29º ;Caracterização; São áreas dentro dos espaços urbanos com interesse ambiental e paisagístico, que podem possuir povoamento florestal ou arbustivo, ou que desempenhem funções de enquadramento e proteção aos aglomerados urbanos contíguos, ou constituir ainda faixas de transição para os espaços florestais.; Art. 30º; Edificabilidade; 1. A edificabilidade em solos integrados nesta categoria fica condicionada a estudo de enquadramento, apenas sendo admissíveis moradias isoladas, uni ou bifamiliares, e desde que o lote ou propriedade possua uma área mínima de 1200 metros quadrados. 2. O derrube de árvores e o movimento de terras nestas áreas, deverá restringir-se ao estritamente necessário para a implantação das edificações. 3. Os projetos devem incluir arranjos exteriores que contemplem o derrube e plantação de árvores, modelação do terreno e todas as peças escritas e desenhadas justificativas da solução adotada e necessárias à completa definição e execução dos diversos trabalhos. 4. O equilíbrio da paisagem não poderá ser perturbado por novas edificações, seja pela sua localização, volumetria ou aspeto exterior, nem pelas obras de infraestruturas. 5. Terão de estar garantidas a obtenção de água potável e energia elétrica, a eficaz eliminação de esgotos e acesso automóvel pavimentado às edificações, nas condições definidas no Capítulo VI, sendo da responsabilidade e encargo do interessado a realização das referidas obras. Art. 31º; Índices Urbanísticos; O índice máximo de construção é de 0,2; ic ≤ 0,2; Art. 32º; (Revogado); Art. 33º; Número de Pisos dos Edifícios; 1. Fixa-se em 2 o número máximo de pisos das edificações; 2. Nos casos de situações de colmatação, ou desde que contemplado em plano de pormenor, podem ser autorizados valores mais elevados.; Art. 34º; Alinhamentos; Devem ser respeitados os alinhamentos definidos nos estudos de enquadramento.; Art. 35º; Logradouros; As áreas de Logradouro ocupadas ou impermeabilizadas, não devem exceder 10% da área total do lote ou propriedade.; Art. 36º; Parâmetros Urbanísticos; Quanto aos restantes parâmetros urbanísticos é aplicável o disposto nos artigos 18º a 27º-A»; «Art. 18º; Alinhamentos e Cérceas; 1. Sem prejuízo para existência de critérios mais específicos definidos para cada classe de espaço, nas áreas para as quais não existam planos ou estudos de maior pormenor aprovados, as edificações a licenciar ficam definidas pelo alinhamento das fachadas e pela cércea dominante do conjunto em que se inserem, não sendo invocável a eventual existência de edifício(s) vizinho(s) ou envolvente(s) que exceda(m) a altura ou o alinhamento dominante do conjunto. 2. Nas áreas de equipamentos a cércea é definida caso a caso, consoante a função. 3. Os edifícios industriais ou de armazenagem incluídos nestas categorias de espaços não podem possuir uma cércea superior a 7m medida no ponto mais alto da cobertura».; Art. 27º - Aº; Altura de meação; 1. Qualquer construção nova ou alteração de cota de logradouros não pode originar alturas de elementos de meação superiores a 3m, exceto nas situações de empenas de encosto de construções em banda ou geminações.; 2. Nos casos em que, dada a topografia do terreno, não seja possível o cumprimento do número anterior, deve ser salvaguardado que em todos os pontos dos elementos de meação não seja ultrapassado o limite definido por uma linha reta de 45º, traçada em cada um desses planos a partir do alinhamento da edificação fronteira, definido pela intersecção do seu plano com o terreno exterior. 3. Não obstante o disposto nos números anteriores, é permitida a construção de um muro com a altura mínima de 1,5m».
40. «SECÇÃO II; Espaços Agrícolas; Artigo 13.º; Caracterização; 1 - Estes espaços, delimitados na Planta de Ordenamento, caracterizam-se pela sua aptidão agrícola atual ou potencial e destinam-se à prática da atividade agrícola. 2 - Alguns destes espaços encontram-se classificados cumulativamente como "Áreas de Elevado Valor Paisagístico", dado o papel desempenhado na estrutura paisagística do Concelho.; Artigo 14.º; Regime; 1 - Nos Espaços Agrícolas inseridos na RAN deve ser observada a aplicação deste regime. 2 - Poderão ser viabilizadas as utilizações não agrícolas previstas no Regime da RAN, nos termos definidos no referido Regime, nas áreas não classificadas como "Áreas de Elevado Valor Paisagístico". 3 - Nos Espaços Agrícolas abrangidos pelo POOC Caminha - Espinho, devem ser observadas as condições expressas no capítulo X do presente Regulamento.; Artigo 15.º; Edificabilidade; 1 - Os Espaços Agrícolas de Elevado Valor Paisagístico são non aedificandi, não sendo permitidas quaisquer construções, de carácter definitivo ou precário, incluindo estufas e painéis publicitários. 2 - Excetuam-se do número anterior: a) A construção de estruturas de apoio à atividade agrícola contempladas em outros instrumentos de gestão do território de maior pormenor; b) A execução de obras de conservação, reconstrução e alteração de edifícios existentes à data de entrada em vigor do PDM, admitindo-se ampliação até 20 % da área bruta existente nos edifícios habitacionais; c) A construção de infraestruturas e de empreendimentos turísticos de reconhecido interesse municipal sem localização alternativa viável. 3 - A construção nos restantes Espaços Agrícolas só é possível para os fins e nas condições a seguir descriminadas: a) Os descritos no ponto anterior; b) As utilizações não agrícolas previstas no Regime da RAN, nos termos definidos no referido Regime; c) No caso de edifícios habitacionais existentes, são permitidas obras de reconstrução e alteração, admitindo-se ampliação até 20 % da área bruta de construção existente ou até aos 200m2 de área bruta de construção; d) A construção de estruturas relacionadas com as atividades agropecuária e agroflorestal; e) A ampliação de outras estruturas produtivas existentes e de reconhecido interesse municipal, admitindo-se a ampliação até 50 % da área bruta de construção existente; f) A construção de equipamentos de reconhecido interesse municipal sem localização alternativa viável».
41. «SUBSECÇÃO III; Zonas Florestais de Proteção; Artigo 21.º; Caracterização; 1 - Estas zonas, identificadas na Planta de Ordenamento, inserem-se predominantemente na REN e correspondem predominantemente às encostas com maior risco de erosão. 2 - Nestas zonas privilegia-se a proteção do solo contra a erosão e a estabilização do regime hídrico, assim como a flora e a fauna que lhe estão associadas. Artigo 22.º; Regime; 1 - Deve adotar-se um aproveitamento florestal compatível com a proteção do solo e a melhoria da cobertura vegetal, através da implementação de práticas culturais adequadas. 2 - Nas margens das linhas de água devem ser preservadas ou reintroduzidas as espécies ripícolas e, na sua envolvente, até uma distância de mínima de 25 m perpendicular às margens e em função das condições edáficas, devem reservar-se faixas de proteção predominantemente arborizadas com folhosas autóctones. 3 - Nas operações de limpeza de matos e povoamentos devem utilizar-se preferencialmente métodos que não impliquem a mobilização do solo em profundidade. 4 - É interdita a destruição de linhas de drenagem natural. 5 - São condicionadas a mobilização e preparação do solo e a atividade de exploração florestal, estando sujeitos a parecer e autorização prévia das entidades competentes».
42. Cfr. Ac. do STJ de 16/11/2017 (relator Abrantes Geraldes), in www.dgsi.pt.
43. Segundo os arts. 119º e 120º do Regulamento do PDM: «SUBSECÇÃO II; Faixas de Gestão de Combustível; Artigo 119.º; Caracterização; Estas áreas encontram -se delimitadas no Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios, correspondem a faixas definidas de acordo com a legislação aplicável e desempenham um papel importante na proteção contra incêndios.; Artigo 120.º; Regime; Esta categoria sobrepõe -se a outras categorias de espaços (…)».
44. Cfr., em sentido similar, Ac. da RG de 17/02/2022 (relatora Sandra Melo), in www.dgsi.pt.
45. Cfr. Francisco Calvão e Fernando Jorge Silva, Código das Expropriações, Anotações e Jurisprudência, Coimbra Editora, 2013, pp. 210/211.
46. O perito indicado pelo expropriado reportou-se à área objeto da expropriação, considerando a sua totalidade como "solo apto para construção".
47. Cfr. Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores anotados e comentados, Almedina, 2010, p. 178.
48. Cfr., ob. cit., pp. 284/286.
49. Cfr., ob. cit., p. 293.
50. Cfr. Fernando Alves Correia, “A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações (…)”, in RLJ, Ano 133 - 2000-2001, Nºs 3911-3912, p. 51.
51. Como refere João Pedro de Melo Ferreira, o n.º 5 do art. 26º do CE “tem de entender-se no sentido de que os montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicional serve meramente de indicador, podendo livremente o tribunal decidir a aplicação de valores para construção muito mais elevados do que estes” (cfr. Código das Expropriações Anotado, 2ª ed., Coimbra Editora, 2000, p. 125). Referindo efetivamente Luís Perestrelo de Oliveira, que “Os n.ºs 4 e 6 e seguintes não têm por objectivo limitar a indemnização na expropriação de terrenos aptos para a construção mas uniformizar o critério da sua avaliação, dentro de parâmetros relativamente elásticos, reduzindo a inevitável subjectividade dos avaliadores e garantindo, consequentemente, uma maior igualdade no tratamento das várias situações. Daí que as percentagens máximas neles referidas não funcionem como barreira na determinação do valor dos solos expropriados aptos para a construção. Essas percentagens são, antes, referenciais para os avaliadores, configurando um mero padrão de cálculo” (cfr. Código das Expropriações Anotado, 2ª ed., Almedina, 2000, p. 101).
52. Cfr. Fls. 268 e 268 vº.
53. O perito indicado pela expropriante, por considerar que a zona onde se insere a parcela se situa numa zona periférica, com caraterísticas rurais, sem se incluir em terrenos confrontantes ao mar ou ao rio, atribuiu 8%, acrescido das percentagens nos termos do n.º 7 em concordância com os demais peritos, totalizando 18% do valor da construção.
54. «Apesar do índice de construção ser baixo (0,2m2/m2) e junto da parcela haver infraestruturas suficientes que servem as edificações muito próxima se de volumetria considerável (4 a 5 pisos), o que por si só seria praticamente suficiente para absorver as infraestruturas respeitantes ao índice 0,20», o perito indicado pelo expropriado considerou que «a percentagem acima de 10% é exagerada, considerando este valor no desenvolvimento do seu cálculo». Diversamente, referindo que o índice muito baixo aliado à dimensão mínima dos lotes implica um custo relativo maior para as infraestruturas necessárias à possível edificação, para além da extensão de ligação devido ao atravessamento de zonas onde não de pode construir, o perito indicado pela expropriante entendeu que a infraestruturação não poderá ser contabilizada com um valor inferior a 30%.
55. Discordando dessa percentagem, o perito indicado pela expropriante considerou que o risco é, para além das outras circunstâncias de mercado, bastante alto, pelo que quantificou o fator de risco em 15%.
56. Segundo o perito indicado pelo expropriado, o Decreto-Lei que fixava através de Portaria os custos de construção fixados administrativamente para efeitos dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada foi revogado pela Lei n.º 80/2014, de 19 de dezembro, não se ajustando às atuais e normais condições de mercado. Assim, de acordo com os critérios definidos no Código de Expropriações para a "justa indemnização", o custo de construção em condições normais de mercado e para a zona envolvente da parcela, tendo em linha de conta as caraterísticas e qualidade construtiva das habitações envolventes, fixa-se à data da DUP, de acordo com o valor médio no mercado de construção civil para ..., em 950,00 €/m2 de área bruta de construção. Já o perito indicado pela Expropriante defende que na zona de enquadramento paisagístico existem 2 zonas onde não é permitida a edificação: a) Zonas ameaçadas pelas cheias (12.035 m2) b) Faixa de gestão de combustível (46.135 m2). Logo, a área do solo apto para construção é de 136.974 m2.
57. O regime de renda condicionada está previsto na Lei n.º 80/2014, de 19 de dezembro, em vigor por força do disposto no artigo 61.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, alterada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto.
58. A Lei n.º 80/2014, de 19 de dezembro, veio estabelecer o novo regime da renda condicionada aplicável aos arrendamentos de fim habitacional, atualizando e revendo o regime antes constante do Decreto-Lei n.º 329 -A/2000, de 22 de dezembro. E a Portaria n.º 236/2015, de 10 de agosto, publicada no Diário da República, 1.ª Série, n.º 154, estabeleceu que a taxa das rendas condicionadas a que se refere o n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 80/2014, de 19 de dezembro, passou a ser fixada em 6,7%.
59. Cfr. Ac. da RC de 12/03/2013 (relatora Catarina Gonçalves) e Ac. da RP de 22/10/2018 (relator Carlos Gil), in www.dgsi.pt.
60. Sem embargo da atribuição do valor de 258 750,00€ a título do restabelecimento da vedação das parcelas sobrantes (fls. 21).
61. Ressalve-se no entanto que, no tocante à reposição de muros, portões, vedações demolidas e a construir (art. 29º do CE), o laudo maioritário arbitrou o valor de 273.771,45€ - cfr. fls. 207.
62. Cfr. Expropriações por Utilidade Pública, 1ª ed., Texto Editora, Lisboa, 1997, p. 216.
63. Cfr. “A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações (…)”, RLJ, Ano 133, p. 56.
64. Publicados na Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 134, pp. 77 e 87.
65. Cfr. Fernando Alves Correia, RLJ, Ano 134, pp. 99-100.
66. Cfr. Fernando Alves Correia, RLJ, Ano 134, p. 100.
67. Fls. 217 e 218.
68. Cfr. Pedro Elias da Costa, obra citada, ob. cit., p. 312.