Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
839/21.3T8VFX.L1-4
Relator: PAULA PENHA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
RENOVAÇÃO
OPOSIÇÃO
PRAZO
DESPEDIMENTO ILÍCITO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/06/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: I – Em consonância com o princípio constitucional da segurança no emprego, a contratação laboral a termo resolutivo, sendo precária, sempre foi e continua a ser considerada como atípica, estando sujeita a regras legais, específicas e rígidas, destinadas a controlar quer a sua celebração, quer a sua execução, quer a sua cessação contratual.
II – A oposição da empregadora à renovação automática (de um contrato de trabalho a termo certo resolutivo) só é válida e eficaz: se for expressa por escrito; se a mensagem contida nesse escrito for, por si só, inequívoca e perceptível; e se a tomada de conhecimento pelo destinatário ou a chegada ao poder do respectivo destinatário, pelo menos, ocorrer com 15 dias de antecedência relativamente ao final do respectivo prazo.
III – Sendo tardia, essa comunicação extintiva da empregadora será insusceptível de produzir o efeito pretendido pela empregadora que era o da cessação do contrato por caducidade. Mas – contrariamente ao que sucederia se não tivesse havido qualquer declaração (em que se operaria a renovação contratual automática) –, neste caso, como tal declaração da empregadora continha uma, expressa e inequívoca, extinção deste vínculo contratual, com a destinatária sua trabalhadora, a partir de determinada data, então, nessa mesma data, operou-se, por iniciativa da empregadora, a extinção deste vínculo contratual que existia ambas as partes.
IV – Esta cessação contratual, operada por iniciativa da empregadora, carece de cobertura legal porque desprovida de prévio procedimento legal ou de qualquer outro motivo justificativo previsto no elenco de válidas modalidade de cessação contratual. Por isso, configurando um despedimento ilícito da trabalhadora.
(sumário da autoria da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

Relatório
Na acção, com processo comum nº 839/21.3T8VFX do J1 do Juízo do Trabalho de Vila Franca de Xira, intentada por AA contra Mosca Portugal, Ldª, a autora pediu (transcrição):
«  a) Ser declarado ilícito o despedimento da Autora;
b) Ser a Ré condenada a reintegrar a Autora no mesmo estabelecimento, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, e a pagar à Autora as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, no valor mensal de 2.264,94€ (dois mil duzentos e sessenta e quatro euros e noventa e quatro cêntimos);
c)  Se a Autora não optar pela reintegração, ser a Ré condenada ao pagamento de indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais, que não deve ser inferior às retribuições que a Autora deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, no valor actual de 24.300,00€ (vinte e quatro mil e trezentos euros);
d) Ser a Ré condenada a pagar à Autora diferenças salariais devidas no acerto de contas realizado na cessação do contrato de trabalho, no valor de 750,09€ (setecentos e cinquenta euros e nove cêntimos);
e)  Ser a Ré condenada a pagar à Autora dois dias de férias não gozadas, no valor de 196,36€ (cento e noventa e seis euros e trinta e seis cêntimos);
f)  Ser a Ré condenada a pagar à Autora trabalho suplementar e nocturno prestado em dias úteis, no valor de 19.626,92€ (dezanove mil, seiscentos e vinte e seis euros e noventa e dois cêntimos);
g)  Ser a Ré condenada a pagar à Autora trabalho suplementar prestado em dias de descanso, no valor de 2.592,00€ (dois mil, quinhentos e noventa e dois euros);
h)  Ser a Ré condenada a pagar juros de mora legais vencidos e vincendos sobre todas as quantias peticionadas até integral pagamento;
i)  Ser a Ré condenada no pagamento das custas e demais despesas legais.»
A ré contestou, concluindo pela improcedência da acção e pela condenação da autora como litigante de má-fé.
A autora respondeu ao pedido de condenação como litigante de má-fé, concluindo pela improcedência de tal pretensão.
Efectuada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença com a seguinte parte decisória (transcrição):
« IV – Dispositivo
Termos em que, com a fundamentação de facto e de direito enunciada, se decide julgar a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência:
a)  Declarar a ilicitude da cessação do contrato determinada pela ré a 8-6-2020;
b)  Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 6 480,00€ (seis mil, quatrocentos e oitenta euros) a título de indemnização nos termos do art.º 393º nº 2 al a) do Código do Trabalho;
c)  Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 25,92€ (vinte e cinco euros e noventa e dois cêntimos) a título de remanescente de compensação nos termos do art.º 344º nº 2 do Código do Trabalho;
d)  Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 6 480,00€ (seis mil, quatrocentos e oitenta euros) a título de remuneração mensal base devida entre 9-6-2020 e 8-9-2020, deduzida das importâncias que a mesma, comprovadamente, tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e dos valores suportados pela segurança social a título de subsídio de desemprego ou retribuições que deverão ser entregues a esta entidade;
e) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 576,00€ (quinhentos e setenta e sies euros) a título de remuneração dos primeiros oito dias de Junho de 2020;
f) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 314,82€ (trezentos e catorze euros e oitenta e dois cêntimos) a título de subsídio de alimentação no período entre 9-6-2020 e 8-9-2020;
g) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 100,17€ (cem euros e dezassete cêntimos) a título de remanescente do valor do recibo de Maio de 2020;
h) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 588,00€ (quinhentos e oitenta eito euros) a título de proporcionais de subsídio de natal do ano de cessação do contrato (2020);
i) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 540,00€ (quinhentos e quarenta euros) a título de proporcionais de subsídio de férias do ano de cessação do contrato (2020);
j) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de 196,36€ (cento e noventa e seis euros) a título de remuneração de dois dias de férias não gozados;
l) Condenar a ré a pagar à autora os juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4,00%, contabilizados sobre os valores referidos em d), e), f) e g) desde o último dia do mês a que respeitam e valor então devido, e desde 8-9-2020 em relação aos demais valores (b), c), h), i) e j)), sempre até efectivo e integral pagamento;
m) Absolver a ré quanto ao mais peticionado;
n) Condenar, na proporção dos seus decaimentos e sem prejuízo da isenção da autora, autora e ré nas custas da acção. »
Inconformada, a ré interpôs recurso desta decisão, tendo terminado as respectivas alegações com as seguintes conclusões e o seguinte pedido (transcrição) :
«a. A R insurge-se contra as ilações tiradas pelo Tribunal quanto à comunicação que consta do facto provado n.º 8, por entender que as mesmas não resultam do teor literal do mesmo, da sua relação com outros e-mails trocados e ainda pela prova testemunhal produzida, como veremos nos pontos abaixo;
b. Em primeiro lugar, o Tribunal a quo considerou que “em ponto algum da dita comunicação a ré dirige à autora declaração de vontade no sentido da não renovação do contrato” (página 14 da douta sentença, terceiro parágrafo);
c. Esta conclusão não corresponde ao teor da mensagem de correio electrónico que integra a decisão de facto, pois a mesma faz menção expressa à não renovação do contrato de trabalho e ainda ao “fim do contrato”;
d. Como resulta do facto provado n.º 8, a R faz a comunicação da não renovação do contrato de trabalho, ainda que por remissão para a conversa tida entre as partes dias antes. Mas, ao mesmo tempo, comunica, naquela mensagem de correio electrónico: o “fim do contrato”;
e. E quando a R comunica, o fim do contrato, já não o está a fazer por remissão a conversa anterior. Trata-se de uma menção autónoma, sob o ponto de vista formal (pois mereceu um parágrafo diferente) e material (dado que surge no contexto de concretizar o termo do contrato, no que diz respeito aos aspectos atinentes à posse pela trabalhadora de meios de trabalho que lhe competia entregar, por causa do fim do contrato);
f. A este propósito também importa ter presente que a A respondeu a essa mensagem de correio electrónico. É certo que essa mensagem não foi considerada no elenco dos factos provados, mas, cremos, reveste importância suficiente para ser considerada;
g. E, segundo essa mensagem de correio electrónico, a A respondeu à comunicação do facto provado n.º 8, no dia 20 de Maio, de 2020, pelas 20h51m56s, mencionando a devolução do telemóvel e pedindo desculpa por ainda não o ter devolvido, demonstrando ter entendido o teor da comunicação enviada, ou seja, o fim do contrato;
h. Isto mesmo é ainda comprovado pelas declarações da Testemunha BB acima transcritas;
i. Em segundo lugar, o Tribunal entendeu ainda que não foi intenção daquela mensagem de correio electrónico opor-se à não renovação do contrato de trabalho, pois, se assim fosse “a ré não teria deixado de emitir declaração, expressa e inequivocamente dirigida à autora, nesse sentido, reiterando o conteúdo da declaração de vontade que constava da carta”;
j. Este argumento do Tribunal, embora pertinente acaba por ser complexo. E é complexo porque, por um lado, a própria trabalhadora, nos seus articulados, não tomou essa posição perante a referida mensagem de correio electrónico. A este propósito, a resposta da A é omissa. O que é relevante pois, não foi o entendimento da A, que a R não tinha a intenção de comunicar a não renovação do contrato de trabalho, com aquela mensagem;
k. Se considerarmos o depoimento prestado pela testemunha BB (supra transcrito) e que foi a autora da referida mensagem de correio electrónico, podemos verificar que a mesma afirmou que comunicou na mensagem de correio electrónico, o que havia sido comunicado verbalmente, ou seja, a não renovação do contrato de trabalho;
l. Adicionalmente, percebe-se pela letra do documento, que foi inequívoca a intenção em formalizar a comunicação de não renovação do contrato de trabalho, em face da devolução da carta que havia sido expedida previamente para esse efeito. Até porque, a própria declarante solicita expressamente à A para solicitar uma cópia da mesma no escritório, aquando da entrega do documento;
m. Pelo que, ainda que se entenda que o fito principal da referida comunicação era a entrega do telemóvel de trabalho que a A mantinha na sua posse, a comunicação do fim do contrato de trabalho da A acaba por ser incontornável, ainda que com maior ou menor intensidade;
n. Em terceiro lugar, ainda quanto à mesma comunicação, o Tribunal refere que, “se o correio electrónico fosse a comunicação de não renovação, não teria a ré posteriormente enviado a carta que a autora veio a recepcionar a 25-5-2020”;
o. Efectivamente, a R procedeu à expedição de nova comunicação, em face da devolução da primeira;
p. Contudo, à semelhança do que resulta da lei, não há definição da lei quanto à forma de comunicação da não renovação do contrato de trabalho. Apenas há a exigência de forma escrita;
q. A opção da expedição por via postal ou por via electrónica, são equivalentes. E, no caso concreto, a expedição por via postal, compreende-se quer sob a perspectiva de repetir a carta previamente expedida, quer, ainda sob a perspectiva de a R não ter confiança que a A fosse acolher o pedido que que lhe fez por escrito na mensagem de correio electrónico, descrita no facto provado n.º 8, ou seja, “Mais informo que a sua carta veio devolvida, assim sendo, deverá solicitar uma cópia da mesma no escritório, aquando da entrega do equipamento, bem com cópia do respectivo modelo RP 5044 e certificado de trabalho” (sublinhado nosso);
r. Por isso, cremos, apesar da segunda carta expedida, não podemos deixar de valorar a comunicação electrónica do dia 20/05/2020;
s. Finalmente e em quarto lugar, argumenta o Tribunal que a funcionária que faz a mensagem de correio electrónico, não refere estar mandatada pela R.;
t. Também neste caso, trata-se de uma questão que não foi suscitada pela A.;
u. Contudo, sempre se dirá que se trata de mensagem que é expedida pela responsável dos recursos humanos;
v.  Circunstância que é reconhecida pela própria A, como resulta das declarações por si prestadas e registadas na acta de audiência de discussão e julgamento datada de 25/10/2021;
w. Sendo por isso válida, no que diz respeito à “autoridade” do remetente, uma vez que a cessação de um contrato de trabalho é uma matéria da competência dos Recursos Humanos.
Termos em que e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, requer a admissão do presente recurso e, julgando-o provado e procedente, (i) requer a revogação da decisão proferida pela Primeira Instância e a sua substituição por outra que, determine a alteração da decisão da matéria de facto, passando a incluir o facto provado n.º 8B nos termos supra, cumulativamente, (ii) decidindo-se que a A teve conhecimento do fim do contrato, no dia 20/05/2020 e absolvendo-se a R da ilicitude do despedimento, julgando-se a oposição à renovação do contrato de trabalho tempestiva, cumulativamente (iii) requer a revogação da condenação da R no pagamento da indemnização pela ilicitude do despedimento em 6.480€, cumulativamente (iv) requer a revogação da condenação da R no pagamento de 6.480 €, ao abrigo do disposto no artigo 390 do Código de Trabalho e cumulativamente (v) requer a revogação da condenação da R no pagamento de 314,82 € a título de subsídio de alimentação. »
A autora apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, mantendo-se toda a fundamentação de facto e de direito da sentença.
Recebidos os autos nesta Relação, a Exmª. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de não merecer reparo a sentença recorrida.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões da recorrente [conforme preveem os artigos 635.º, n.º 4, 637º, nº 2, e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante com a abreviatura CPC), aplicáveis “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (doravante com a abreviatura CPT)] – sem prejuízo do conhecimento oficioso de outras [conforme prevê o art. 608º, n.º 2, parte final, aplicável “ex vi” do art. 663º, n.º 2, parte final, do CPC aplicáveis “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do CPT ] – as questões a decidir são, pela ordem lógica da sua apreciação, as seguintes:
1ª – Há matéria de facto por assentar (face à prova ao teor documental e testemunhal constante dos autos) ?    
2ª – Há erro de julgamento (no tocante à intempestividade da oposição da ré à renovação automática do contrato com a autora) ?
Fundamentação
Atentemos ao teor da fundamentação de facto da sentença recorrida (transcrição):
« Estão provados os seguintes factos:
1. A autora foi admitida ao serviço da ré em 9-9-2019, por contrato de trabalho celebrado, por escrito e nessa data, por um prazo de três meses, renovável por iguais períodos e até três renovações.
2. A autora foi contratada para o exercício das funções de operacional de tráfego, com uma duração semanal de quarenta horas, de segunda a sexta feira, entre as 9 horas e as 18 horas.
3.  Em contrapartida da sua prestação a autora auferia 2 160,00€ de remuneração mensal e subsídio de alimentação no montante de 4,77€ por cada dia de trabalho.
4.  Em 15 de Maio de 2020 a autora reuniu com responsáveis da ré que lhe comunicaram que esta não pretendia renovar o contrato que com ela havia celebrado.
5.  Nesse mesmo dia a ré remeteu, por via postal registada, uma carta datada de 13-5-2020, comunicando à autora a não renovação do contrato.
6.  A referida carta foi enviada para Av. …
7.  Em 19-5-2020 a ré recebeu a carta devolvida com menção de endereço insuficiente ou incorrecto.
8.  No dia 20-5-2020 , pelas 18h08m , a ré, através de uma sua funcionária, dirigiu à autora um correio electrónico no qual, identificando como assunto “Férias”, referia o seguinte: “O combinado entre mim e o Sr CC, aquando da comunicação da sua não renovação do contrato de trabalho no passado dia 15/05/2020, foi proceder à entrega do equipamento no passado dia 18/05, sendo que hoje é dia 20/05, agradeço que proceda à entrega do mesmo amanhã sem falta, sob pena de não se proceder ao pagamento do acerto das suas contas finais, até que proceda à entrega do mesmo. Por outro lado, a empresa agradece que não utilize o equipamento para fins profissionais, nem pessoais, uma vez que se encontra de férias, por motivo de fim de contrato, devendo o mesmo permanecer desligado até à respectiva entrega. Mais informo que a sua carta veio devolvida, assim sendo, deverá solicitar uma cópia da mesma no escritório, aquando da entrega do equipamento, bem com cópia do respectivo modelo RP 5044 e certificado de trabalho.”.
9.  A autora recebeu, nesse dia, o referido correio electrónico.
10.  Em 25-5-2020 a autora recepcionou carta, registada com aviso de recepção, envida pela ré com data de 13-5-2020 na qual lhe comunicava a não renovação do contrato de trabalho a partir de 8-6-2020.
11.  A autora durante a execução do contrato apenas gozou férias de 18-5-2020 a 8-6-2020.
12.  No recibo de contas finais elaborado em Maio de 2020 a ré liquidou 946,08€ de compensação de cessação do contrato e 900,00€ de subsídio de natal.
13.  Do referido recibo, com o valor total líquido de 4 101,81€ a ré apenas pagou 4 001,64€.
14.  A ré não pagou a remuneração de oito dias de Junho de 2020.
Não se provou
1. A morada constante da carta registada expedida no dia 15-5-2020 havia sido indicada pela autora à ré para efeitos de celebração do contrato.
2.  A autora desde 15-5-2020 manifestou que não ia aceitar a não renovação do contrato.
3.  Na reunião realizada nesse dia foi-lhe entregue em mão carta com comunicação de não renovação do contrato, ficando a autora de assinar a mesma.
4.  As funções exercidas pela autora ao serviço da ré obrigavam a uma prestação diária das 8h às 22h e a trabalhar ao sábado, das 9h às 13h, de quinze em quinze dias.  »
Apreciação do recurso
1ª questão – Há matéria de facto por assentar (face ao teor documental e testemunhal constante dos autos) ?   
A recorrente (ré/empregadora) considera que deve ser aditado, no elenco dos factos provados, a resposta que a autora (trabalhadora/recorrida) dera à mensagem de correio electrónico daquela (constante do item 8 dos factos provados). Argumentando que tal resposta constava dos autos e evidenciava que, na noite do dia 20/5/2020, a trabalhadora tomara conhecimento e dera anuência à comunicação do fim do contrato por não renovação pela empregadora e que tal fora corroborado pelo depoimento da testemunha BB.
A recorrida (autora/trabalhadora) considera que deve manter-se inalterado o acervo factual constante da sentença.
Cumpre apreciar e decidir.
Como é sabido, a propósito da impugnação de matéria de facto julgada pela 1ª instância, dispõe o art. 640º, nºs 1 e 2, do CPC, intitulado “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto “ que:
«1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
 b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
 O nosso legislador garante o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, mas subordina a possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância à observância, por parte de um recorrente, dos transcritos ónus que a lei adjetiva lhe impõe.
Assim, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais e seguindo os ensinamentos doutrinais (nomeadamente de António Santos Abrantes Geraldes em “Recursos em Processo Civil”, 7ª edição actualizada, págs.194 a 211) e jurisprudenciais (nomeadamente do STJ no acórdão de 19/1/2023 do Exmº. Relator Nuno Pinto Oliveira, em dgsi.pt), impõe-se que um recorrente proceda à delimitação, com toda a precisão:
- dos concretos pontos de facto da decisão que pretende questionar/factos que considera incorrectamente julgados (com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões que permita ao recorrido infirmá-las);
- dos respectivos meios de prova, disponibilizados pelo processo ou pelo registo ou gravação nele realizada, que imponham, sobre aqueles pontos, distinta decisão (com enunciação daqueles na motivação de recurso);
- e da decisão que, no ver desse recorrente, se impunha para os pontos de facto objeto da impugnação (com enunciação daquela no recurso) .
Quando um recorrente cumpra estes ónus, a 2ª instância atenta à fundamentação convocada pelo Tribunal recorrido e à impugnação deduzida pelo recorrente e faz uma reanálise/reapreciação quer desses meios probatórios convocados pelo recorrente quer das demais provas constantes do processo, com vista a formar a sua própria e autónoma convicção – a qual pode ser ou não coincidente com a convicção evidenciada pelo tribunal recorrido (na respectiva fundamentação). E, respectivamente, não impor ou impor (total ou parcialmente) uma decisão de facto diversa da proferida pelo Tribunal recorrido, nos concretos pontos de facto postos em crise pelo recorrente.
Com efeito, funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, nessa sua reapreciação, este tem autonomia apreciatória e decisória. Por isso, ao Tribunal de 2ª instância compete-lhe  apreciar/ponderar/analisar, de forma crítica, as provas em que assentou a parte impugnada da decisão factual, sem prejuízo de, oficiosamente, poder atender a quaisquer outros elementos probatórios que tenham sido produzidos nos autos, sujeitando-se às mesmas regras legais de direito probatório a que se encontrava sujeito o Tribunal recorrido. 
Não sendo de olvidar, no que se refere à reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos/declarações prestados pelas partes (não confessórias) e/ou por testemunhas e/ou da prova por inspecção e/ou da prova pericial, que no nosso ordenamento jurídico vigora, para além das normas de direito probatório material contidas, respectivamente, nos arts. 361º, 389º, 391º e 396º do Código Civil, o princípio da livre apreciação da prova, expressamente, consagrado art. 607º, n.º 5, do CPC (sob o título «Sentença» e aplicável à 2ª instância “ex vi” do art. 663º, nº 2, do mesmo diploma).
O nº 5 desse art. 607º consigna o seguinte: « O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes ».
 Quer isto dizer que, em regra [salvo nestas 4 situações ditadas/ressalvadas na 2ª parte deste preceito legal], a conclusão probatória não está pré-fixada legalmente, detendo o Julgador a liberdade de apreciar toda a prova produzida, ponderar e formar a sua convicção sobre os factos, segundo as regras da experiência humana, da lógica, da prudência e, se for esse o caso, das regras da ciência convocáveis ao caso.
No caso da solicitada reapreciação da decisão de facto por parte do Tribunal da Relação, este Tribunal “ad quem” (enquanto Tribunal que garante um 2º grau de jurisdição/reponderação) pode e deve analisar, criticamente e sujeito às mesmas regras da experiência, da lógica e da ciência, toda a prova produzida sobre a factualidade impugnada, formando ele próprio, uma nova e autónoma convicção. Caso em que, se constatar - com a necessária segurança - que ela não é coincidente com a convicção formada pelo  Tribunal “a quo”/recorrido, isto é, com a necessária segurança, se constatar a existência de manifesto erro de julgamento sobre a respectiva matéria de facto impugnada (por uma clara distorção da realidade factual e/ou uma óbvia desarmonia entre a prova disponível e a decisão tomada pelo Tribunal de 1ª instância), então, dever-se-á efetuar as correções/modificações na matéria de facto que esta (nova e autónoma) sua convicção lhe imponha, seja no sentido oposto seja num plano intermédio com alteração da decisão no sentido restritivo ou explicativo.
Feitas estas considerações, estamos em melhores condições de apreciar e decidir o caso concreto.
No caso em apreço, a recorrente/ré/empregadora, cumprindo os aludidos ónus, insurge-se contra a omissão, na fundamentação de facto da sentença recorrida, de uma mensagem de correio electrónico [que pretende ver incluída como facto provado nº 8B], por se tratar de mensagem constante dos autos e que havia sido enviada pela recorrida/autora/trabalhadora, às 20h:51m:56s do dia 20/5/2020, como resposta à mensagem de correio electrónico que aquela lhe enviara na tarde desse dia daquela e só esta da tarde vem aludida na fundamentação de facto (item 8 dos factos assentes).  
Compulsados os autos, constata-se que, efectivamente, essa mensagem de correio electrónico deles consta, mais concretamente o seu teor está reproduzida no item 14 da contestação e a sua impressão em formato de papel, com número 3, está anexada ao mesmo articulado (tudo sob a referência citius 10998773 e aqui dada por reproduzida ).
Também se constata que, tendo havido notificação à autora, não houve qualquer impugnação por parte desta, relativamente a essa mesma sua mensagem de correio electrónico (cfr. as referências citius 10998773 e aqui dadas por reproduzida).
Tendo em conta tudo isto, resulta incontroverso que, após a autora ter recepcionado a mensagem de correio electrónico aludida nos termos já constante dos itens 8 e 9 dos factos provados, a autora respondeu à mesma, também por mensagem de correio electrónico, nos exactos termos constantes do item 14 da contestação e documento anexo à mesma e aqui dados por reproduzidos. Segundo os quais (transcrição):
De: AA<mail >
Enviado: Wednesday, May 20, 2020 8:51:56 PM
Para: CC <mail >; DD <mail >
Asunto: ...Férias / tlm
Boa noite a CC e DD.
Sinceramente, há necessidade de uma resposta nestes termos?!
Hoje de manhã falei com o CC, pedi desculpa pelo facto de não ter tido disponibilidade para ir ao escritório
devolver o tlm e que tentaria envidar esforços para o fazer hoje!
Pena CC, tanta pena a imaturidade e falta de cordialidade no trato correcto para com os colaboradores por parte
dos recursos humanos!
Não existindo nenhum tipo de conflito, como é o meu caso, o não ter tido oportunidade de entregar um tlm. (2dias)
dias garantidamente não justifica este tipo de postura!
Obrigada
Bom descanso.
AA
Telemóvel: 91...
Por tudo isto, é desnecessário atentar ao invocado depoimento, em audiência de discussão, da testemunha BB para este efeito.
Afigurando-se-nos que tal matéria factual, podendo ser relevante para a decisão da lide (segundo as várias soluções plausíveis da mesma), deve constar da fundamentação de facto da sentença, nos termos previstos pelos arts. 607º, nº 4, e nº 5, 2ª parte, também aplicável à presente decisão “ex vi” do nº 2 do art. 663º ambos do CPC e aplicáveis ao foro laboral por remissão do art. 87º, nº 1, do CPT.
Aliás, tal poderia ser feito mesmo oficiosamente, conforme é o sentido pacífico da doutrina (nomeadamente Abrantes Geraldes “Recursos em Processo Civil”, 7ª edição actualizada, pág. 367) e da jurisprudência (nomeadamente, o acórdão da secção social do STJ de 15/9/2021) que a consideração, na decisão, de factos provados por confissão ou acordo das partes ou documentos integrados nos autos sem impugnação, que não tenham sido já incluídos na matéria assente, não está sujeita a (novo) contraditório, o contraditório ocorreu no momento dos articulados e a sua consideração na sentença não constitui decisão surpresa, que exija a prévia pronúncia das partes.
Assim sendo, inclui-se na fundamentação de facto o teor desse documento já constante dos autos e cujo teor não fora impugnado.
Mas, atenta a sequência cronológica de todos os factos assentes, impondo-se que o seja a seguir ao item 9 dos factos provados, isto é, determinando-se o aditamento do item 9-A com o seguinte teor:
« 9-A. Na sequência do aludido nos itens 8 e 9 desta sentença, pelas 20h51m56s desse mesmo dia 20-05-2020, a autora enviou a seguinte mensagem de correio electrónico: 
Asunto: ...Férias / tlm
Boa noite a CC e DD.
Sinceramente, há necessidade de uma resposta nestes termos?!
Hoje de manhã falei com o CC, pedi desculpa pelo facto de não ter tido disponibilidade para ir ao escritório
devolver o tlm e que tentaria envidar esforços para o fazer hoje!
Pena CC, tanta pena a imaturidade e falta de cordialidade no trato correcto para com os colaboradores por parte
dos recursos humanos!
Não existindo nenhum tipo de conflito, como é o meu caso, o não ter tido oportunidade de entregar um tlm. (2dias)
dias garantidamente não justifica este tipo de postura!
Obrigada
Bom descanso.
AA
Telemóvel: 91...  ».
Nesta conformidade, se julga procedente a questão recursiva em apreço.
2ª questão – Há erro de julgamento (no tocante à intempestividade da oposição da ré à renovação automática do contrato com a autora) ?
A recorrente (ré/empregadora) invocou erro de apreciação da matéria factual dada como provada, considerando que da mesma resulta ter a recorrida (autora/trabalhadora), em 20/5/2020, tomado conhecimento da escrita oposição daquela à renovação do contrato a termo certo que vigorava entre ambas, com a inerente cessação válida e eficaz do mesmo a 8/6/2020.
A recorrida (autora/trabalhadora) pronunciou-se no sentido de ser mantida a decisão recorrida no tocante à intempestividade da oposição à renovação do contrato a termo que vigorava entre ambas, por a empregadora só o ter efectuado no dia 25/5/2020, com a inerente ineficácia dessa escrita comunicação que configurou um despedimento ilícito da trabalhadora relativamente ao contrato cujo termo resolutivo só teria lugar a 8/9/2020.
Cumpre apreciar e decidir.
Como sabemos, a celebração de contratos de trabalho sujeitos a termo resolutivo significa (segundo os termos previstos no art. 278º do Código Civil, doravante com a abreviatura CC) que, a partir de certo momento (certo ou incerto) cessarão os efeitos desse negócio jurídico.
Este tipo ou modalidade de contratação, sendo precária, sempre foi e continua a ser considerada como atípica, estando sujeita a regras legais rígidas, criadas pelo nosso legislador, com vista:  a controlar  a sua celebração (só admitida nas hipóteses e sob as condições previstas na lei); e a controlar a sua execução e cessação contratual (sujeitas a regras específicas).
Pois, a contratação laboral por tempo indeterminado continua a ser a regra geral no nosso sistema jus-laboral, em consonância com o art. 53º da Constituição da República Portuguesa que consagra o princípio da segurança no emprego.
 Sendo consentida, a título excepcional, a contratação laboral sujeita a termo resolutivo, conforme se depreende do regime contido nos arts. 139º a 149º, 340º, al. a), e 343º, al. a) a 345º do Código do Trabalho [na redacção dada pela Lei nº 93/2019, de 4-9, a vigorar desde 1/10/2019 – aplicável atenta a data dos factos em apreço  e doravante com a abreviatura CT] que exige sempre, nomeadamente: - a forma escrita para a sua celebração; - contendo a concretização factual da respectiva justificação quer em termos de fundamento quer em termos de duração temporal;  - a limitação da sua duração temporal máxima, com ou sem renovação; - o limite de renovações e da respectiva duração temporal de cada uma nos contratos a termo certo;  - nestes últimos, a caducidade do contrato, que o faz cessar, ocorre aquando da verificação do final do respectivo prazo/termo certo estipulado ou do final da respectiva renovação; - havendo renovação automática se não tiver sido consignada, nos dizeres expressos do contrato, a sua não renovabilidade e a renovabilidade, até 3 vezes, não faça, a duração total do contrato, ultrapassar o limite temporal máximo de 2 anos; - nesse caso, qualquer uma das partes pode obstar à renovação automática se o comunicar por escrito à contraparte e com antecedência mínima de 15 ou 8 dias antes de o prazo expirar, consoante se trate do empregador ou do trabalhador.
A este propósito e sob o título “Caducidade de contrato de trabalho a termo certo”, dispõe o art. 344º, nº 1, do CT: « 1 - O contrato de trabalho a termo certo caduca no final do prazo estipulado, ou da sua renovação, desde que o empregador ou o trabalhador comunique à outra parte a vontade de o fazer cessar, por escrito, respectivamente, 15 ou oito dias antes de o prazo expirar. »
A razão de ser desta diferença de prazos, consoante a oposição à renovação contratual provenha do empregador ou do trabalhador, reside na maior debilidade/fragilidade contratual deste último, inerente à sua condição humana cujo trabalho lhe garante o rendimento de que, na maior parte dos casos, este carece para subsistir, gerando dependência económica, bem como a subordinação jurídica inerente à natureza deste tipo contrato (conforme os ensinamentos de Monteiro Fernandes em “Direito do Trabalho”, 22ª edição, págs. 31-34 e 193-196).
Assim, motivando-se a sua maior protecção dada pelo legislador, por forma a este saber com mais antecedência que advirá tal efeito extintivo contratual com as inerentes consequências para a sua vida, desde logo, o nível profissional. E, aliás, se tal caducidade operar por iniciativa do empregador, o trabalhador tem sempre direito a uma compensação (nos termos previstos pela 1ª parte do nº 2 do art. 344º do CT) com vista a minorar a maior incerteza/precaridade laboral – o que já não sucede se tal caducidade operar por iniciativa do trabalhador (conforme ressalva a parte final desse mesmo nº 2). 
Em qualquer dos casos, importa ter em conta que a cessação de um contrato de trabalho a termo certo por caducidade não opera “ipso jure” – contrariamente ao que sucede no regime geral da caducidade (previsto nos arts. 328º a 333º do CC) –, sendo sempre necessária uma comunicação prévia e com a respectiva antecedência mínima (independentemente de se tratar de um contrato renovável ou não) conforme se depreende da redacção do supra transcrito art. 344º, nº 1, do CT).
Aqui chegados, vejamos com mais detalhe, como pode operar-se, por iniciativa do empregador, de forma válida e eficaz, a caducidade de contrato a termo certo resolutivo.
É sempre necessário que a empregadora expresse tal vontade por escrito, dirigido ao trabalhador destinatário e por este recebido, pelo menos, 15 dias antes de o prazo expirar.
Sendo aplicável à contagem deste prazo (previsto no art. 344º, nº 1, do CT), em caso de alguma dúvida, as regras gerais contidas no art. 279º do CC.
E sendo aplicável as normais gerais contidas nos arts. 217º e seguintes do CC, nomeadamente a propósito da configuração, do conteúdo, da transmissão e da recepção das declarações negociais, com vista a poder aferir-se da perfeição, da validade e da eficácia das mesmas.
Pois, sendo essa uma declaração negocial unilateral e receptícia (através da qual uma das partes contratantes manifesta à outra parte contratante a intenção de fazer cessar o contrato de trabalho a termo certo que vigora entre ambas) aplicam-se-lhe, para além da sobredita norma especial contida no art. 344º, nº 1, do CT, as regras gerais do CC, tais como as contidas nos seus artigos 217º a 239º.
Assim, da conjugação de todas estas normas legais (na parte com interesse para o caso dos autos, em conjugação com os ensinamentos doutrinais de Heinrich Ewald Horster em “A Parte Geral do Código Civil Português Teoria Geral do Direito Civil”, reimpressão da edição de 1992, págs. 446-454), resulta que para essa declaração negocial ser válida e eficaz é sempre necessário que: 
-  seja expressa por escrito (que tanto pode ser uma tradicional carta como uma mensagem de correio electrónico);
-  a mensagem contida nesse escrito seja, por si só, inequívoca e perceptível (não podendo ser completada por estipulações verbais acessórias quer anteriores, quer contemporâneas, quer posteriores àquele documento escrito);  
- esse escrito tem de chegar ao poder ou ao conhecimento do respectivo destinatário - salvo se devido à culpa do destinatário não for por este recebida oportunamente -;
- e tal tomada de conhecimento pelo destinatário ou chegada ao poder do respectivo destinatário, tem de ocorrer, pelo menos, nos 15 dias anteriores ao final do respectivo prazo/termo certo resolutivo.
Feitas estas considerações, estamos em melhores condições para apreciar e decidir a caso concreto.
Nos presentes autos é indiscutível que as partes haviam celebrado um contrato de trabalho, com início a 9/9/2019 e com duração de 3 meses, renovável por iguais períodos até ao limite de 3 vezes, caso nenhuma das partes comunicasse à contraparte a sua não renovação. 
Contrato este que se renovou duas vezes, mais concretamente, em 9/12/2019 e 9/3/2020.
E, durante esta execução contratual, em 15/5/2020, houvera uma reunião entre ambas as partes na qual os responsáveis da empregadora haviam, verbalmente, comunicado à trabalhadora que aquela não pretendia renovar esse contrato.
Tendo, nesse mesmo dia, sido remetida pela empregadora uma carta registada, datada de 13/5/2020, dirigida à trabalhadora, contendo uma comunicação escrita dessa mesma vontade, intitulada “CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO”. Carta esta que foi devolvida à remetente, em 19/5/2020, com a menção de endereço insuficiente ou incorrecto.
No dia 20/5/2020, pelas 18h08m, através de uma sua funcionária e por correio electrónico, tendo a empregadora enviado à trabalhadora que, recebeu nesse mesmo dia, uma mensagem, mencionando “Assunto: Férias” e contendo os demais dizeres constantes do item 8 dos factos assentes (aqui dado por reproduzido).
Na sequência desta e, neste mesmo dia 20/5/2020, pelas 20h51m56s, tendo a trabalhadora enviado aos representantes da empregadora uma mensagem por correio electrónico, mencionando “Assunto:…Férias/tlm” e contendo os demais dizeres constantes do aditado item 9-A dos factos assentes (aqui dado por reproduzido).
No dia 25/5/2020, a trabalhadora recepcionou uma carta registada com aviso de recepção que a empregadora lhe havia enviado, contendo uma comunicação escrita de não renovação do contrato a partir de 8/6/2020, intitulada “CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO” nos termos constantes do item 10 dos factos assentes (aqui dado por reproduzido).
Será que, perante esta factualidade apurada, o Tribunal de 1ª instância devia ter considerado que a empregadora comunicara à trabalhadora, por escrito recebido por esta com a antecedência superior à mínima de 15 dias, a oposição à renovação contratual (como defende a empregadora/recorrente) ou o Tribunal de 1ª instância bem considerou que a comunicação escrita dessa vontade da empregadora só fora recebida pela trabalhadora com 14 dias de antecedência (como defende a trabalhadora/recorrida) ?
Afigura-se-nos que bem andou a Exmª Juiz da 1ª instância ao considerar que só fora recebida pela destinatária com 14 dias de antecedência, sendo intempestiva.
Pois – salvo o devido respeito pela recorrente –, não se descortina que aquela mensagem de correio electrónico enviada, às 18h08m do dia 20/5/2020, pela empregadora (através da sua funcionária/responsável dos recursos humanos da empregadora) à trabalhadora e por esta recebida nesse mesmo dia (20/5/2020), contenha uma comunicação de oposição à renovação automática do contrato com inerente caducidade do mesmo.
Dos dizeres escritos contidos nesta comunicação não resulta qualquer declaração de vontade no sentido que a recorrente pretende ver.
Vejamos em detalhe:
. O assunto que o intitula é: “Férias”;
. Apenas faz alusão: ao “….combinado entre mim e o Sr. CC, aquando da comunicação da sua não renovação do contrato de trabalho no passado dia 15/5/2020, foi proceder à entrega do equipamento no dia 18/5…. agradeço que proceda à entrega do mesmo amanhã sem falta, sob pena de não se proceder ao pagamento do acerto das suas contas finais, até que proceda à entrega do mesmo. Por outro lado, a empresa agradece que não utilize o equipamento para fins profissionais, nem pessoais, uma vez que se encontra de férias, por motivo de fim de contrato, devendo o mesmo permanecer desligado até à respectiva entrega. Mais informo que a sua carta veio devolvida, assim sendo, deverá solicitar uma cópia da mesma no escritório, aquando da entrega do equipamento….”;
. Não anexa qualquer documento do qual se extraia qualquer comunicação escrita da caducidade do contrato, nomeadamente da contida na carta que a empregadora lhe enviara em 15/5/2020 e que viera devolvida no dia 19/5/2020;
. Nem sequer reproduz os dizeres contidos nessa missiva que a empregadora lhe enviara, mas que viera devolvida no dia anterior a este e-mail.
Sendo de salientar que, face à factualidade apurada, não se podia (nem pode) imputar à culpa da destinatária (trabalhadora) a ocorrência da devolução, em 19/5/2020, dessa missiva que lhe havia sido enviada pela empregadora a 15/5/2020 – caso em que , à luz do disposto no art. 224º, nº 2, do CC, seria de considerar como se tivesse sido recebida por ela e tempestivamente. O que não se apurou ter sucedido nos autos em apreço.
Antes pelo contrário, confrontando a morada da trabalhadora que consta do respectivo contrato de trabalho (documento nº 1 do formulário citius da petição inicial) com a morada aposta nessa missiva da empregadora destinada à trabalhadora (documento nº 1 do formulário citius da contestação), constata-se haver divergência quanto ao número de porta e, por conseguinte, a incorreção do endereço apenas é imputável à remetente.
Por isso, a declaração de vontade da empregadora contida em tal missiva não se tornou eficaz, porque não se apurou que o seu conteúdo tivesse chegado ao poder da trabalhadora sua respectiva destinatária – conforme exige a 1ª alternativa da 1ª parte do nº 1 do art. 224º do CC – e, também, não se apurou que o conteúdo dessa missiva tivesse chegado ao conhecimento da trabalhadora sua respectiva destinatária antes do dia 25/5/2020 – conforme exige a 2ª alternativa da 1ª parte do nº 1 do art. 224º do CC -.
Aliás, os dizeres finais contidos no e-mail enviado pela empregadora à trabalhadora, na tarde do dia 20/5/2020 e por esta recepcionado nesse mesmo dia [nos termos constantes dos itens 8 e 9 dos factos assentes - mais concretamente a alusão à devolução da sua carta e a menção de que a trabalhadora deveria solicitar uma cópia da mesma no escritório, aquando da entrega do equipamento -], não podiam (nem podem) valer como sendo imputável à trabalhadora a falta de recepção da missiva [constante dos itens 5 a 7 dos factos assentes], por, alegadamente (segundo a recorrente): 
. se dever ao comportamento omissivo da trabalhadora que, alegadamente, não fora devolver o equipamento no dia 18/5/2020, contrariando o combinado no dia 15/5/2020;  
. e que, desde então, não fora possível entregar-lhe cópia dessa missiva que viera a ser devolvida;
. e que, desde então, a trabalhadora tivesse obstado à eficácia/tempestividade da recepção da comunicação da caducidade do contrato;
. e que, desde então, recaísse sobre a trabalhadora quer o ónus de ir ao escritório da empregadora levantar cópia dessa carta desde o dia 18/5/2020, quer o ónus de provar falta de culpa pela não recepção dessa missiva desde então.   
Ora, conforme já vimos, para ser atendível, como válida e eficaz, uma oposição por parte de uma empregadora (à renovação de um contrato a termo certo resolutivo), tem de ser expressa por escrito dirigido a um trabalhador seu destinatário e por este recebido, pelo menos, 15 dias antes de expirar o respectivo prazo.
Estas exigências legais advêm do alcance/efeito jurídico que tal declaração tem [quando válida e eficazmente comunicada] que é: a cessação do respectivo vínculo contratual, por caducidade do respectivo contrato de trabalho a termo certo resolutivo, por iniciativa do empregador.
Não bastando o empregador ter a vontade e o objectivo de não renovação contratual. É sempre exigido que haja, por parte deste, a respectiva declaração negocial unilateral receptícia, isto é, que este expresse essa vontade, de forma escrita e inequívoca, dirigida ao respectivo trabalhador e por este destinatário seja  recebida e entendida, tempestivamente, tal comunicação escrita de oposição à renovação automática do contrato de trabalho a termo certo.
Sendo que, conforme já vimos, o aludido e-mail enviado pela empregadora à trabalhadora, na tarde do dia 20/5/2020 e por esta recepcionado nesse mesmo dia, não contém esse tipo de declaração negocial com esse tipo de sentido.
Para além disso – e salvo o devido respeito pela recorrente – não se descortina que a resposta a esse e-mail por parte da trabalhadora [enviado por esta na noite do dia 20/5/2020, nos termos constantes do aditado item 9-A dos factos assentes], fosse sequer susceptível de vir completar o e-mail enviado por parte da empregadora (na tarde do dia 20/5/2020, nos termos constantes do item 8 dos factos assentes).
Uma, eventual, completação/aditamento escrito de uma tal declaração negocial unilateral só seria possível: se proviesse da mesma declarante; se tal sucedesse de forma inequívoca e perceptível a este propósito; se fosse recepcionada pela mesma destinatária e dentro daquele prazo de antecedência mínima relativamente à verificação do termo certo resolutivo.
Ora, no caso desses e-mails em apreço,  estamos perante a mesma trabalhadora, mas colocada em posições inversas, mais concretamente: no e-mail da tarde, a trabalhadora é a sua destinatária  (sendo emitente a responsável dos recursos humanos da empregadora); enquanto que no e-mail da noite, a trabalhadora é emitente (sendo destinatários dois representantes da empregadora).
Por outro lado – e salvo o devido respeito pela recorrente – não se descortina que desse e-mail enviado pela trabalhadora (na noite do dia 20/5/2020), em resposta ao e-mail enviado (na tarde desse mesmo dia), pela empregadora (através da sua responsável dos recursos humanos) se possa extrair que aquela trabalhadora recebera e percebera o teor de alguma comunicação escrita de oposição à renovação do contrato por parte desta empregadora.    
Em suma, sendo este um renovável contrato de trabalho a termo certo de 3 meses, com início a 9/9/2019, que já tivera duas renovações automáticas (respectivamente, em 9/12/2019 e 9/3/2020), ainda podia ter uma terceira/última renovação automática (em 9/6/2020 por forma a vigorar até 8/9/2020).
A empregadora (apesar de não pretender esta última renovação automática) não comunicou à trabalhadora essa sua vontade, por escrito, com a necessária antecedência mínima de 15 dias – sendo irrelevante essa antecedência dada aquando da comunicação, meramente verbal, durante a reunião ocorrida em 15/5/2020.
Ora, só tendo ocorrido essa comunicação extintiva escrita nos 14 dias anteriores ao prazo de renovação automática, tem de considerar-se tardia/ intempestiva/extemporânea.
 E, por conseguinte, ineficaz/insusceptível de produzir o efeito pretendido pela empregadora que era o da cessação do contrato por caducidade (em 8/6/2020).
Mas – contrariamente ao que sucederia se não tivesse havido qualquer declaração (em que se operaria a renovação contratual automática) –, neste caso, como tal declaração da empregadora continha uma, expressa, extinção deste vínculo contratual, com a destinatária sua trabalhadora, a partir do dia 8/6/2020, então, neste mesmo dia (8/6/2020) operou-se, por iniciativa da empregadora, a extinção deste vínculo contratual que existia ambas as partes.
Por conseguinte, impõe-se considerar (conforme bem considerou a Exmª Juiz da 1ª instância) que tal cessação contratual operada, em 8/6/2020, por iniciativa da empregadora, carece de cobertura legal porque desprovida de prévio procedimento legal ou de qualquer outro motivo justificativo previsto no elenco de válidas modalidade de cessação contratual.
Configura/equivale/consubstancia um despedimento ilícito da trabalhadora face ao disposto à contrário nos arts. 340º e 381º do CT – cfr. a pacífica jurisprudência de que destacam os Acórdãos do STJ do Exmº Relator Vasques Dinis em 16/12/2020 e do Exmº Relator Fernandes da Silva em 9/10/2013, ambos em dgsi.pt, – com as inerentes consequências legais (nomeadamente, as previstas nos arts. 344º, nº 2, e 393º, nº 2, do CT (especificamente para os contratos a termo) em conjugação com as normas gerais contidas nos arts. 389º, nº 1, al. a), 390º e 391º por remissão do nº 1 do art. 393º, todos do CT).
Resta-nos fazer uma nota final a propósito dos demais itens do pedido recursivo que estão prejudicados não só pela improcedência desta questão recursiva, como também pelo facto de não há qualquer menção, em relação aos mesmos, quer na motivação recursiva quer nas conclusões recursivas – contrariando as exigências contida nos artigos 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC, aplicáveis “ex vi” do art. 87º, nº 1, do CPT.
Concluindo, impõe-se declarar a improcedência da questão recursiva em apreço.

Decisão
Em conformidade com o exposto, acorda-se em:
I – Aditar aos factos provados o sobredito item 9-A com os sobreditos dizeres;
II – No mais, julgar improcedente a apelação, confirmando-se a douta decisão recorrida.
*
Custas do recurso a cargo da recorrente, sem prejuízo da sua isenção.
Notifique.

Lisboa, 6 de Março de 2024                                                           
Paula de Sousa Novais Penha
Manuela Bento Fialho
Francisca Mendes