Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1359/17.6T8BCL-B.G1
Relator: JOAQUIM BOAVIDA
Descritores: APOIO JUNTO DO PROGENITOR
REVISÃO DA MEDIDA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 – Aquando da revisão da medida provisória de apoio junto da mãe da criança, aplicada no processo de promoção e protecção, é de manter essa medida se o pai não demonstra estar em melhores condições para que a medida seja executada junto de si.

2 – A circunstância de a criança ter menos de um ano, estar a ser amamentada e de a execução da medida estar a decorrer de forma positiva só por si justifica que não se produza nesta fase qualquer alteração.

3 – Constitui indício de alguma limitação para o exercício das responsabilidades parentais o facto de dois outros filhos do progenitor, irmãos consanguíneos da criança, terem sido objecto de longos percursos de institucionalização, até à sua maioridade, no âmbito de processos de promoção e protecção.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – RELATÓRIO

1.1. Nos autos de promoção e protecção, que correm termos no Juízo de Família e Menores de Barcelos, relativos, além do mais, ao menor S. B., nascido em …, cujos progenitores são T. G. e J. D., após realização de diligências instrutórias, foi proferida decisão nos seguintes termos:

«Assim, não resta ao Tribunal e face ao acima exposto e aos elementos aduzidos pelo Ministério Público, que aqui damos por integralmente reproduzidos, determinar, quanto à criança S. B., a prorrogação da medida provisória, aplicada a título cautelar, de "Apoio junto dos Pais, a executar na pessoa da mãe", por mais 6 (seis) meses, com revisão findo o período de 3 (três) meses e quanto às crianças A. C. e G. C., a alteração da medida de promoção e proteção de "Acolhimento Residencial", aplicando-se, a título provisório e cautelar, a medida de "Apoio junto dos Pais, a executar na pessoa da mãe" pelo período de 6 (seis) meses, com revisão findo o período de 3 (três) meses - artigos 37.º e 35.º, n.º 1, a), 62.º, n.ºs 1 e 3, alíneas b) e c), da LPCJP, deferindo o apoio económico nos termos propostos pela Segurança Social, ao abrigo do disposto no D.L. n.º 12/2008, de 17 de Janeiro.
Aguardem, pois, os autos pela evolução da situação, pretendendo-se de uma forma favorável, devendo um mês antes do términus do prazo de revisão das referidas medidas, solicitar-se à Segurança Social o envio de relatório social circunstanciado a fim de efectuar nova revisão.
Dê-se a conhecer à Segurança Social, alertando que se houver algum agravamento da situação deverão de imediato dar a conhecer ao Tribunal».
*
1.2. Inconformado, o progenitor J. D. interpôs recurso de apelação e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida no dia 19 de setembro de 2018, a qual decidiu aplicar a prorrogação da medida provisória, aplicada a título cautelar, de “Apoio junto dos pais, a executar junto da mãe”, por mais 6 (seis) meses, com revisão findo o período de 3 (três) meses., quanto à criança S. B..
II. Ora, salvo o devido respeito, não se conforma o progenitor e recorrente com tal decisão.
III. O progenitor J. D. e aqui recorrente não pode concordar com a medida aplicada uma vez que entende que a mãe do menor S. B. não reúne as condições necessárias, para sozinha, tratar e proteger três crianças.

Da não valoração das declarações do progenitor J. D.:

IV. No requerimento apresentado pelo aqui recorrente, no dia 05.09.2018, o recorrente refere que entende que a mãe do menor S. B. não reúne as condições necessárias, para sozinha, tratar e proteger três crianças,
V. Entendimento que renova nas suas declarações aquando da conferência do dia 19.09.2018.
VI. Para concretizar este seu entendimento, o progenitor referiu que a progenitora T. G. apresenta vários problemas, designadamente processos judiciais, com o seu ex-companheiro, o que pode prejudicar o seu cuidado ao menor S. B..
VII. Mas, o douto Tribunal a quo não valorou devidamente estas declarações, pois caso o fizesse, teria aplicado uma outra medida cautelar.

Da não valoração de documentos apresentados:

VIII. No decurso deste processo de Promoção e Proteção, a progenitora T. G. apresentou queixa pela prática de crime de violência doméstica contra o aqui recorrente, sendo certo que no mesmo dia o progenitor J. D. apresentou, também, queixa contra aquela pelo mesmo crime – tudo conforme documento junto pelo aqui recorrente no dia 05.09.2018.
IX. No entanto, o douto Tribunal a quo não teve em conta este facto nem o mencionou na sua decisão, pois caso o tivesse feito, a sua decisão teria sido a de aplicar uma outra medida cautelar.
X. Acrescente-se que a progenitora está desempregada, e não tem apoio de nenhum familiar ou amigos – tudo conforme relatório social elaborado pela segurança social, junto aos autos a fls. 569 a fls. 571.
XI. E, ainda no decurso deste ano de 2018, preferiu que as crianças A. C. e G. C. se mantivessem em instituições – tudo conforme relatório social elaborado pela segurança social, junto aos autos a fls. 569 a fls. 571.
XII. Mas o Tribunal a quo não valorou, como devia, os factos supra mencionados e constantes dos autos, pois, caso o fizesse, a sua decisão teria sido a de aplicar a medido de apoio junto dos pais, a executar na pessoa do pai!
XIII. Por outro lado, o aqui recorrente entende, tal como referido aquando das suas declarações na conferência do dia 19 de setembro, que possui as competências e os meios necessários para tratar e cuidar do menor S. B..

Senão vejamos:

XIV. O progenitor reside em casa arrendada, habitação que consiste numa casa individual, com dois andares, sendo que o piso térreo é composto por um quarto, duas salas, cozinha, casa de banho de serviço, lavandaria e uma arrecadação; o piso superior é composto por quatro quartos e casa de banho – tudo conforme relatório junto aos autos e declarações do recorrente.
XV. Tal como consta do relatório elaborado pela Segurança Social, o progenitor e aqui recorrente está desempregado, mas em busca ativa de emprego – tudo conforme declarações do recorrente.
XVI. Elementos que concorrem para demonstrar a vontade que o progenitor tem em que o seu filho S. B. faça parte do seu agregado familiar e passe a residir consigo.

Da não valoração dos depoimentos das testemunhas:

XVII. O progenitor e aqui recorrente conta com o apoio da sua mãe, em termos financeiros e outros – tudo conforme declarações do recorrente e da testemunha ouvida em sede de conferência do dia 19 de setembro.
XVIII. E conta, ainda, com a ajuda e colaboração da sua filha E., já maior, para o ajudar a cuidar do seu filho – tudo conforme declarações do recorrente e relatório social elaborado pela segurança social, junto aos autos a fls. 569 a fls. 571.
XIX. Neste momento, o progenitor e recorrente tem já a confirmação de vaga em infantário para o seu filho S. B. – tal como referido pelo progenitor e aqui recorrente nas suas declarações.
XX. Refira-se que a testemunha P. S. mencionou que o progenitor e recorrente desde sempre assumiu muito bem o seu papel de pai e que o mesmo reúne as condições para ter o filho a seu cuidado.
XXI. Contudo, o Tribunal a quo não valorou, de todo, as provas aduzidas pois, caso o tivesse feito, a sua decisão seria a de aplicar uma medida de apoio junto dos pais, a executar na pessoa do pai!
XXII. O progenitor tem o propósito e o desejo de que o seu filho S. B. passe a residir consigo, tendo já apresentado o pedido para regulação das respectivas responsabilidades, o qual corre os seus termos por apenso aos presentes autos.
XXIII. Atentas todas as provas aduzidas devia o douto Tribunal a quo ter decido aplicar uma medida cautelar de apoio junto dos pais, a executar na pessoa do pai.
XXIV. A douta decisão não ponderou devidamente as declarações do progenitor J. D., os depoimentos das testemunhas por ele arroladas nem os documentos por ele juntos, ignorando, por via disso, as concretas condições por este reunidas para ficar com o seu filho S. B., bem como as reais condições da progenitora.

Termos em que, revogando a douta Sentença, substituindo-a por decisão que aplique a medida cautelar de apoio junto dos pais, a executar na pessoa da mãe, farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!».
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A progenitora T. G. apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:

«I. A sentença proferida pelo Tribunal a quo não padece que quaisquer erros, contradições e/ou vícios, e dispensa quaisquer reparos adicionais, não podendo, porém, a Recorrida deixar de fazer algumas observações.
II. Em primeiro lugar, a leitura do despacho proferido pelo Tribunal a quo permite, facilmente, concluir que as declarações prestadas pelo progenitor J. D. foram devidamente valoradas.
III. Em segundo lugar, tanto o requerimento junto aos autos pelo Recorrente em 5 de Setembro de 2018 como os depoimentos das testemunhas arroladas – e que supostamente não foram valorados pelo Tribunal a quo – não passam de uma tentativa frustrada de justificar a queixa apresentada contra o Recorrente, pelo crime de violência doméstica (processo n.º 261/18.9PABCL – DIAP de Barcelos), e de desresponsabilizá-lo do mesmo, pouco contribuindo para a decisão do Tribunal no que concerne à determinação da medida de promoção e protecção a aplicar à criança S. B..
IV. De resto, o Recorrente alega factos que supostamente resultam das suas declarações e das declarações da testemunha Maria, prestadas em 19 de Setembro de 2018, sem que as mesmas tenham qualquer tipo correspondência com o que ficou registado na respectiva acta de declarações e conferência do artigo 112.º da L.P.C.J.P.
V. Por exemplo, embora o Recorrente refira nas suas alegações que – conforme ao que o próprio e a sua mãe alegadamente declararam – conta com a colaboração desta e da sua filha E. para cuidar do menor S. B., o certo é que nada consta da respectiva acta neste sentido. - Cf. acta de declarações e conferência do artigo 112.º da L.P.C.J.P., junto aos autos a fls. 579 a fls. 584.
VI. Porém, a mãe do Recorrente tem 74 anos de idade, desloca-se com o auxílio de uma cadeira de rodas e frequenta o centro de dia da Santa Casa da Misericórdia.
VII. Ademais, os seus filhos AB. e E. até aos 21 e 18 anos de idade, respectivamente, estiveram acolhidos em casas de acolhimento no âmbito de processos de promoção e protecção, tendo aquele, após completar 21 anos de idade, estado até 7 de Junho de 2018 (tendo nesta data quase 23 de idade) integrado na casa de acolhimento da APPADCM de Braga e entregue aos cuidados da instituição no âmbito de processo de interdição/inabilitação, o que contraria tudo o que o mesmo alega, sendo, também, demonstrativo, se mais não houvesse, do acerto da decisão ora em crise. - Cf. Relatório da S. S., junto aos autos a fls. 569 a fls. 571.
VIII. Por seu turno, a progenitora é responsável e diligente no acompanhamento do menor S. B., afectuosa e atenta às necessidades daquele, reunindo competências educativas e parentais positivas ao acompanhamento da criança. – Cf. Relatório da S. S., junto aos autos a fls. 569 a fls. 571 e declarações da Sra. Técnica da Segurança Social constantes da acta de declarações e conferência do artigo 112.º da L.P.C.J.P., junto aos autos a fls. 579 a fls. 584.
IX. A que acresce o facto de este menor ter apenas 8 meses de idade, e de ser, ainda, amamentado pela progenitora, sendo, nesta fase da sua vida, de todo, aconselhável que fique entregue aos cuidados da sua mãe.
X. Ademais, por desejar a reunificação familiar, a progenitora, com o apoio técnico da casa abrigo onde esteve acolhida, já conseguiu reunir as condições necessárias à sua autonomização, tendo, para o efeito, arrendado uma habitação, encontrando-se a mesma devidamente mobilada e equipada para aí residir com os seus três filhos. Cf. Relatório da Segurança Social de 14 de Setembro de 2018, junto aos autos a fls. 569 a 571 e declarações da Sra. Técnica da Segurança Social e da progenitora T. G. constantes da acta de declarações e conferência do artigo 112.º da L.P.C.J.P., junto aos autos a fls. 579 a fls. 584.
XI. O bem-estar, os interesses e as melhores condições de vida dos seus filhos sempre foi e continua a ser a principal preocupação da progenitora, que se encontra desempregada beneficiando de prestação social de desemprego mas que procura activamente emprego, por forma a garantir estabilidade e bem-estar material aos seus filhos - Cf. Relatório da Segurança Social de 14 de Setembro de 2018, junto aos autos a fls. 569 a fls. 571 e declarações da Sra. Técnica da Segurança Social e da progenitora T. G. constantes da acta de declarações e conferência do artigo 112.º da L.P.C.J.P., junto aos autos a fls. 579 a fls. 584.
XII. Aliás, não fosse precisamente a consideração da progenitora pelo bem-estar dos seus filhos e a necessidade de reunir as condições para os ter entregues aos seus cuidados e já há muito mais tempo teria a progenitora tomado a decisão – que veio a tomar – de acolher os seus filhos G. C. e A. C. (de 10 e 6 anos de idade respectivamente), tendo sido exclusivamente o interesse dos seus filhos o motivo de todas as suas decisões na vida e ao longo deste processo. Cf. acta de declarações e conferência do artigo 112.º da L.P.C.J.P., junto aos autos a fls. 579 a fls. 584.
XIII. Finalmente, refira-se não corresponder, de todo, à verdade que a progenitora apenas apresentou queixa pelo crime de violência doméstica contra o Recorrente para prejudicar a relação do filho com o pai, sem que, no entanto, tivesse ocorrido uma situação grave entre o casal, já que o contrário resulta precisamente da queixa apresentada pela Recorrida em 19 de Junho de 2018 e sucessivos aditamentos – Cf. queixa apresentada pela progenitora, junto aos autos a fls. 500 a fls. 503, que aqui e dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais e relatório da Segurança Social elaborado em 14 de Setembro de 2018, junto aos autos a fls. 569 a fls. 571.
XIV. Em todo o caso, concluindo, a decisão ora em crise está suportada em factos e circunstâncias objectivas, devidamente documentadas, não se vislumbrando nela qualquer vício, sendo, aliás, inequivocamente aquela que melhor serve – se não a única - o superior interesse do menor S. B..
XV. Por todo o exposto e por tudo o mais que resulta dos presentes autos, deverá o recurso interposto improceder e a decisão de prorrogar a medida provisória, aplicada a título cautelar, de “apoio junto dos pais, a executar na pessoa da mãe” por mais 6 (seis) meses, com revisão findo o período de 3 (três) meses ser mantida, em nome do superior interesse do menor S. B..

Termos em que, deve a douta sentença recorrida ser confirmada, negando-se provimento ao recurso interposto, assim se fazendo Justiça!».
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O Ministério Público apresentou contra-alegações, onde conclui:

«Destarte as reafirmações do progenitor em querer já decretar, “tout court”, o regime de guarda da menor na sua exclusiva titularidade tanto nestes autos de promoção e protecção como no Apenso-A da Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais e os laços afectivos que reclama demonstrar face ao menor seu filho acabam por ser, também, inadequadas afirmações de posse que, nessa estrita medida, se estão sobrepondo ao verdadeiro e empenhado amor parental, traduzido em esforço e sacrifício pessoal no sentido de se dotar daquela sábia paciência que permite o desenrolar da actividade instrutória do Tribunal recorrido e a conclusão de um desfecho securizante para o menor seu filho…;

Assim, com esta medida de apoio junto dos pais a executar na pessoa da mãe p. no artº 35º, nº 1, al. a) e 39º da Lei nº 147/99, de 01 de Setembro, pretende-se (nesta, embora alongada, fase instrutória do processo) garantir ao menor a sua segurança e estabilidade num meio sócio-familiar adequado ao desenvolvimento da sua personalidade e a prestação de cuidados adequados às suas concretas necessidades e bem-estar e a educação necessária ao seu desenvolvimento integral – e, no caso concreto, tal medida de apoio não é de Longa Duração pois é previsível supor um regresso desta criança a um regime normalizado do Exercício das Responsabilidades Parentais que passe pela alteração da medida provisória decretada em consonância com os superiores interesses da mesma criança.

Atentos, pois, todos os elementos já disponíveis nos autos afigura-se-nos ser premente a definição de um projecto de vida para o menor aqui abrangido que não passe mais pela sua sujeição aos caprichos e instabilidade emocional dos progenitores (tão graves a ponto de pender Inqtº criminal por Maus-tratos, como acima aduzido) advenientes de uma separação ainda mal resolvida interiormente por ambos os pais e a uma visão egocentrista de cada um deles quanto aos seus poderes-deveres parentais que afectam gravemente a segurança e o equilíbrio emocional da mesma menor….

Todas as indicações vão no sentido de que a família biológica do menor está diminuída na sua capacidade de manter uma relação afectiva securizante com este seu filho devendo este ser protegido com a presente intervenção judicial de promoção e protecção e com esta medida provisória ora em crise evitando-se que se danifique um período crucial da sua vida pueril, pacífico como é que a personalidade das crianças se constrói não só nos primeiros tempos de colo da sua vida, mas também na restante infância e na adolescência – na verdade os factos já coligidos nestes autos configuram uma situação subsumível à previsão ínsita no artºs. 3º, nºs 1 e 2, als. c) e f) daquela Lei nº 147/99 de 1/IX [isto é: não só sofrendo, tal menor, inadequados cuidados de afeição face à sua respectiva idade e situação pessoal como estando sujeite, de forma directa e indirecta, a comportamentos de instabilidade emocional de ambos os progenitores (tão graves a ponto de pender Inqtº criminal por Maus-tratos, como acima aduzido)…] – caso o mesmo menor fosse, neste momento entregue à imediata guarda do R. Pai como pretende o Recorrente;

Destarte e porque à protecção dos “direitos”(que são, como se sabe, apenas “poderes-deveres”, meramente funcionais relativamente aos superiores interesse dos menores) dos progenitores sobrepõe-se o direito dos filhos ao seu são desenvolvimento, através da criação de uma relação filial securizante, deve, em favor do menor S. B., de 08 meses de idade (porque nascido em 07-02-2018) ser mantida a provisória medida protectiva decretada na decisão ora em crise.
Assim sendo, por falta de fundamento legal e de facto, deve improceder o recurso interposto mantendo-se, na íntegra, a douta decisão recorrida».
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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1.3. QUESTÕES A DECIDIR

Tendo presente que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635º, nºs 2 a 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são:

i) – Determinar se existiu erro no julgamento da matéria de facto e, na afirmativa, as respectivas repercussões;
ii) – Saber se existem razões para alterar a medida provisória aplicada pelo Tribunal recorrido, em especial se o progenitor possui as competências e os meios necessários para tratar e cuidar da criança S. B..
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II – FUNDAMENTOS

2.1. Fundamentos de facto

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

2.1.1. Segundo o relatório social, junto a fls. 569 a fls. 571, elaborado pela Segurança Social, a progenitora, T. G., encontra-se integrada em casa abrigo fora do concelho de Barcelos, na companhia de S. B. e, segundo informação recolhida junto da equipa técnica da casa abrigo quanto às competências parentais e educativas de T. G., tanto no que concerne a S. B., como a A. C. e G. C., é muito positiva.
2.1.2. Tendo em conta o desejo de reunificação familiar da progenitora, esta beneficiou do apoio técnico da casa abrigo e conseguiu reunir as condições necessárias à sua autonomização, tendo já procedido ao arrendamento de uma habitação, a qual se encontra devidamente mobilada e equipada para aí residir na companhia dos seus filhos.
2.1.3. O progenitor de S. B., J. D., reside numa habitação alugada pela mãe, sendo o agregado familiar composto por si, pela sua mãe e pelo seu filho AB..
2.1.4. O filho AB., até aos 21 anos, bem como a sua irmã E., estiveram acolhidos em casas de acolhimento no âmbito de processos de promoção e protecção.
2.1.5. O progenitor J. D. encontra-se desempregado, inexistindo rendimentos declarados, bem como inexiste regularidade em trabalho declarado.
2.1.6. J. D. mantém o desejo de que a progenitora e o seu filho S. B., bem como os filhos da progenitora, A. C. e G. C., passem a residir consigo.
2.1.7. O progenitor das crianças A. C. e G. C., António, conforme já referido no relatório social de 07.06.2018, constante dos autos a fls. 468 a fls. 470, continua a manter residência na habitação que é propriedade da sua mãe, encontrando-se actualmente com sistema de vigilância electrónica, por ter sido condenado em processo-crime de violência doméstica.
2.1.8. Quanto ao projecto de vida dos seus filhos, António, mantém a mesma posição, considerando que aos mesmos deve ser aplicada uma medida de confiança com vista a futura adopção, por ser seu parecer que nem o próprio, nem outros familiares, possuem competências para um adequado acompanhamento das crianças.
2.1.9. No tocante à actual situação das crianças A. C. e G. C., resulta que estes mantêm a integração na casa de acolhimento da X, tendo beneficiado de diversos momentos de visitas, no período de férias, junto dos avós maternos e da progenitora, de forma intercalada.
2.1.10. Segundo informação da equipa técnica da casa de acolhimento, as crianças evidenciam mal-estar emocional pela manutenção da medida de acolhimento residencial e forte desejo de regresso à família biológica e, nesta sequência, iniciaram acompanhamento psicológico no Hospital Santa Maria Maior, em Barcelos.
2.1.11. A. C. mantém situação de enurese, tendo sido suspensa a terapêutica anteriormente prescrita dada a ineficácia de resultados, sendo certo que, de acordo com parecer clínico, tal decorrerá da instabilidade emocional da criança.
2.1.12. Agendada a presente conferência, e uma vez inquirida, a Sr.ª Técnica da Segurança Social manteve o parecer emitido no seu relatório, considerando que se encontram reunidas todas as condições para que a medida de acolhimento residencial aplicada às crianças A. C. e G. C., seja alterada para uma medida, em meio natural de vida, de apoio junto dos pais, a executar na pessoa da progenitora e, quanto à criança S. B., referiu que deve ser mantida a medida de promoção e protecção, já aplicada de forma cautelar, em meio natural de vida, de apoio junto dos pais, a executar na pessoa da progenitora.
2.1.13. Procedeu-se à audição da progenitora, tendo a mesma mantido o desejo de assumir o acolhimento e acompanhamento dos seus filhos A. C. e G. C., reunindo todas as condições necessárias ter aos seus cuidados os três filhos.
2.1.14. O progenitor das crianças A. C. e G. C. referiu não querer estar com os filhos, mesmo após lhe ter sido proposto a elaboração de um plano convivial do mesmo com as crianças.
2.1.15. Refere que o melhor para os filhos é continuarem institucionalizados ou, então, serem encaminhados para adopção, cortando assim os laços de sangue com os mesmos.
2.1.16. O progenitor da criança S. B. entende reunir melhores condições do que a progenitora para acolher o filho.
2.1.17. Pelo Ministério Público foi promovido na presente diligência, face ao teor e conclusões da Equipa Multidisciplinar de Apoio aos Tribunais ínsitos no seu derradeiro relatório social, que, quanto à criança S. B., se prorrogue por mais seis meses, com revisão findo o período de três meses, a medida de apoio junto dos pais, a executar na pessoa da progenitora, e que, quanto às crianças A. C. e G. C., se altere a medida de promoção e protecção, aplicando-se a título provisório e pelo período de seis meses, com revisão ao final de três meses, a medida de idêntica natureza, apoio junto dos pais, a executar na pessoa da progenitora.
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2.2. Do objecto do recurso

2.2.1. Impugnação da decisão da matéria de facto

Em sede de recurso, o Recorrente começa por impugnar a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal de 1ª instância.
De harmonia com o disposto no artigo 640º do CPC, recai sobre o recorrente o ónus de demonstrar o concreto erro de julgamento ocorrido, apontando claramente os pontos da matéria de facto incorrectamente julgados, especificando os meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida e indicando a decisão que, no seu entender, deverá ser proferida sobre a factualidade impugnada.
Entende o Recorrente que o Tribunal recorrido não valorou devidamente as declarações que prestou, os documentos apresentados e os depoimentos das testemunhas.

Vejamos.

2.2.1.1. No que respeita à alegada não valoração das declarações prestadas pelo progenitor, verifica-se que o Tribunal a quo pronunciou-se sobre tais declarações, pois até as fez constar dos factos que considerou provados.

Com efeito, deu como demonstrado que J. D. mantém o desejo de que a progenitora e o seu filho S. B., bem como os filhos da progenitora, A. C. e G. C., passem a residir consigo. Também deu como provado que o progenitor da criança S. B. entende reunir melhores condições do que a progenitora para acolher o filho.

Portanto, o Tribunal recorrido considerou factualmente as declarações do progenitor. Coisa diferente será concluir que, pelo simples facto de o pai declarar que pretende ter o filho consigo e que reúne melhores condições para acolher a criança, isso corresponde à realidade. Como é evidente, entre o querer e o ser vai uma imensa distância: a circunstância de um progenitor manifestar a sua vontade e exprimir uma valoração sobre a sua situação não é suficiente para demonstrar a veracidade dos factos em que se baseia essa apreciação subjectiva. As afirmações e valorações feitas pelos progenitores têm de ser confrontadas com outros elementos de prova e foi isso que fez o Tribunal a quo, que chegou fundadamente a um outro resultado probatório, ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova.
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2.2.1.2. Sustenta o Recorrente que no decurso deste processo de promoção e protecção, a progenitora T. G. apresentou queixa pela prática de crime de violência doméstica contra o aqui Recorrente, sendo certo que no mesmo dia o progenitor J. D. apresentou, também, queixa contra aquela pelo mesmo crime, tudo conforme documento junto por si no dia 05.09.2018.
Alega que o Tribunal a quo não teve em conta este facto nem o mencionou na sua decisão, pois caso o tivesse feito, a sua decisão teria sido a de aplicar uma outra medida cautelar.
Nos presentes autos estão em causa os interesses da criança S. B. e não propriamente os interesses dos seus progenitores. Só relevam para estes autos os factos que, de alguma forma, interfiram com os direitos fundamentais desta criança. Os conflitos entre os progenitores só serão relevantes para os autos se se reflectirem na criança.

Ora, a mera circunstância de os progenitores apresentarem queixas-crime cruzadas, reclamando cada um ser vítima dos maus tratos do outro, é algo que em princípio não deve ser levado aos factos assentes, pois daí não resulta nenhuma conclusão jurídico-factual relevante. Mesmo se já existisse decisão com trânsito em julgado, teria de haver uma apreciação concreta da respectiva fundamentação factual para apurar da sua relevância para os autos de promoção e protecção.

Por outro lado, não se descortina como é que o Recorrente consegue concluir que o simples facto de existirem essas duas queixas cruzadas demonstra que está em melhores condições de acolher o filho. À partida, a existência das duas queixas não constitui sequer um indício de que o progenitor dispõe de melhores condições para poder ter o filho consigo.
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2.2.1.3. Finalmente, alega o Recorrente que não foram valorados os depoimentos das testemunhas.

Arrolou duas testemunhas e foram efectivamente ouvidas Maria, mãe do Recorrente, e P. S., seu amigo.
A primeira testemunha disse:
«Nunca existiu violência doméstica entre o filho e a T. G..
A T. G. não teve motivos para ter saído de casa.
Quer que o neto S. B. volte para casa, sendo certo que a T. G. também pode voltar».
A segunda testemunha afirmou:
«É amigo do J. D. há muitos anos.
O J. D. assumiu muito bem o seu papel de pai.
Quando a T. G. e o J. D. ainda estavam juntos, por diversas vezes foi caminhar com o casal e o mesmo aparentava dar-se bem, sendo que nunca presenciou qualquer discussão entre os mesmos. O J. D. não é uma pessoa de maltratar.
A atitude que a T. G. teve de "fugir" demonstra que a mesma não tem sanidade mental.
O J. D. tem todas as condições para ter o filho a seu cuidado».

De útil a primeira testemunha apenas carreou para os autos o desejo de o seu neto voltar para a sua casa e a sua disponibilidade para acolher a progenitora daquele. Tendo presente a situação de perigo para a criança verificada quando foi despoletada a intervenção do Tribunal, se a progenitora teve ou não teve motivos para sair de casa e se existia violência doméstica é neste momento algo menor face aos superiores interesses da criança.

A segunda testemunha entende que estava tudo bem entre os progenitores e que o facto de ter saído de casa demonstra a sua falta de “sanidade mental”. De forma conclusiva, expressa a opinião de que o progenitor tem todas as condições para ter o filho a seu cuidado.

Verifica-se que o Tribunal a quo confrontou os parcos elementos factuais resultantes das declarações das testemunhas com os demais elementos de prova e que deu prevalência, pela sua natural isenção e imparcialidade, ao depoimento de Paula, técnica da Segurança Social, e ao teor do relatório social junto aos autos em 14.09.2018, constante a fls. 569 a fls. 571.

Por outro lado, os factos que se deram como provados não são sequer infirmados pelos depoimentos das duas testemunhas inquiridas, excepto na parte em que a testemunha P. S. diz que «a atitude que a T. G. teve de "fugir" demonstra que a mesma não tem sanidade mental», o que é mais uma opinião do que um facto. A seu tempo, no processo-crime, verificar-se-á se a mãe da criança saiu de casa devido a ser vítima de violência doméstica ou se saiu porque quis.

Finalmente, verifica-se que o Recorrente alega nestes autos de recurso também factos que supostamente resultam das suas declarações e dos depoimentos das duas testemunhas, quando é certo que em lado algum do exarado na acta de 19.09.2018 constam tais factos. Por exemplo, embora refira nas suas alegações que conta com a colaboração da mãe e da sua filha E. para cuidar da criança S. B., o certo é que nada consta da respectiva acta neste sentido.

Em todo o caso, a decisão recorrida descreve os factos objectivos relativos à situação pessoal, familiar e socioeconómica do Recorrente em termos que se mostram conformes com a prova produzida.

Aliás, a dizer-se que existe alguma omissão ou não valoração, só se for de factos que objectivamente são desfavoráveis ao Recorrente, como é o caso de estar evidenciado nos autos, mas não constar da decisão recorrida, que a sua mãe tem 74 anos de idade, desloca-se de cadeiras de rodas e frequenta o centro de dia da Santa Casa da Misericórdia, o que põe seriamente em causa o que fez constar da sua conclusão 17ª - «conta com o apoio da sua mãe» -, atenta a circunstância de a criança ter nascido em 07.02.2018 e de a avó, naquelas circunstâncias, ter muita dificuldade em tomar conta de um menor de tão tenra idade.

Termos em que se conclui não ter existido erro no julgamento da matéria de facto.
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2.2.2. Da alteração da medida aplicada

Estamos no âmbito de um processo de protecção de crianças e jovens em perigo, cujo diploma fundamental é a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP), aprovada pela Lei nº 147/99, de 1 de Setembro, alterada pelas Lei nºs 31/2003, de 22 de Agosto, 142/2015, de 8 de Setembro, e 23/2017, de 23 de Maio.
O objectivo de qualquer intervenção ao abrigo da LPCJP é garantir o bem-estar e desenvolvimento integral da criança. O fim último é assegurar o seu harmonioso desenvolvimento físico, moral e psíquico num ambiente, familiar ou outro, afectivo, educativo e responsável (1).
E a intervenção tem lugar quando «quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de acção ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo» (art. 3º, nº 1, da LPCJP).
A intervenção, seja ela judiciária ou não judiciária, deve atender prioritariamente aos interesses e direitos superiores da criança e do jovem – artigo 4º, al. a), da LPCJP. É esse o primordial princípio norteador da intervenção, o qual se superioriza a qualquer outro interesse ou direito das demais pessoas envolvidas no seu processo.
O artigo 106º da LPCJP estabelece as fases do processo de promoção e protecção, sendo aplicáveis, subsidiariamente, com as devidas adaptações, na fase de debate judicial e de recurso, as normas relativas ao processo civil declarativo comum – artigo 126º da LPCJP.
Trata-se de um processo de jurisdição voluntária – artigos 100º da LPCJP e 986º a 988º do CPC.

No caso vertente, por decisão de 12.07.2018 (folhas 507 e 508 do processo de promoção e protecção), quanto à criança S. B., foi aplicada a medida cautelar de apoio junto da mãe, pelo período de 6 meses, nos termos dos artigos 37º e 35º, nº 1, alínea a), ambos da LPCJP.

A fim de se aquilatar o grau de adequação e resultado da execução da medida provisória aplicada, foi agendada conferência, para inquirição dos progenitores de S. B., da técnica da Segurança Social que acompanha o caso e das testemunhas arroladas pelo progenitor, eventualmente seguida da realização da conferência a que alude o artigo 112º da LPCJP.
Por decisão de 19.09.2018 foi determinada a prorrogação da medida provisória, aplicada a título cautelar, de «apoio junto dos pais, a executar na pessoa da mãe, por mais seis meses, com revisão findo o período de três meses».

É esta última decisão que é objecto deste recurso, uma vez que o Recorrente entende que a medida devia ser executada junto do pai e não da mãe.
Sustenta que possui as competências e os meios necessários para tratar e cuidar do filho e que está em melhores condições do que a mãe.
No fundo, a questão essencial neste recurso consiste em saber se é a mãe, como decidiu o Tribunal a quo, ou o pai, como este defende nas respectivas alegações, que dispõe de melhores condições para que a medida seja executada junto de si.

Ninguém neste recurso põe em causa o pressuposto fundamental que levou o Ministério Público a impulsionar o processo de promoção e protecção: a criança encontrava-se em perigo e o mesmo ainda não se mostra definitivamente afastado. A sua tenra idade – nasceu a 07.02.2018 – implica também que se tenha um redobrado cuidado na apreciação da sua situação e dos seus interesses.
A opção do Tribunal recorrido por uma medida executada em meio natural de vida também não é questionada e não existe qualquer razão substancial para a pôr em causa.
Deu-se prevalência à integração da criança na família e parecem existir vínculos afectivos próprios da filiação e estes não se encontram, até agora, seriamente comprometidos, sendo certo que estamos numa fase muito incipiente para formular conclusões definitivas a esse respeito.
A intervenção preconizada pela Segurança Social, e que o Tribunal a quo acolheu, apontava para a necessidade de desenvolver um trabalho junto da família, no sentido de afastar o perigo e proporcionar à criança um mínimo de condições para o seu desenvolvimento integral.

No âmbito desse trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, segundo o relatório da Segurança Social junto aos autos, verifica-se que a progenitora, T. G., encontra-se integrada em casa-abrigo fora do concelho de Barcelos, na companhia de S. B., e que, segundo informação recolhida junto da equipa técnica da casa-abrigo, quanto às competências parentais e educativas da progenitora, a sua evolução é “muito positiva”.
Além disso, no prosseguimento desse trabalho, foi dado o passo seguinte: perante o seu desejo de reunificação familiar, a progenitora beneficiou do apoio técnico da casa-abrigo e conseguiu reunir as condições necessárias à sua autonomização, tendo já procedido ao arrendamento de uma habitação, a qual se encontra devidamente mobilada e equipada para aí residir na companhia dos seus filhos.
Vai entrar-se, por conseguinte, nessa segunda fase de preparação da progenitora e de progressiva autonomização. Segundo se lê no relatório social e resulta do depoimento da técnica ouvida e das próprias declarações da progenitora, apesar de se encontrar desempregada, beneficia da prestação social de desemprego, procura activamente emprego e foi-lhe deferido o apoio económico nos termos propostos pela Segurança Social.

Ora, se as coisas estão correr de forma positiva, dificilmente se compreenderia uma alteração neste momento (2). Desde logo, importa ter presente que estamos a falar de uma criança nascida a 07.02.2018 (certidão do assento de nascimento de fls. 490) e que ainda é amamentado ao peito de sua mãe, pelo que é aconselhável que fique entregue aos cuidados da progenitora, como bem salienta o Ministério Público nas suas contra-alegações.
Por outro lado, a alternativa apresentada pelo progenitor não parece ser melhor do que aquela na qual se tem investido.
No que respeita às suas condições pessoais, familiares e socioeconómicas, sabe-se que o progenitor da criança reside numa habitação alugada pela sua mãe, sendo o agregado familiar composto por si, pela sua mãe e pelo seu filho AB.. O progenitor encontra-se desempregado, inexistindo rendimentos declarados, bem como inexiste regularidade de exercício de actividade laboral declarada.

À partida, as condições objectivas são desfavoráveis e, apesar do verbalizado, não parece poder contar com um apoio efectivo por parte da mãe, uma vez que esta tem 74 anos de idade, desloca-se em cadeira de rodas e frequenta o centro de dia da Santa Casa da Misericórdia.

Acresce que, em termos mais subjectivos, o seu historial de vida suscita fortes reservas sobre a sua capacidade para cuidar do seu filho, sobretudo quando este tem apenas alguns meses de idade. Neste particular, não pode ignorar-se que o filho AB., até aos 21 anos, bem como a sua irmã E. (até aos 18 amos), estiveram acolhidos em casas de acolhimento no âmbito de processos de promoção e protecção. Aliás, o filho AB., mesmo após completar os 21 anos de idade, esteve até 07.06.2018 (tem quase 23 anos de idade) integrado na casa de acolhimento da APPADCM de Braga e entregue aos cuidados da instituição no âmbito de processo de interdição/inabilitação (v. relatório a fls. 569 a 571).

Tudo isto põe seriamente em causa que o progenitor seja uma melhor alternativa à progenitora da criança S. B.. Se os seus dois outros filhos, irmãos consanguíneos do S. B., tiveram que realizar longos percursos de institucionalização, isso só pode querer significar que não puderam contar com o amparo e a diligência paternal do Recorrente, o que indicia algumas limitações para a assunção e o exercício das responsabilidades parentais.

Acresce que os objectivos que presidem aos processos de promoção e protecção não se compadecem com experimentalismos, antes exigindo medidas viáveis e exequíveis, e o afastamento de soluções que apenas se alicerçam em manifestações de vontade sem base séria e realista.

Finalmente, importa notar que estamos numa fase de instrução dos autos de promoção e protecção e que as medidas tomadas têm uma natureza provisória e cautelar, sendo susceptíveis de revisão e alteração futura. Numa fase posterior haverá oportunidade para, uma vez feito o diagnóstico mais preciso da situação da criança, determinar o que a defesa do seu superior interesse então reclama. Por enquanto, o superior interesse da criança S. B. exige que se continue a desenvolver a medida de apoio junto da mãe.

Termos em que deve ser julgada improcedente a apelação.
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2.3. Sumário

1 – Aquando da revisão da medida provisória de apoio junto da mãe da criança, aplicada no processo de promoção e protecção, é de manter essa medida se o pai não demonstra estar em melhores condições para que a medida seja executada junto de si.
2 – A circunstância de a criança ter menos de um ano, estar a ser amamentada e de a execução da medida estar a decorrer de forma positiva só por si justifica que não se produza nesta fase qualquer alteração.
3 – Constitui indício de alguma limitação para o exercício das responsabilidades parentais o facto de dois outros filhos do progenitor, irmãos consanguíneos da criança, terem sido objecto de longos percursos de institucionalização, até à sua maioridade, no âmbito de processos de promoção e protecção.
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III – DECISÃO

Assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo Apelante.
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Guimarães, 08.11.2018
(Acórdão assinado digitalmente)

­ Joaquim Boavida
(relator)
Paulo Reis
(1º adjunto)
Joaquim Espinheira Baltar
(2º adjunto)


1. Neste sentido, Paulo Guerra, Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo Anotada, 3ª edição, Almedina, 2018, pág. 24, obra que constitui o nosso guia neste excurso.
2. Só se deve mudar quando algo está mal e a alternativa é melhor. Caso contrário, como diz o ditado, para pior já basta assim.