Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
16415/21.8YIPRT.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
REABILITAÇÃO URBANA
IVA
TAXA
VALOR
INJUNÇÃO
JUROS
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE (RECURSO PRINCIPAL) / IMPROCEDENTE (RECURSO SUBORDINADO)
Sumário: Sumário da responsabilidade do relator:
I- A aplicação da Verba 2.23 da lista anexa ao Código do IVA (taxa reduzida a 6%) depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) Tratar-se de uma empreitada de reabilitação urbana, tal como definida em diploma específico; b) Realizada em imóvel ou espaço público localizado em área de reabilitação urbana, delimitada nos termos legais.
II- Não basta que a obra se integra em área de reabilitação urbana, é necessário que a Câmara certifique que as obras realizadas constituíram uma intervenção de reabilitação urbana, ao abrigo do disposto na al. j) do art. 2.º do Regime Jurídico de Reabilitação Urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 307/2009, de 23 de outubro, na sua atual redação.
III- Quanto à taxa reduzida em obras efectuadas em imóveis destinados à habitação tal como consta do ponto 2.27 da Lista anexa ao CIVA deve ser interpretada do seguinte modo: se os materiais representarem um valor menor ou igual a 20% do custo total da empreitada, a taxa aplicável será, na totalidade, a taxa reduzida de IVA; se aqueles materiais representarem mais de 20% do valor global da mesma, o empreiteiro deverá ter em conta o seguinte: a) se na facturação forem autonomizados os valores do serviço prestado e dos materiais, deve aplicar-se a taxa reduzida aos serviços, e a taxa normal às transmissões de bens; b) se a factura for emitida pelo preço global da empreitada, não tem aplicação a verba 2.27, devendo o valor da empreitada ser tributado globalmente à taxa normal de IVA. Provando-se nos autos que materiais incorporados na obra é superior a 20% do valor total da empreitada, e que as facturas não autonomizam os valores dos serviços prestados e dos materiais incorporados, não é possível aplicar uma taxa reduzida de 6% aos serviços prestados e 23% aos materiais, estando correcta facturação à taxa única de 23%.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes na 2.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
APELANTE/REQUERENTE INJUNÇÃO e AUTORA: E e V, Lda     
APELADO/ REQUERIDO INJUNÇÃO e RÉU: BV   
Todos com os sinais dos autos.
Valor da acção: 8.634,50 euros (decisão recorrida)
I.1. A Autora instaurou esta acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, deduzida como injunção contra o réu peticionando a condenação do réu no pagamento da quantia de €8.634,50, juros vencidos de €24,53 sobre a quantia de €8.609,97. Alega que é uma sociedade que se dedica à construção civil foi abordada pelo réu, para a realização da empreitada de remodelação da fração correspondente ao … Andar Esquerdo, n.º …, Rua …, Lisboa. Em 20 de Setembro de 2020, após alguma negociação, a autora apresentou ao réu a proposta final, proposta 2020_084, para a realização dos trabalhos pretendidos no valor total de €25.371,25 Euros, acrescidos de IVA, perfazendo de €31.206,63. No dia seguinte, em 21 de Setembro de 2020, o réu pediu alteração de tal proposta à autora com a alteração do material dos caixilhos de alumínio para PVC o que implicou uma redução na proposta apresentada de €155,50 e o assentamento de Lajetas que acresceu €650,00 à proposta, que ficou com valor final de €25.865,75, acrescidos de IVA, num total de €31.814,87. O réu adjudicou então a empreitada ao autor, para início dos trabalhos foi desde logo emitida pela autora a fatura …/… no valor de €7.759,70, de IVA à taxa de 23% no valor de €1784,73, perfazendo €9.544,43, que o réu saldou através de três transferências bancárias realizadas nos dias 07,08, 09 e 12 de Outubro, três no valor de €2.500,00 e uma no valor de €2.044,43. No decorrer dos trabalhos, o réu voltou por diversas vezes a manifestar à autora a vontade de serem realizados trabalhos a mais ao inicialmente acordado, assim como alterar alguns dos estavam na proposta originalmente apresentada. A autora sempre informou o réu que tais trabalhos a mais e alterações iriam ter custos acrescidos, em muitas das alterações – como a alteração da pedra da bancada da cozinha ou dos 30 candeeiros colocados a mais – o réu acompanhou os legais representantes da autora aos fornecedores e escolheu os materiais que entendeu, com perfeita consciência dos seus custos extra uma vez que os preços de tais materiais estavam claramente marcados, o réu não se opôs aos valores apresentados pela autora e adjudicou os trabalhos a esta dizendo que custos não eram um obstáculo. Os trabalhos terminaram a 15/01/2021 e nessa data foi realizada reunião em obra para entrega da mesma, na qual foi entregue a obra, sem qualquer reserva por parte do réu. Nessa reunião foi entregue a chave da fração e transmitido que iriam ser emitidas pela autora facturas finais trabalhos realizados, sem que tal suscitasse qualquer objecção por parte do réu. Para o que faltava facturar do orçamento original, foi emitida fatura n.º …/… no montante de €18.106,05, acrescidos de IVA no valor de €4.164,39, perfazendo €22.270,44. Relativamente a trabalhos a mais e alterações, foi emitida factura n.º 2021/2 no montante de €3.085,80, acrescidos de IVA no valor de €709,76, perfazendo €3.795,53. Quando interpelado para realizar o pagamento, o réu invocou que as facturas eram muito altas e que desejava, agora que os trabalhos tinham sido realizados e a obra tinha sido entregue, gostaria renegociar alguns valores dos trabalhos executados. Pois embora não negasse a adjudicação destes à autora e a sua realização por parte desta, alegava que nunca concordou em pagar os valores peticionados. Assim como que queria que o IVA fosse reduzido a 6%. O que a autora de forma alguma aceitou. Do orçamento original, o réu efectuou pagamentos num total de €27.000,43. Estando totalmente saldada a factura 2020/24 no valor total de €9.544,43. Mas no tocante à fatura n.º …/…, no valor de €22.270,44, apenas pagou €17.456,00, ficando por saldar €4.814,44. E da fatura n.º …/… no montante no total de €3.795,53, nada saldou. Ficou em dívida pelo réu €8.609,97, respeitante às facturas n.º …/… e …/…, ambas vencidas em 28/01/2021 e referente aos trabalhos de remodelação e conservação realizados no … Andar Esquerdo, n.º …, Rua …, Lisboa, ao qual acrescem juros desde a data de vencimento até integral pagamento. Estando assim em dívida o montante total de €8.609,97.
I.2. O réu apresentou contestação. O réu deduziu pedido reconvencional. O réu pagou €27.000,43 (tal como alegado pela autora) e €650,00 em dinheiro em 22.1.2021 (sublinhados nossos), num total de €27.650,43. O réu pagou a totalidade do montante determinado, acordado e adjudicado entre as partes, a obra ainda não está acabada. O montante do IVA é de 6% - e não de 23%. O réu disse aos representantes da autora que o IVA aplicável era de 6%. A nova proposta da autora, recebida em 21 de Setembro de 2020, tinha um valor total, com IVA de 6%, de €27.417,70 (e não de €31.814,87). Em 18.9.2021, na 1.ª visita da autora ao apartamento, o réu informou a autora de que a taxa aplicável do IVA era de 6%, relativamente às obras de reabilitação urbana, por o apartamento se encontrar inserido em área de reabilitação urbana, conforme declaração da CM, quando recebeu a primeira fatura, em outubro, o réu disse à autora que teria de alterar a fatura, relativamente à taxa do IVA aplicável. E, posteriormente, aquando da entrega da chave, relativamente a outras facturas, nunca foi acordado entre a autora e o réu quaisquer trabalhos a mais. Em 15.1.2021, após indicação da autora de que a obra estava concluída, as partes reuniram-se no apartamento para entrega da chave. Todavia, havia trabalhos que não estavam finalizados. Nesse dia 15.1.2021, a autora enviou ao réu e-mail com trabalhos a mais e respetivos preços. Todavia, os supostos trabalhos a mais, encontravam-se incluídos no orçamento aprovado, pelo que o respectivo preço não é devido à autora. Foi indeferido liminarmente o pedido reconvencional. Notificada, a autora respondeu à matéria de exceção.
I.3. Inconformada com a sentença de 12/1/2023 que, julgando a acção parcialmente procedente, consequentemente condenou o Réu a pagar à Autora a quantia de €4.164,44, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, dela apelou a Autora, em cujas alegações, em suma, conclui:
1- A Douta sentença recorrida peca por dar como provado no seu ponto 10 que “os supostos trabalhos a mais encontravam-se incluídos no orçamento aprovado, pelo que o respectivo preço não é devido á autora.” alicerçando a sua convicção puramente nas declarações de parte do R. e da sua companheira, a testemunha FC, ignorando por completo não só a prova documental junta aos autos, inclusive a própria proposta adjudicada, como o testemunho das 2 testemunhas fulcrais (sublinhados nossos) que não só depuseram diretamente e com conhecimento de causa sobre os factos, como também são idóneas não tendo qualquer laço familiar com o R. ignora também as regras da experiencia e do senso comum ao considerar que a A. faria diversos trabalhos extra a pedido do R, incorrendo num aumento de custos, inclusive o aumento para o dobro do custo da pedre aplicada, devido exclusivamente ás escolhas estéticas do R. , sem que por isso cobrar-se qualquer valor por tais trabalhos extra ou imputasse ao R. os custos adicionais que as suas escolhas implicaram as declarações de parte realizados pelo R. foram hesitantes e sem precisão utilizando o R. um discurso nervoso, gaguejante e impreciso, recorrendo o R. a expressões como “acho eu”, “uma parte das coisas” e “é só um exemplo”, mas deixando até antever que de facto haviam trabalhos a mais, dizendo ao minuto 14:12 “reparamos que uma parte das coisas que lá estavam, senão a totalidade, eram coisas que estavam no orçamento, havia pequenas coisas que não estava…”. A testemunha FC é companheira do R., não só sendo claro que directa interessada na causa, tanto financeira ou emocionalmente, como que foi a principal participante e interveniente em obra, decidindo pondo e dispondo como se de parte se tratasse, a testemunha menciona, ao minuto 1:19:43 que existiram trabalhos a mais cuja orçamentação foi feita A. e não aceite pelo R., com excepção das lajetas do jardim que assume ter sido aceite, mas não junta o R. ai autos quaisquer comprovativo dessa suposta orçamentação, ao invés da A. que junta, nos documentos 14, 15, 19, 20 e 21 pedidos de alterações e trabalhos extra enviados pelo R. e por esta testemunha ao legal representante da A. ao minuto 1:04:41 do seu depoimento afirma que no dia 15 o legal representante da ira proceder á entrega posterior de um Excel com os trabalhos extra– coisa que o R. também tinha mencionado ao minuto 13:15 – para depois, ao minuto 1:06:26, já dizer esta testemunha que “No dia foi-nos entregue por e-mail o Excel, e o D__ diz não vejam agora, com calma, em casa, analisam e depois conversamos”. Ao minuto 1:33:56 esta testemunha ainda entra em maior contradição quando é inquirida sobre o alegado envelope de dinheiro que o R. terá entregue ao Legal representante da A. no dia 22 acaba por admitir que nesse dia 22 ainda nem sequer tinha discutido com o legal representante da A. o pagamento dos trabalhos extra realizados expressamente dizendo “Não! Não porque nem sequer tínhamos discutido isso ainda!” A testemunha acaba por admitir que a questão dos trabalhos a mais nem sequer tinha sido ainda discutida com o legal representante da A., que nesse dia estava ali apenas para exigir o pagamento do remanescente da factura respeitantes aos trabalhos inicialmente orçamentados, com o IVA a taxa de 25%. Também na questão da entrega desse envelope a testemunha um testemunho faccioso e inverosímil, alegando que foi entregue tal envelope, mas não sabendo explicar o porque do seu montante, 650 euros, quando de modo algum tal montante se enquadra na versão do R. ou da A. das contas. Em relação à testemunha HM, cujo o depoimento não é levado em consideração pelo tribunal a quo, mas que é um terceiro sem qualquer ligação à A. ou ao R. expressamente indicou como decorreu a alteração da pedra de cozinha escolhida, o que tal alteração significou em termos de custos e que tal foi desde logo transmitido ao Ré e à sua companheira. Ficando claro com o depoimento desta testemunha que a pedra Silistone de gama media/baixa foi substituinte pela pedra Empira White da gama superior, tendo tal alteração implicado um custo de quase o dobro. Custo esse que se vê refletido na factura 2021/2 em que a A. cobra mais 1 643,00 Euros pela alteração para pedra Empira Brancco. A testemunha NS, cujo o testemunho também não foi tido em consideração pelo tribunal a quo na douta sentença ora recorrida, atestou os trabalhos que o próprio realizou na obra nomeadamente a colocação de leds por toda a casa, a abertura de nichos nas casas de banho e o aro estrutura tipo gaiola de madeira na cozinha, tudo trabalhos que vem expressamente descriminados na factura 2021/2 e nenhum dos quais vem mencionado ou descriminado na proposta apresentada e adjudicada. Também não tem em consideração o tribunal a quo a vasta prova documental junta aos autos, nomeadamente a proposta 2020_84, a qual foi adjudicada pelo R. e na qual expressamente se lê “Estão excluídos todos e quaisquer trabalhos não contemplados na Lista E as diversas mensagens Whattsapp em o R. e a testemunha FC pedem ou alteram trabalhos á A. ( documentos ., 14., 15, 19, 20 e 21 junto com a resposta á matéria de exceção.) A conjugação e apreciação de toda esta prova á luz da experiência do senso comum, bem como das relações comerciais normais entre empreiteiro e cliente, não poderiam conduzir senão a que a realização dos trabalhos a mais e alterações de custos tivesse sido dada como provada. Assim como deveria ter sido dado como provado que tais trabalhos a mais não constavam na proposta inicial – como tal proposta expressamente o menciona e por consequência que o R. era devedor á A. da factura 2021/2. [Conclusões A a LL]
2- No tocante ao alegado pagamento feito em numerário pelo R. o tribunal quo no ponto 7 da Douta sentença ora recorrida, dá tal pagamento como provado e mais uma vez motiva a sua fundamentação apenas e tão só nas declarações do R. e da sua companheira a testemunha FC, é claro que o mero depoimento desta testemunha não é prova suficiente para dar como provado o pagamento alegado pelo R. sendo que a este cabia ao R. o ónus da prova deste pagamento e não tendo preenchido tal ónus satisfatoriamente deveria ter sido dado tal pagamento como não provado tal. E logo condenado o R. na sua realização. [Conclusões BB a TT]
3- A douta sentença no ponto 18 da sua fundamentação dá como não provados os juros de mora motivando tal fundamentação da seguinte forma “A factualidade não provada em 18. Deve-se a falta de prova”. No entanto o Tribunal deu como provado a existência de um montante devido à A .condenado o R. no pagamento de 4. 164,44 Euros tal montante é devido deste da data de vencimento da factura que lhe dá origem, 28/01/2021, admitindo o próprio R. que nessa mesma data foi interpelado pela A. para pagamento, através de e-mail, não tendo realizado tal pagamento o R. constitui-se em mora pelo que decorre da Lei a obrigação de pagamento dos juros legais, desde a data de emissão da factura até integral pagamento. [Conclusões UU a AAA]
Termina pedindo a revogação parcial da decisão recorrida e substituída por outra que condene o R., não apenas no montante de 4 164,44 Euros respeitante ao IVA da factura 2021/1, mas sim na totalidade do pedido, nomeadamente o pagamento à A. de 8 609,97 Euros acrescidos de juros vencidos e vincendos, assim se fazendo JUSTIÇA
I.2. Em contra-alegações, com recurso subordinado, conclui, em suma, o Réu (sublinhados nossos):
1. Compulsados todos os documentos juntos aos autos, bem como as declarações das Partes e os depoimentos das testemunhas em sede de audiência de julgamento, dúvidas não existem de que a Sentença produzida pelo Tribunal a quo é totalmente acertada na parte relacionada com os (supostos) trabalhos a mais, e que nenhuma outra decisão poderia ter sido tomada neste processo relativamente a esta matéria que não a de considerar que o valor reclamado pela Recorrente pelos (supostos) trabalhos a mais não é devido pelo Recorrido. Como referiu o Réu/Recorrido ao longo do processo, não foram realizados quaisquer trabalhos a mais (i) por um lado, porque todos os trabalhos adjudicados se encontravam devidamente orçamentados e adjudicados logo no início da obra; e, (ii) por outro lado, quaisquer trabalhos não compreendidos na proposta não foram adjudicados e/ou resultaram de erros cometidos pela Recorrente na execução da empreitada. O Réu/Recorrido, a par da sua namorada (testemunha FC), são as únicas pessoas que têm conhecimento profundo quanto a todos os elementos objetivos e subjetivos que os levaram a avançar para a realização da empreitada em análise nos autos e que, como tal, são os únicos que foram capazes, ao longo de todo o processo, de explicitar cabalmente a realidade dos factos subjacentes ao mesmo. O Recorrido explicitou que seria impossível ter adjudicado trabalhos a mais, considerando que tinha um tecto para o valor da empreitada: cerca de € 25.000,00 (valor ao qual acresceria uma taxa de IVA a 6%). Em momento algum do seu depoimento, o Réu/Recorrido admitiu a existência/execução de trabalhos a mais ao longo da empreitada. Pelo contrário, o mesmo foi muito claro a esclarecer que os (alegados) trabalhos a mais inseridos na listagem enviada pela Recorrente – excel – já constavam da proposta inicial para os trabalhos produzida pela Recorrente ou então que se tratavam de trabalhos efetuados sem qualquer aprovação/autorização prévia e/ou para retificar erros na realização das obras. Sublinhe-se que o ónus da prova de comprovar a realização dos trabalhos a mais sempre seria da Recorrente, que os invoca, e nunca do Recorrido. Porém, a Recorrente não o conseguiu fazer nem no seu requerimento de injunção, nem através dos documentos juntos aos autos, nem através do depoimento do seu legal representante na audiência, nem no seu Recurso. O Réu/Recorrido mantém a sua versão quanto ao pagamento do valor em numerário de €650,00, facto este dado como provado na Sentença do Tribunal a quo. O legal representante da Recorrente nada logrou dizer em audiência, em termos concretos e factuais, quanto à realização de trabalhos não incluídos na proposta inicial da empreitada. A testemunha FC participou activamente na negociação da proposta, acompanhou sempre o andamento dos trabalhos, questionou e participou na escolha dos materiais usados, forneceu plantas e deu todos os detalhes previamente à apresentação da proposta e início dos trabalhos por parte da Recorrente e, como tal, foi a única testemunha arrolada no âmbito do processo que conseguiu esclarecer o Tribunal a quo quanto à factualidade relevante para a produção da sua decisão quanto à inexistência de quaisquer trabalhos a mais, a simples audição de alguns trechos do seu depoimento (FC) –de que são exemplo os referenciados no ponto 64) das contra-alegações de Recurso aqui apresentadas pelo Réu/Recorrido – atesta bem como foi acertada a decisão do Tribunal a quo em relevar de forma decisiva o depoimento desta testemunha na sua decisão, o depoimento da testemunha HM, conforme considerou o Tribunal a quo, é totalmente irrelevante para a prova de qualquer factualidade inerente a este processo. Em resposta às questões que lhe foram formuladas pelo próprio mandatário da Recorrente, em sede de audiência de julgamento, referiu a testemunha HM que: (iv)       Não sabe qual é a obra para a qual vendeu uma determinada pedra – alegadamente do tipo Empira White – aos representantes da Requerida (D__ e M__); v) Não foi à obra; e (vi) Não conhece nem sabe os nomes dos (alegados) clientes finais (alegadamente o Recorrido e a sua namorada). Em esclarecimentos apresentados a questões que lhe foram formuladas pelo mandatário do Réu/Recorrido, referiu a testemunha HM que: (vii) Não tem acesso aos orçamentos formulados pela Recorrente; (viii) Nem a testemunha, nem ninguém que consigo trabalhe, participou no orçamento apresentado pela Recorrente ao Recorrido para a empreitada; (ix) Não sabe se no orçamento inicial da obra estava orçamentada a pedra por si faturada à Recorrente; (x) Nunca foi à obra em análise nos autos; (xi)  Nunca viu se alguma pedra por si fornecida foi implementada na obra; e (xii)  Não faz a “mínima ideia” se a pedra que vendeu à Recorrente foi para a empreitada em análise nos autos, ou não. Também a testemunha NS, arrolada pela Recorrente ao seu rol de testemunhas, nada acrescentou com relevância para a matéria em disputa nos autos Esta irrelevância do testemunho do depoimento NS é notória pela seguinte ordem de fatores: (iv) A testemunha não participou na elaboração de qualquer proposta/orçamento para a empreitada, não sabendo o que estava incluído no orçamento inicial da obra, ou não; (v)         A testemunha é dependente hierárquico da Recorrente, obedecendo às suas ordens diretas na realização das suas tarefas diárias – faz e implementa em qualquer obra o que os seus “patrões” lhe mandam, sem ter acesso a qualquer documento que tenha sido acordado previamente; e (vi) É natural que, em função da dependência hierárquica da Recorrente, este depoimento esteja, por esse facto, condicionado quanto à sua espontaneidade, coerência e veracidade. Na medida em que a testemunha afirmou de forma que “não tem acesso a nada disso” – quando se referia à proposta/orçamento adjudicado para esta empreitada -, não serve o mesmo para provar que tenha sido realizado qualquer trabalho a mais. [Conclusões a) a AAA]
2. O Recorrido não concorda com a parte da Sentença em que foi condenado ao pagamento do montante de € 4.164,44, por entender, como resulta do seu Recurso Subordinado, que o valor do IVA que deveria incidir sobre o valor da empreitada seria de 6%. Importará, porém, concretizar, considerando o sustentado pela Recorrente relativamente a juros, que mesmo que o Tribunal de Recurso mantenha, contra o entendimento do Recorrido, a condenação do mesmo nesse montante, sempre se dirá que até ao momento que este processo transite em julgado, sobre os montantes em análise/discussão no mesmo jamais poderá incidir quaisquer juros de mora. Primeiro, considerando que esse montante resulta de um facto contravertido e em disputa e sobre o qual o Recorrido, tão logo recebeu as facturas, lhes deduziu uma excepção – não serem parte dos montantes que lhe foram faturados devidos. Depois, porque a matéria relacionada com a taxa do IVA que deve incidir sobre a empreitada em análise nos autos ainda se encontra em disputa, e dependente de uma decisão final por parte do Tribunal de recurso que venha a transitar em julgado, no caso concreto o artigo 805.º/n.º 1, do Código Civil sempre deverá ser interpretado no sentido de que só com uma notificação judicial para o efeito, poderá ficar (ou não) constituído em mora o Recorrido, consoante venha a cumprir (ou não) com o que vier a ser determinado pelo Tribunal. Admitindo que este Tribunal de Recurso venha a dar razão ao Recorrido, partilhando o seu entendimento de que sobre o valor da empreitada apenas incide IVA à taxa de 6%,, nem o valor de € 4.164,44 em que o Tribunal a quo condenou (salvo o devido respeito, erradamente) o Recorrido, nem o (pretenso) montante de juros de mora que sobre o mesmo montante pudesse incidir, se considerarão devidos pelo Recorrido à Recorrente, a final. não pode o Recorrido aceitar a interpretação feita pelo Tribunal a quo da disposição legal em causa, uma vez o legislador, ao utilizar a palavra “ou” nas situações acima identificadas no ponto 2.23 da referida Lista pretendeu apresentar três situações alternativas e não cumulativas em que a taxa de IVA reduzida de 6% deve ser aplicada, a saber: (i) Empreitadas de reabilitação urbana realizadas em imóveis localizados em áreas de reabilitação urbana delimitadas nos termos legais; ou (ii) Empreitadas de reabilitação urbana (tal como definida em diploma específico) realizadas em espaços públicos localizados em áreas de reabilitação urbana delimitadas nos termos legais; ou (iii) Empreitadas de reabilitação urbana (tal como definida em diploma específico) no âmbito de operações de requalificação e reabilitação de reconhecido interesse público nacional. Com efeito, a referência naquela norma a “espaços públicos” e “reconhecido interesse público nacional” consubstancia a identificação de critérios específicos independentes aplicáveis a situações distintas daquela que importa in casu: saber se a empreitada foi “realizada em imóveis localizados em áreas de reabilitação urbana”. Ora, esse facto ficou provado no presente processo, (cfr. facto provado n.º 13). Pelo que, estando provado que a empreitada em causa nos presentes autos foi realizada num imóvel localizado em área de reabilitação urbana, deve o Tribunal ad quem decidir pelo preenchimento do requisito plasmado no ponto 2.23 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e pela consequente aplicação do mesmo ao caso sub judice, concluindo pela aplicabilidade da taxa reduzida de IVA a 6% à empreitada. A aplicação da regra dos 20% prevista no ponto 2.27 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado não pode ser feita de forma automática, mas sim tendo em consideração todos os elementos relevantes, bem como o destinatário daquela norma. importa referir que: (i) consideram-se "beneficiários" da aplicação da taxa reduzida de IVA, ao abrigo do mencionado ponto 2.27 (na qualidade de donos da obra), o proprietário, o locatário ou o condomínio (cfr. ponto 4 do Oficio-Circulado n.º 30.135 da Autoridade Tributária e Aduaneira); e (ii) o que está na origem da redução do IVA prevista pelo legislador nestas situações é o benefício dos serviços com características de alta intensidade de fator de trabalho, dos quais se pode destacar, por exemplo, as recuperações de imóveis antigos em que o fator “trabalho” constitui a maioria dos custos para os proprietários. Sucede que, a pessoa ou entidade que poderá autonomizar, na factura emitida para o efeito, o preço de cada material e serviço ou determinar se o valor dos materiais incorporados é superior a 20% do valor global da empreitada é o empreiteiro, que não é beneficiário da aplicação da taxa reduzida de IVA e que pode considerar a respetiva aplicação, em muitas situações, como sendo prejudicial para a sua esfera patrimonial, levando-o a atuar no sentido de pugnar pela aplicabilidade do IVA à taxa normal nas empreitadas. E a verdade é que o empreiteiro desta obra – i.e., a Recorrente – sabia que o IVA aplicável à empreitada era de 6%, uma vez que: (i) ficou provado que, à data da contratação da empreitada, o imóvel encontrava-se em área de reabilitação urbana (cfr. facto provado n.º 13), facto esse que a Recorrente, tendo em consideração a área profissional onde atua, tinha – ou exige-se que tivesse de ter – conhecimento; e (ii) foi alertada em diversas ocasiões para esse facto pelo Recorrido, conforme resulta do (i) do facto provado n.º 5, (ii) depoimento de parte do Recorrido – minuto 09.30 a minuto 09.53 e minuto 22.35 a minuto 23.34 da gravação da audiência – e (iii) do depoimento da testemunha FC – minuto 56.28 a minuto 56.50 e minuto 57.42 a minuto 58.00 da gravação da audiência). Pelo que apenas se pode concluir que a opção, por parte da Recorrente, de emitir uma factura com o IVA a 23% enquadra-se numa manifesta atitude de má-fé, que se encontra alicerçada no facto de o Recorrido se ter oposto à questão dos supostos trabalhos a mais no momento em que foi confrontado com esse tema, já depois de terminada a empreitada e que surgiu como solução para a Recorrente fazer face à sua desorganização relativamente aos custos que teve com a obra inicialmente orçamentada. Esta foi, inclusivamente, a conclusão do Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 13 de dezembro de 2022, num caso recente e muito semelhante àquele que está em causa nos presentes autos, do qual consta o seguinte: “Temos pois (como é entendimento da AT, constante da informação vinculativa de 02/08/2017, proferida no processo n.º 1...) que a empreitada dos autos reunia requisitos para lhe ser aplicado IVA à taxa reduzida de 6%, o que aconteceria, na totalidade, se as faturas explicitassem os serviços prestados – autonomizando os valores dos serviços prestados e dos materiais incorporados – e o valor percentual dos materiais incorporados na empreitada representassem um valor menor ou igual a 20% do custo total da mesma; e, caso estes/materiais ultrapassassem tais 20%, só estes/materiais seriam tributados à taxa normal de 23%, continuando o valor dos serviços a ser tributado à taxa reduzida de 6%. Sucede que a R. não fez qualquer explicitação/autonomização nas duas faturas referidas, antes se limitando a mencionar “remodelação de apartamento”, hipótese em que a AT entende que todo o valor é tributado à taxa normal de 23%. Assim sendo, aqui chegados, não podemos deixar de considerar que é devido/imputável ao modo “descuidado” como a R. procedeu à faturação da empreitada que a mesma, que reunia requisitos para lhe ser aplicado IVA à taxa reduzida de 6%, deixa de beneficiar de tal taxa reduzida, pelo que, sendo assim, não pode a R. repercutir sobre o A. o seu “lapso” – não alegando/provando sequer qual a percentagem de materiais incorporados na empreitada (e/ou que tal percentagem foi superior a 20%) – e, por conseguinte, a R. só pode exigir ao A. IVA à taxa reduzida de 6% sobre os € 22.590,00 do preço, ou seja, tão só € 1.355,40.” (disponível em https://jurisprudencia.pt/acordao/211783/ - sublinhados e destacados nossos). Decorre assim de tudo o que se acaba de expor que, e salvo o devido respeito, não se pode aceitar a posição tomada pelo Tribunal a quo na Sentença no que respeita a esta matéria, devendo, por isso, o Tribunal ad quem decidir pela aplicação do ponto 2.27 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ao caso sub judice, concluindo pela aplicabilidade da taxa reduzida de IVA a 6% à empreitada. [Conclusões BBB a WWW]
Termina pedindo a improcedência do recurso da Autora e a procedência do recurso subordinado revogando-se a sentença do na parte em que considerou que o IVA aplicado a esta empreitada é de 23% e que, como tal, deveria o Recorrido pagar à Recorrente o montante de € 4.164,44, devendo, ao invés, concluir o Tribunal a quem que o IVA aplicável a esta empreitada é de 6% e que, como tal, não tem o Réu/Recorrido que liquidar qualquer montante à Autora/Recorrente.
I.3. Os Meritíssimos-Juízes adjuntos tiveram vistos nos autos e nada sugeriram. Nada obsta ao conhecimento do recurso.
I.4. São as seguintes as questões a dirimir:
No recurso da Autora:
a) Saber se ocorre na decisão recorrida erro na apreciação dos meios de prova e decisão quanto aos pontos de facto 7, 10, positivos e 18 negativo.
b) Saber se, alterando-se a decisão recorrida também no tocante à factura 2021/2 quanto aos trabalhos a mais realizadas pela autora o pedido procede na sua totalidade.
c) Saber se sobre o valor de 4 164,44 euros da condenação, tal montante é devido deste da data de vencimento da factura que lhe dá origem, 28/01/2021, sendo a obrigação de pagamento dos juros legais, desde a data de emissão da factura até integral pagamento.
No recurso subordinado do Réu:
Saber se ocorre na decisão recorrida erro de interpretação e aplicação das disposições legais do CIVA sendo aplicável ao caso a taxa reduzida de 6% e não ade 23% que a Autora fez constar das facturas.
II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
II.1 Deu o Tribunal recorrido como provados os seguintes factos cujos sob 7 e 10  a apelante impugna:
1. A autora é uma sociedade que se dedica à construção civil.
2. Em 20 de Setembro de 2020, a autora apresentou ao réu a proposta …_..., para a realização dos trabalhos pretendidos de remodelação e conservação no apartamento do … andar esquerdo, n.º …, Rua …, em Lisboa, pelo valor total de €25.371,25 Euros, acrescidos de IVA, cf. fls. 46.
3. Em 21 de Setembro de 2020, o réu pediu alteração de tal proposta à autora com a alteração do material dos caixilhos de alumínio para PVC o que implicou uma redução na proposta apresentada de €155,50 e o assentamento de Lajetas que acresceu €650,00 à proposta, que ficou com valor final de €25.865,75, acrescidos de IVA, cf. fls. 61, 67.
4. O réu adjudicou a empreitada à autora.
5. O réu disse aos representantes da autora que o IVA aplicável era de 6%.
6. A autora emitiu faturas com o IVA a 23%.
7. O réu pagou à autora um total de €27.000,43, por transferências bancárias, e €650,00 em dinheiro em 22.1.2021, num total de €27.650,43.
8. Em 15.1.2021, após indicação da autora de que a obra estava concluída, as partes reuniram-se no apartamento.
9. Após a reunião, nesse dia 15.1.2021, a autora enviou ao réu email com trabalhos a mais e respetivos preços, cf. fls. 63 verso-64.
10. Os supostos trabalhos a mais encontravam-se incluídos no orçamento aprovado, pelo que o respetivo preço não é devido à autora.
11. Havia trabalhos em falta, que o réu comunicou à autora no email de fls. 37 verso, de 27.1.2021:
"(...)
Como comunicado no dia 18, existem várias situaçõespendentes de resolução, que foram devidamente orçamentadas, nomeadamente:
- em falta três traves da cama que se encontrava na casa;
- gavetas da cozinha impossíveis de utilizar, sendo necessária a troca das molas;
- peças do microondas em falta. Como é possível verificar pelas fotografias em anexo, faltam peças, o que faz com que exista um espaçamento errado entre as portas e o microondas;
- cai água por baixo do lava-loiças;
- cai água do termaacumuiador;
- espelho riscado no WC social;
- divisória em vidro no WC social mal vedado;
- cerâmico de revestimento da varanda. rachado;
- rodapé na lavandaria mal colocado;
- puxador da porta da suste mal instalado e cai constantemente;
- tampo Sanitana Glam queda amortecia partido na suíte, como se pode ver pela foto, tentaram colocar massa para não ser perceptível".
12. Posteriormente, o réu não quis que a autora finalizasse os trabalhos.
13. A fls. 43 encontra-se documento emitido pela Câmara Municipal de Lisboa, de 29.1.2021, declarando que a morada do apartamento encontra-se em área de reabilitação urbana, desde a entrada em vigor do aviso n.º 8391/2015, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 148, de 31 de Julho de 2015.
14. O orçamento apresentado pela autora descreve os trabalhos a realizar, que agrupa em três “capítulos”, não referindo o preço de cada trabalho, nem de cada material, mas o preço de cada conjunto de trabalhos, e o preço final, soma de 3 preços.
15. Nas faturas emitidas não foram autonomizados os valores dos serviços prestados e dos materiais, constando apenas o preço de cada trabalho realizado com, ou sem, fornecimento de material.
16. O valor dos materiais incorporados na obra é superior a 20% do valor total da empreitada.
II.2. Deu o Tribunal como não provados os seguintes factos, cujo sob 18
17. A autora concordou que a taxa do IVA aplicável fosse de 6%.
18. Juros de mora vencidos
III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 5, 635, n.º 4, 649, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3. No recurso da Autora Saber se ocorre na decisão recorrida erro na apreciação dos meios de prova e decisão quanto aos pontos de facto 7, 10, positivos e 18 negativo.
III.3.1. Estatui o art.º 640 n.º 1: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente, obrigatoriamente, especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considerar incorrectamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. O n.º 2 do art.º, por seu turno estatui que quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar, com exactidão as passagens de gravação em que se funda o recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (alínea a); independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes (alínea b)”.
III.3.2. Dispunha o n.º 1, do art.º 685-B: “Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (alínea a)],e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (alínea b)]”
E o n.º 2: “No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 522-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à sua transcrição.”
III.3.3. Os ónus são basicamente os mesmos, vincou-se na alínea c) do n.º 1 do art.º 640 (o que não estava suficientemente claro, mas a doutrina pressupunha), o ónus de especificar a decisão que no entender do recorrente deveria ser proferida sobre a matéria de facto, manteve-se, também, o ónus (com redacção ligeiramente diferente) de identificar com exactidão (nova redacção), ou identificar precisa e separadamente (anterior redacção) as passagens da gravação em que se funda (comum).
III.3.4. Pode dizer-se que continua válido o entendimento anterior da doutrina nessa matéria. A este propósito referia António Santos Abrantes Geraldes que o recorrente deve especificar sempre nas conclusões os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; para além disso, deve especificar os concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (documentos, relatórios periciais, registo escrito), deve indicar as passagens da gravação em que se funda quando tenha sido correctamente executada pela secretaria a identificação precisa e separada dos depoimentos, deve igualmente apresentar a transcrição dos depoimentos oralmente produzidos e constantes de gravação quando esta tenha sido feita através de mecanismo que não permita a identificação precisa e separada dos mesmos, deve especificar os concretos meios probatórios oralmente produzidos e constantes da gravação, quando esta foi feita por equipamento que permitia a indicação precisa e separada e não tenha sido cumprida essa exigência pela secretaria e por último a apresentação de conclusões deficientes obscuras ou complexas a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos para que possa afirmar-se a exigência da especificação na conclusão dos concretos pontos de facto impugnados ou da localização imediata dos concretos meios probatórios. Tudo isto sob pena de rejeição imediata sem convite ao aperfeiçoamento[2].
III.3.5 O recorrente cumpre o seu ónus processual este tribunal está em condições de reapreciar a prova.
III.3.6. Comecemos pelo ponto 18 negativo (juros de mora vencidos). Trata-se de um contrato de empreitada de construção civil tendo como objecto a remodelação e um apartamento mediante um preço. A obra foi executada, discute-se o que foi executado, foi paga certa quantia discute-se se é devida a peticionada. Por se tratar de obrigação pecuniária, caso se demonstre o atraso no cumprimento da obrigação, presume-se o mesmo culposo nos termos do art. 799º n.º 1, do Cód. Civil consequentemente ocorre a mora o que implica o pagamento de juros, desde aquela data, nos termos das disposições conjugadas dos art. 804º n.º 1 e 806º n.º 1, ambos do Cód. Civil, até integral pagamento. A questão de saber se se venceram ou não juros é assim questão puramente de direito e não de facto, razão pela qual se dá por não escrita aquela decisão negativa
III.3.7. Vejamos agora os pontos de facto 7 e 10. A sentença motivou assim a decisão: “...Relativamente à factualidade provada em 7.: a primeira parte resultou do acordo das partes, a segunda parte deve-se às declarações de parte do réu e ao depoimento da testemunha FC... A factualidade provada em 10. deve-se às declarações de parte do réu e ao depoimento da testemunha FC, sendo que nas declarações de parte da autora, o legal representante não concretizou os trabalhos a mais realizados. Sustenta a recorrente em suma que:
  • A testemunha FC menciona 1:19:43 que existiram trabalhos a mais cuja orçamentação foi feita A. e não aceite pelo R., com exceção das lajetas do jardim que assume ter sido aceite, mas não junta o R. aos autos quaisquer comprovativo dessa suposta orçamentação, ao invés da A. que junta, nos documentos 14, 15, 19, 20 e 21 pedidos de alterações e trabalhos extra enviados pelo R. e por esta testemunha ao legal representante da A. a testemunha acaba por admitir que a questão dos trabalhos a mais nem sequer tinha sido ainda discutida com o legal representante da A., que nesse dia estava ali apenas para exigir o pagamento do remanescente da factura respeitantes aos trabalhos inicialmente orçamentados, com o IVA a taxa de 25% em total e completa contradição com o que anteriormente diz ter-se passado. Quanto no ponto 11.1 do orçamento apresentado ao R., documento 16 junto com a resposta à matéria de excepção apresentada pela A., claramente menciona outro tipo de pedra, dizendo - Fornecimento e aplicação de tampo de bancada em pedra artificial tipo “silestone”. É óbvio e notório que existiu uma alteração á pedra orçamentada e que, ao que a testemunha HM chamou Empira White, a A. chamou Empira branco, aportuguesando o termo. É o próprio fornecedor do bem que vem aos autos atestar que tal bem ficou significativamente mais caro à A., dobrando o seu custo. E mais que tal foi expressamente referido ao R. e à sua companheira. Ao minuto 48:51, quando perguntado se foram instalados LEDs embutidos no tecto (pontos 6, 7 8 e 9 da factura demandada pela A. e que correspondem ao valor total de 584 Euros) a testemunha NS refere: “Sim, até foi eu que abri os buracos e meti lá eles” e depois, ao minuto 40:09 refere que não tem dúvidas que a colocação de tais LED, foi por toda a casa, LEDs esses que, em lugar algum da proposta 2020_84 constam! Ao minuto 49:24 quando é perguntado á testemunha se existia um aro no corredor e tal aro foi retirado, esta responde “Exactamente” Tal aro respeita ao ponto terceiro da factura demandada pela A., e em lugar algum constam na proposta adjudicada. Ao minuto 50:05 quando inquirido sobre os pontos 11 e 12 da factura demandada pela A., os nichos rebaixados nas instalações sanitárias, a testemunha responde categoricamente que “O nicho foi eu que abri o buraco Refere também, ao minuto 50:31 que, no tocante ao ponto 15 da factura demandada pela A, a estrutura tipo gaiola de madeira na cozinha, “Fui eu que meti lá a estrutura”. Sendo que na proposta adjudicada, documento 16 junto com a resposta á matéria de exceção apresenta pela A., apenas englobava no seu ponto 1.1 Execução de demolição de: estrutura de madeira tipo gaiola pombalina existente na sala. Termina esta testemunha dizendo ao minuto 50:36 que não tem dúvidas que esses trabalhos foram feitos.
  • Não soube o R. explicar porque terá entregue aquele montante de 650 euros ao legal representante da A. Tal montante de 650 euros, não faz qualquer sentido, quer se tenha em consideração o que o R. defende dever pelos trabalhos, que neste ponto seriam só apenas 417,26 euros quer tendo em consideração o que a A. reclama ter para receber que seriam 8 609,97 Euros. Alegando tanto o R. como a testemunha FC que apenas entregaram um envelope de dinheiro ao legal representante da A. para este se ir embora é claro que o mero depoimento desta testemunha não é prova suficiente para dar como provado o pagamento alegado pelo R.
    III.3.8. Comecemos pelo ponto 10. Há logo aí uma dificuldade que é o adjetivo “supostos” que significa, hipotético, conjecturado, fictício. O que é hipotético é o que é fundado em mera hipótese, algo sujeito a demonstração e no caso cabia ao empreiteiro não só a alegação como a prova de que foram contratados e realizados trabalhos a mais. E aí entroncamos na proposta de orçamento do empreiteiro, saber o que foi negociado qual a intenção das partes aquando da proposta e da aceitação da proposta e a verdade é que para além do legal representante da autora e do réu ninguém mais presenciou a negociação, desconhece-se a vontade real das partes quando da elaboração da proposta e da sua aceitação e doa troca de e-mails juntos aos autos, nenhum contributo se retira para a interpretação do orçamento. A testemunha HM desconhece o orçamento da obra, sabe que os réus foram ao seu estabelecimento escolher a pedra, sabe que a pedra escolhida foi levada, desconhece para onde e se foi assente. Disse entre o mais com interesse “...o casal esteve lá a escolher não gostavam da pedra que o D__ queria, escolheram pedra de gama superior “Empire White”, é o grupo superior da Silestone, a pedra foi facturada ao D__ (onde está a factura nos autos), que pagou, não me lembro da obra deles...não sei nada do orçamento contratado entre o casal e o D__, não sei se no orçamento inicial estava ou não incluído a pedra Empire White, nunca fui à obra e não sei s efoi para lá e se foi colocada, confrontada com a foto 5/11 essa foto não faz jus à pedra não sei se foi essa a pedra que forneci...”. De igual modo NS, trabalhador da E e V, faz um bocado de tudo na empresa desde a electricidade, até ao assentamento do tijolo e colocação do pladur estava lá em 2020/2021 há já sete anos que lá está, não conhece o orçamento e com interesse disse: “...abri os buracos  no tecto para embutir os leds...removi o arco de passagem no corredor, picámos...os donos da obra, o casal estava lá sempre, executei nichos rebaixados nos sanitários, abri buracos, pus válvulas de click-clack...não apresentou reclamação da obra eu estava lá aquando da entrega da obra ao cliente. Já a testemunha FC, não obstante a ligação afectivo ao réu BV teve quanto a essa matéria e quanto à explicação dos e-mails e dos documentos juntos um depoimento muito preciso e sereno, entre o mais disse: “...o orçamento foi ao principal motivo da decisão de avançara com  abra, o valor entre os 25 e os 27 mil euros...no 1.º dia de reunião co  D__ e M__ falámos, estavam habituados, conheciam uma situação anterior...nunca houve conversa de trabalhos a mais, envergonhado o D__ disse que fez um excell com trabalhos a mais a obra tinha-se arrastado muito e ele estava com prejuízo...pedimos lajetas e portas pvc com cortes térmicos, aceitámos as lajetas, não aceitámos o corte térmico que também não foi realizado, caixotes de lixo embutidos, quando o D__ disse que eram  40/50 euros fui comprar ao IKEA, sem orçamentação prévia não pode haver trabalhos a mais...trabalhos a mais foi surpresa , o D__ disse não vejam agora, analisem em casa voltamos a ver-nos dia 22...D__ quis ir a casa ele estava fora de si não o deixámos entrar, fez escarcéu, nós dissemos que não íamos pagar trabalhos que não eram a mais...fizemos mapa de medições para não haver erro de board, com materiais a aplicar em obra, a cor , o tipo de material, a planta as alterações (era um remodelação do obra existente em planta a vermelho, os amarelos de demolição, as alterações necessárias isso consta do e-mail de 1-6-2020...nunca fizemos alterações ao que foi desenhado...as alterações forma tidas por escrito, as lajetas do jardim acertámos o valor e colocámos...o D__ orçamentou com base no mapa de medições que fiz eles nem sequer uma fita métrica trouxeram, ninguém consegue fazer orçamento sem mapa de medições de obra, concordei com o orçamento com base no mapa de medições...”. Não logrou, assim, a Autora provar, como lhe competia, a negociação de trabalhos a mais em relação ao que estava orçamentado e a dúvida sobre essa realidade resolve-se contra a Autora (art.º 414), mantendo-se o facto sob 10.
    III.3.9. Em relação ao facto sob 7 o Tribunal convenceu-se da realidade desse facto apenas com base no depoimento da testemunha FC que o legal representante da Autora nega. A narrativa relativa a esse pagamento e o seu enquadramento circunstancial de tempo lugar e modo deixam algumas dúvidas. Diz o Réu BV a este respeito na parte que interessa nas suas declarações de parte: “Dei-lhe 650,00 euros em dinheiro que tinha...tinha-lhe dado 26.750,00 euros com iva a 6% baseei numa relação e confiança se o Iva fosse a 6% não teria feito a obra...era um orçamento de mão-de-obra, deixou-nos que fossemos nós a escolher as loiças, electrodomésticos...paguei 650,00 euros naquela altura em envelope...” A testemunha FC que com o réu BV vivia sobre esta matéria disse “...O orçamento era de 27.417,00 euros com Iva a 6% fizemos transferências de 27.043,00 euros entregamos 650,00 euros num envelope ele pegou no dinheiro e foi-se embora...”. Fosse o orçamento combinado o de 26.750,00 euros ou de 27.417,00 euros com IVA a 6% já incluído, tendo entregue o mencionado valor de 27.000,43 euros, o valor alegadamente entregue de 650,00 euros não corresponde ao remanescente em dívida. Se não corresponde ao valor em dívida de IVA_nem a 6 nem a 23%_ se o Réu sempre negou a realização de trabalhos a mais- que de resto não ficaram provados- não se percebe a que propósito é que o Réu iria entregar num envelope aquela valor que não corresponde nem a confissão de dívida de trabalhos a mais nem ao valor do IVA em dívida mesmo na perspectiva do Réu pelo que não havendo nenhuma outra prova que suporte essa entrega não se alcança o modo como o julgado da 1.ª instância alcançou a convicção da entrega desse valor em dinheiro que nenhum sentido faz, razão pela qual, procedendo nessa parte a apelação da Autora, no ponto 7 se elimina a parte final “...e €650,00 em dinheiro em 22.1.2021, num total de €27.650,43.”
    III.4. No recurso da Autora saber se, alterando-se a decisão recorrida também no tocante à factura 2021/2, quanto aos trabalhos a mais realizadas pela autora o pedido procede na sua totalidade.
    III.4.1. Como acima se disse não ficou provado nem o acordo nem a realização de trabalhos a mais pelo que o valor dessa factura não é devida, improcedendo a apelação da Autora quanto a esse ponto.
    III.5. No que toca ao recurso subordinado do Réu saber se ocorre na decisão recorrida erro de interpretação e aplicação das disposições legais do CIVA sendo aplicável ao caso a taxa reduzida de 6% e não a de 23% que a Autora fez constar das facturas.
    III.5.1. O Tribunal deu como não provado e não vem impugnado no recurso subordinado que  “A autora concordou que a taxa do IVA aplicável fosse de 6%.”-ponto 17. Entendeu-se na decisão recorrida que:
  • O valor da proposta final adjudicada foi de €25.865,75, acrescida de IVA.
  • O réu invoca que o valor do IVA é de 6%.
  • Nos termos do disposto no artigo 18.º do Código do IVA (Taxas do imposto): “1. As taxas do imposto são as seguintes:  a) Para as importações, transmissões de bens e prestações de serviços constantes da lista I anexa a este diploma, a taxa de 6%; (…) b) Para as importações, transmissões de bens e prestações de serviços constantes da lista II anexa a este diploma, a taxa de 13%;  c) Para as restantes importações, transmissões de bens e prestações de serviços, a taxa de 23%.  (…)” Nos termos da Lista I anexa: “2.23 - Empreitadas de reabilitação urbana, tal como definida em diploma específico, realizadas em imóveis ou em espaços públicos localizados em áreas de reabilitação urbana (áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, zonas de intervenção das sociedades de reabilitação urbana e outras) delimitadas nos termos legais, ou no âmbito de operações de requalificação e reabilitação de reconhecido interesse público nacional.”
  • A fls. 43 encontra-se documento emitido pela Câmara Municipal de Lisboa, de 29.1.2021, declarando que a morada do apartamento se encontra em área de reabilitação urbana, desde a entrada em vigor do aviso n.º 8391/2015, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 148, de 31 de Julho de 2015.
  • O réu demonstrou que à data da contratação o imóvel encontrava-se em área de reabilitação urbana.
  • Todavia, não se afigura que esta norma seja aplicável, atenta a referência a espaços públicos e a reconhecido interesse público nacional.
  • Nos termos da Lista I anexa: “2.27 - As empreitadas de beneficiação, remodelação, renovação, restauro, reparação ou conservação de imóveis ou partes autónomas destes afetos à habitação, com exceção dos trabalhos de limpeza, de manutenção dos espaços verdes e das empreitadas sobre bens imóveis que abranjam a totalidade ou uma parte dos elementos constitutivos de piscinas, saunas, campos de ténis, golfe ou minigolfe ou instalações similares. A taxa reduzida não abrange os materiais incorporados, salvo se o respetivo valor não exceder 20 % do valor global da prestação de serviços.”
  • Em causa está uma empreitada de remodelação de apartamento.
  • O valor dos materiais incorporados é superior a 20% do valor global da empreitada, pelo que nunca seria aplicável a taxa reduzida aos materiais.
  • O orçamento apresentado pela autora descreve os trabalhos a realizar, que agrupa em três “capítulos”, referindo não o preço de cada trabalho, nem dos materiais, mas o preço de cada conjunto de trabalhos, e o preço final, soma de 3 preços.
  • Também nas faturas não foram autonomizados o preço de cada material, nem de cada serviço, constando apenas o preço de cada trabalho realizado com, ou sem fornecimento de material.
  • O réu adjudicou o orçamento referido. No orçamento adjudicado não foi indicado o preço dos materiais - ao qual não é aplicável a taxa reduzida - e o preço dos serviços, à qual seria aplicável a taxa reduzida.
  • Todavia, afigura-se que esta norma pressupõe a indicação dos trabalhos realizados pelo empreiteiro e respetivo valor; e a indicação dos materiais utilizados e respetivos valores – o que não corresponde ao orçamento apresentado pela autora e aceite pelo réu, pelo que esta norma não é aplicável à empreitada em causa, pelo exposto, não é de aplicar a taxa reduzida, importando concluir que o IVA é à taxa de 23%, cf. alínea c).
  • O valor da proposta final adjudicada foi de €25.865,75, acrescida de IVA de 23% de €5.949,12, num total de €31.814,87. O réu pagou à autora um total de €27.000,43, por transferências bancárias, e €650,00 em dinheiro em 22.1.2021, num total de €27.650,43, o réu deve à autora a quantia de €4.164,44.
    III.6.2. Discordando, em suma, diz o Réu no recurso subordinado.
  • o ponto 2.23 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, ao dispor que a taxa de 6% é aplicável a “Empreitadas de reabilitação urbana, tal como definida em diploma específico, realizadas em imóveis ou em espaços públicos localizados em áreas de reabilitação urbana (áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, zonas de intervenção das sociedades de reabilitação urbana e outras) delimitadas nos termos legais, ou no âmbito de operações de requalificação e reabilitação de reconhecido interesse público nacional” (sublinhados e destacados nossos), pretende elencar situações alternativas e não cumulativas.
  • Ou seja, de acordo com a mencionada Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a taxa reduzida de 6% será aplicada nas seguintes situações alternativas: (i) Empreitadas de reabilitação urbana (tal como definida em diploma específico) realizadas em imóveis localizados em áreas de reabilitação urbana delimitadas nos termos legais; ii) Empreitadas de reabilitação urbana (tal como definida em diploma específico) realizadas em espaços públicos localizados em áreas de reabilitação urbana delimitadas nos termos legais; ou (iii) Empreitadas de reabilitação urbana (tal como definida em diploma específico) no âmbito de operações de requalificação e reabilitação de reconhecido interesse público nacional.
  • Neste sentido, veja-se, por exemplo, o Parecer Técnico PT 20008 da Ordem dos Contabilistas, que transcreve.
  • Esta é também a interpretação plasmada na Informação Vinculativa da Autoridade Tributária de 4 de janeiro de 2011, nos termos da qual, ao pedido formulado pelo requerente “(...) acerca da possibilidade de aplicar a taxa reduzida de IVA, a que se refere a verba 2.23 da Lista I anexa ao CIVA, a empreitadas de reabilitação urbana de imóveis situados no centro urbano de Santarém”, a resposta dada foi que: (i) “(...) cabe ao respectivo Município, neste caso Santarém (...) delimitar as zonas de reabilitação urbana”; e (ii) “Se estiver em causa uma empreitada de reabilitação urbana nas condições anteriormente referidas, se o imóvel estiver situado numa zona legalmente delimitada como área de reabilitação urbana, (...) é tributada à taxa reduzida de IVA, a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 18º do CIVA, que, actualmente, é de 6 %”. (vide http://www.taxfile.pt/file_bank/news0913_13_1.pdf - sublinhado e destacado nossos).
  • Mesmo que este Tribunal ad quem assim não o entenda, o que apenas se admite por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que o segundo argumento invocado pelo Tribunal a quo para a não aplicação da taxa reduzida de IVA, referente ao disposto no ponto 2.27 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, não pode igualmente proceder.
  • Conforme se encontra explicitado no Oficio-Circulado n.º 30.135 da Autoridade Tributária e Aduaneira (no respetivo ponto 4), consideram-se "beneficiários" da aplicação da taxa reduzida de IVA, ao abrigo do mencionado ponto 2.27 (na qualidade de donos da obra), o proprietário, o locatário ou o condomínio.
  • Compreende-se o alcance dado à norma, uma vez que o que está na origem da redução do IVA prevista pelo legislador nestas situações é o benefício dos serviços com características de alta intensidade de fator de trabalho, dos quais se pode destacar, por exemplo, as recuperações de imóveis antigos em que o fator “trabalho” constitui a maioria dos custos para os proprietários.
  • Sucede que, a pessoa ou entidade que poderá autonomizar, na factura emitida para o efeito, o preço de cada material e serviço ou determinar se o valor dos materiais incorporados é superior a 20% do valor global da empreitada é o empreiteiro, ora conforme referido acima, o empreiteiro não é a pessoa que o legislador pretendeu beneficiar ao prever a redução do IVA nestas situações, o empreiteiro, na realidade, nada tem que ver com o espírito que se encontra por trás da redação da disposição legal ora em análise, podendo, em muitas situações, a sua aplicabilidade ser-lhe prejudicial e levar, inclusivamente, a uma atuação por parte do empreiteiro no sentido de pugnar pela aplicabilidade do IVA à taxa normal nas empreitadas. Por esse motivo, a análise da aplicação da regra dos 20% prevista no ponto 2.27 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado não pode ser feita de forma automática.
  • Com efeito, apenas quando percebeu que o Recorrido não concordava com a factura referente a trabalhos a mais – que o Tribunal a quo confirmou, e bem, que não existiram – é que a Recorrente decidiu emitir uma fatura com o IVA a 23%.
  • Este é, inclusivamente, o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, que se encontra plasmado no Acórdão de 13 de dezembro de 2022, num caso recente e muito semelhante àquele que está em causa nos presentes autos, do qual consta o seguinte: “Temos pois (como é entendimento da AT, constante da informação vinculativa de 02/08/2017, proferida no processo n.º 1...) que a empreitada dos autos reunia requisitos para lhe ser aplicado IVA à taxa reduzida de 6%, o que aconteceria, na totalidade, se as faturas explicitassem os serviços prestados – autonomizando os valores dos serviços prestados e dos materiais incorporados – e o valor percentual dos materiais incorporados na empreitada representassem um valor menor ou igual a 20% do custo total da mesma; e, caso estes/materiais ultrapassassem tais 20%, só estes/materiais seriam tributados à taxa normal de 23%, continuando o valor dos serviços a ser tributado à taxa reduzida de 6%. Sucede que a R. não fez qualquer explicitação/autonomização nas duas faturas referidas, antes se limitando a mencionar “remodelação de apartamento”, hipótese em que a AT entende que todo o valor é tributado à taxa normal de 23%. Assim sendo, aqui chegados, não podemos deixar de considerar que é devido/imputável ao modo “descuidado” como a R. procedeu à faturação da empreitada que a mesma, que reunia requisitos para lhe ser aplicado IVA à taxa reduzida de 6%, deixa de beneficiar de tal taxa reduzida, pelo que, sendo assim, não pode a R. repercutir sobre o A. o seu “lapso” – não alegando/provando sequer qual a percentagem de materiais incorporados na empreitada (e/ou que tal percentagem foi superior a 20%) – e, por conseguinte, a R. só pode exigir ao A. IVA à taxa reduzida de 6% sobre os € 22.590,00 do preço, ou seja, tão só € 1.355,40.” (disponível em https://jurisprudencia.pt/acordao/211783/ - sublinhados e destacados nossos).
  • Decorre assim de tudo o que se acaba de expor que, e salvo o devido respeito, não se pode aceitar a posição tomada pelo Tribunal a quo na Sentença no que respeita a esta matéria, devendo, por isso, o Tribunal ad quem decidir pela aplicação do ponto 2.27 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ao caso sub judice, concluindo pela aplicabilidade da taxa reduzida de IVA a 6% à empreitada.
    III.6.3.  Dispõe o Artigo 36.º do CIVA “Prazo de emissão e formalidades das facturas”(sublinhados nossos)
    1 - A fatura referida na alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º deve ser emitida:
    a) O mais tardar no 5.º dia útil seguinte ao do momento em que o imposto é devido nos termos do artigo 7.º;
    b) O mais tardar no 15.º dia do mês seguinte àquele em que o imposto é devido nos termos do artigo 7.º, no caso das prestações intracomunitárias de serviços que sejam tributáveis no território de outro Estado membro em resultado da aplicação do disposto na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º;
    c) Na data do recebimento, no caso de pagamentos relativos a uma transmissão de bens ou prestação de serviços ainda não efetuada, bem como no caso em que o pagamento coincide com o momento em que o imposto é devido nos termos do artigo 7.º.
    (*Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013)
    2 - Nos casos em que seja utilizada a emissão de facturas globais, o seu processamento não pode ir além de cinco dias úteis do termo do período a que respeitam.
    3 - As faturas são substituídas por guias ou notas de devolução, quando se trate de devoluções de mercadorias anteriormente transacionadas entre as mesmas pessoas, devendo a sua emissão processar-se o mais tardar no 5.º dia útil seguinte à data da devolução.  (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013).
    4 - Os documentos referidos nos números anteriores devem ser processados em duplicado, destinando-se o original ao cliente e a cópia ao arquivo do fornecedor.
    5 - As faturas devem ser datadas, numeradas sequencialmente e conter os seguintes elementos: (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013
    a) Os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente sujeito passivo do imposto, bem como os correspondentes números de identificação fiscal; (Redação dada pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro)
    b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efectivamente transaccionadas devem ser objecto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução;
    c) O preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável;
    d) As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido;
    e) O motivo justificativo da não aplicação do imposto, se for caso disso;
    f) A data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efectuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da factura.
    No caso de a operação ou operações às quais se reporta a factura compreenderem bens ou serviços sujeitos a taxas diferentes de imposto, os elementos mencionados nas alíneas b), c) e d) devem ser indicados separadamente, segundo a taxa aplicável.
    6 - As guias ou notas de devolução e outros documentos retificativos de faturas devem conter, além da data e numeração sequencial, os elementos a que se refere a alínea a) do número anterior, bem como a referência à fatura a que respeitam e as menções desta que são objeto de alterações (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013) 
    7 - Os documentos emitidos pelas operações assimiladas a transmissões de bens pelas alíneas f) e g) do n.º 3 do artigo 3.º e a prestações de serviços pelas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 4.º devem mencionar apenas a data, natureza da operação, valor tributável, taxa de imposto aplicável e montante do mesmo.
    8 - Pode o Ministro das Finanças, relativamente a sujeitos passivos que transmitam bens ou prestem serviços que, pela sua natureza, impeçam o cumprimento do prazo previsto no n.º 1, determinar prazos mais dilatados de facturação.
    9 - No caso de sujeitos passivos que não disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional, que tenham nomeado representante nos termos do artigo 30.º, as faturas emitidas, além dos elementos previstos no n.º 5, devem conter ainda o nome ou denominação social e a sede, estabelecimento estável ou domicílio do representante, bem como o respetivo número de identificação fiscal. (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013)
    10 - As faturas podem, sob reserva de aceitação pelo destinatário, ser emitidas por via eletrónica.(Redação dada pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro)
    11 - A elaboração de faturas por parte do adquirente dos bens ou dos serviços fica sujeita às seguintes condições:  (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013) 
    a) A existência de um acordo prévio, na forma escrita, entre o sujeito passivo transmitente dos bens ou prestador dos serviços e o adquirente ou destinatário dos mesmos;
    b) O adquirente provar que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços tomou conhecimento da emissão da factura e aceitou o seu conteúdo.
    c) Conter a menção 'autofaturação'(Aditado pelo D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013)
    12 - (Revogado. (*)) (Pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro)
    13 - Nas situações previstas nas alíneas i), j), l), m) e n) do n.º 1 do artigo 2.º, bem como nas demais situações em que o destinatário ou adquirente for o devedor do imposto, as faturas emitidas pelo transmitente dos bens ou prestador dos serviços devem conter a expressão 'IVA - autoliquidação'. (Redação do Decreto-Lei n.º 85/2022, de 21/12 - Produz efeitos a partir de 1 de janeiro de 2023)
    14 - (Revogado.) (Pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro)
    15 - (Revogado.) (Pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro)
    16 - A indicação na fatura do número de identificação fiscal do adquirente ou destinatário não sujeito passivo é sempre obrigatória quando este o solicite.
     (Aditado pelo D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013)
    17 - A regulamentação do processamento e arquivo das faturas e documentos retificativos de faturas consta de legislação especial.
     (Aditado pelo Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro)
    III.6.4. Actualmente, na lista I do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), estão previstas duas verbas que permitem beneficiar de uma taxa reduzida de 6%: nas (i) empreitadas de reabilitação urbana (verba 2.23), e nas (ii) empreitadas realizadas em imóveis afectos à habitação (verba 2.27). A possibilidade de beneficiar de tais taxas reduzidas tem suscitado a necessidade de emissão de diversas informações vinculativas por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”). A aplicação da citada Verba 2.23 depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) Tratar-se de uma empreitada de reabilitação urbana, tal como definida em diploma específico; b) Realizada em imóvel ou espaço público localizado em área de reabilitação urbana, delimitada nos termos legais.      
    III.6.5. No tangente ao conceito de “reabilitação urbana” e seguindo o comando normativo que manda atender à definição constante de diploma específico, devemos convocar o Decreto-Lei n.º 307/2009, de 23 de outubro, que estabelece o regime jurídico da reabilitação urbana, cujo artigo 2.º, alínea j), define “reabilitação urbana” como “a forma de intervenção integrada sobre o tecido urbano existente, em que o património urbanístico e imobiliário é mantido, no todo ou em parte substancial, e modernizado através da realização de obras de remodelação ou beneficiação dos sistemas de infraestruturas urbanas, dos equipamentos e dos espaços urbanos ou verdes de utilização coletiva e de obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação ou demolição dos edifícios”. Não basta que a obra se integra em área de reabilitação urbana é necessário que a Câmara certifique que as obras realizadas constituíram uma intervenção de reabilitação urbana, ao abrigo do disposto na al. j) do art. 2.º do Regime Jurídico de Reabilitação Urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 307/2009, de 23 de outubro, na sua atual redação” (cf. facto provado r)). [3]
    III.6.6. O facto sob 13 não permite concluir tal, pelo que não se está perante a situação prevista no ponto 2.23 da Lista Anexa ao Código do CIVA.
    III.6.7. Vejamos agora a situação prevista no ponto 2.27 da lista anexa ao CIVA. Verdade que do orçamento não consta o valor da taxa nem vem provado que, não obstante o Réu o ter referido à Autora esta tenha concordado com a aplicação a taxa reduzida de 6%. Verifica-se que, em primeiro lugar, é necessário que se esteja perante um contrato de empreitada, nos termos do artigo 1207.º e ss. do Código Civil, o que implica, obrigatoriamente, a realização de uma obra global, segundo parâmetros contratualmente previstos entre o dono da obra e o empreiteiro, vertidos num documento escrito (desde logo para efeitos de prova), por um preço previamente estipulado, é o caso. A Autoridade Tributária tem entendido que, quer uma empreitada realizada em parte comum de prédio constituído em propriedade horizontal, adjudicada pelo condomínio, quer uma obra adjudicada pelo proprietário ou mesmo pelo arrendatário, poderão beneficiar da aplicação da taxa reduzida de IVA. A jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Sul o Acórdão correspondente ao proc. 3078/05.7BELSB, de 25.06.2019, já veio defender que apenas releva para a aplicação da taxa reduzida o tipo de empreitada e o destino dos imóveis, e não o adquirente dos serviços de empreitada. Relativamente aos materiais contemplados na empreitada, poderão beneficiar da aplicação da taxa reduzida, desde que não ultrapassem 20% do valor global da mesma. Nos termos da informação vinculativa correspondente ao processo n.º 15421, por despacho de 02.09.2019, da Directora de Serviços do IVA, defende a AT que, se os materiais representarem um valor menor ou igual a 20% do custo total da empreitada, a taxa aplicável será, na totalidade, a taxa reduzida de IVA. Mas se aqueles materiais representarem mais de 20% do valor global da mesma, o empreiteiro deverá ter em conta o seguinte: a) se na facturação forem autonomizados os valores do serviço prestado e dos materiais, deve aplicar-se a taxa reduzida aos serviços, e a taxa normal às transmissões de bens; b) se a factura for emitida pelo preço global da empreitada, não tem aplicação a verba 2.27, devendo o valor da empreitada ser tributado globalmente à taxa normal de IVA.
    III.6.7. No caso dos autos não há apenas uma factura, há várias desde logo a primeira factura 2020/24 de 3/10/2020, no valor de 7.759,70 euros sem discriminação de serviços ou bens com IVA a 23% no montante de 9.544,43 euros e que o Réu pagou sem reclamar, do que, diz na oposição, se arrependeu posteriormente porque sempre se convencera de que o IVA aplicável era de 6%, convencimento que não era partilhado pela empreiteira, ao que tudo indica. Temos também a factura 2021/2 de 28/1/2021 no valor de 3.795,53 euros onde vêm discriminados vários parciais relativos aos serviços prestados com a taxa a 23% por exemplo fornecimento e montagem de estores de 118,00 euros e outros a 23%. Mais se prova e não vem impugnado que “15.Nas faturas emitidas não foram autonomizados os valores dos serviços prestados e dos materiais, constando apenas o preço de cada trabalho realizado com, ou sem, fornecimento de material. 16.   O valor dos materiais incorporados na obra é superior a 20% do valor total da empreitada.”. Entende o recorrente BV que tal não releva para efeitos da aplicação da taxa de 6% , ao arrepio do entendimento das informações vinculativas da Autoridade Tributária como se disse e traz à colação o teor do ACSTJ de 13/12/2022. Diz-se no mencionado Acórdão, com matéria de facto diferente da deste processo, na parte que releva “...O Acórdão recorrido, a tal propósito, verteu a seguinte e sucinta fundamentação: Não foi possível apurar se os materiais incorporados na empreitada representaram um valor menor ou igual a 20% do custo total da obra. Só nesse caso é que o IVA seria reduzido a 6%. Não se tendo alcançado tal facto cabe aplicar o IVA à taxa normal. Assim deve o A pagar à a quantia a quantia de € 5.195,70... Temos pois (como é entendimento da AT, constante da informação vinculativa de 02/08/2017, proferida no processo n.º 1...) que a empreitada dos autos reunia requisitos para lhe ser aplicado IVA à taxa reduzida de 6%, o que aconteceria, na totalidade, se as faturas explicitassem os serviços prestados – autonomizando os valores dos serviços prestados e dos materiais incorporados – e o valor percentual dos materiais incorporados na empreitada representassem um valor menor ou igual a 20% do custo total da mesma; e, caso estes/materiais ultrapassassem tais 20%, só estes/materiais seriam tributados à taxa normal de 23%, continuando o valor dos serviços a ser tributado à taxa reduzida de 6%. Sucede que a R. não fez qualquer explicitação/autonomização nas duas faturas referidas, antes se limitando a mencionar “remodelação de apartamento”, hipótese em que a AT entende que todo o valor é tributado à taxa normal de 23%. Assim sendo, aqui chegados, não podemos deixar de considerar que é devido/imputável ao modo “descuidado” como a R. procedeu à faturação da empreitada que a mesma, que reunia requisitos para lhe ser aplicado IVA à taxa reduzida de 6%, deixa de beneficiar de tal taxa reduzida, pelo que, sendo assim, não pode a R. repercutir sobre o A. o seu “lapso” – não alegando/provando sequer qual a percentagem de materiais incorporados na empreitada (e/ou que tal percentagem foi superior a 20%) – e, por conseguinte, a R. só pode exigir ao A. IVA à taxa reduzida de 6% sobre os € 22.590,00 do preço, ou seja, tão só € 1.355,40...”. Ora, prova-se e não vem posto em causa, que o valor dos materiais incorporados é de valor superior a 20%, não obstante as facturas não discriminarem os valores respeitantes aos materiais incorporados, assim sendo, salvo melhor opinião, não obstante a factura não discriminar o valor desses materiais, não podia a factura nunca ser emitida a 6% seguindo ainda o entendimento da Autoridade Tributária sobre essa matéria[4]. Pelas razões expostas conclui-se não haver qualquer erro de interpretação e aplicação das disposições legais do CIVA sobre a questão do IVA facturado.
    III.7. No recurso da Autora, saber se sobre o valor de 4 164,44 euros da condenação, tal montante é devido deste da data de vencimento da factura que lhe dá origem, 28/01/2021, sendo a obrigação de pagamento dos juros legais, desde a data de emissão da factura até integral pagamento.
    III.7.1. Entendeu-se em suma na decisão recorrida sobre essa matéria:
  • O valor da proposta final adjudicada foi de €25.865,75, acrescida de IVA de 23% de €5.949,12, num total de €31.814,87. O réu pagou à autora um total de €27.000,43, por transferências bancárias, e €650,00 em dinheiro em 22.1.2021, num total de €27.650,43. O réu deve à autora a quantia de €4.164,44.
  • Nos termos do disposto no artigo 804.º, 805.º, n.º 1, do Código Civil e 806.º, n.º 1, e n.º 2, são devidos juros de mora, à taxa legal, desde a citação.
    III.7.2. Sustenta a Autora que a factura que dá origem à condenação no pagamento dos 4. 164,44 eur data de 28/01/2021, admitindo o próprio R. que nessa mesma data foi interpelado pela A. para pagamento, através de e-mail, não tendo realizado tal pagamento o R. constitui-se em mora pelo que decorre da Lei a obrigação de pagamento dos juros legais.
    III.7.3. Já acima se disse que se não provou a entrega dos 650,00 euros pelo que tendo o Réu pago 27.000,43 euros de um total de 31.814,87 euros, está em dívida 4.814,44 euros nessa parte procedendo a apelação como se disse. Os 4.814,44 euros resultam da factura de …/…/…? A Autora alegou efectivamente que no final da obra ainda havia valores a facturar faltava facturar do orçamento original, por isso foi emitida fatura n.º …/… no montante de €18.106,05, acrescidos de IVA no valor de €4.164,39. O que consta dos factos dados como provados é entre o mais que “A autora emitiu faturas com o IVA a 23%” e que “do valor orçamentado O réu pagou à autora um total de €27.000,43, por transferências bancárias”. Não consta dos factos dados como provados que o Autor e o Réu acordaram em que o valor constantes das facturas era devido na data da emissão das mesmas e que o Réu foi interpelado para pagar na data da emissão daquela factura referida, assim como não consta dos factos dados como provados em que datas foram feitos os pagamentos parciais, designadamente o que foi pago em relação à mencionada factura 2021/1 e em que data, também não é possível considerar admitido por acordo tais factos por falta de alegação expressa para além do que o Réu sempre pôs em causa o valor da taxa de incidência do IVA referente ao valor dessa factura e das outras. Assim sendo, não procede nessa parte a apelação por se não comprovar o disposto no art.º 805/2/a do CCiv, sendo os juros devidos desde a citação como decidido na decisão recorrida (art.º 805/1 do CCiv).

    IV- DECISÃO
    Tudo visto acordam os juízes em:
    a) julgar parcialmente procedente o recurso principal da Autora, razão pela qual se revoga a decisão recorrida quanto ao valor a pagar pelo réu, que é de 4.814,44 euros (quatro mil oitocentos e quatorze euros e quarenta e quatro cêntimos),
    b) julgar improcedente o recurso subordinado do réu.
    c) confirmar no mais a decisão recorrida.
    Regime da Responsabilidade por Custas: as custas do recurso principal são da responsabilidade da autora e réu na proporção de decaimento, as do recurso subordinado são da responsabilidade do réu, que decai (art.º 527/1 e 2)

    Lisboa, 21-03-2024
    Vaz Gomes
    Carlos Gabriel Castelo Branco
    Arlindo Crua
    _______________________________________________________
    [1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/7, atento o disposto nos art.º 5/1, 8, e 7/1 (a contrario sensu) e 8 da mesma Lei que estatuem que o novel Código de Processo Civil entrou em vigor no dia 1/09/2013 e que se aplica imediatamente, atendendo a que injunção deu entrada em 2021 e a data da decisão recorrida que é de ; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
    [2] Recursos em Processo Civil, Novo Regime, Almedina, 2008, págs.
    [3] Cfr entre outros o Acórdão do Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Administrativa, vulgo CAAD, de 8/5/2023 no processo 603/2022-T, disponível on line.
    [4] Pode ler-se no Ofício 30135 de 26/9/2012, disponível on line sob 8 o seguinte: “A parte final a da verba 2.27 estabelece que se os materiais incorporados na empreitada representarem um valor menor ou igual a 20% do custo total da mesma, a taxa aplicável será na totalidade, a taxa reduzida. Se aqueles materiais representarem mais de 20% do valor global da mesma, o empreiteiro deve ter em conta o seguinte: se na facturação emitida forem autonomizados os valores dos serviços prestados (mão de obra) e dos materiais, deve ser aplicada a taxa reduzida nos serviços prestados e a taxa normal aos materiais; se a factura for emitida pelo preço global da empreitada não tem aplicação a verba 2.27, devendo o seu valor ser globalmente tributado à taxa normal”