Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
24070/20.6YIPRT.L1-7
Relator: DIOGO RAVARA
Descritores: CONTRATO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE MERCADORIAS
SERVIÇO POSTAL UNIVERSAL
PRESCRIÇÃO
PRAZO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/21/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I.–O prazo de prescrição consagrado no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07, quando reportado a créditos emergentes da prestação de serviços postais, apenas se aplica aos créditos de que seja titular a empresa CTT – Correios de Portugal, S.A. e que tenham sido prestados no âmbito do serviço postal universal.

II.–Tal prazo não se aplica, por isso, a serviços de transporte de mercadorias prestados por outras empresas e fora do âmbito do serviço postal universal.

III.–O prazo de prescrição consagrado no art. 317º, al. b) do CC não se aplica a créditos de que seja devedora uma sociedade comercial, por serviços de transporte de mercadorias que lhe foram prestados por outra sociedade comercial, tendo ambas contratado no âmbito dos respetivos objetos sociais.
É incompatível com a natureza presuntiva das prescrições consagradas no art. 317º do CC a invocação, pela devedora, da exceção de cumprimento defeituoso da prestação, em articulado no qual reconhece que não pagou a contraprestação em dinheiro a que se havia vinculado.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


1.Relatório


A[1], intentou procedimento de injunção contra B[2], solicitando a atribuição de força executiva ao requerimento de injunção, no qual peticionou a quantia global de 10.016,58 €, sendo € 8.698,62 a título de “capital inicial”, e € 1.317,96 a título de “juros de mora” vencidos, contados até 19-03-2020[3].

No mesmo requerimento no campo intitulado “Exposição dos factos que fundamentam a pretensão”, a requerente expôs o que segue:

1–A Requerente tem como objecto social a prestação de serviços de recolha, tratamento, transporte e distribuição de documentos, mercadorias e outros envios postais de âmbito nacional e internacional, bem como serviços complementares na área da logística.
2–Nesse âmbito prestou a requerente serviços à Requerida, de recolha, transporte e distribuição de mercadorias, ao abrigo do alvará n.º 4940, que os aceitou.
3–Tendo a Requerente, em relação aos serviços prestados, emitido as facturas abaixo discriminadas, que, desde o seu vencimento até à presente data não foram pagas, apesar das interpelações para o efeito.
4–Assim, encontram-se em dívida as seguintes facturas, acrescidas de juros às taxas legais comerciais:
(…)
Capital Inicial: 8.698,62 €
Total de Juro: 1.317,96 €
Capital Acumulado: 10.016,58 €.”
Notificada a requerida, esta apresentou requerimento de oposição, invocando a prescrição dos créditos titulados pelas faturas mencionadas no requerimento de injunção, nos termos previstos no art. º 10º, nº 1, da Lei nº 23/96, alterada pela Lei 12/08 de 26-02, e pela Lei n.º 24/2008 de 02-07, e subsidiariamente, a prescrição de parte das mencionadas faturas, nos termos previstos no art. 317º, al. b) do CC[4].
Remetidos os autos à distribuição como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, e aberta conclusão, foi proferido despacho convidando a autora a exercer o contraditório no tocante à exceção de prescrição invocada pela requerida, ora ré[5], o que a autora veio fazer, sustentando, em resumo, que não é titular da concessão do serviço público de distribuição postal, e que o contrato que celebrou com a ré não é um contrato de prestação de serviços postais, mas antes um contrato de transporte de mercadorias, não sendo aplicável aos autos o prazo de prescrição previsto no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07, nem sequer a previsto no art. 317º, al. b), do CC. Finalmente argumentou ainda que mesmo que assim não fosse, nos termos previstos lei nº 17/2012 de 26-04  as encomendas com peso superior a 20 kg não são qualificáveis como encomendas postais, sendo certo que parte das encomendas transportadas pela A. tinha um peso superior àquele. [6]
Prosseguindo a causa, teve lugar a audiência final, após o que foi proferida sentença julgado a exceção de prescrição procedente, e a ação totalmente improcedente, com a consequente absolvição da ré do pedido[7].

Inconformada com tal decisão, veio a autora interpor o presente recurso de apelação, apresentando alegações de recurso cuja motivação resumiu nas seguintes conclusões[8]:
A.–O Tribunal a quo decidiu qualificar erroneamente a relação jurídica estabelecida entre as partes como contrato de prestação de serviços postais.
B.–Firmando tal decisão no dispostos nos artigos 4° e 5° da Lei 17/2012 de 26 de Abril (Regime Jurídico Aplicável à Prestação de Serviços Postais).
C.–Pelo que mal andou o tribunal a quo, ao não qualificar o contrato celebrado entre as partes como um contrato de prestações de serviços de transporte rodoviário de mercadorias.
D.–Sendo-lhe aplicável o Decreto-lei 239/2003 de 4 de Outubro.
E.–E não o regime jurídico aplicável à prestação de serviços postais no território nacional.
F.–A Lei 17/2012 estabelece o regime jurídico aplicável à prestação de serviços postais no território nacional, bem como serviços internacionais com origem ou destino no território nacional.
G.–O regime de exploração e utilização dos serviços postais no território nacional, bem como dos serviços postais internacionais com origem ou destino no território nacional, consta de diploma de desenvolvimento da presente lei.
H.–É A CTT - Correios de Portugal, S. A., em território nacional, a prestadora do serviço postal universal, até 31 de dezembro de 2020.
I.–Sendo que, a Autora nos autos é a CTT EXPRESSO, SERVIÇOS POSTAIS E LOGÍSTICA, SA pessoa jurídica distinta e que não se confunde com a CTT - Correios de Portugal, S.A., não lhe sendo aplicável, pois, o disposto neste diploma legal como decorre da restrição explicitada no artigo 57° n° 1.
J.–“Aos contratos de transporte de bens e mercadorias em território nacional celebrados com a CTT EXPRESSO, SERVIÇOS POSTAIS E LOGÍSTICA, SA, aplica-se o regime legal do DL n.° 239/2003 de 4 de Outubro diploma que revogou os anteriores artigos 366.° a 393.° do Código Comercial na parte aplicável ao contrato de transporte rodoviário de mercadorias.”
K.–O serviço em causa não se enquadra na definição de serviço público essencial, mas sim de transporte rodoviário de mercadorias.
L.–A Lei n° 17/2012 de 26/04, que define as bases gerais a que obedece regime jurídico aplicável à prestação de serviços postais, define por serviço postal encomendas postais cujo valor não exceda os 20 kg.
M.–E que, de uma análise dos envios se depreende que os valores propostos vão para além dos 20Kg, pelo que o serviço proposto nunca poderia ser o serviço postal.
N.–O serviço expresso encontra-se excluído do âmbito dos serviços públicos essenciais.
O.–De uma leitura atenta das faturas juntas com a p.i. se conclui que os objetos expedidos excedem os 20kg.
P.–Tendo sim este limite a ver com a qualificação do serviço e não como garantia do serviço universal.
Q.–Pelo que não poderia o Tribunal a quo ter feito tábua rasa de tais factos, devidamente alegados e provados por documentos juntos aos autos.
R.–Não podendo, pois, entender que a dívida se encontrava prescrita, por ser aplicável ao contrato celebrado entre as partes o Regime Jurídico do Transporte Rodoviário de Mercadorias.
S.–O que não poderá proceder!

Rematou as suas conclusões nos seguintes termos:
“… deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, sendo substituída por outra onde seja julgada improcedente a exceção de prescrição por aplicabilidade ao contrato celebrado entre as partes do regime jurídico do Decreto-Lei 239/2003 de 4 de Outubro.”

A apelada apresentou contra-alegações, que sintetizou nas seguintes conclusões:[9]
1–A R., ora Recorrida, considera que a mui douta sentença proferida pelo tribunal a quo não merece qualquer censura e/ou reparo ao julgar a ação totalmente improcedente e absolvendo a R. do pedido.
2–Não pode a Recorrente vir, agora, em sede de recurso, alegar e invocar legislação que até ao encerramento da discussão e julgamento não invocou/alegou.
3–O objeto dos serviços, que decorre da descrição das faturas, era a remessa de bens a determinadas moradas e respetiva entrega nos locais indicados.
4–Não restam dúvidas de que entre a Recorrente e a Recorrida foi celebrado um contrato de prestação de serviços, ao qual tem plena aplicação o disposto na Lei n.° 23/96, de 26 de julho.
5–São serviços essenciais os serviços postais (art.° 1°, n° 2, al e)) decorrendo do art.° 10.°, n° 1 que o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.
6–As faturas emitidas pela Recorrente, reclamadas no requerimento injuntivo, estão prescritas, nos termos do n.° 1 do artigo 10.° da Lei 23/96, de 26 Julho.
7–Não pode aceitar-se, como pretende a Recorrente, a alteração da decisão que o tribunal a quo (e bem) emitiu e que julgou improcedente a ação, dada a prescrição, absolvendo a Ré/Recorrida do pedido.
8–Não merece reparo e/ou censura a decisão proferida pelo tribunal a quo.

Admitido o recurso, e recebidos os autos neste Tribunal da Relação, foram colhidos os vistos.

2.–Objeto do recurso

Conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam[10]. Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. arts. 573º, nº 2 e 5º n.º 3 do Código de Processo Civil).
Por outro lado, constitui entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência que, em princípio, as partes não podem invocar, em sede de recurso, fundamentos de facto ou de Direito que não tenham invocado na primeira instância.
Com efeito, estabelece o art.  573º do nº 1 do CPC que “toda a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei mande deduzir em separado”, acrescentando o nº 3 do mesmo preceito que “Depois da contestação só podem ser deduzidas as exceções, incidentes, e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente”.
O preceito citado consagra o princípio da concentração da defesa, do qual decorre que o demandado deve deduzir na contestação ou oposição todos os meios de defesa que tenha ao seu alcance, sob pena de preclusão dos mesmos.

Não obstante, a lei processual consagra quatro exceções a esse princípio:
-os incidentes que devem ser deduzidos em separado;
-os meios de defesa supervenientes, ou seja, os fundados em factos que se verifiquem depois de esgotado o prazo para contestar ou deduzir oposição (superveniência objetiva), ou de que o demandado só tenha conhecimento depois de esgotado esse prazo (superveniência subjetiva);
-os meios de defesa que a lei expressamente admita após tal momento;
-os meios de defesa de que o Tribunal deva conhecer oficiosamente.
Como decorrência deste princípio, a doutrina e a jurisprudência têm sublinhado que os recursos não servem para apreciar questões (de direito ou de facto) novas, mas apenas reapreciar questões já debatidas.

Nessa medida, bem aponta ABRANTES GERALDES[11], “A natureza do recurso como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina uma outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se com questões novas.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. Segundo a terminologia proposta por Teixeira de Sousa, podemos concluir que tradicionalmente temos um modelo de reponderação que vis o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame que permita a repetição da instância no tribunal de recurso.”

Por seu turno sustenta FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA[12]: “No nosso sistema processual (no que concerne à apelação e à revista) predomina o «esquema do recurso de reponderação: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção de efeitos jurídicos “ex-novo”. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex ante proferida, que não o julgamento de uma qualquer questão nova.”

RUI PINTO[13] sintetiza os efeitos práticos do sistema de reponderação nos seguintes termos: “não se admitem nem novos factos, nem novos fundamentos de ação ou de defesa, nem novas provas. A estes recursos dá-se a qualificação de recursos de reponderação: a decisão impugnada é reavaliada no quadro do seu próprio objeto e em razão dos seus vícios específicos, pelo que o objeto do pedido é na parte da revogação a própria decisão e na substituição a matéria que fora objeto da decisão revogada, tal e qual fora conhecida pelo tribunal a quo.”

Este entendimento foi amplamente acolhido pela jurisprudência. Como se refere no ac. STJ de 07-07-2016 (Gonçalves Rocha), p.156/12.0TTCSC.L1.S1, “Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação”. – No mesmo sentido, cfr. RC 14-01-2014 (Mª Inês Moura), p. 154/12.3TBMGR.C1, e RP 16-10-2017 (Miguel Baldaia de Morais), p. 379/16.2T8PVZ.P1.

Mas precisamente porque a lei processual admite a invocação de exceções de conhecimento oficioso após a contestação, a jurisprudência tem sublinhado que essas questões podem ser suscitadas apenas em sede de recurso – neste sentido cfr. ac. STJ 17-11-2016 (Ana Luísa Geraldes), p. 861/13.3TTVIS.C1.S2.

No caso em apreço sustentou a apelada, nas suas contra-alegações, que “não pode a Recorrente vir, agora, em sede de recurso, alegar e invocar legislação que até ao encerramento da discussão e julgamento não invocou/alegou”[14]. Se bem entendemos o alcance desta afirmação, a mesma reporta-se ao argumento da inaplicabilidade das Lei nº 23/96 ao(s) contrato(s) de prestação de serviços celebrado(s) entre autora e ré, e, por conseguinte, à inaplicabilidade do prazo de prescrição previsto nesse diploma e aplicado pelo Tribunal a quo na sentença apelada.
Porém, uma simples leitura do articulado de resposta à exceção de prescrição necessariamente nos conduz à conclusão inversa. Em tal articulado, a autora expõe, expressamente o apontado argumento, em termos semelhantes àqueles em que o fez nesta sede de recurso.

Donde se conclui que a apelante não invocou em sede de recurso qualquer questão nova.

Nesta conformidade, as questões a apreciar e decidir são as seguintes:
a)-A prescrição dos créditos invocados pela autora, em especial a aplicabilidade do prazo prescricional previsto no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07.

3.–Fundamentação

3.1.– Os factos

3.1.1.–Factos provados

O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1.–A requerente tem como atividade a prestação de serviços de recolha, tratamento, transporte e distribuição de documentos, mercadorias e outros envios postais de âmbito nacional e internacional, bem como serviços complementares na área da logística.
2.–Nesse âmbito prestou a requerente serviços à requerida, de recolha, transporte e distribuição de mercadorias.

3.–Pela execução de tais serviços a requerente emitiu as seguintes faturas, pelos serviços, valores e datas aí consignados, as quais passam a descrever-se:
a.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......13 no valor de 3 987,94 €, de outubro de 2017, conforme documento de fls. 18 a 39 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
b.-Fatura n.° ZFT 0.../2.......34 no valor de 91,65 €, de outubro de 2017, conforme documento de fls. 40 a 42 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
c.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......37 no valor de 44,63 €, de outubro de 2017, conforme documento de fls. 43 a 45 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
d.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......36 no valor de 3 331,48 € de novembro de 2017, conforme documento de fls. 46 a 64 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
e.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......02 no valor de 112,82 €, de novembro de 2017, conforme documento de fls. 65 a 67 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
f.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......51 no valor de 40,88 € de novembro de 2017, conforme documento de fls. 68 a 70 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
g.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......42 no valor de 155,90 € de fevereiro de 2018, conforme documento de fls. 71 a 73 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
h.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......03 no valor de 16,45 € de junho de 2018, conforme documento de fls. 74 a 76 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
i.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......23 no valor de 52,89 € de julho de 2018, conforme documento de fls. 77 a 79 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
j.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......95 no valor de 111,62 € de julho de 2018, conforme documento de fls. 80 a 82 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
k.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......08 no valor de 153,66 € de agosto de 2018, conforme documento de fls. 83a 85 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
l.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......61 no valor de 6,37 € de agosto de 2018, conforme documento de fls. 86 a 88 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
m.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......01 no valor de 32,60 € de agosto de 2018, conforme documento de fls. 89 a 91 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
n.- Fatura n.° ZFT 0.../2......513 no valor de 103,90 € de setembro de 2018, conforme documento de fls. 92 a 93 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
o.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......96 no valor de 24,07 € de setembro de 2018, conforme documento de fls. 94 a 96 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
p.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......72 no valor de 32,30 € de outubro de 2018, conforme documento de fls. 97 a 99 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
q.-Fatura n.° ZFT 0.../2......461 no valor de 6,52 € de outubro de 2018, conforme documento de fls. 100 a 102 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
r.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......64 no valor de 123,48 € de outubro de 2018, conforme documento de fls. 103 a 105 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
s.- Fatura n.° ZFT 0.../2......823 no valor de 79,95 € de novembro de 2018, conforme documento de fls. 106 a 108 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
t.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......89 no valor de 55,66 € de novembro de 2018, conforme documento de fls. 109 a 111 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
u.- Fatura n.° ZFT 0.../2........01 no valor de 21,59 € de novembro de 2018, conforme documento de fls. 112 a 114 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
v.- Fatura n.° ZFT 0.../2......551 no valor de 89,86 € de dezembro de 2018, conforme documento de fls. 115 a 117 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
w.- Fatura n.° ZFT 0.../2.......97 no valor de 22,40 € de janeiro de 2019, conforme documento de fls. 118 a 120 cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
todas a contabilizar 8 698,62 € de capital.
4.–A injunção foi intentada em 19-03-2020.
5.–A requerida trabalha com equipamentos profissionais, com características muito especificas, que têm de ser manuseados com grande cuidado e devidamente acondicionados, como sejam computadores, portáteis, telemóveis, LCDs, entre outros.
6.–Foi apresentada reclamação aos CTT, porque um LCD chegou com rebordo partido, situação que ocorreu durante o acondicionamento e transporte do pacote postal.
7.–A requerente não aceitou a reclamação por falta de menção do cliente do defeito no ato de entrega.

8.–No descrito das faturas provadas em 3 FP existem descritas 3 entregas de mercadoria de peso superior a 20 kg:
- a fls. 35: entrega à PT de Alfornelos com peso de 47.560 Kg;
- a fls. 42: entrega ao Hotel Real Bella Vista Hotels com peso de 38.680 Kg;
- a fls. 58: entrega à PT de Alfornelos com peso de 22.440 Kg.

1.1.2.– Factos não provados

O Tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos:
a)- que o aludido em 2 FP o foi ao abrigo do alvará n.° 4940;
b)- que a reclamação aludida em 6 FP ocorreu em 21-05-2018;
c)- que o LCD tinha o valor de 2290.17€.

3.2.–Os factos e o direito

3.2.1.–Da qualificação do contrato celebrado entre autora e ré

Da factualidade provada resulta que a pedido da ré, em diversas ocasiões, a autora procedeu de recolha, transporte e distribuição de mercadorias que para o efeito a ré lhe entregou, mediante contrapartida em dinheiro[15].

O Tribunal a quo qualificou tal relação comercial como um único contrato de prestação de serviços, previsto e regulado nos arts. 1154º e segs. do CC, e definido no mencionado artigo como “aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”.

Tal qualificação peca por escassa, na medida em que o contrato dos autos se subsume a uma categoria especial do contrato de prestação de serviços, a saber, o contrato de transporte rodoviário nacional de mercadorias, previsto e regulado no DL nº 239/2003, de 04-10[16], o qual procedeu à atualização do regime anteriormente definido pelo Código Comercial.

Na redação inicial do mencionado diploma constava uma definição do mencionado tipo contratual, ali descrito como “O contrato de transporte rodoviário nacional de mercadorias é o celebrado entre transportador e expedidor nos termos do qual o primeiro se obriga a deslocar mercadorias, por meio de veículos rodoviários, entre locais situados no território nacional e a entregá-las ao destinatário.”

O DL. nº 57/2021 alterou a redação deste preceito, que substituiu a mencionada definição legal por uma formulação que aponta apenas para o objeto do diploma: “O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico do contrato de transporte rodoviário nacional de mercadorias e das operações de carga e descarga de mercadorias realizadas em território nacional, incluindo dos tempos de espera, sejam elas relacionadas com transportes nacionais ou internacionais.”

Cremos, porém, que a definição constante da versão original do preceito se mantém atual, enquanto definição doutrinária, por corresponder ao regime consagrado no mesmo diploma.

Nesta conformidade, os contratos de transporte nacional rodoviário de mercadorias celebrados pela autora regem-se pelo referido diploma – Neste sentido cfr. ac. RL 11-02-2021 (Isoleta Costa), p. 20633/19.0T8LSB.L1-8.

Por outro lado, afigura-se que tendo autora e ré contratado em diversas ocasiões, sem que se tenha apurado terem previamente outorgado um qualquer acordo-quadro, é de considerar que celebraram vários contratos, correspondentes a cada um dos transportes levados a cabo pela ré.

3.2.2.–Da exceção perentória de prescrição

3.2.2.1.–Da aplicabilidade do prazo previsto no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07

Como já se deu conta, a sentença apelada julgou verificada a exceção perentória de prescrição prevista no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07.[17]
Estabelece o mencionado preceito que “o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”.
O âmbito de aplicação deste diploma e, por conseguinte, do prazo de prescrição nele previsto é delimitado no art. 1º do mesmo diploma, relevando no caso em apreço, a al. e) do seu nº 2. Assim, de acordo com este preceito, a referida lei aplica-se aos “serviços públicos”, incluindo os “serviços postais”.
Por sua vez, o conceito de serviços postais é delimitado pela Lei nº 17/2012, de 26-04[18],estabelecendo o art. 4º deste diploma que a atividade de serviço postal compreende as operações de aceitação, tratamento, transporte e distribuição de objetos postais, ou seja, correspondência, publicações periódicas, e encomendas(vd. art. 5º do mesmo diploma).

Por outro lado, há que reter que como refere a Lei nº 23/96, de 26/07, a mesma “consagra regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais”. Ora, no que respeita aos serviços postais, apenas se consideram essenciais os compreendidos no conceito de serviço postal universal, definidos no art. 10º, nº 1 do mesmo diploma como os que consistem na “oferta de serviços postais definida na presente lei, com qualidade especificada, disponível de forma permanente em todo o território nacional, a preços acessíveis a todos os utilizadores visando as necessidades de comunicação da população de das atividades económicas e sociais”.

Ora, nos termos previstos no DL nº 448/99, de 04-11[19], o serviço postal universal é prestado mediante concessão do Estado Português, e desde a privatização dos correios de Portugal, essa concessão sempre coube à CTT – Correios de Portugal, S.A..
Nesta conformidade, conclui-se que no tocante aos serviços postais, o prazo de prescrição previsto no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07 apenas se aplica aos créditos emergentes da atividade de serviços postal universal prestados pela CTT – Correios de Portugal, S.A. e de que esta seja credora.
No caso vertente resulta à saciedade da matéria de facto provada que os créditos reclamados na presente causa não foram prestados pela CTT – Correios de Portugal, S.A., mas sim pela autora e ora apelante CTT Expresso – Serviços Postais e Logística, S.A., e que os serviços que a mesma prestou à ré e ora apelada consistiram na recolha, transporte e distribuição de mercadorias[20], ou seja, trata-se de serviços que não se subsumem ao conceito de serviços postais, e muito menos se integram no conceito de serviço postal universal.

Em sentido concordante com o exposto, considerando que aos contratos de transporte de bens e mercadorias em território nacional celebrados com a CTT EXPRESSO, SERVIÇOS POSTAIS E LOGÍSTICA, SA, se aplica o regime legal do DL n.º 239/2003 de 04-10, e não a Lei nº 17/2012, cfr. o já mencionado ac. RL 11-02-2021 (Isoleta Costa), p. 20633/19.0T8LSB.L1-8.
Tanto basta para concluir pela inaplicabilidade do prazo de prescrição consagrado no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07.

3.2.2.2.Da aplicabilidade do prazo previsto no art. 317º, al. b) do Código Civil
A título subsidiário invocou a ré e ora apelada, no articulado de oposição[21], o prazo prescricional previsto no art. 317º, al. b) do Código Civil. A sentença apelada não apreciou esta questão, por ter resultado prejudicada, visto que julgou procedente a exceção de prescrição fundada no art. 10º, nº 1 da Lei nº ,23/96.
Concluindo este Tribunal pela inaplicabilidade deste prazo prescricional, cumpre apreciar a exceção de prescrição prevista no art. 317º, al. b) do CC.
Estabelece o mencionado preceito que prescrevem no prazo de dois anos “Os créditos dos comerciantes pelos objectos vendidos a quem não seja comerciante ou os não destine ao seu comércio, e bem assim os créditos daqueles que exerçam profissionalmente uma indústria, pelo fornecimento de mercadorias ou produtos, execução de trabalhos ou gestão de negócios alheios, incluindo as despesas que hajam efetuado, a menos que a prestação se destine ao exercício industrial do devedor.”
Como resulta de modo inequívoco da ressalva constante da parte final do citado preceito, o mesmo não se aplica sempre que o crédito emerja de negócio jurídico celebrado pelo devedor no exercício da sua atividade comercial ou industrial.
No caso presente, tanto a autora, ora apelada, como a ré e ora apelante são sociedades comerciais, e os créditos reclamados pela autora, ora apelante, emergem de contratos de prestação de serviços celebrados entre ambas no exercício das respetivas atividades[22], razão pela qual se impõe concluir pela inaplicabilidade do invocado art. 317º, al. b) do CC.
Acresce que mesmo que assim não fosse, sempre esta exceção seria julgada improcedente.
Com efeito, todas as causas de prescrição previstas no art. 317º do CC, tal como aliás a prevista no art. 316º do mesmo código se fundam na presunção de cumprimento – art. 312º do CC.
Por isso, estabelece o art. 314º do mesmo código dispõe que a dívida se considera confessada se o devedor se recusar a cumprir ou praticar em juízo atos incompatíveis com a presunção de cumprimento.

Interpretando o disposto no art. 312º do CC dizem PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA[23] que “A expressão prescrição presuntiva indica que ela se funda na presunção de cumprimento, (…) e se destina, no fundo, a proteger o devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo durante muito tempo”. E, mais adiante, em comentário ao art. 314º, acrescentam os mesmos autores que “É incompatível com a presunção de cumprimento ter o devedor negado, por exemplo, a existência da dívida, ter discutido o seu montante, ter invocado uma compensação, ter invocado a gratuitidade dos serviços, etc. (…)”

Na mesma linha de raciocínio, sustentou MENEZES CORDEIRO[24] também explicita que: “As prescrições presuntivas baseiam-se numa presunção de que as dívidas visadas foram pagas. De um modo geral, elas reportam-se a débitos marcados pela oralidade ou próprios do dia-a-dia. Qualquer discussão a seu respeito ou ocorre imediatamente, ou é impossível dirimir em consciência”.
E mais adiante, acrescenta o mesmo Mestre:
“Na base do afinamento jurisprudencial temos a ideia de confissão tácita, assente, segundo o artigo 314.º, em que o devedor pratica em juízo atos incompatíveis com a presunção de incumprimento. Assim:
- os opositores a uma ação de honorários de um advogado que se põem a discutir o seu montante ilidem, obviamente, a presunção de que pagaram
- o opositor ao pedido de condenação no preço de serviços, que nega a dívida, ilide a presunção de que pagou;
- o próprio devedor que, em contestação, reconheça não ter efetuado o pagamento, ilide a presunção;
- o réu que queira fazer valer a prescrição presuntiva terá de alegar claramente que pagou;
- na falta de impugnação especificada dos factos invocados pela autora, o réu confessa tacitamente, ilidindo a presunção de prescrição.”
No caso em apreço verificamos que articulado de oposição a ré e ora apelada, longe de sustentar que pagou as faturas reclamadas pela autora, admite que as não pagou, invocando para tanto que um dos bens transportados foi entregue com danos, não tendo a autora e ora apelante aceite compensá-la pelos prejuízos daí resultantes.[25]
Tal comportamento da ré e ora apelada é incompatível com a presunção de cumprimento que subjaz às prescrições presuntivas, razão pela qual também por este motivo concluímos pela inaplicabilidade do disposto no art. 317º do CC ao caso dos autos.

3.2.2.3.Do prazo prescricional aplicável - síntese conclusiva
Não sendo aplicável ao caso dos autos nem o prazo prescricional previsto no art. 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26-07, nem o prazo consagrado no art. 317º do CC, e não se descortinando que os créditos reclamados nos presentes autos se achem sujeitos a qualquer outro prazo especial, sendo manifestamente inaplicável o prazo de cinco anos consagrado no art. 310º do CC, os mesmos devem considerar-se sujeitos ao prazo geral de prescrição consagrado no art. 309º do CC, ou seja, que é de vinte anos.
Assim, e uma vez que as faturas a que se reportam os presentes autos foram emitidas em datas compreendidas entre outubro de 2017 e janeiro de 2019, e considerando que o requerimento inicial deu entrada na Secretaria das Injunções em 19-03-2020, tendo a ré sido notificada em 15-06-2020[26], forçoso é concluir que tal prazo não se completou.
Nesta conformidade, e diversamente do entendido pelo Tribunal a quo, conclui este Tribunal pela improcedência da exceção de prescrição, procedendo assim as conclusões de recurso que apontam neste sentido.

3.2.3.Dos créditos da apelante

3.2.3.1.Do pagamento dos serviços prestados
Da factualidade provada resulta que a apelante prestou à apelada serviços de transporte de mercadorias, não tendo esta pago o respetivo preço, cujo valor global totalizou € 8.698,62.[27]
É certo que a ré, ora apelada invocou o cumprimento defeituoso da prestação a que a autora e apelante se havia obrigado, sustentando que um dos bens transportados, a saber um LCD se partiu, o que lhe causou um prejuízo de € 2.290,17, decorrente da necessidade que teve de substituir tal LCD, a fim de o entregar ao cliente[28], mas também é certo que não retira de tal afirmação qualquer consequência jurídica, nem deduz qualquer pretensão[29].
Mas ainda que o tivesse feito, o certo é que não resultou provado que tenha sofrido qualquer prejuízo.
Na verdade, embora se tenha apurado que um LCD transportado pela apelante “chegou com rebordo partido”[30], não consta da factualidade provada a quem tal bem pertencia, nem consta do elenco de factos provados que essa ocorrência tem há causado à ré e ora apelante qualquer prejuízo, sendo certo que não resultou provado que aquele LCD tinha o valor de € 2.290,17.[31]

3.2.3.2.Da mora e da indemnização nela fundada
Pediu a autora e ora apelante a condenação da ré, ora apelada, a pagar-lhe a quantia de € 1.317,96 a título de juros de mora vencidos até 19-03-2020, e dos vincendos desde tal data até integral pagamento.
Nos termos do disposto no art. 804º, nº 1 do CC, a simples mora constitui o devedor na obrigação de indemnizar o credor, correspondendo tal indemnização ao pagamento de juros de mora, contados à taxa legal aplicável, salvo se outra taxa for convencionada e sem prejuízo da faculdade que assiste ao credor no sentido de alegar e provar que a mora do devedor lhe causou prejuízo mais elevado (art. 806º do CC).
Sendo autora e ré empresas comerciais, esses juros contabilizam-se à taxa prevista nos arts. 559º do CC e 102º do Código Comercial.
Quanto ao momento da constituição em mora, haverá que ter presente que, por regra, tal só se verifica com a interpelação do devedor (art. 805º, nº 1 do CC), a menos que a obrigação tenha prazo certo, provier de facto ilícito do devedor, ou se torne impossível por facto imputável ao mesmo (art. 805º, nº 2).
No caso vertente, da factualidade apurada não resulta qualquer facto que permita concluir que as partes tenham convencionado qualquer prazo para o cumprimento da obrigação do pagamento do preço dos serviços de transporte prestados pela apelante à apelada.
Neste particular, haverá que realçar que a emissão das faturas, por si só não transmuta aquela obrigação em obrigação com prazo certo, embora a sua apresentação à apelada fosse de qualificar como interpelação para pagar, razão pela qual seria de considerar que a apelada se teria constituído em mora na data em que recebeu tais faturas.
Sucede, porém, que não resulta da factualidade provada que antes da propositura da injunção que deu origem à presente ação, a apelante tenha enviado à apelada as faturas juntas aos autos, ou por qualquer outra forma tenha desta exigido o pagamento dos serviços prestados. Na verdade, apenas resultou provado que os serviços foram prestados e as faturas emitidas[32].
Nesta conformidade, a ré e ora apelada apenas se pode considerar interpelada, e por isso em mora, desde a data em que recebeu a notificação da injunção, o que, como já referimos ocorreu em 15-06-2020.
Daí a improcedência do pedido de condenação no pagamento de juros de mora, no que diz respeito aos liquidados no requerimento de injunção, que compreendem períodos decorridos até 19-03-2020, bem como no tocante aos juros vencidos desde esta data até à data da citação.
O pedido de juros de mora procede, pois, apenas no tocante aos vencidos desde 15-06-2020 até integral pagamento.
Consequentemente, será a ré e ora apelada condenada a pagar à autora e ora apelante juros de mora sobre e 8.698,62, contados à taxa legal prevista no art. 102º do Código Comercial e nas sucessivas portarias a que tal preceito se reporta, desde 15-06-2020, até integral pagamento.

3.2.4.Das custas
Nos termos do disposto no art. 527º, nº 1 do CPC, “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.”
A interpretação desta disposição legal, no contexto dos recursos, deve atender ao elemento sistemático da interpretação.
Com efeito, o conceito de custas comporta um sentido amplo e um sentido restrito.
No sentido amplo, as custas tal conceito inclui a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (cf. arts. 529º, nº1, do CPC e 3º, nº1, do RCP).
sentido restrito, as custas são sinónimo de taxa de justiça, sendo esta devida pelo impulso do processo, seja em que instância for (arts. 529º, nº 2 e 642º, do CPC e 1º, nº 1, e 6º, nºs 2, 5 e 6 do RCP).
O pagamento da taxa de justiça não se correlaciona com o decaimento da parte, mas sim com o impulso do processo (vd. arts. 529º, nº 2, e 530º, nº 1, do CPC). Por isso é devido quer na 1ª instância, quer na Relação, quer no STJ.
Assim sendo, a condenação em custas a que se reportam os arts. 527º, 607º, nº 6, e 663º, nº 2, do CPC, só respeita aos encargos, quando devidos (arts. 532º do CPC e 16º, 20º e 24º, nº 2, do RCP), e às custas de parte (arts. 533º do CPC e 25º e 26º do RCP).
Tecidas estas considerações, resta aplicar o preceito supracitado.
E fazendo-o diremos que no caso em apreço, face à parcial procedência da ação e do presente recurso, as custas devem ser suportadas por apelante e apelada, na proporção dos respetivos decaimentos.

4.Decisão
Pelo exposto acordam os Juízes desta 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar o presente recurso parcialmente procedente, e em consequência, revogando a decisão recorrida:
a)-julgar improcedente a exceção de prescrição;
b)-julgar a ação parcialmente procedente:
i.- condenando a apelada a pagar à apelante a quantia global de € 8.698,62, acrescida de juros de mora contados à taxa supletiva aplicável aos créditos das empresas comerciais, desde 15-06-2020 até integral pagamento;
ii.- Absolver a ré do pedido de condenação no pagamento de juros de mora liquidados no requerimento inicial e dos vencidos até à data referida em i.
Custas em ambas as instâncias por apelante e apelada, na proporção dos respetivos decaimentos.


Lisboa, 21 de junho de 2022 [33]



Diogo Ravara
Ana Rodrigues da Silva
Micaela Sousa



[1]Pessoa coletiva nº 5.......6.
[2]Pessoa coletiva nº 5.......5
[3]Refª 26645013, de 09-07-2020, apresentado em 19-03-2020, constante de fls. 2.
[4]Refª 397566455/35945097, de 01-07-2020, constante de fls. 4 ss.
[5]Refª 400154370, de 03-11-2020, fls. 14.
[6]Refª 2771809/37140604, de 13-11-2020, fls. 15 ss.
[7]Refª 410058296, de 23-11-2021, fls. 142-146.
[8]Refª 31439804/41080144, de 21-01-2022 - fls. 147-151.
[9]Refª 31738573/41382867, de 19-02-2022, fls. 153-158.
[10]Neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117
[11]Ob. cit., p. 119.
[12]“Direito Processual Civil”, Vol. II, 2.ª Ed., Almedina, 2019, p. 468.
[13]“O Recurso Civil. Uma Teoria Geral”, AAFDL, 2017, p. 69.
[14]Conclusão 2-.
[15]Pontos a 1 a 3 dos factos provados.
[16]Alterado pelos DLs nºs 145/2008, de 28-07, e 57/2021, de 13-07.
[17]Alterada pela Leis nºs 12/2008, de 26-02; 24/2008, de 02-06; 06/2011, de 10-3; 44/2011, de 22-06; 10/2013, de 28-01; e 51/2019, de 29-06. As alterações introduzidas no diploma em apreço em datas posteriores às mencionadas no elenco de factos provados e não provados da sentença apelada são irrelevantes para a apreciação das questões debatidas no presente aresto.
[18]Alterada peo DL nº 160/2013, de 19-11; pela Lei nº 16/2014, de 04-04; pelo DL nº 49/2021, de 14-06, e pela Lei nº 22-A/2022, de 07-02. Valem aqui por inteiro as considerações vertidas na segunda parte da nota que antecede.
[19]Alterado pelos DLs nºs 150/2001, de 07-05; 116/2003, de 12-06; 112/2006, de 09-06; e 160/20136, de 19-11.
[20]Ponto 2. dos factos provados.
[21]Art. 19º do mencionado articulado.
[22]Vd. pontos 2. e 5. dos factos provados. No primeiro refere-se que o objeto dos mencionados contratos foi o transporte de mercadorias, ou seja, de bens utilizados pela ré e ora apelada no exercício da sua atividade; e no segundo alude-se a especiais caraterísticas dos equipamentos transacionados pela ré e  ora apelada, retirando-se do sentido dos pontos 6 e seguintes do elenco de factos provados que os bens transportados pela autora e ora apelante tinham as mencionadas caraterísticas.
[23]“Código Civil anotado”, vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, 1987, pp. 281-283.
[24]“Tratado de direito Civil”, V, 2ª ed., p. 217.
[25]Vd. arts. 20º a 49º do articulado de oposição.
[26]Cfr. fls. 3.
[27]Pontos 2. e 3. dos factos provados.
[28]Vd. arts. 25º a 48º do articulado de oposição.
[29]Com efeito, a ré e apelada não invocou a exceção de compensação de créditos, nem de deduziu reconvenção, seja com este, seja com qualquer outro fundamento.
[30]Ponto 6. dos factos provados.
[31]Vd. último item dos factos não provados.
[32]Ponto 3. dos factos provados.
[33]O presente acórdão foi assinado digitalmente – cfr. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.