Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2881/18.2T8GMR.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: PER
ADMINISTRADOR JUDICIAL PROVISÓRIO
REMUNERAÇÃO
APOIO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/15/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- No âmbito do PER e do PEAP, homologado o plano de recuperação ou o plano de pagamento, respetivamente, as custas do processo são da responsabilidade do devedor, atento o critério do proveito ou do beneficio, dado que não havendo nesses processos, por natureza, vencido, é o requerente que recorreu aos processos em causa quem retira proveito dos mesmos e do plano neles aprovado pela maioria dos seus credores e homologado por sentença judicial transitada e julgado (arts. 17º-F, n.º 12 e 222º-F, n.º 9, do CIRE).
2- A remuneração do administrador judicial provisório e as despesas que suportou no exercício dessas funções no âmbito do PER ou do PEAP consubstanciam “encargos” dos processos em causa e integram, por isso, a condenação em custas, impendendo a responsabilidade pelo seu pagamento sobre o devedor.
3- Apenas quando o devedor beneficiar de proteção jurídica na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos do processo, existe fundamento legal para que o IGFEJ, I.P., adiante, no âmbito do PER ou do PEAP, a quantia necessária ao pagamento da remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas que suportou no exercício dessas funções (arts. 17º-C, n.º 6 e 222º-C, n.º 6, do CIRE).
4- O art. 32º, n.º 3 do CIRE é apenas aplicável à remuneração devida ao administrador da insolvência e às despesas que suportou no exercício dessas funções no âmbito do processo de insolvência e carece de ser interpretado no sentido de que, ocorrendo encerramento do processo de insolvência por insuficiência de massa insolvente (arts. 39º e 322º do CIRE), o IGFEJ, I.P. tem de suportar a remuneração e as despesas devidas ao administrador da insolvência.
5- No caso de PER em que tenha sido homologado plano de recuperação, por sentença transitada em julgado, que condenou o devedor (requerente do PER e beneficiário do plano nele aprovado e homologado) nas custas do processo, vindo, posteriormente, a essa homologação o devedor a ser declarado insolvente, esse processo de insolvência mostra-se totalmente autónomo em relação ao PER, não sendo desenvolvimento ou consequência deste, pelo que não existe fundamento legal para que o IGFEJ, I.P. adiante a quantia necessária ao pagamento da retribuição e as despesas arbitradas no âmbito do PER ao administrador judicial provisório, ainda que o processo de insolvência venha a ser encerrado por insuficiência de massa insolvente, sem que o referido entendimento comporte qualquer violação aos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

RELATÓRIO

EMP01..., Lda., com sede na Rua ..., ... ..., ..., instaurou processo especial de revitalização, em 11/05/2018.
Por despacho proferido em 18/05/2018, nomeou-se como administrador judicial provisório AA, atendendo-se à sugestão feita pela requerente quanto ao administrador judicial provisório a ser-lhe nomeado.
O administrador judicial provisório e a devedora EMP01..., Lda. requereram, em 21 de agosto de 2018, a prorrogação do prazo de negociações por um mês.
Em 29/05/2018, a devedora juntou aos autos a versão final do plano de recuperação a ser submetido a votação dos credores (cfr. fls. 304 a 321 do processo físico).
Por sentença proferida em 13/11/2018, transitada em julgado, homologou-se a proposta de plano de recuperação apresentada pela devedora e condenou-se esta nas custas do processo, constando a dita sentença homologatória do seguinte teor (procede-se à transcrição ipsis verbis da sentença):
“EMP01..., Lda., veio, ao abrigo do disposto nos artºs 17º-A e ss. do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas requerer a instauração de Processo Especial de Revitalização, bem como a nomeação de administrador judicial provisório.
Concluídas as negociações, foi junto aos autos informação de conclusão das negociações com a aprovação de plano de recuperação conducente à revitalização do devedor, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 17.º-F do C.I.R.E..
O plano de recuperação foi votado favoravelmente por 71,57% dos credores.
Ora, conclui-se que reúne o voto favorável exigido pelo art. 17-F, nº3, al. b) do CIRE.
Assim, estando reunidos os pressupostos de reunião e de deliberação do plano, com votação favorável pela maioria exigida no art. 17.º-F n.º 3 do C.I.R.E. e inexistindo os fundamentos a que aludem os arts. 215.º e 216.º do C.I.R.E., ex vi, art. 17.º, n.º 5 do mesmo diploma que impusessem a não homologação do plano de revitalização junto aos autos, homologa-se o plano de recuperação conducente à revitalização do devedor junto aos autos (art. 17.º, n.º 5 do C.I.R.E), sendo que a referida homologação vincula os credores (art. 17.º, n.º 6 do CIRE).
*
Notifique, publique e registe nos termos do disposto no art. 37.º e 38.º do CIRE, ex vi, art. 17.º-F, n.º 6 do mesmo diploma legal.
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Custas do processo de homologação a cargo do devedor, devendo ser emitida a respetiva nota de custas (cfr. art. 17º-F, n.º 7 e n.º 6 in fine).
Valor tributário: 5.000,01 euros”.

Em 10/01/2019, o administrador judicial provisório requereu que lhe fosse fixada a remuneração e lhe fossem pagas as despesas, no montante global de 853,87 euros, solicitando expressamente que o pagamento da remuneração e das despesas lhe fosse feito “através dos Cofres do Estado”.
Por despacho proferido em 07/02/2019, transitado em julgado, fixou-se a remuneração do administrador judicial provisório, na quantia de 1.900,00 euros, e determinou-se que lhe fossem pagas as despesas que apresentou, no montante global de 853,87 euros, devendo o pagamento ser efetuado pela devedora EMP01..., Lda., constando esse despacho do teor que se segue:
Ref. ...71: Atento o volume de trabalho desenvolvido, o resultado das negociações e por critérios de equidade fixa-se a remuneração devida ao Sr. AJP em 1.900,00 euros, a que acrescem as despesas ali indicadas.
Tais quantias integram-se nas custas do processo e são encargo do devedor.
D.N.”.

O despacho que antecede foi notificado ao administrador judicial provisório, via Citius, em 08/02/2019.
Em 19/03/2019, elaborou-se a conta de fls. 621, tendo a devedora, EMP01..., Lda., requerido que fosse autorizada a pagar a quantia de 3.573,07 euros de custas do processo da sua responsabilidade em doze prestações, iguais, mensais e sucessivas, o que foi deferido por despacho proferido em 29/03/2019.
Em 24/09/2019, proferiu-se despacho, transitado em julgado, em que se declarou encerrado o processo especial de recuperação, nos termos do art. 17º, n.º 1 do CIRE.
Em 27/09/2019, a Secção abriu vista ao Ministério Público, com a informação de que a devedora, EMP01..., Lda., apenas tinha procedido ao pagamento da primeira prestação de custas, encontrando-se a restantes onze prestações em dívida, num total de 3.275,36 euros, na sequência do que, foi promovido que se declarassem vencidas as prestações não liquidadas pela devedora EMP01..., Lda..

Por requerimento entrado em juízo em 29/10/2019, o administrador judicial provisório requereu o seguinte:

“1. O aqui signatário requereu aos autos, o pagamento da remuneração fixada nos autos, bem como as despesas suportadas através dos Cofres do Estado;
2. Tal pretensão foi atendida conforme conclusão com a ref. ...93, do dia 7 de fevereiro de 2019;
3. Pelo que é possível constatar através da conta de custas elaborada no dia 19 de março de 2019, tais encargos encontram-se efetivamente incluídos na conta de custas;
4. No entanto, até à presente data, não foi concretizado qualquer pagamento ao aqui signatário, pelo que este vem muito respeitosamente

REQUERER
Aos autos, o efetivo pagamento da remuneração e reembolso de despesas, já fixados nos autos”.

O Ministério Público promoveu nada ter a opor ao requerido.
Sobre o requerimento apresentado pelo administrador judicial provisório que antecede recaiu, em 11/11/2019, o despacho de indeferimento, que se segue:
“Ref. ...13: O despacho de 07/02/2019 determinou que tais quantias integram-se nas custas do processo e são encargo do devedor.
Como tal, não pode haver adiantamento pelos Cofres do Estado, havendo apenas que executar a dita conta de custas, caso não haja pagamento voluntário.
D.N.”.

O despacho que antecede foi notificado, via Citius, ao administrador judicial provisório em 12/11/2019.
Em 16/12/2019, o contador elaborou nova conta, informando que:
“A conta de custas de fls. 621 foi parcialmente paga – 1 prestação – faltando o pagamento das restantes. Foi dada baixa da conta pelo montante já pago. Entretanto, foi junta aos autos, a fls. 634 a 636, custas da Conservatória do Registo Comercial ....
A fim de ser apurado o valor das custas atualmente em dívida vou proceder à elaboração das custas atualmente em dívida onde sejam englobadas todas as quantias em dívida”.

Nessa mesma data de 16/12/2019, elaborou-se nova conta e notificou-se a devedora, EMP01..., Lda., da mesma e para proceder ao pagamento da quantia de 3.375,36 euros de custas da sua responsabilidade, que nada pagou ou requereu.
Entretanto, múltiplos credores vieram dar nota que a devedora, EMP01..., Lda., incumprira o plano de pagamento aprovado e homologado quanto aos créditos neles previstos quanto aos mesmos, posto que não lhes pagou nenhuma das prestações previstas no plano nas datas de vencimento dessas prestações, mantendo-se essa situação de incumprimento mesmo após a terem notificado, por escrito, nos termos do disposto no art. 218º, n.º 1 do CIRE, informando alguns desses credores, inclusivamente, que a devedora teria cessado a sua atividade (cfr. fls. 642 a 704.
Em 14/11/2023, a Secção concluiu os autos com a informação que: “Em 16/12/2019, foi emitida e notificada à devedora a conta de custas e, foram levados à conta de custas os honorários e despesas fixadas por despacho de 07/02/2019, ao Exmo. Sr. A.J.P.. A conta de custas não foi paga e, em 24/09/2010, foi emitida certidão e comunicada à administração tributária, não constando dos autos qualquer pagamento ao exmo. Sr. A.J.P.”.
Ordenou-se que fosse dado conhecimento ao administrador judicial provisório da informação lavrada pela Secção.
Cumprido com o determinado, por requerimento de 21/11/2023, o administrador judicial provisório requereu:
“1. Tomou o aqui signatário conhecimento da não homologação do plano de recuperação, e ao prosseguimento dos autos para insolvência da devedora, cuja a respetiva declaração de insolvência, ocorreu nos presentes autos, Juiz ..., do Juízo do Comércio ..., sob o processo nº3081/20.....
2. E à luz do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/02/2023, proferido no processo 3767/22...., onde determinou que “o pagamento da remuneração fixa e das despesas do AJ em PER (e PEAP) está assegurado, em última instância pelo Estado, através do IGFEJ;”
3. Uma vez que, “De contrário, a norma do art.º 17.º-C, nº 7 (e do art.º 222.ºC, nº 7) e qualquer outra que fosse interpretada no sentido de vedar a satisfação da remuneração fixa devida ao AJP por adiantamento do IGFEJ, não resistiriam a um juízo de inconstitucionalidade por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade analisados por referência à referida natureza e contexto jurídico-processual legal do exercício e prestação da atividade do AJ no âmbito dos processos de insolvência, PER e PEAP já que “A imposição legal do dever de colaboração (a medida restritiva) e o regime remuneratório (a medida mitigadora) constituem uma unidade funcional incindível, de modo que [a ausência de garantia do Estado quanto ao pagamento da remuneração que unilateralmente estipulou dever ser paga ao AJ] implica, não a responsabilidade do Estado pelo facto lícito de impor a colaboração do perito, mas a inconstitucionalidade (e consequente ilicitude) da própria imposição do dever de colaboração nesses termos”, e porque “Por outro lado, é justo que o sacrifício seja, na medida possível, suportado não pelo próprio [administrador judicial], mas pelo processo em cujo âmbito presta os seus serviços”.
4. Conforme seguinte link de consulta:
http://www.gde.mj.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/f8a4818ee1926e6480258975003f9442?OpenDocument
5. Requer muito respeitosamente aos presentes autos, que seja ordenado ao IGFEJ, o pagamento da remuneração fixa devida ao subscritor pelas funções exercidas nos presentes autos”.

Sobre esse requerimento recaiu despacho de 27/11/2023, em que a 1ª Instância indeferiu o requerido, constando esse despacho do teor que se segue:
“Ref. ...91:
Como se decidiu no Ac. do TRC de 09/11/2022 (relator: José Avelino Gonçalves):
«Nessas situações, as custas são a cargo do requerente do processo, isto é, os honorários e as despesas arbitradas ao administrador judiciário provisório, enquanto encargos do processo, são a cargo do requerente que viu o PER ou o PEAP a improceder, não havendo, por isso, também, nesses casos, qualquer fundamento legal para que as quantias necessárias ao pagamento dessa remuneração e despesas sejam adiantadas pelo IGFEJ, salvo nos casos em que o requerente do PER ou do PEAP beneficie de apoio judiciário que o isente do pagamento de custas ou na modalidade de pagamento faseado.
Não existe fundamento legal para o IGFEJ, IP, ser responsabilizado a título principal, como pretende o Apelante, pois nem sequer quando prevista a sua intervenção tal sucede - na insolvência aquela responsabilização apenas ocorre após serem esgotadas as disponibilidades da massa insolvente; ou seja, o IGFEJ, IP, apenas é, então, responsabilizado, sempre a título subsidiário e nos casos em que a lei prevê a existência de uma massa insolvente».
Aliás isso é, a nosso ver, bastante claro da leitura do disposto no art. 17º-C, n.ºs 6 e 7 do CIRE.
Pelo exposto, indefere-se o ali requerido.
Notifique”.

Inconformado com o assim decidido, o administrador judicial provisório, AA, interpôs recurso, em que formula as seguintes conclusões:
I. A Revitalizanda foi declarada insolvente em 10/02/2021 nos autos de insolvência que correram termos pelo Juízo do Comércio ... - Juiz ..., sob o nº 3081/20...., e encerrado o estabelecimento da insolvente, com cumprimento do disposto no art.º 65º n.º 3 do CIRE, em que nestes foi nomeado um outro AI, que não o aqui Recorrente, o que o impediu de ser remunerado subsidiariamente, através dos Cofres do Estado, ou sequer vir a ser pago na sequência de qualquer execução por custas.
II. O douto despacho em cotejo, nega o pagamento pelos cofres considerando que a intervenção do IGFEJ, IP, só é possível a título subsidiário e em caso de insolvência, quando sejam esgotadas as disponibilidades da Massa Insolvente.
III. Face a isto, desemboca o Recorrente na insatisfação/não pagamento da sua remuneração no entendimento do Tribunal “a quo” sustentar que o pagamento em sede de PER é da única e exclusiva responsabilidade da Revitalizanda.
IV. O Recorrente não pode aderir a esta tese, uma vez que “in casu” e em todos os semelhantes, o exercício das funções de AJP e o trabalho que este consequentemente prestou nunca lhe seria remunerado. 
V. O que nem é justo nem é legal, face à figura que este profissional assume perante a lei, a Justiça e ao seu Estatuto Remuneratório como manda a Lei 22/2013, de 26 de fevereiro. 
VI. Face aos superiores princípios da igualdade e da proporcionalidade, essa remuneração deverá ser “in casu” assumida pelos Cofres do Estado/IGFEJ, IP.
VII. O despacho recorrido, viola o disposto no art.º 32º do CIRE, o EAJ, aprovado pela Lei 22/2013, de 26 de fevereiro.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, SE IMPÕE A ALTERAÇÃO DO DESPACHO RECORRIDO, REVOGANDO-O E SUBSTITUINDO-O POR OUTRO QUE ORDENE O PAGAMENTO DA REMUNERAÇÃO DO RECORRENTE E DAS DESPESAS POR SI SUPORTADAS PELO IGFEJ, IP. 
ASSIM, SE DANDO COR DE VERDADE À JUSTIÇA!

O Ministério Público contra-alegou, pugnando no sentido de que a apelação deverá improceder.
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A 1ª Instância admitiu o recurso interposto como sendo de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido objeto do despacho sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido nelas apreciadas, visando obter a sua anulação (quando padeçam de vício determinativo de nulidade), ou revogação ou alteração (quando padeçam de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito), nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, o despacho recorrido[1].
No seguimento desta orientação, cumpre ao tribunal ad quem apreciar uma única questão, que consiste em saber se o despacho recorrido (ao indeferir a pretensão do administrador judicial provisório – o apelante - para que a remuneração e as despesas que lhe foram arbitradas no âmbito do processo especial de recuperação (PER), por decisão proferida, transitada em julgado, lhe fossem liquidadas pelo IGFEJ, ante a consideração de que aquela remuneração e despesas não lhe foram pagas/liquidadas pela aí devedora  - EMP01..., Lda. -, e esta foi, entretanto, declarada insolvente) padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe revogar esse despacho e substitui-lo por outro, ordenando que o pagamento daquela remuneração e despesas sejam suportadas pelo IGFEJ, I.P..
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos que relevam para apreciar a questão objeto do presente recurso são os que constam do relatório acima exarado.
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IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

A- Responsabilidade pelo pagamento das custas no âmbito do PER e do PEAP
Estabelece o art. 527º, n.º 1 do CPC, aplicável aos processos previstos no CIRE (onde se conta o processo especial de recuperação - PER - sobre que versam os presentes autos, mas também o PEAP) “em tudo o que não contrarie as disposições” nele previstas (art. 17º, n.º 1 do CIRE) que: “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito”, e acrescenta-se, no seu n.º 2, que: “Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for”.
Das disposições jurídicas acabadas de transcrever extrai-se, por um lado, que, salvo quando exista alguma isenção objetiva ou subjetiva de custas (art. 4º, n.º 2, do RCP), todas as ações, incluindo incidentes ou recursos, implicam o pagamento de custas (art. 1º do RCP) e, por outro, que a decisão da matéria de custas integra a sentença, sendo complemento desta (art. 607º, n.º 4 do CPC) e, finalmente, que em sede de determinação do responsável pelo pagamento das custas vigoram dois critérios: um geral (o critério da causalidade), nos termos do qual é responsável pelo pagamento das custas “a parte que a elas houver dado causa”, e um  critério subsidiário (o critério do proveito ou do benefício), o qual apenas atua quando o geral, pela natureza da própria ação, não pode atuar por não haver “vencimento” na ação, em que as custas ficam a cargo da parte que “retirou proveito do processo”, isto é, que retirou benefício do nele decidido.
O conceito de “custas processuais” utilizado pelo Código de Processo Civil (CPC) e pelo Regulamento das Custas Processuais (RCP) é polissémico, podendo ser utilizado em sentido amplo ou em sentido estrito, pelo que importa indagar qual o conceito de “custas” a que alude o identificado art. 527º, n.º 1.
As custas processuais em sentido amplo abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (art. 529º, n.º 1 do CPC).
A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do RCP nos respetivos arts. 5º a 7º, 11º, 13º a 15º (n.º 2 do art. 529º do CPC).
Deriva do escopo que é prosseguido pela taxa de justiça que o fator que determina o seu pagamento é o mero impulso processual de relevantes dinâmicas processuais como é a ação, os incidentes ou recursos, e não o decaimento nestes[2], não estando, por isso, a responsabilidade pelo pagamento de taxa de justiça dependente do resultado da ação, incidente ou do recurso, mas apenas  do impulso de dinâmicas processuais que o RCP considera como constituindo “processo autónomo” para efeitos de pagamento de taxa de justiça.
Para esse efeito, nos termos do n.º 2, do art. 1º do RCP, considera-se processo autónomo cada ação, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação própria.
Por «impulso processual» entende-se, por sua vez, “grosso modo, a prática do ato de processo que dá origem a núcleos relevantes de dinâmicas processuais, designadamente, a ação, a execução, o incidente, o procedimento, incluindo o cautelar, e o recurso”[3].
Os encargos do processo são todas as despesas resultantes da condução do mesmo, requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz da causa (n.º 3 do art. 529º do CPC), estando o seu regime previsto nos arts. 16º a 20º, 23º e 24º do RCP, onde se engloba, no caso de PER (de PEAP), a remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas por este suportadas no exercício dessas funções.
As custas de parte compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensado em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do RCP, basicamente, nos seus arts. 25º, 26º e 30º a 35º (art. 530º, n.º 4 do CPC).
Resulta do exposto que, a decisão de custas, que é complemento da decisão que julgue a ação, o incidente, o recurso, o procedimento cautelar ou a execução, a que alude o art. 527º, n.º 1 do CPC, respeita às custas processuais em sentido estrito, não estando nelas contemplada a taxa da justiça, posto que o pagamento desta, conforme antedito, deriva da simples prática de ato que o RCP considera constituir um processo autónomo para efeitos de pagamento de taxa de justiça, independentemente do resultado desse processo autónomo.
A taxa de justiça configura, assim, uma verdadeira taxa, que as partes têm de liquidar, quando impulsionem o que o RCP considera para esses efeitos como “processo autónomo”, quer quando formulem em relação a ele um impulso ou um contra impulso, por a taxa de justiça ser contrapartida do serviço de justiça que lhes é prestado, muito embora não se exija uma rigorosa equivalência económica entre o montante da taxa de justiça a liquidar e o valor do serviço de justiça que lhes é prestado, mas apenas que exista uma certa proporcionalidade entre esses dois vetores, por forma a que não ocorra uma violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso constitucionalmente consagrados[4].
As custas a que se reporta o art. 527º, n.º 1 do CPC, e que é complemento da decisão que julgue a ação, incidente, procedimento cautelar, recurso ou execução, são, portanto, as custas em sentido estrito, nelas apenas se englobando os encargos e as custas de parte (mas não a taxa de justiça).
O critério geral determinativo dos responsáveis pelo pagamento das custas processuais em sentido estrito, conforme antedito, é o princípio da causalidade, o qual impõe que a responsabilidade pelo seu pagamento recaia sobre a parte que “a elas der causa”, presumindo-se inilidivelmente[5], para esses efeitos, no n.º 2 do art. 527º do CPC, que dá causa às custas a parte vencida, na proporção em que o for.
Ou seja, é a sucumbência das partes nas pretensões que formularam em juízo que determinará a sua responsabilidade pelo pagamento (ou não) das custas em sentido estrito.
O princípio da causalidade prescinde, assim, de qualquer outra indagação autónoma para determinar quem dá causa à ação e quem, consequentemente, deve ser condenado nas custas na decisão que que julgue a ação, incidente, procedimento cautelar, recurso ou execução, bastando verificar quem figura na ação como autor, no incidente como requerente, e no recurso como recorrente e, bem assim, quem figura naqueles como réu, requerido ou recorrido, respetivamente, e verificar qual a pretensão formulada (pedido) e qual o sentido da decisão judicial que recaiu sobre essa pretensão, no sentido de se verificar se esta obteve ou não provimento ou provimento parcial para se proferir a decisão quanto a custas no sentido do resultado obtido.
Dito por outras palavras, “o critério para determinar quem dá causa à ação, incidente ou recurso prescinde, em princípio, de qualquer indagação autónoma: dá-lhe causa quem perde. Quanto à ação, perde-a o réu quando é condenado o pedido; perde-a o autor quando o réu é absolvido do pedido ou da instância. Quanto aos incidentes, paralelamente, é parte vencida aquela contra a qual a decisão é proferida: se o incidente for julgado procedente, paga as custas o requerido; se for rejeitado ou julgado improcedente, paga-as o requerente. No caso dos recurso, as custas ficam por conta do recorrido ou do recorrente, conforme o recurso obtenha ou não provimento”[6].
Frise-se que, subjacente ao princípio da causalidade enquanto critério geral determinativo do responsável pelo pagamento das custas, está a consideração que seria injusto impor-se a condenação em custas à parte que teve necessidade de recorrer ao sistema de justiça para exercer ou defender os seus direitos ou legítimos interesses e se veio a constatar, por decisão judicial, que tinha razão, visando o legislador, mediante a consagração daquele critério obter  “uma correspondência entre a responsabilidade pelo pagamento das custas e o resultado da atividade processual dos sujeitos intervenientes no processo: a responsabilidade pelo pagamento das custas assenta precisamente na ideia de que o processo não deve causar prejuízos à parte que tem razão, sendo por isso as mesmas pagas pela parte vencida, e na medida em que o for; ou, não havendo vencimento, pela parte que tirou proveito. Logo, procura-se não se impor um sacrifício patrimonial à parte em benefício da qual a atividade do tribunal se realizou, uma vez que é interesse do Estado que a utilização do processo não cause prejuízo ao litigante que tem razão. Compreende-se, por isso, que se afirme que, no regime de custas definido pelo legislador ordinário para o processo cível assenta, a título principal, no princípio da causalidade (indiciado pelo princípio da sucumbência), isto é, as custas serão suportadas pela parte que a elas houver dado causa, entendendo-se como tal a parte vencida, na proporção em que o for, e só subsidiariamente a responsabilidade pelas custas apelará ao princípio da vantagem ou do proveito resultante do processo, isto é, só quando, pela natureza da ação, não haja lugar a vencimento por qualquer das partes, as custas serão suportadas por quem do processo tirou proveito”[7].
Destarte, apenas quando pela própria natureza do processo (v.g., ação de divisão de coisa comum), o critério da causalidade não poder atuar, por nesse processo não haver vencido, impõe-se, então, nos termos do art. 627º, n.º 1, parte final, do CPC, recorrer ao critério subsidiário do proveito ou do benefício, ficando as custas (em sentido estrito) a cargo da(s) parte(s) que tirou(raram) proveito da decisão judicial proferida.
Os critérios que se acabam de enunciar são normas que o CPC manda aplicar na ausência de regras especiais que imponham outros critérios.
Daí que se imponha indagar se no âmbito do CIRE existem comandos especiais que imponham critérios distintos, em sede de determinação do responsável pelo pagamento das custas (em sentido estrito), tanto mais que, nos termos do art. 17º, n.º 1 do CIRE, os processos nele regulados regem-se pelo CPC, apenas nos casos omissos, isto é, quando a questão não se encontra regulada no CIRE e, adicionalmente, desde que o regime do CPC não contrarie as disposições estabelecidas no CIRE.
Ora, compulsado o regime jurídico previsto no CIRE, é inegável que esse regime especial aplicável aos processos que se encontram regulados no CIRE existe e encontra-se consagrado nos arts. 17º-C, n.ºs 6 e 7 e 17º-F, n.ºs 9 e 12 (quanto ao PER), 222º-C, n.ºs 6 e 7 e 222º-F, n.º 9 (quanto ao PEAP), 32º, n.º 3 e 304º (este último, quanto ao processo de insolvência), todos do CIRE.
Lê-se no art. 17º-C, n.º s 6 e 7 do CIRE que:
“6- A remuneração do administrador judicial provisório é fixada pelo juiz, na própria decisão de nomeação ou posteriormente, e constitui, juntamente com as despesas em que aquele incorra no exercício das suas funções, um encargo nas custas do processo, suportado pela empresa, sendo o organismo responsável pela gestão financeira e patrimonial do Ministério da Justiça responsável pelo seu pagamento apenas no caso de a empresa beneficiar de proteção jurídica na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo.
7- Caso a empresa venha a ser declarada insolvente na sequência da não homologação de um plano de recuperação, a remuneração do administrador judicial provisório e as despesas de um plano de recuperação, a remuneração do administrador judicial provisório e as despesas em que este tenha incorrido, que não sejam pagas, constituem créditos da insolvência”.
No art. 17º-F, n.º 9, 11 e 12 do mesmo Código que:
“9- Caso o juiz homologue o acordo (de revitalização aprovado pelos credores), aplica-se o disposto nos n.ºs 3 a 9 do art. 17º-G.
11- A decisão de homologação vincula a empresa e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º 5 do artigo 17º-C, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal.
13- Compete à empresa suportar as custas do processo de homologação.”
Tendo o processo especial para acordo de pagamento (PEAP), sido introduzido no ordenamento jurídico nacional pelo DL n.º 79/2017, de 30/06, que entrou em vigor em 01 de julho de 2017, e que aditou ao CIRE os arts. 222º-A a 222º-J, criando o novo processo especial para acordo de pagamento, o qual permite ao devedor que, não sendo uma empresa e que comprovadamente se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir um acordo de pagamento, que obste a que caia numa situação de irremediável insolvência (n.º 1 do art. 222º-A do CIRE), em que o regime jurídico do PEAP foi praticamente decalcado pelo legislador do aplicável ao PER, ao ponto de se poder afirmar grosso modo que o PEAP é o “PER não empresários”[8], nos arts. 222º-C, n.ºs 6 e 7 e 222º-F, nºs 6, 8 e 9 do CIRE, repete-se o regime jurídico antes transcrito dos arts. 17º-C, nºs 6 e 7 e 17º-F, n.ºs 9, 11 e 12 para o PER agora quanto ao PEAP.
Por sua vez, estabelece o art. 32º, n.º 3 do CIRE que:
“3- A remuneração do administrador judicial provisório é fixada pelo juiz, na própria decisão de nomeação ou posteriormente, e constitui, juntamente com as despesas em que ele incorra no exercício das suas funções, um encargo compreendido nas custas do processo, que é suportado pelo organismo responsável pela gestão financeira e patrimonial do Ministério da Justiça na medida em que, sendo as custas da responsabilidade da massa, não puder ser satisfeito pelas forças desta”.
E no art. 304º do CIRE, que:
“As custas do processo de insolvência são encargos da massa insolvente ou do requerente, consoante a insolvência seja ou não decretada por decisão com trânsito em julgado”.
Finalmente, dispõe o Estatuto do Administrador Judicial (EAJ), aprovado pela Lei n.º 22/2013, de 26/02, e sucessivas alterações, no seu art. 30º, que:
“1- Nas situações previstas nos artigos 39º e 322º do CIRE, a remuneração do administrador da insolvência e o reembolso das despesas serão suportadas pelo organismo responsável pela gestão financeira e patrimonial do Ministério da Justiça.
2- Nos casos previstos no art. 39º do CIRE, a provisão a adiantar pelo organismo referido no número anterior é metade da prevista no n.º 8 do artigo anterior, sendo paga imediatamente após a nomeação.
3- Se o devedor beneficiar do diferimento do pagamento das custas, os termos do art. 248º (isto é, por via de pedido de concessão do benefício de exoneração do passivo restante e deferimento liminar do pedido de exoneração) do CIRE, o pagamento da remuneração e o reembolso das despesas são suportados pelo organismo referido no n.º 1, na medida em que a massa insolvente seja insuficiente para esse efeito”.

Confrontadas as disposições legais que se acabam de transcrever, nomeadamente, o regime especial dos arts. 17º-C, n.ºs 6 e 7 e 17º-F, n.ºs 9, 11 e 12 do CIRE, quanto à determinação do responsável pelo pagamento das custas em sede de PER (e o dos arts. 222º-C, n.ºs 6 e 7 e 222º-F, n.º 6, 8 e 9, do mesmo diploma, quanto à determinação desse responsável pelo pagamento de custas em sede de PEAP), com os princípios gerais previstos no art. 527º do CPC, verifica-se que, quanto ao PER e ao PEAP, se mantém a determinação legal de que, na decisão final a proferir no âmbito desses processos especiais, o juiz terá de proferir decisão quanto a custas (relembra-se, em sentido estrito – cfr. art. 17º-F, n.º 12, para o PER, e art. 222º-F, n.º 9, para o PEAP), sendo essa decisão complemento daquela decisão homologatória do plano.
Mais se verifica que, englobando as custas em sentido estrito, os encargos e as custas de parte, em consonância com a noção de “encargos”, acima enunciada, nos apontados arts. 17º-C, n.º 7 (quanto ao PER) e 222º-C, n.º 6 (quanto ao PEAP), estabelece-se expressamente que a remuneração devida ao administrador judicial provisório e os encargos por este suportados no exercício das suas funções, constitui “um encargo compreendido nas custas do processo”.
Contudo, porque o PER é o processo que permite ao devedor, que sendo uma empresa, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização, que obste a que caia numa situação de insolvência irremediável (art. 17º-A, n.º 1 do CIRE), enquanto o PEAP é o processo especial que permite ao devedor que, não sendo uma empresa, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo de pagamento, que obste a que esse devedor não empresário caia numa situação de insolvência irremediável (art. 22º-A, n.º 1 do CIRE), não existindo nos processos em causa “vencido”, nos casos em que esses processos culminem com a homologação de, respetivamente, plano de recuperação ou plano de pagamento aprovado pela maioria dos credores do devedor, o legislador, nos arts. 17º-C, n.ºs 6, 7 e 17º-F, n.º 12 (quanto ao PER), 222º-C, n.ºs 6 e 7 e 222º-F, n.º 9 (quanto ao PEAP), abandonou compreensivelmente o critério geral determinativo do responsável pelo pagamento das custas fixado no art. 527º, n.ºs 1, primeira parte, e 2 do CPC, ou seja, o critério da causalidade, e, na mesma linha de raciocínio que seguiu nesse preceito, na sua parte final (do art. 527º, n.º 1 do CPC), adotou o critério supletivo do proveito ou do benefício.
Daí que, no âmbito do PER (e do PEAP), as custas (em sentido estrito, as quais, reafirma-se, apenas incluem os encargos, onde se incluem a remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas por ele suportadas no exercício das suas funções, bem como as custas de parte) desses processos especiais, em caso de homologação, respetivamente, do plano de recuperação ou do plano de pagamento, ficam a cargo do devedor (que recorreu ao processo em causa) e que, por isso, é quem beneficiou do plano de recuperação ou do plano de pagamento que, respetivamente, neles foram aprovados e homologados.
Contudo, o legislador não se pode apartar, por um lado, que o devedor que recorreu a PER ou PEAP, poderá beneficiar da concessão do benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça e demais encargos do processo, e, por outro lado, que, em ambos os processos em causa, o devedor pode, a todo o tempo, desistir, de forma imotivada, das negociações com os seus credores (art. 17º-G, n.º 2 – quanto ao PER – e art. 222º-G, n.º 2 – quanto ao PEAP); que o prazo legalmente estipulado para as negociações poderá decorrer sem que devedor e credores cheguem a acordo quanto à aprovação de, respetivamente, um plano de recuperação ou de um plano de pagamento (art. 17º-G, n.º 1 – quanto ao PER – a art. 222º-G, n.º 1 – quanto ao PEAP), ou que, chegando a esse acordo, o plano de recuperação ou de pagamento que, respetivamente, foi aprovada pelo devedor e pela maioria dos seus credores poderá não ser homologado pelo juiz (art. 17º-, n.ºs 7, 8 e 10º - quanto ao PER – e art. 222º-F, n.ºs 5 e 6 – quanto ao PEAP) e que, em todas essas situações terá o administrador judicial provisório de emitir parecer no sentido de se o devedor se encontra já (ou não) em situação de insolvência atual, e caso conclua que este já se encontra em situação de insolvência, terá de ser instaurado processo de insolvência, requerendo que seja declarado insolvente (art. 17º-G, n.ºs 3, 5, 6 e 7 – quanto ao PER – e art. 222º-G, n.ºs 3, 5, 6 e 7 – quanto ao PEAP).
Quando o PER ou o PEAP culmine com a aprovação e homologação de, respetivamente, um plano de recuperação ou de um plano de pagamento, apesar de, nos termos do critério do proveito ou do benefício, as custas do processo ficarem sempre a cargo do devedor, quanto este goze de benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça e demais encargos do processo, nos termos dos arts. 17º-C, n.º 6 (quanto ao PEAP) e 222º-C, n.º 6 (quanto ao PEAP), sendo, conforme antedito, a remuneração devida ao administrador judicial provisório pelas funções que exerceu nesses processos e as despesas que efetuou no exercício dessas funções considerado “encargo” dos processos em causa, mas beneficiando o devedor de proteção jurídica que o dispensou do pagamento dos encargos do processo, coerentemente com esta última decisão, aqueles arts. 17º-C, n.º 6 e 222º-C, n.º 6 determinam que a remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas que suportou no exercício dessas funções são a cargo do organismo responsável pela gestão financeira e patrimonial do Ministério da Justiça ou seja, pelo IGFEJ, I.P..
O IGFEJ adianta então a quantia necessária à liquidação da remuneração e das despesas devidas ao administrador judicial provisório, sem prejuízo das quantias assim adiantadas terem de ser incluídas na conta de custas do PER e do PEAP, conforme o determina o art. 16º, n.º 1, al. a), do RCP, e de serem imputadas nas custas do processo (em sentido estrito) a serem suportadas pelo devedor.
Note-se que a solução jurídica prevista nos enunciados arts. 17º-C, n.º 6 e 222º-C, n.º 6 do CIRE para o PER e o PEAP, respetivamente, em que se determina que, em caso de homologação de, respetivamente, plano de revitalização ou plano de pagamento, e do devedor beneficiar de proteção jurídica que o isente do pagamento de encargos, o IGFEJ, I.P. tem de adiantar a quantia necessária ao pagamento da remuneração devida ao administrador judicial provisório e das despesas que suportou no exercício dessas funções nada tem de novo em relação ao regime geral previsto para a generalidade dos processos cíveis no art. 532º, n.º 1 do CPC, em que se dispõe que: “Salvo o disposto na lei que regula o acesso ao direito, cada parte paga os encargos a que tenha dado origem e que foram produzindo no processo”,  e no art. 29º, n.º 1 do RCP, em que se estabelece que: “Quando a parte beneficie de isenção de custas ou de apoio judiciário, os encargos são sempre adiantados pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infraestruturas da Justiça, I.P, sem prejuízo de reembolso”, adiantando-se, no art. 16º, n.º 1, al. a) daquele RCP que: “As custas compreende, os seguintes encargos: a) Os reembolsos ao Instituto de Gestão Financeira e das Infraestruturas da Justiça, I.P.”.
Em suma, sempre que no âmbito do PER ou do PEAP, esses processos especiais culminem com uma decisão de homologação de um plano de recuperação ou de um plano de pagamento, respetivamente, de acordo com o princípio do proveito ou do benefício consagrados nos arts. 527º, n.º 1, parte final, do CPC, 17º-F, n.º 11 (para o PER) e 222º-F, n.º 9 (para o PEAP), as custas do processo (em sentido estrito, englobando apenas os encargos e as custas de parte) são a cargo do devedor, que é quem aproveita do plano de recuperação e o plano de pagamento aprovados e homologados.
Se o devedor beneficiar de proteção jurídico que o isente do pagamento de encargos, cumpre ao IGFEG,I.P. adiantar a quantia necessária ao pagamento desses encargos, onde se inclui a remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas por este suportadas no desempenho das suas funções (pelo que este obtém sempre pagamento da remuneração que lhe é devida e das despesas), as quais, contudo, são consideradas na conta de custas a apresentar ao devedor, enquanto beneficiário do PER ou do PEAP e, consequentemente, responsável pelo pagamento das custas desses processos (art. 17º-C, n.ºs 6 e 7 (quanto ao PER), 222º-C, n.º 6 (quanto ao PEAP) do CIRE, 532º, n.º 1 do CPC, 19º, n.º 1 e 16º, n.º 1, al. a) do RCP.
Assim, se o devedor não proceder ao pagamento das custas dos processos em causa, por cujo pagamento é legalmente responsável, as quantias adiantadas pelo IGFEJ, I.P., acabam por reverter em prejuízo para este organismo, ou seja, do Estado.
Já no caso de, no âmbito do PER ou do PEAP, ser homologado, respetivamente, plano de recuperação ou plano de pagamento, sendo as custas (em sentido estrito) daqueles processos, de acordo com o princípio do proveito ou do benefício, da responsabilidade do devedor, caso este não goze de proteção jurídica que o isente do pagamento de encargos, não existe fundamento legal para o IGFEJ, I.P., adiantar os encargos, mormente, a remuneração devida ao administrador judicial provisório pelas funções que exerceu no âmbito do PER ou do PEAP, nem das despesas que suportou com o exercício dessas funções (veja-se que nos termos dos arts. 17º-C, n.º 6 - para o PER -, 222º-C, n.º 6 - para o PEAP - do CIRE, art. 532º, n.º 1, do CPC e art. 19º, n.º 1, do RCP, o que legitima o adiantamento dos encargos pelo IGFEJ, I.P. é a circunstância do responsável pelo pagamento das custas do processo – o devedor que recorreu a PER ou a PEAP - beneficiar de apoio judiciário que o dispense do pagamento de encargos). Os encargos, nessa situação, terão de, nos termos do art. 16º, n.º 1, als. h) e i) do RCP, de serem considerados na conta do processo, a título de custas, mas se o devedor não vier a liquidar, por qualquer motivo, essas custas do processo por cujo pagamento é responsável, o não pagamento dos encargos, mormente, da remuneração devida ao administrador judicial provisório pelas funções que exerceu no processo (PER ou PEAP) e os encargos que suportou no exercício dessas funções acaba por reverter em prejuízo do próprio administrador judicial provisório.
Nessa situação, o administrador judicial provisório, cuja remuneração e encargos não foram voluntariamente pagos pelo devedor (responsável pelo pagamento das custas), dispõe de título bastante (a conta e a notificação do devedor para que procedesse ao pagamento das custas, obrigação essa incumprida) para instaurar execução contra o devedor tendo em vista a cobrança coerciva da remuneração e dos encargos que lhe foram fixados e que o devedor não satisfez, execução essa que cumpre ser promovida oficiosamente pela secretaria e que será levada a cabo pela Administração Tributária (art. 35º do RCP).
Já no caso de, na sequência do PER ou do PEAP, não ser homologado plano de revitalização ou plano de pagamento por uma das causas acima já mencionados (o devedor pôs termo às negociações com os credores; decorreu o prazo de negociação sem que tivesse sido alcançado acordo entre devedor e credores, ou apesar de alcançado esse acordo, o juiz não homologou o plano aprovado, por decisão transitada em julgado) e o administrador judicial provisório emitir parecer de que o devedor já se encontra numa situação de insolvência atual, situação essa que, como antedito, leva a que tenha de ser instaurado processo de insolvência contra o devedor, caso nesse processo de insolvência o devedor venha a ser declarado insolvente, ou independentemente do que se acaba de referir, após o encerramento do PER ou do PEAP (sem instauração de processo de insolvência), o devedor venha, posteriormente, a apresentar-se à insolvência ou a ser objeto de um processo de insolvência em que venha a ser declarado insolvente, se as custas da sua responsabilidade no âmbito do PER ou do PEAP não tiverem sido liquidadas, os arts. 17º-C, n.º 7 (quanto ao PER) e 222º- C, n.º 7 do CIRE (quanto ao PEAO), estabelecem que “a remuneração do administrador judicial provisório e as despesas em que este tenha incorrido, que não sejam pagas, constituem crédito da insolvência”, com o que, mais uma vez, não se estabelece aqui nenhuma novidade em relação ao regime jurídico que já resulta das normas gerais que regulam a insolvência.
Com efeito, do regime dos arts. 36º, n.º 1, al. j), 46º, 51º, a contrario, e 128º e ss. do CIRE, resulta constituírem dívidas da insolvência aquelas que se constituírem antes do devedor ter sido declarado insolvente.
Mais resulta constituírem dívidas da massa insolvente as que se constituíram após o devedor ter sido declarado insolvente, aqui se incluindo as despesas com as remunerações do administrador da insolvência e as despesas deste e dos membros da comissão de credores (art. 51º, n.º 1, al. b) do CIRE).
Ora, não respeitando a remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas que teve no exercício das suas funções no âmbito do PER ou do PEAP, a remunerações ou despesas devidas ao administrador da insolvência como contrapartida das funções que exerceu no âmbito do processo de insolvência (mas a remuneração que é devida ao administrador judicial provisório como contrapartida das funções que exerceu no âmbito do PER – ou do PEAP -, e despesas que suportou no exercício dessas funções), essa remuneração e despesas não só se constituíram antes da declaração da insolvência do devedor, mas trata-se de um crédito que o administrador judicial provisório é titular perante o devedor e que se constituiu no âmbito de PER (ou de PEAP) anterior ao processo de insolvência, pelo que, essa remuneração e despesas são necessariamente crédito do administrador judicial provisório sobre a insolvência (e não sobre a massa insolvente).
Adiante-se que, no que respeita à remuneração devida ao administrador da insolvência como contrapartida das funções que exerceu no âmbito do processo de insolvência e as despesas que suportou no exercício dessas funções (o que, reafirma-se, nada tem a ver com o caso dos presentes autos e, consequentemente, sobre o objeto do presente recurso, onde o que está em causa é a remuneração e as despesas devidas a administrador judicial provisório no âmbito do PER, que correu no âmbito dos presentes autos, que nada têm a ver com o processo em que a devedora EMP01..., Lda. veio a ser declarada insolvente), o art. 304º do CIRE determina que as custas do processo de insolvência são a cargo do requerente quando não seja declarada a insolvência do devedor, e a cargo da massa insolvente no caso contrário.
Assim, a remuneração devida ao administrador da insolvência e as despesas deste, enquanto “encargos” do processo de insolvência, ficam a cargo do requerente (no caso do devedor não ser declarado insolvente) ou da massa insolvente (no caso de ser declarado insolvente).
Acresce que, não ignorando o legislador que o processo de insolvência pode ser declarado encerrado por insuficiência de massa insolvente (arts. 39º e 232º do CIRE)  e que, nessas situações, inexiste massa insolvente que possa responder pela satisfação da remuneração devida ao administrador da insolvência e pelas despesas que teve no exercício dessas suas funções no processo de insolvência (art. 51º, n.º 1, al b) do CIRE), acautelando essa remuneração e despesas do administrador da insolvência, nos casos em que o administrador da insolvência foi nomeado pelo juiz, o art. 32º, n.º 2 do mesmo Código, determina que o IGFEJ, I.P., satisfaz a quantia necessária ao pagamento da remuneração devida ao administrador da insolvência e das despesas que suportou no exercício dessas funções.
Iguais cautelas são adotadas pelo legislador na insolvência de pessoa singular, quando nela o devedor requeira que lhe seja concedido o benefício de exoneração do passivo restante, posto que, a formulação desse pedido, nos termos do art. 248º, n.º 1 do CIRE, opera o imediato diferimento do pagamento das custas da responsabilidade do devedor (insolvente) para a decisão final a proferir quanto ao incidente de exoneração (em situações normais e em caso de diferimento liminar desse pedido, para o termo do período de cessão, cuja duração é de três anos, a contar do encerramento do processo de insolvência – arts. 235º e 237º, al. d), do CIRE), pelo que se justifica plenamente que o IGFEJ, I.P., adiante a quantia necessária ao pagamento da remuneração e das despesas devidas ao administrador da insolvência sempre que se verifique que a massa insolvente e o rendimento disponível do devedor durante o período de cessão é insuficiente para assegurar o pagamento daquela remuneração e despesas.
 
B- Do caso concreto.
Assentes nas premissas que se acabam de expor, revertendo ao caso dos autos, neles a devedora, EMP01..., Lda., apresentou-se a PER e requereu que lhe fosse nomeado como administrador judicial provisório o apelante, AA.
Por despacho de 18/05/2018, nomeou-se como administrador judicial provisório à devedora o apelante.
A devedora EMP01..., Lda. e os respetivos credores vieram a chegar a acordo quanto à aprovação de um plano de recuperação e esse plano foi homologado por sentença proferida, em 13/11/2018, que transitou em julgado e que condenou a devedora nas custas do PER.
 Em 10/01/2019, o apelante (AA) requereu que lhe fosse fixada a remuneração que lhe era devida como contrapartida das funções que desempenhou no âmbito de PER enquanto administrador judicial provisório e lhe fossem pagas as despesas, no montante global de 853,97 euros, que suportou no desempenho dessas funções, requerendo que essa remuneração e despesas lhe fossem pagas através “dos Cofres do Estado”.
Por despacho proferido em 07/02/2019, fixou-se a remuneração devida ao apelante, como contrapartida das funções de administrador judicial provisório que exerceu no âmbito do PER em 1.900,00 euros, e determinou-se que lhe fossem pagas as despesas que indicou, no montante global de 853,87 euros, despendidas no exercício dessas funções.
No que respeita à pretensão do apelante BB, no sentido de que a remuneração que lhe foi fixada como contrapartida das funções que exerceu, enquanto administrador judicial provisório no âmbito do PER, bem como as despesas que suportou no exercício dessas funções, lhe fossem pagas “pelo Cofre do Estado” ou, melhor dizendo, pelo IGFEJ, I.P., essa pretensão, não colhe fundamento legal, posto que, sendo, nos termos dos arts. 527º, n.º 1, parte final, do CPC, e 17º-F, n.º 12, do CIRE, atento o critério do benefício ou do proveito, as custas do PER da responsabilidade da devedora EMP01..., Lda., que foi quem recorreu ao processo em causa e beneficiou da medida de recuperação nele aprovada e homologada, as custas do PER são a cargo desta, conforme, aliás, ficou decidido na sentença homologatória do plano de revitalização, proferida em 13/11/2018, a qual, à data de 10/01/2019, em que o apelante apresentou aquele requerimento, já se encontrava transitada em julgado, estando a decisão de custas nela proferida coberta por caso julgado formal, tornando-se, por isso, obrigatória e incontestável dentro da presente ação de PER (art. 620º, n.º 1 do CPC).
Acresce que, não beneficiando a responsável pelo pagamento das custas do PER, isto é, a EMP01..., Lda., de apoio judiciário que a tivesse isentado do pagamento de encargos, nos termos do disposto nos arts. 532º, n.º 1 do CPC, 17º-C, n.º 6 do CIRE, 16º, n.º 1, al. a) e 19º, n.º 1 do RCP, inexistia fundamento legal para que o IGFEJ, I.P. adiantasse a quantia necessária ao pagamento da remuneração arbitrada ao administrador judicial provisório (1.900,00 euros), como contrapartida das funções que exerceu no âmbito do PER, bem como as despesas (no montante global de 853,87 euros) que suportou no exercício dessas funções.
E na esteira do que se vem dizendo, decidiu a 1ª Instância, no despacho proferido em 07/02/2019, que a remuneração e as despesas que aí fixou ao apelante, enquanto administrador judicial provisório, pelas funções que exerceu no âmbito do PER, “integram-se nas custas do processo e são encargo do devedor”, com o que indeferiu a pretensão daquele no sentido de que a remuneração e as despesas que aí lhe fixou fossem suportadas pelos “Cofres do Estado”, mais decidindo (bem) que estas tinham de lhe ser pagas pela requerente EMP01..., Lda.
O despacho de 07/02/2019 acabado de referir foi notificado, via Citius, ao apelante (administrador judicial provisório) em 08/02/2019, que se conformou com o mesmo, pelo que transitou em julgado, operando caso julgado formal. Daí que o nele decidido tornou-se incontestável e imodificável dentro dos presentes autos, onde o decidido não pode ser novamente suscitado e reapreciado, sob pena de violação do caso julgado formal que cobre a decisão de 07/02/2019.
A circunstância da requerida EMP01..., Lda., não ter pago as custas  processuais (em sentido estrito) do PER, por cujo pagamento, é responsável, conforme decidido na sentença proferida em 13/11/2018, transitada em julgado, onde se inclui a remuneração e as despesas devidas ao apelante, como contrapartida das funções de administrador judicial provisório que exerceu no âmbito do presente processo (PER) e de, entretanto, ter sido declarada insolvente no âmbito de processo de insolvência que veio posteriormente a ser intentado contra aquela, não legitima, nem consente, a violação do caso julgado formal que cobre a decisão de 07/02/2019, posto que, nos termos do disposto no art. 17º-C, n.º 6 do CIRE, a declaração da insolvência da devedora EMP01..., Lda., tem como única consequência jurídica que as custas do PER, onde se inclui a remuneração e as despesas fixadas ao apelante como contrapartida das funções de administrador judicial provisório que nele exerceu, constituem créditos sobre a insolvência, tendo de ser reclamadas no âmbito desse processo de insolvência, a fim de aí obterem pagamento, caso naturalmente esse processo de insolvência não tenha sido encerrado por insuficiência de massa insolvente (art. 232º do CIRE).
É certo que, conforme sustenta o apelante, no acórdão da R.L., de 18/02/2023, decidiu-se, sendo este, aliás, o teor do sumário desse aresto, que: “No processo de insolvência liquidatária a lei reconhece o devedor ou a massa patrimonial que lhe sucede com a declaração da insolvência como a parte ou o sujeito responsável pelo pagamento da remuneração do administrador da insolvência mas, verificada ausência de massa insolvente, perante aquele operador da justiça, a lei reconhece o organismo responsável pela gestão financeira – ou seja, o Estado (no sentido lato do termo) -, como garante do pagamento da remuneração e despesas do administrador da insolvência, o que sucede independentemente da possibilidade de as incluir na conta de custas e de, através destas, cobrar ao devedor o reembolso daqueles valores ou de, na ausência de pagamento voluntário e de bens penhoráveis na esfera jurídica daquele, os suportar em definitivo”.
Mais se adianta nesse acórdão que: “No PER a remuneração do AJP é da direta e imediata responsabilidade do devedor candidato à recuperação, do qual o AJ deve cobrar o seu pagamento, pois aqui não existe massa insolvente e, diversamente do devedor declarado insolvente, aquele mantém o poder de dispor dos seus rendimentos e de outros valores pecuniários que integram o seu património”, mas que: “Tal qual como o lei previa e prevê para os processos de insolvência sem massa, no âmbito do PER, onde pela natureza e efeitos do procedimento também não existe massa insolvente, a remissão do anterior n.º 4 do art. 17º- C do CIRE para o art 32º, n.º 3, assim como a do atual art. 17º-C, n.º 6, ao qualificar a remuneração como encargo compreendidos nas custas do processo, não visa senão, perante o AJP, responsabilizar o IGFEG pela garantia de pagamento da remuneração, adiantando-a a título de encargo a incluir oportunamente nas custas do processo para o devido e oportuno reembolso. Por não corresponder à desresponsabilização do devedor pelo encargo, mas apenas o seu adiantamento em benefício da devida satisfação do direito à remuneração do AJP, a lei previu o seu reembolso pelo obrigado ao pagamento da remuneração através da contabilização e inclusão daquele encargo em conta de custas a cargo do requerente do PER (ou do devedor insolvente singular), na qualidade de sujeito processual responsável pelas custas e encargos do processo, adaptando-se então nestes termos a aplicação do art. 32º, n.º 3 à remuneração do AJP nomeado em PER”.
Também se adianta que: “Do confronto do regime que decorrida da aplicação adaptada do art. 32º, n.º 3 com o atualmente previsto nos arts. 32º, n.º 3 com o atualmente previsto nos n.ºs 6 e 7 do art. 17º-C do CIRE, concluímos que, no que ao regime do pagamento da remuneração do AJP respeita, a alteração introduzida pela Lei n.º 9/2022, de 11/01, restringe-se à alteração da qualificação do reembolso devido ao IGFEJ a título de reembolso pelo adiantamento daquele encargo, que passa a constituir crédito sobre a insolvência e não sobre a massa insolvente, sujeitando-o ao procedimento concursal deste processo e, com isso, o agravamento sério, da impossibilidade de o suportar em definitivo. Em síntese, o pagamento da remuneração fixa e das despesas do AJ em PER (e o PEAP) está assegurado, em última instância pelo Estado, através do IGFEJ”.
E conclui-se que: “De contrário, a norma do art. 17º-C, n.º 7 (e do art. 222º-C, n.º 7) e qualquer outra que fosse interpretada no sentido de vedar a satisfação da remuneração fixa devida ao AJP por adiantamento do IGFEJ, não subsistiriam a um juízo de inconstitucionalidade por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade analisados por referência à referida natureza e contexto jurídico-processual legal do exercício e prestação da atividade do AJ no âmbito dos processos de insolvência, PER e PEAP já que “A imposição legal do dever de colaboração (a medida restritiva) e o regime remuneratório (a medida mitigadora) constituem uma unidade funcional incindível, de modo que (a ausência de garantia do Estado quanto ao pagamento da remuneração que unilateralmente estipulou dever ser paga ao AJ), implica, não a responsabilidade do Estado pelo facto lícito de impor a colaboração do perito, mas a inconstitucionalidade (e consequente ilicitude) da própria imposição do dever de colaboração nesses termos” e porque “Por outro lado, é justo que o sacrifício seja, na medida do possível, suportado não pelo próprio (administrador judicial), mas pelo processo em cujo âmbito presta os seus serviços”[9].
Acontece que se bem interpretamos a jurisprudência  em causa a mesma versa sobre uma situação que nada tem a ver com o caso dos autos, mas com uma situação em que, instaurado PER (ou PEAP) a requerimento do devedor (único que dispõe de legitimidade ativa para o efeito), este pôs termo unilateralmente às negociações que estavam em curso com os seus credores, ou em que o período de negociações legalmente estipulado decorreu sem que fosse alcançado entre devedor e credores acordo quanto a um plano de recuperação (no caso de PER) ou de pagamento (no caso de PEAP), ou em que tendo os mesmos chegado a esse acordo, o julgador recusou a homologação do plano, por decisão transitada em julgado, e nessa sequência, o administrador judicial provisório emitiu parecer no sentido de que o devedor já se encontrava numa situação de insolvência atual, o que, conforme antedito, tem como consequência jurídica a imediata a instauração de processo de insolvência contra o devedor, em que este pode vir a ser declarado insolvente.
Nessas situações, o processo de insolvência surge como uma espécie de extensão ou desenvolvimento do PER (ou do PEAP), o que não é a situação sobre que versam os presentes autos.
Com efeito, nos presentes autos foi instaurado PER pela devedora EMP01..., Lda., foi-lhe nomeado administrador judicial provisório (o apelante) e as negociações entre devedora e os seus credores, sobre a alçada do administrador, chegaram a bom termo, tendo sido aprovado por devedora e a maioria dos seus credores um plano de recuperação, o qual foi homologado por sentença transitada em julgado, que condenou a devedora nas custas do processo de recuperação e onde, consequentemente, se reconheceu que, mediante esse plano de recuperação que foi homologado, esta (devedora EMP01..., Lda.) tinha efetivas condições de ser revitalizada.
O processo foi remetido à conta e foi contado, tendo-se apurado as custas de responsabilidade da devedora, EMP01..., Lda., que não reclamou dessa conta, mas antes com ela se conformou, tanto assim que requereu o pagamento daquelas custas em doze prestações iguais, mensais e sucessivas, o que lhe foi deferido, vindo, porém, a pagar uma única dessas doze prestações.
Finalmente, o PER veio a ser encerrado, por despacho proferido em 24/09/2019, que transitou em julgado.
Daí que, salvo melhor entendimento, o processo de insolvência em que a devedora EMP02..., Lda. foi declarada insolvente nada tem a ver com o PER sobre que versam os presentes autos, não sendo o processo de insolvência consequência ou desenvolvimento deste processo, mas antes um processo totalmente autónomo e distinto, pelo que as custas do PER, mormente, a remuneração nele fixada ao administrador judicial provisório (o apelante) e as despesas que nele teve por via do exercício dessas funções (que são dívidas da massa insolvente) nada têm a ver com as custas do processo de insolvência, nomeadamente, com a remuneração devida ao administrador da insolvência e despesas por ele suportados no âmbito do processo de insolvência.
Acresce que a jurisprudência invocada pelo apelante está longe de ser pacífica e não pode por nós ser subscrita, quando se verifica não existir fundamento legal para se aplicar o regime legal do art. 32º, n.º 3 do CIRE, por remissão do art. 17º-C, n.º6 e 7 do mesmo Código, ao PER e ao PEAP.
Com efeito, o art. 17º-C, nºs 6 e 7 versa sobre a remuneração do administrador judicial no âmbito do PER (e o art. 222º-C, n.ºs 6 e 7, no PEAP)  e determina que essa remuneração, juntamente com as despesas em que incorra no exercício dessas funções, constituem encargo compreendido nas custas do processo, a ser suportado pela empresa, sendo essa remuneração e despesas apenas adiantada pelo IGFEJ, I.P. exclusivamente no caso do devedor responsável pelo pagamento das custas (no caso, a EMP01..., Lda.) ser beneficiário de proteção jurídica na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça e demais encargos do processo, benefício esse de que a devedora EMP01..., Lda. não é beneficiária.
Daí que a pretensão do apelante não possa merecer acolhimento.
Acresce enfatizar que, contrariamente ao que se sustenta na jurisprudência invocada, que não se perfilha, apesar de no art. 32º, n.º 3 do CIRE se ler que: “A remuneração do administrador judicial provisório” e dessa expressão remeter efetivamente para o PER ou o PEAP, o restante teor da norma em causa afasta semelhante entendimento e denota claramente que o legislador nela refere-se antes à “remuneração do administrador da insolvência. É que logo após aquela expressão – “remuneração do administrador judicial provisório” –, o restante teor da disposição legal daquela art. 32º, n.º 2 é no sentido de que essa remuneração “é fixada pelo juiz na própria decisão de nomeação ou posteriormente” (o que significa que o comando que encerra apenas é aplicável aos casos em que o administrador da insolvência tenha sido nomeada pelo próprio juiz, e não quando seja nomeado pelos credores), e constitui, juntamente com as despesas em que ele incorre no exercício das suas funções, um encargo compreendido nas custas do processo, que é suportado pelo organismo responsável pela gestão financeira e patrimonial do Ministério da Justiça na medida em que, sendo as custas da responsabilidade da massa, mão puder ser satisfeita pelas forças desta”.
  Em sede de PER e de PEAP, como é sabido, não existe “massa insolvente”, pelo que é indiscutível que a previsão legal do art. 32º, n.º 2 do CIRE, contrariamente ao propugnado pelo apelante e pelo acórdão que invoca na defesa do seu ponto de vista e que acima transcrevemos, o art. 17º-C, n.ºs 6 e 7 não remete para o art. 32º, n.º 2, não determinando que no PER (e no PEAP) a remuneração do administrador judicial provisório e as despesas que este teve no exercício dessas suas funções no âmbito desses processos (PER ou PEAP) fiquem a cargo ou sejam adiantadas pelo IGFEJ,I.P., mas nele apenas se determina que a quantia necessária a efetuar o pagamento da remuneração e das despesas suportadas pelo administrador judicial provisório sejam adiantadas por este organismo nos casos do devedor (beneficiário do plano de recuperação ou do plano de pagamento, aprovados e homologados, respetivamente, no PER ou no PEAP) beneficiar de proteção jurídica na modalidade da dispensa de taxa de justiça e demais encargos do processo.
Por outro lado, o art. 32º, n.º 2 do CIRE refere-se exclusivamente à retribuição do administrador da insolvência e às despesas que suporte no exercício dessas funções no âmbito do processo de insolvência, nos casos em que aquele tenha sido nomeado pelo juiz, determinando o legislador (em relação ao qual, na fixação do sentido e alcance da lei, deverá o intérprete presumir que consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados - art. 9º, nº 3 do CC), que sempre que a massa insolvente seja insuficiente para satisfazer essa remuneração e despesas do administrador da insolvência, deverá o IGFEJ adiantar a quantia  necessária a satisfazer esse pagamento.
Ao assim estatuir teve o legislador em mente o caso em que o processo de insolvência seja encerrado por insuficiência da massa insolvente, nos termos previstos nos arts. 39º e 322º do CIRE, ou seja, dando concretização e reafirmando o que já tinha preceituado no art. 30º, n.º 1, do EAJ[10]
Decorre do exposto, que tendo o apelante deixado transitar o despacho proferido em 07/02/2019, em que se indeferiu que a remuneração que lhe foi arbitrada como contrapartida das funções de administrador judicial provisório que exerceu no âmbito do PER, e as despesas que suportou no exercício dessas funções lhe fossem pagas pelos “Cofres do Estado”, mais concretamente, que lhe fosse paga/adiantada pelo IGFEJ, I.P., e onde expressamente se decidiu que essa remuneração e despesa eram “encargo do devedor” EMP01..., Lda., por se integrarem “nas custas do processo”, não pode agora colocar em crise o decidido, nomeadamente, questionar a constitucionalidade material do decidido, por alegada violação dos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade, por se tratar de questões que teria de ter suscitado no recurso que interpusesse do despacho proferido de 07/02/2019, recurso esse que não interpôs, deixado antes que esse despacho transitasse em julgado, operando caso julgado formal, tornando-se imodificável e incontestável o nele decidido dentro de presente processo.
Acresce que, a circunstância de a devedora EMP01... ter vindo, posteriormente, a ser declarada insolvente, num outro processo, que é totalmente autónomo e distinto da presente ação de PER, em nada contende com as custas deste último processo, nomeadamente, com a remuneração arbitrada ao apelante, enquanto administrador judicial provisório, no âmbito do PER e as despesas que teve no exercício dessas funções, o qual é totalmente autónomo em relação ao processo de insolvência em que a EMP01..., Lda. veio a ser declarada insolvente, tanto assim que, no âmbito do PER, foi aprovada uma medida de recuperação e esta foi homologada por sentença transitada em julgado.
Note-se que a circunstância de eventualmente o apelante não vir a obter satisfação da remuneração que lhe foi arbitrada pelas funções de administrador judicial provisório que exerceu no âmbito do PER e das despesas que teve no exercício dessas funções (as quais, relembra-se, constituem, nos termos do art. 17º-C do CIRE, créditos da insolvência) não configura qualquer violação aos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.
Com efeito, como ensinam Jorge Miranda e Rui Medeiros, o sentido primário da fórmula constitucional do princípio da igualdade “é negativo: consiste na vedação de privilégios e de discriminações. (…). Mais rico e exigente vem a ser o sentido positivo da igualdade: (i) tratamento igual de situações iguais (ou tratamento semelhante de situações semelhantes); (ii) tratamento desigual de situações desiguais, mas substancial e objetivamente desiguais e não criadas ou mantidas artificialmente pelo legislador; (iii) tratamento em moldes de proporcionalidade das situações relativamente iguais ou desiguais e que, consoante os casos, se converte para o legislador ora em mera faculdade, ora em obrigação: (iv) tratamento de situações não apenas como existem mas também como devem existir (acrescentando-se, assim, uma componente ativa ao princípio e fazendo da igualdade perante a lei uma verdadeira igualdade através da lei); (v) consideração do princípio não como uma “ilha” antes como princípio a situar na âmbito dos padrões materiais da Constituição”.
Contudo, esses mesmos autores adiantam que, “em qualquer caso, a concretização do alcance desta dupla vertente assinalada suscita muitas dificuldades. A questão é delicada porque, em rigor, a problemática do controlo do respeito pelo princípio da igualdade não pode ser dissociada do princípio fundamental da separação de poderes. Os tribunais, que não respondem politicamente, nem assumem políticas de satisfação das necessidades coletivas democraticamente legitimadas através de processos eleitorais, não estão legitimados para assumir a sistemática prossecução de interesses públicos distintos do da observância da ordem jurídica para asseguramento da paz jurídica. O controlo da igualdade deve ser um controlo meramente negativo, não sendo legítimo aos tribunais invocar o princípio da igualdade para orientar em concreto a opção por um outro critério valorativo. Como refere o Tribunal Constitucional, a propósito da atividade legislativa, “a prevalência da igualdade como valor supremo do ordenamento tem de ser caso a caso compaginada com a liberdade que assiste ao legislador de ponderar os diversos interesses em jogo e diferenciar o seu tratamento no caso de entender que tal se justifica” (Ac. n.º 231/94). O princípio da igualdade não tolhe, pois, a liberdade de conformação do legislador ou a margem de livre decisão administrativa no sentido de tratamento desigual de situações materialmente desiguais, permitindo tão somente, enquanto norma de controlo, a consideração como ilegítima de uma medida consagradora de soluções desiguais se e apenas na medida em que não se descortina qualquer fundamento material para a distinção”[11] (destacado e sublinhado nosso).
Ora, cientes que o poder de controlo dos tribunais a propósito do princípio da igualdade se limita à vertente negativa do princípio em causa, em que aqueles apenas podem considerar ocorrer violação do princípio da igualdade quando, perante as opções legislativas do legislador, não descortinem qualquer fundamento substantivo para ocorrer um tratamento diferenciado de situações iguais, dir-se-á que o tratamento diferenciado previsto, por um lado, nos arts. 17º-C, n.º 6 (para o PER) e 222º-C, n.º 6 (para o PEAP) do CIRE, em que se determina que a remuneração devida ao administrador judicial provisório por via das funções que exerceram nesses processos, assim como as despesas que efetuaram no exercício dessas funções, integram as custas do processo, cabendo ao devedor suportá-las, adiantando o IGFEJ apenas essas quantias necessários ao pagamento da remuneração e despesas do administrado judicial provisório nos casos em que o devedor beneficiar de proteção jurídica na modalidade da dispensa do pagamento da taxa de justiça e demais encargos do processo, e por outro, o regime do art. 32º, n.º 3 do mesmo Código, que determina que, nos casos em que o processo de insolvência seja encerrado, nos termos dos arts. 39º e 322º do CIRE, por insuficiência de massa insolvente, a retribuição devida ao administrador da insolvência por via das funções que exerceu no âmbito do processo de insolvência, e as despesas que suportou no exercício dessas funções, sejam suportadas pelo IGFEJ, I.P., assenta num fundamento substancial que justifica a apontada distinção: no PER e no PEAP, o devedor não é privado dos bens e rendimentos que integram o seu património, não existindo massa insolvente, e homologada a medida de recuperação aprovada, por sentença judicial, transitada em julgado, aquele dispõe de condições de recuperação e, por isso, para pagar as custas do PER e PEAP, as quais integram, a título de encargo, a remuneração e as despesas do administrador judicial provisório; enquanto no processo de insolvência, não só o devedor é imediatamente privado do poder de administração dos bens que integram o seu património suscetível de ser penhorado, o qual passa a integrar a massa insolvente (art. 81º, n.º 1 do CIRE), como perante a inexistência de massa insolvente, gorou-se qualquer possibilidade do administrador da insolvência vir a ser pago da remuneração que lhe é devida como contrapartidas das funções que desenvolveu no âmbito do processo de insolvência enquanto administrador, e  de lhe serem pagas as despesas que suportou por via do exercício dessas funções, justificando-se, pois, que o IFGEJ, I.P., as suporte.     
Em suma, decorre do excurso antecedente que, o despacho recorrido não padece de nenhum dos erros de direito que lhe são imputados pelo apelante, impondo-se julgar improcedente a presente apelação e confirmar o despacho sob sindicância.
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Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
1- No âmbito do PER e do PEAP, homologado o plano de recuperação ou o plano de pagamento, respetivamente, as custas do processo são da responsabilidade do devedor, atento o critério do proveito ou do beneficio, dado que não havendo nesses processos, por natureza, vencido, é o requerente que recorreu aos processos em causa quem retira proveito dos mesmos e do plano neles aprovado pela maioria dos seus credores e homologado por sentença judicial transitada e julgado (arts. 17º-F, n.º 12 e 222º-F, n.º 9, do CIRE).
2- A remuneração do administrador judicial provisório e as despesas que suportou no exercício dessas funções no âmbito do PER ou do PEAP consubstanciam “encargos” dos processos em causa e integram, por isso, a condenação em custas, impendendo a responsabilidade pelo seu pagamento sobre o devedor.
3- Apenas quando o devedor beneficiar de proteção jurídica na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos do processo, existe fundamento legal para que o IGFEJ, I.P., adiante, no âmbito do PER ou do PEAP, a quantia necessária ao pagamento da remuneração devida ao administrador judicial provisório e as despesas que suportou no exercício dessas funções (arts. 17º-C, n.º 6 e 222º-C, n.º 6, do CIRE).
4- O art. 32º, n.º 3 do CIRE é apenas aplicável à remuneração devida ao administrador da insolvência e às despesas que suportou no exercício dessas funções no âmbito do processo de insolvência e carece de ser interpretado no sentido de que, ocorrendo encerramento do processo de insolvência por insuficiência de massa insolvente (arts. 39º e 322º do CIRE), o IGFEJ, I.P. tem de suportar a remuneração e as despesas devidas ao administrador da insolvência.
5- No caso de PER em que tenha sido homologado plano de recuperação, por sentença transitada em julgado, que condenou o devedor (requerente do PER e beneficiário do plano nele aprovado e homologado) nas custas do processo, vindo, posteriormente, a essa homologação o devedor a ser declarado insolvente, esse processo de insolvência mostra-se totalmente autónomo em relação ao PER, não sendo desenvolvimento ou consequência deste, pelo que não existe fundamento legal para que o IGFEJ, I.P. adiante a quantia necessária ao pagamento da retribuição e as despesas arbitradas no âmbito do PER ao administrador judicial provisório, ainda que o processo de insolvência venha a ser encerrado por insuficiência de massa insolvente, sem que o referido entendimento comporte qualquer violação aos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.
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V- Decisão

Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a presente apelação improcedente e, em consequência, confirmam o despacho recorrido.
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Custas da apelação pelo apelante (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 15 de fevereiro de 2024

José Alberto Moreira Dias – Relator
Gonçalo Oliveira Magalhães – 1º Adjunto
José Carlos Pereira Duarte – 2º Adjunto             



[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
[2] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, pág. 603.
[3] Salvador da Costa, “Regulamento das Custas Processuais”, 2012, 4ª ed., Almedina, pág. 73.
[4] Salvador da Costa, ob. cit., pág. 163.
[5] Salvador da Costa, em comentário ao Ac. R.L., de 23/10/2018, no sítio https://blogippc.blogspot.com/2009/01 (14/09/2023)
[6] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2ª, 3ª ed., Almedina, pág. 419.
[7] Ac. R.G., de 16/03/2023, Proc. 2553/21.0T8GMR.G3, in base de dados da DGSI, onde constam todos os acórdãos que se venham a citar, sem menção em contrário.
[8] Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, 11ª ed., Almedina, pág. 265; Maria do Rosário Epifânio, ob. cit., pág. 491, em que expende que “(…) diferentemente do PER (art. 17º-A, n.º 1), a lei não exige (pelo menos expressamente) a sua recuperabilidade – aliás, em nenhum preceito do PEAP se faz essa referência”; Catarina Serra, ob. cit., págs. 584 e 585: “Tal como o PER (antigo e atual), o PEAP é um processo pré-insolvencial, logo pressupõe a pré-insolvência (insolvência iminente ou situação económica difícil). Todavia, enquanto no PER (antigo e atual) se exige que a empresa seja recuperável, no PEAP não. A dispensa deste segundo pressuposto no PEAP compreende-se à luz do facto de que os destinatários do PEAP não são empresas e entendida a recuperabilidade em sentido estrito (como suscetibilidade de sobrevivência). Quando muito, sabendo que são destinatários do PEAP certas pessoas jurídicas, poderia discutir-se se a dispensa da recuperabilidade se justifica em todos os casos”.
[9] Ac. R.L., de 28/02/2023, Proc. 3767/22.1T8FNC-C.L1.
[10] Acs. R.P., de 30/06/2022, Proc. 2374/21.0T8STS.P1; RL., de 09/02/2017, Proc. 1118/13.5TYLSB.L1-6; R.C. de 09/11/2022, Proc. 3192/22.4T8CBR-A.C1, expendendo-se neste que: “Apesar de ao administrador judicial provisório nomeado em sede de PER ou de PEAP ser aplicável o regime jurídico dos arts. 32º a 34º, com as devidas adaptações (arts. 17º-C, n.º 4 e 222º-C, n.º 4), não é aplicável aos referidos processos a parte final do n.º 3, do art. 32º do CIRE, na parte em que se estabelece que a remuneração devida ao administrador judicial provisório, em sede de processo de insolvência, juntamente com as despesas e que ele incorra no exercício das suas funções, configuram encargos compreendidos nas custas do processo, que é suportado pelo Cofre Geral dos Tribunais, na medida em que sendo as custas da responsabilidade da massa, não puder ser satisfeito pelas forças desta. A garantia que a remuneração do administrador da insolvência é suportado pelo organismo responsável pela gestão financeira e patrimonial do Ministério da Justiça, é apenas aplicável nas situações previstas nos arts. 39º e 232ºdo CIRE, isto é, quando o processo de insolvência tenha sido encerrado por insuficiência de massa insolvente. (…). No PER ou no PEAP não existe norma que permita ao tribunal ordenar que a quantia arbitrada ao administrador judicial, a título de honorários e despesas, seja paga pelo IGFEJ. As custas do PER e do PEAP são sempre a cargo do devedor ou da massa insolvente, nos casos em que seja declarada a insolvência. PER e PEAP são processos bem distintos do processo de insolvência, uma vez que têm pressupostos e finalidades diferentes, pelo que as funções de administrador judicial provisório e de administrador da insolvência não se confundem”.
[11] Jorge Miranda e Rui Medeiros, “Constituição Portuguesa Anotada”, tomo I, 2ª ed, Wolters Kluwer e Coimbra Editora, págs. 222 e 223.