Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1029/20.8T8GMR.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: AGRAVAMENTO DE INCAPACIDADE
FACTOR DE BONIFICAÇÃO DE 1.5
FUNDAMENTAÇÃO DO LAUDO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/01/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
. I – Quando existe agravamento da incapacidade e se coloca a questão da aplicação do fator 1.5, este é aplicável à soma da incapacidade inicial atribuída com o agravamento resultante da decisão proferida no processo atual.
II - Não padece de deficiência ou de falta de fundamentação o laudo de junta médica no qual os Srs. Peritos Médicos, por maioria, explicaram de forma clara e concisa as razões pelas quais atribuíram a IPP ao sinistrado, indo de encontro à avaliação realizada em sede de exame singular (onde apenas divergiram no grau de IPP a atribuir), isto, depois de terem tido oportunidade de coletivamente observarem sinistrado em sede de junta, de terem analisado os elementos clínicos juntos aos autos e de terem discutido a avaliação do sinistrado, o que os levou a divergir em conformidade com as respostas aos quesitos formulados pela Seguradora.
III - Os Srs. Peritos Médicos não têm de justificar das razões pelas quais entendem não valorizar determinada sequela que consideram ser inexistente e que até à data não havia sido evidenciada por qualquer um dos Peritos Médicos que havia examinado o sinistrado. IV - Estando a decisão recorrida suficientemente sustentada na perícia médica colegial, permitindo assim que o julgador se pronuncie com rigor quanto à avaliação da incapacidade resultante do acidente, não existe qualquer erro de julgamento que imponha a sua anulação.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

Na fase conciliatória dos presentes autos com processo especial emergentes de acidente de trabalho, em que é sinistrado AA e responsável COMPANHIA DE SEGUROS EMP01..., não obteve êxito a tentativa de conciliação que teve lugar no dia 26/09/2022.
Por esse facto veio a seguradora responsável requerer a realização de junta médica, nos termos do artigo 138.º n.º 2 do C.P.T., tendo apresentado os respectivos quesitos.
Designada tal diligência, nela vieram os peritos nomeados responder aos quesitos nos termos consignados no auto de junta médica, emitindo parecer por maioria, do qual resulta que o sinistrado é portador de uma IPP de 6% desde a data da alta (29/07/2021), tendo estado na situação de ITA de 1.03.2019 a 29.07.2021. O Perito do sinistrado defendeu outro entendimento dele resultando a atribuição ao sinistrado da IPP 21 %, que resulta do acréscimo ao coeficiente de desvalorização do laudo maioritário radiculopatias - TNI: Cap. VII, (0,10-0,20) atribuindo 0,10 (10,00%), o resultado seria de 0,04+0,10=0,14x1.5=0,21 =21%. Fundamenta a sua posição no facto do sinistrado ter além da rigidez L4-Sl de fixação cirúrgica, radiculopatia das raízes L5 e S1 esquerdas conforme eletromiografias realizadas a 15-04-2021 e 05-01-2023, ambas juntas aos autos.
O sinistrado apresentou reclamação ao laudo requerendo que os Srs. Peritos Médicos que subscreveram o laudo maioritário sejam notificados “para esclarecer as dúvidas suscitadas e fundamentar devidamente a sua avaliação/ respostas”, o que deve ser feito “em sede de junta, na presença do sinistrado”, sob pena de “ser declarado nulo o Auto de Exame por junta médica, por falta ou insuficiência de fundamentação”.
O Tribunal a quo indeferiu o pedido de esclarecimentos apresentado pelo sinistrado e seguidamente proferiu sentença, a qual terminou com o seguinte dispositivo:
“Nestes termos, e pelo exposto, condeno a seguradora Companhia de Seguros EMP01..., S.A., no pagamento ao autor AA, sem prejuízo dos juros que se mostrem devidos (art.º 135.º do Código de Processo do Trabalho), das quantias de:
- €36.00 a título de transportes ao tribunal;
- € 40,60 de diferenças de indemnização pelos períodos de IT´s e
- o capital de remição correspondente à pensão anual, devida em 23.03.2023, no montante de €414,99.
*
Custas pela seguradora.
Valor da ação – €5.163,96 (art.º 120.º do Código de Processo do Trabalho).
Registe e notifique.
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Uma vez que o sinistrado deverá receber um capital de remição, proceda ao cálculo do capital– arts. 148.º, n.os 3 e 4 e 149.º do Código de Processo do Trabalho.”
*
Inconformado veio o sinistrado interpor recurso de apelação, no qual formulou as seguintes conclusões que passamos a transcrever:
CONCLUSÕES:

1. O recorrente não concorda com a forma de cálculo da IPP de que ficou afetado, face à forma como foi aplicado o fator de bonificação 1,5, por parte dos Exmos. Senhores Peritos e Mme. Juiz.
2. O sinistrado tem já mais de 50 anos de idade, e verificou-se um agravamento de sequela já valorada em anterior acidente de trabalho sofrido.
3. Os Exmos. Senhores Peritos e Mª Juíza primeiro descontaram a incapacidade anterior (da qual o sinistrado já padecia) e depois, ao valor restante é que aplicaram o fator 1.5, ou seja, 10% - 6% = 4% x 1,5 = 6%.
4. E com base nesta IPP fixou os valores a pagar a cargo da entidade responsável.
5. Considera, pelo contrário, o recorrente que deveria ter-se procedido à aplicação do fato 1,5 à totalidade da incapacidade atribuída, e depois é que se subtrai a incapacidade anterior, ou seja, 10% x 1,5 = 14% - 6% = 9%, fixando-se os efeitos da nova IPP a partir de 29/07/2021 (data da alta)
6. Entendemos, na senda do que tem vindo a ser entendido nos incidentes de revisão da incapacidade, quando existe agravamento da incapacidade o fator 1,5 é aplicável à soma da incapacidade inicial atribuída com o agravamento resultante da decisão proferida no processo atual.
7. Nos termos do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 1/02/2016 que acompanhamos “se a «pensão revista» deve ser calculada do mesmo modo que a pensão inicial, então a alteração da mesma deve ser feita como se a «nova pensão» estivesse a ser fixada desde o início (…) mas agora com mais um elemento: o factor 1.5”.
8. “E tal entendimento não ofende o caso julgado formado pelo despacho homologatório/sentença relativamente à fixação da pensão inicial, na medida em que esta incapacidade (…) [a que acresce o factor 1.5] e esta «nova» pensão – decorrente do incidente de revisão – só produzem efeitos desde a data do pedido de revisão”.
9. Assim, em nossa opinião, o cálculo efetuado na douta sentença para aplicação do fator de bonificação padece de vício.
10. Termos em que deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que, julgando o recurso procedente altere a forma de cálculo da IPP por aplicação do fator 1,5, aplicando-se este coeficiente à totalidade da IPP que afeta atualmente o sinistrado, condenando a entidade responsável a pagar a pensão anual correspondente.
11. A pensão anual devida deve ser arbitrada a partir do dia seguinte ao da alta, e como tal a partir do dia 30.07.2021.
12. Motivo por que deve, também nesta parte, a decisão ser revogada, sendo a seguradora condenada a pagar o capital de remição correspondente à pensão anual, devida a partir de 30.07.2021.
Sem prescindir,
13. O relatório de Junta Médica está insuficientemente fundamentado.
14. Os senhores peritos do tribunal e da seguradora pura e simplesmente não fundamentaram a sua decisão, principalmente a questão da discordância relativamente ao perito do sinistrado, relativamente à não existência de radiculopatia das raízes L5-S1 esquerdas, mesmo as mesmas constando de eletromiografias, realizadas em 15.04.2021 e 5.01.2023, e juntas aos autos, conforme se pode verificar pela análise das respostas dadas aos quesitos constantes do auto de junta médica, em especial quesito 3 e 4.
15. Nos termos do nº 8 das Instruções Gerais da TNI, os peritos devem fundamentar as suas conclusões de forma a permitir ao julgador a análise e ponderação, com segurança, do grau de incapacidade a atribuir.
16. Por outro lado, verificando-se, como se verifica, uma divergência entre os peritos sobre a questão das sequelas que afetam o sinistrado e análise critica dos registos clínicos constantes dos autos (eletromiografias, realizadas em 15.04.2021 e 5.01.2023) era indispensável que do Relatório constassem as razões invocadas por cada um deles para dar resposta num e noutro sentido, de forma a que, o Tribunal (este e algum outro que se venha a pronunciar sobre tal matéria), pudessem avaliar a bondade dos fundamentos de cada uma dessas posições.
17. A falta de fundamentação do relatório pericial constitui nulidade processual nos termos do art. 201º do CPC.
18. Não se pronunciando o tribunal sobre estes aspectos e omitindo tais factos na sentença, tal, porque influi na decisão da causa, constitui nulidade processual nos termos do referido art. 201º do CPC.
19. A sentença não apreciou convenientemente todas as questões que lhe foram colocadas, designadamente sobre a eventual existência de sequela a nível da diminuição da acuidade auditiva e reflexão dessa sequela na IPP atribuída, devido à falta de fundamentação do laudo de junta médica.
20. A falta de fundamentação do laudo pericial influi na decisão da causa, desde logo porque fornece ao tribunal uma informação cuja coerência ou acerto não é possível sindicar.
21. Afectando ainda, por inerência, a inteligibilidade e compreensão da sentença proferida com base nesse relatório no que toca à fixação da incapacidade, já que na mesma remete o Sr. Juiz para os fundamentos constantes do laudo pericial.
22. O que impede, nomeadamente, um Tribunal Superior, em sede de recurso, se pronuncie quanto ao acerto dessa sentença, na medida em que dela não consta os correspondentes fundamentos.
23. Com efeito, devido à falta de fundamentação do relatório médico, não tinha o Tribunal os meios de prova suficientes que suportassem a decisão proferida, pelo que se verifica erro de julgamento – art. 712º, nº 4, do CPC.
Nestes termos e nos de direito aplicável, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente:
- que deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que, julgando o recurso procedente altere a forma de cálculo da IPP por aplicação do fator 1,5, aplicando- se este coeficiente à totalidade da IPP que afeta atualmente o sinistrado, condenando a entidade responsável a pagar a pensão anual correspondente, a partir do dia seguinte ao da alta, e como tal a partir do dia 30.07.2021.
Sem pescindir,
- deve ser declarado nulo o Auto de Exame por Junta Médica, por falta ou insuficiência de fundamentação;
- deve ser anulada a sentença recorrida, e ordenado ao tribunal de 1ª instância que leve acabo as diligências que considere serem pertinentes, e repetição da junta médica para suprimento das mencionadas irregularidades, com resposta total e fundamentada do laudo que emitam quanto à questão da IPP – quesito 3 e 4, em especial a sua valoração;
- se determine o pedido de esclarecimentos ao Srs. Peritos que integraram essa junta, também com essa finalidade; tudo nos termos e ao abrigo do disposto no art. 712º, nº 4, do CPC; assim se fazendo J U S T I Ç A!”
A Ré Seguradora não apresentou contra-alegação.
O recurso foi admitido como apelação a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito devolutivo.
A Sr.ª Procuradora Geral-Adjunta emitiu parecer nos termos do art.º 87.º n.º 3, do CPT, pronunciando-se no sentido da procedência parcial do recurso,
Cumpridos os vistos, cumpre apreciar.
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II OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões do Recorrente (artigos 608º n.º 2, 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil), as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes:
- Do Cálculo da IPP por Aplicação do Fator 1,5
- Da Data de Início da Pensão 30.07.2021 e não 23.03.2023
 - Nulidade processual, por falta de fundamentação do auto de junta médica;
- Erro de julgamento, por insuficiência dos meios de prova em que se fundamentou a decisão.
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III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos relevantes para a decisão da causa são os seguintes:
1) AA, no dia 28-03-2019, pelas 10:30 horas, em ..., ..., quando prestava a atividade profissional de trolha de 1ª na indústria de construção civil, sob as ordens, direção e fiscalização da entidade empregadora EMP02..., Lda., com sede na Rua ..., ..., ... ...,
2) (…) sentiu uma dor súbita lombar quando pousava uma tabua no chão, do que lhe resultou lombalgia.
3) Na data do sinistro auferia a remuneração anual de anual ilíquida de € 9.880,71.
4) A responsabilidade infortunística encontra-se integralmente transferida para a seguradora demandada;
5) A seguradora reconheceu o acidente como acidente de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, o salário auferido pelo sinistrado e a sua responsabilidade pela reparação dos danos.
6) O sinistrado gastou a quantia de €20,00 em transportes ao tribunal.
7) O sinistrado nasceu em .../.../1965.
8) O sinistrado esteve na situação de ITA de 01.03.2019 a 29.07.2021
9) O sinistrado está clinicamente curado, mas é portador de sequelas que lhe determinam uma incapacidade permanente parcial (IPP) de (IPP) de 0,06 =6,00% =0,04 X1,5 =0,06 =6,00% desde o dia seguinte ao da consolidação das lesões, ocorrida em 29.07.2021.
10) – Em sede de exame por junta médica responderam os Srs. Peritos Médicos por maioria aos seguintes quesitos e da seguinte forma:
Quesitos apresentados pela seguradora:
1. Quais as lesões que o sinistrado sofreu em consequência do acidente?
2. Quais as sequelas das lesões sofridas no acidente de que o sinistrado é portador?
 1 e 2 R: Do acidente dos autos de 28.03.2019 resultou um agravamento do quadro sequelar pré existente, consecutivo acidente de trabalho prévio ocorrido em 4.01.2012, já anteriormente desvalorizado, tendo-se verificado agravamento das sequelas lombares ao nível de L5-S1 e tendo no âmbito do acidente dos autos sido submetido a artrodese cirúrgica L4-S1
3. Qual o seu enquadramento na T.N.I.?
4. Qual a natureza e grau de desvalorização que lhes corresponde?
3 e 4 R:Ver quadro anexo.
Nota: Atendendo à desvalorização prévia de 6% por raquialgia residual após lesão ao nível L5-S1 resultante de acidente de trabalho ocorrido em 2012 (Proc. 1261/12....), e ao agravamento dessas sequelas raquidianas decorrente do acidente de trabalho em estudo considera-se que a IPP decorrente do acidente de trabalho actual é “correspondente à diferença entre a incapacidade anterior e a que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente”
5. Quais os períodos de incapacidades temporárias atribuídos?
R: Os propostos pela seguradora, atendendo a que o período de 07.07.2020 a 28.02.2021 sinistrado esteve com baixa por doença natural

IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO
- Do Cálculo da IPP por Aplicação do Fator 1.5

Insurge-se o Recorrente quanto ao facto de o Tribunal a quo não ter procedido à aplicação do factor 1.5 à totalidade da incapacidade atribuída, pois só depois é que se subtrai a incapacidade anterior, ou seja, 10% x 1.5 = 14% - 6% = 9%, fixando-se os efeitos da nova IPP a partir de 29/07/2021 (data da alta), tudo isto tendo presente que a incapacidade que atualmente o sinistrado é portador resultante do acidente dos autos, se traduz no agravamento das sequelas raquidianas decorrente de um outro acidente, o que corresponde “à diferença entre a incapacidade anterior e a que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente”
Desde já diremos que assiste inteira razão ao Recorrente
Na senda do que temos vindo a defender em sede de incidente revisão de incapacidade, quando existe agravamento da incapacidade e se coloca a questão da aplicação do fator 1.5, este é aplicável à soma da incapacidade inicial atribuída com o agravamento resultante da decisão proferida no processo atual.
Neste sentido, tem vindo a decidir este Tribunal da Relação de Guimarães designadamente entre outros, no Acórdãos de 26.06.2017, proc. n.º 59/10.2TTMTS.4G1; de 6.12.2018, proc. n.º 404/14.1T8VRL.G1.; de 6/02/2020, proc. n.º 558/06.0TTBRG.G3 e no Ac. 15.06.2021, proc. n.º 141/11.9TTVNF.4.G1, consultáveis em www.dgsi.pt
Neste último a este propósito consignou-se o seguinte:
“(…)tendo o sinistrado requerido o exame de revisão depois de ter completado 50 anos de idade e verificando-se um agravamento das sequelas de que é portador, sem que anteriormente tivesse beneficiado do factor de bonificação a que alude o n.º 5 das instruções gerais da TNI, urge proceder à sua aplicação, em respeito pelas regras definidas na tabela nacional de incapacidades, em conformidade com o prescrito no n.º 3 do art.º 21.º da NLAT.
(…)
As sequelas resultantes do agravamento, constatado em sede de exame médico, de que o sinistrado ficou portador em resultado do acidente, cuja avaliação não foi questionada correspondem a um coeficiente 0,1012, que deverá ser multiplicado por 1.5 segundo a fórmula IG + (IG x 0,5) (factor de bonificação).
Assim sendo, a incapacidade do sinistrado devia ter sido fixada em 15,18 = (10,12 + (10,12 x 0,5) e a pensão anual e obrigatoriamente remível em €977,95 assim calculada: €9.203,46 x 70% x 15,18%.
Contudo, o sinistrado já recebeu o capital de remição correspondente à desvalorização de 0,0644 (6,44%), pelo que apenas lhe é devida a diferença entre a pensão já remida e a pensão correspondente à sua actual incapacidade, o que se traduz na pensão anual e obrigatoriamente remível de €563,05, sendo da responsabilidade da Seguradora (92,17%): €518,96 e da responsabilidade do empregador (7,83%): €44,09”
Vejamos melhor a questão da aplicabilidade da bonificação ao caso dos autos, uma vez que o apelante discorda da sentença na parte em que aplicou o factor 1.5 à IPP de 4% (agravamento), defendendo que o factor de bonificação deve incidir a IPP de 10%, que é a IPP de que ficou portador.

Estabelece o art.º 11.º da NLAT (Lei n.º 98/2009, de 4.09) com a epígrafe “Predisposição patológica e incapacidade” o seguinte:
1 – A predisposição patológica do sinistrado num acidente não exclui o direito à reparação integral, salvo quando tiver sido ocultada.
2 – Quando a lesão ou doença consecutivas ao acidente for agravada por lesão ou doença anterior, ou quando esta for agravada pelo acidente, a incapacidade avaliar-se-á como se tido dele resultasse, a não ser que pela lesão ou doença anterior o sinistrado já esteja a receber pensão ou tenha recebido um capital de remição nos termos da presente lei.
3 – No caso de o sinistrado estar afetado por incapacidade permanente anterior ao acidente, a reparação é apenas a correspondente à diferença entre a incapacidade anterior e a que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente.
(…)”
E prescreve a instrução 5ª da Tabela Nacional de Incapacidade, aprovada pelo DL n.º 325/2007 de 23.10 (TNI) que:
5 — Na determinação do valor da incapacidade a atribuir devem ser observadas as seguintes normas, para além e sem prejuízo das que são específicas de cada capítulo ou número:
a) Os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados, até ao limite da unidade, com uma multiplicação pelo fator 1.5, segundo a fórmula: IG + (IG × 0.5), se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais quando não tiver beneficiado da aplicação desse fator;
(…)”

A «bonificação» prevista no n.º 5 das Instruções gerais da TNI aplica-se, por regra, quando à data da alta o sinistrado tem 50 anos ou mais. O legislador «ficcionou» que a partir daquela idade as lesões tendem a agravar-se com a consequente maior limitação da capacidade de trabalho do sinistrado/trabalhador.
No caso em apreço o sinistrado já era portador de uma IPP de 6% por raquialgia residual, resultante de acidente de trabalho ocorrido em 2012, no âmbito do qual não beneficiou da aplicação do factor de bonificação, desde logo por ter na altura idade inferior a 50 anos, sendo certo que do acidente dos autos resultou o agravamento dessa sequela raquidiana de que já era portador. Daí que a incapacidade permanente de que é portador tem de ser calculada, nos termos previstos no transcrito artigo 11.º da NLAT, ou seja, “como se tudo fosse imputado ao acidente
Ora, o acidente que os autos se reportam ocorreu em 28.03.2019, altura em que o sinistrado tinha mais de 50 anos, sem que até à data tivesse beneficiado do factor de bonificação, sendo certo que o valor da IPP apurado foi tratado como um agravamento de sequelas de que padecia de um anterior acidente. Trata-se de uma situação equiparada ao agravamento resultante da revisão da incapacidade com a nuance que no caso o sinistrado sofreu um novo acidente.
Na verdade, a IPP atribuída agora ao sinistrado é calculada como se tudo fosse imputado ao acidente dos autos, razão pela qual não vislumbramos qualquer razão para não fazer incidir sobre o valor encontrado a atribuição do factor 1.5 e só posteriormente descontar a incapacidade referente ao 1.º acidente, relativamente ao qual já recebeu o capital de remição.
Tal como as situações de revisão da incapacidade não geram uma nova pensão, mas uma alteração do montante da pensão já fixada, pelo que “no cálculo de uma pensão consequente de alteração de incapacidade deve usar-se a mesma fórmula que se usou para o cálculo da pensão inicial”. No caso dos autos, ainda que pela via de um novo acidente, acaba também por ocorrer um agravamento da incapacidade do sinistrado: antes tinha uma IPP de 6% e agora tem uma IPP de 10%, mas também tem mais de 50 anos na data em que ocorre o novo acidente.
É verdade que a Lei do Acidentes de Trabalho não nos diz como se deve proceder quando o sinistrado, depois de já ter sido fixada uma pensão por força da atribuição de uma IPP, atinge os 50 anos, por isso consideramos que na falta de outros elementos, e em homenagem ao princípio da unidade do sistema jurídico, a «pensão agravada» seja ou não revista deve ser calculada do mesmo modo que a pensão inicial, e por isso a alteração da mesma deve ser feita como se a «nova pensão» estivesse a ser fixada desde o início, não obstante só ser devida desde a data do pedido da alta referente ao acidente mais recente.
Por outras palavras: a IPP de 10% atribuída ao sinistrado em função do novo acidente é a que tem de ser considerada para o cálculo da pensão como se esta estivesse a ser fixada inicialmente, nela fazendo incidir a aplicação do factor 1.5. E nem se diga que tal entendimento ofende o caso julgado formado pelo despacho homologatório/sentença relativamente à fixação da pensão inicial, na medida em que esta incapacidade de 10%, a que deve acrescer o factor 1.5 é uma outra pensão – decorrente do acidente mais recente – e só produz efeitos desde a data alta do acidente mais recente. Neste sentido se pronunciou este sentido o Tribunal da Relação do Porto no Acórdão de 1/02/2016, proc.º n.º 75/08.1TTPNF.P1no qual se sumariou o seguinte:
“3.A revisão da incapacidade não gera uma nova pensão mas uma alteração do montante da pensão já fixada.
4. Tendo o sinistrado, na data do pedido de revisão da incapacidade, 50 anos de idade ou mais, e tendo ocorrido modificação da sua capacidade de ganho proveniente de agravamento das lesões que deram origem à reparação, deve à IPP global atribuída, decorrente desse agravamento, aplicar-se o factor 1.5.
4. Tal não constitui ofensa do caso julgado formado quanto à pensão fixada inicialmente na medida em que a «nova pensão» só é devida a partir do pedido de revisão, e nesta data o sinistrado já tinha mais de 50 anos.”
De tudo isto resulta que o cálculo efectuado pelo Tribunal a quo por aplicação do factor de bonificação terá de ser corrigido.
Procedendo aos cálculos e tendo por certo que o sinistrado é portador de sequelas que lhe determinam uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 0,10 (0,04+0,06 =10,00% (0,10 X1.5= 0,15 - 0,06 =0,90 =9%, desde o dia seguinte ao da consolidação das lesões, ocorrida em 29.07.2021 e que corresponde à pensão obrigatoriamente remível no valor de €622,48, assim calculada €9.880,71 x 0,7 x 9%IPP.
Nesta parte procede a apelação

2. Da Data de Início da Pensão
Insurge-se o Recorrente quanto à data do início da pensão, defendendo que a mesma é devida desde da data da alta.
Sem necessidade de grandes considerações teremos de dizer que lhe assiste inteira razão.
De acordo com o prescrito no n.º 2 do art.º 50.º da NLAT a pensão por incapacidade permanente é fixada em montante anual alta, e começa a vencer-se no dia seguinte ao da alta do sinistrado.
Tendo sido dado como assente que a data da consolidação das lesões ocorreu em 29.07.2021, só por lapso no dispositivo que se fez constar uma outra data que não o dia 30.07.221, como sendo o dia a partir do qual é devida a pensão.
Em face do exposto e deferindo a pretensão do recorrente consignamos que a pensão é devida ao sinistrado desde 30.07.2021 e não 23.03.2023.

3. Da nulidade processual por falta de fundamentação do auto de junta médica
Invoca o Recorrente que o laudo de junta médica não está devidamente fundamentado em conformidade com o que determina o n.º 8 das Instruções Gerais da TNI, designadamente porque os Peritos do Tribunal e da Seguradora não fundamentaram a sua discordância relativamente ao Perito do sinistrado.
Conclui o Recorrente que a falta de fundamentação do laudo pericial consubstancia nulidade processual que invoca nos termos previstos no art.º 201.º do CPC, o que determina a repetição de tal exame ou pelo menos a elaboração de novo auto do qual conste a fundamentação das conclusões dos peritos, com a consequente anulação de tudo o que após o mesmo foi processado.

Vejamos:
Como é consabido as nulidades podem ser processuais e da sentença, traduzindo-se as primeiras em desvios ao formalismo processual estabelecido na lei (pratica de acto proibido, omissão de um acto prescrito na lei e realização de acto imposto ou permitido por lei, sem o formalismo requerido) e as segundas derivam de actos ou omissões violadoras de lei processual praticados pelo juiz na sentença, a elas se reportando o art.º 615.º n.º 1 do CPC. De ambas se distingue ainda o erro de julgamento que consiste numa errada apreciação da prova e consequentemente da decisão sobre a matéria de facto (erro da decisão de facto) ou numa errada subsunção dos factos à norma jurídica ou à sua errada interpretação.
No que respeita às nulidades processuais e porque constituem uma anomalia no processo devem ser conhecidas no Tribunal onde foram praticadas e, não se tratando de nulidades de conhecimento oficioso (quais sejam as previstas no art.º 196º do CPC), devem ser arguidas pela parte, no próprio acto se nele esteve presente, ou, caso contrário, no prazo de 10 dias a contar de algum acto praticado no processo ou da notificação para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência (cfr. art.º 199.º n.º 1 do CPC). Não concordando com o despacho que a conhecer, sempre dele se poderá recorrer.
No caso em apreço, a eventual violação do dever de fundamentação do laudo de junta médica, por falta de observação das instruções gerais da TNI aprovada pelo DL n.º 352/2007, de 23/10, (designadamente os ns.º 8 e 13 de tais instruções, dos quais resulta que os peritos médicos devem fundamentar todas as suas conclusões, bem como os elementos que devem constar do processo quando esteja em causa a atribuição de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual), na medida em que possa influir no exame e decisão da causa, poderá constituir nulidade processual a arguir perante a 1ª instância, onde foi cometida - cfr. art.º 195.º, n.º 1 do CPC.
Como resulta dos autos o sinistrado arguiu em sede de reclamação do resultado da junta médica a falta de fundamentação do laudo pericial, tendo o Tribunal a quo indeferido tal reclamação, com os seguintes fundamentos:
 “(…) não vemos justificação para o seu deferimento. Com efeito, o singulariza a prova pericial é o seu objeto, a perceção ou averiguação de factos que reclamem conhecimentos especiais que o julgador comprovadamente não domina (artº 388 do Código Civil), assistindo as partes a faculdade de reclamar, se entenderem que há nele qualquer deficiência, obscuridade ou contradição ou que as conclusões não se mostrarem devidamente fundamentadas (artº 485 nºs 1 e 2 do CPC). No caso em apreço, as respostas dadas pelos Exmos. peritos não padecem de qualquer deficiência, que importe e deva ser corrigida, verificando-se apenas a divergência apontada, a qual só por si não justifica o pedido de esclarecimentos em apreço.
Com estes fundamentos, indefere-se o pedido de esclarecimentos apresentado pelo sinistrado.”
A perícia por junta médica, constitui uma modalidade de prova pericial, que está sujeita à regra da livre apreciação pelo juiz (art. 389.º do Código Civil e arts. 489.º e 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil), não estando o mesmo, por isso, adstrito às asserções e conclusões dessa perícia médica. Porém, para que o juiz possa fundamentar circunstanciadamente a sua decisão, como se lhe exige, é indispensável que a prova pericial se apresente também ela devidamente fundamentada.
Estabelece o n.º 8 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades, anexa ao DL n.º 352/2007, de 23 de Outubro, que o resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões.
Daqui resulta que a atribuição da incapacidade pelos peritos deve encontrar justificação na fundamentação que consta do laudo, podendo tal justificação resultar das respostas dadas aos quesitos formulados pelas partes. Tal obrigação de fundamentação assume particular relevo, no enquadramento das lesões, na concretização do grau de incapacidade e na aplicação ou não de fatores de bonificação ou correção.
Do laudo devem resultar os elementos essenciais ao método tendente à aquisição da conclusão a que os peritos chegaram. Aos peritos impõem-se que exponham o seu próprio itinerário cognitivo, de forma compreensível para um não técnico.
No caso, o laudo consta em ficha que respeita as componentes previstas no modelo, sendo certo que os Srs. Peritos responderam de forma clara e concisa a todos os quesitos formulados e justificaram a razão do resultado. É certo que os Peritos com opinião maioritária não rebateram nem justificaram o seu desacordo relativamente à posição assumida pelo Perito do sinistrado, mas tal não configura a falta de fundamentação do auto pericial. Aos peritos incumbe responderam aos quesitos formulados pelas partes e proceder à avaliação do sinistrado, não estando vinculados e muito menos obrigados a rebater a posição assumida pela opinião minoritária, como parece pretender o recorrente.
Importa ainda referir que o exame por junta médica, no processo de acidente de trabalho tem uma enorme relevância, pois a sua realização é imposta por lei e destina-se precisamente a ultrapassar as discordâncias de qualquer uma das partes relativamente ao exame singular de forma a proporcionar uma maioria técnica e cientifica mais consolidada tal como resulta inequívoco dos artigos 105.º, 106.º 139.º e 145.º do CPT.
No caso em apreço, em sede de exame por junta médica os Srs. Peritos Médicos por maioria explicaram de forma clara e concisa as razões pelas quais atribuíram a IPP ao sinistrado, indo de encontro à avaliação realizada em sede de exame singular (onde apenas divergiram no grau de IPP a atribuir), isto, depois de terem tido oportunidade de coletivamente observarem sinistrado em sede de junta, de terem analisado os elementos clínicos juntos aos autos e de terem discutido a avaliação do sinistrado, o que os levou a divergir em conformidade com as respostas aos quesitos formulados pela Seguradora.
Os Srs. Peritos Médicos não têm de justificar das razões pelas quais entendem não valorizar determinada sequela que consideram ser inexistente e que até à data não havia sido evidenciada por qualquer um dos Peritos Médicos que havia examinado o sinistrado.
Acresce ainda dizer que a posição assumida pelo Perito do sinistrado se mostra isolada relativamente a todos os outros Peritos que avaliaram o sinistrado.
Ora, não estamos perante uma situação de falta ou de deficiente fundamentação do laudo pericial, mas sim estamos perante um inconformismo do sinistrado em não aceitar o laudo maioritário.
Em suma, o auto de junta médica não padece de qualquer vício, uma vez que se mostra de suficientemente fundamentado.

4.- Erro de julgamento, por insuficiência dos meios de prova em que se fundamentou a decisão.
Insurge-se o Recorrente quanto ao facto do tribunal se ter socorrido de meios de prova insuficientes para suportar a decisão da matéria de facto, já que por falta de fundamentação o auto de junta médica não deveria ter sido valorizado, devendo por isso proceder-se a anulação da sentença.
Vejamos!
Dispõe o artigo art.º 662º do Código de Processo Civil e aqui aplicável por força do n.º 1 do art.º 87º do Código de Processo do Trabalho, o seguinte:
“1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
(…)”
O que está em causa é o auto de exame por junta médica, que como é consabido, não é vinculativo, devendo por isso ser apreciado como qualquer outro meio de prova.
Contudo, estando em causa um juízo técnico-jurídico, para dele divergir o julgador tem de fundamentar essa divergência, impondo-se uma especial exigência da fundamentação, assente preferencialmente em opinião ou parecer científico ou técnico, de sinal contrário. Porém, para que o juiz possa fundamentar circunstanciadamente a sua decisão é indispensável que a prova pericial se apresente também devidamente fundamentada.
Assim, embora o tribunal aprecie livremente os elementos médicos constantes do processo, designadamente perícia singular, relatórios clínicos e exames complementares de diagnóstico, a par da própria observação do sinistrado, essa livre apreciação não é, todavia, sinónimo de arbitrariedade, razão pela qual aos peritos médicos que intervêm na junta médica impõem-se que indiquem os elementos em que basearam o seu juízo e que o fundamentem, para que o Tribunal, o sinistrado e a entidade responsável pela reparação do acidente o possam sindicar.
 Resumindo, as perícias médicas não constituem decisão sob o grau de incapacidade a fixar, mas são somente um elemento de prova, com exigências especiais de conhecimentos na matéria, por isso o laudo pericial tem de conter os factos que serviram de base à atribuição de determinada incapacidade de modo a que o tribunal possa interpretar e compreender o raciocínio lógico realizado pelos Srs. Peritos Médicos de forma a poder valorá-lo.
 Competindo à perícia médica (exame singular ou exame por junta médica), a apreciação e determinação das lesões/sequelas que o sinistrado apresenta, bem como proceder à fixação da incapacidade para o trabalho decorrente das mesmas, não existindo razões objectivas para se discordar do laudo médico ou para formular pedidos de esclarecimentos aos peritos médicos, ou solicitar a realização de exames e de outros pareceres complementares, caso estes tenham respondido com precisão a todos os quesitos de forma lógica sem deficiência, obscuridade ou contradição, não se verificará qualquer razão para que o julgador divirja do laudo, fixando incapacidade distinta ou não atribuindo incapacidade.
Por fim, salientamos que resulta do disposto no artigo 140.º do CPT. que a fixação da incapacidade para o trabalho decorre de decisão soberana do juiz, que evidentemente terá de ter em atenção a prova pericial produzida, que deverá ser apreciada livremente pelo julgador.
No entanto, atenta a natureza técnica e complexa associada a este tipo de perícia, na maioria dos casos a decisão proferida pelo juiz relativamente à fixação da incapacidade para o trabalho corresponde àquela que foi atribuída pelos peritos médicos que intervieram no processo em exame singular ou colegial e sendo este último presidido pelo juiz, permite-lhe indagar e esclarecer, aquando da realização do exame, todas as suas dúvidas resultantes da complexidade e tecnicidade que normalmente decorre de uma perícia médico-legal.
Reafirmamos que destinando-se esta prova a fornecer ao tribunal uma especial informação de facto tendo em conta os específicos conhecimentos técnicos ou científicos do perito que se não alcançam pelas regras gerais da experiência (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1976, 261 e segs. e Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, 322 e segs.), deve ser apreciada pelo juiz segundo a sua experiência, a sua prudência, o seu bom senso, com inteira liberdade, sem estar adstrito a quaisquer regras, medidas ou critérios legais, o que implica que o juiz possa na decisão de facto afastar-se do que resultou da perícia, mas apenas deverá discordar em casos devidamente fundamentados, nomeadamente baseados em outras opiniões científicas, ou em razões jurídico processuais que se afigurem ao legislador de relevantes.
Retornando ao caso dos autos desde já diremos que a deliberação dos senhores peritos em sede colegial foi tomada por maioria, após realização de exame ao sinistrado e análise dos elementos clínicos juntos aos autos, veio ainda que de forma maioritária, a corroborar a perícia médica singular efectuada pelo perito médico do GML na fase conciliatória do processo, aplicando o mesmo artigo da TNI apenas divergindo na concretização do grau a atribuir à sequela lombar de que o sinistrado atualmente padece.
Em jeito de repetição da posição acima assumida, diremos que o laudo de junta médica está elaborado em conformidade com o previsto no ponto 8 das instruções gerais a TNI, aprovada pelo DL 352/2007, de 23 de Outubro e não padece de falta ou de insuficiência de fundamentação pois indo de encontro à posição assumida em sede de exame singular, justifica de forma suficiente a atribuição da IPP de que o sinistrado ficou portador em consequência do acidente.
Em suma, a decisão recorrida está suficientemente sustentada na perícia médica colegial, permitindo ao julgador pronunciar-se com rigor quanto à avaliação da incapacidade resultante do acidente, não existindo qualquer erro de julgamento que imponha a sua anulação.
Improcede, assim, neste segmento a apelação.

V – DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e consequentemente, condena-se a Seguradora Companhia de Seguros EMP01..., S.A., no pagamento ao sinistrado AA da pensão anual e obrigatoriamente remível, no montante de €622,48, devida desde 30.07.2021, acrescida dos respetivos juros moratórios vencidos e vincendos até integral e efetivo pagamento,
Quanto ao mais confirma-se a sentença recorrida
Custas a cargo do Recorrente (sem prejuízo do benefício do apoio judiciário) na proporção de 2/3 e da Recorrida na proporção de 1/3.
Notifique.
1 de Fevereiro de 2024

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Antero Dinis Ramos Veiga
Maria Leonor Barroso