Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
78623/19.0YIPRT.L1-2
Relator: CARLOS CASTELO BRANCO
Descritores: NULIDADE DE SENTENÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REJEIÇÃO
ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO
SUBEMPREITADA
PAGAMENTO DO PREÇO
CRÉDITO
COMPENSAÇÃO
NULIDADE PROCESSUAL
ARGUIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I)A não apreciação de algum fundamento fáctico ou argumento jurídico, invocado pela parte que, possa, eventualmente, prejudicar a boa decisão sobre o mérito das questões – de facto e/ou de direito - suscitadas não conduz à existência do vício de omissão de pronúncia, a que se refere o artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, por estar em causa, quando muito, um erro de julgamento e, não, uma falta de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar.

II)Não se verificando que os fundamentos de facto e/ou de direito invocados pelo julgador devessem conduzir logicamente a resultado oposto ao expresso na decisão, não ocorre a nulidade a que se refere a primeira parte, da alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC.

III)Não resultando, nem das conclusões, nem da motivação da apelação, quais os concretos meios probatórios, constantes do processo, que imporiam decisão diversa da recorrida, deve ser rejeitado o recurso referente à impugnação da matéria de facto, por inobservância do ónus de impugnação contido na alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.

IV)Não tomando a apelante concreta posição, identificando-a, sobre qual a decisão que deveria ser tomada por este Tribunal de recurso a respeito da factualidade impugnada, não observou o ónus de impugnação a que se reporta a al. c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.

V)No âmbito de contrato de subempreitada, demandado o empreiteiro pelo subempreiteiro para pagamento de parte do preço não solvido por aquele, e pedindo o réu, em reconvenção, o reconhecimento de um crédito, visando a sua compensação com o crédito do autor, incumbe ao réu, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do CC, a prova dos factos genéticos ou constitutivos do aludido crédito, enquanto extintivos do direito ao preço reclamado pela contraparte.

VI)Tendo o depoimento de testemunha tido lugar, em sessão da audiência de discussão e julgamento que decorreu em 20-12-2019, na presença da ré e da sua mandatária, a ré deveria ter arguido a nulidade que veio invocar – apenas em sede de alegações - a respeito do depoimento desta testemunha, no decurso desta sessão, pelo que, a invocação da aludida nulidade, apenas nesta sede recursória, conduz à verificação da extemporaneidade na arguição de tal vício, atento o disposto no artigo 199.º, n.º 1, do CPC.


(Sumário elaborado pelo relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do CPC).


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

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1.Relatório:

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1.SANESTRADAS - EMPREITADAS DE OBRAS PÚBLICAS E PARTICULARES, S.A., identificada nos autos, instaurou procedimento de injunção contra MAP-ENGENHARIA, LDA., também identificada nos autos, para pagamento da quantia de € 15.846,75 e respetivos juros de mora, à taxa legal, vencidos, no valor de € 234,01, e vincendos até integral pagamento (acrescida das quantias de €350,00 e €153,00, a título de despesas de contencioso e taxa de justiça suportadas, respetivamente).
Fundamentou a sua pretensão no facto de ter celebrado com a requerida, em 22/01/2019, um contrato de subempreitada, não tendo esta, apesar de interpelada para tal, procedido ao pagamento da totalidade do preço devido, estando ainda em dívida a quantia de €15.846,75.

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2.A requerida deduziu oposição, excecionando:
i)-a inexigibilidade da dívida (a fatura n.° FO 2019/99, no valor peticionado, que lhe foi remetida pela requerente, não veio acompanhada do correspondente auto de medição previamente aprovado por ambas as partes, conforme estipulado no contrato de subempreitada invocado pela requerente);
ii)-o incumprimento por parte da requerente do contrato invocado como causa de pedir, pois que a requerente abandonou a obra sem concluir os trabalhos a que se obrigou contratualmente, o que determinou a resolução do contrato, comunicada à requerente por carta de 03/04/2019.
Com base nesta última exceção perentória, a requerida deduziu ainda reconvenção, pedindo:
a)-a condenação da requerente no pagamento da quantia de €35.254,91, a título de indemnização dos prejuízos sofridos em consequência do incumprimento contratual;
b)-e, caso venha a ser reconhecido o crédito da requerente, a condenação desta, operada a compensação, no pagamento do remanescente desse crédito, no montante de €18.671,15.

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3.Os autos foram remetidos à distribuição como ação de processo comum, tendo a autora impugnado os factos invocados em fundamento das exceções deduzidas e da reconvenção, concluindo pela sua improcedência.

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4.Por despacho de 21-01-2021, foram as partes convidadas a aperfeiçoar os respetivos articulados, o que estas fizeram, por requerimentos de 15-10-2021.

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5.Posteriormente, foram os autos saneados e proferido despacho de identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, nos termos do n.º 1 do artigo 596.º do CPC.

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6.Realizou-se audiência de julgamento, com produção probatória, após o que, em 26-07-2023, foi proferida sentença, julgando a ação procedente, por provada, e, em consequência, condenando a ré a pagar à autora a quantia de € 15.846,75, acrescida dos juros de mora vencidos, à taxa legal supletiva para os juros comerciais, sobre o capital, desde o dia 11/06/2019 até integral pagamento e, julgando improcedente a reconvenção, absolvendo a autora/reconvinda do pedido reconvencional.

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7.Não se conformando com a referida sentença, dela apela a ré, pugnando pela sua revogação, tendo formulado as seguintes conclusões:

“OBJETO DO RECURSO
1.–O Tribunal a quo condenou a MAP a pagar à SANESTRADAS a quantia de €15.846,75, acrescida dos juros e julgou improcedente, por não provado, o pedido reconvencional da Recorrente.
2.–A sentença padece de graves erros de julgamento de facto e de erros de juízo de Direito.
3.–Na sequência do disposto no art. 662/1 do CPC, defende Abrantes Geraldes que o Tribunal da Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem".

4.–O presente recurso visa, assim, a reapreciação da matéria de facto e de direito, tendo por objeto a resposta às seguintes questões:                                                                                                           
i.-Há nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia quanto a factos essenciais, complementares/concretizadores e instrumentais?
ii.-Existe oposição entre os fundamentos e a decisão proferida?
iii.-Quais os trabalhos executados e não executados pela Subempreiteira?
iv.-Quais os custos suportados pela MAP em virtude do abandono da obra e da não execução total dos trabalhos objeto do Contrato de Subempreitada? A Autora é responsável pelos custos extraordinários suportados pela Ré decorrente do incumprimento imputável à Sanestradas? Em que medida?
NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA E DE DECISÃO QUANTO A FACTOS ESSENCIAS/COMPLEMENTARES E CONCRETIZADORES E INSTRUMENTAIS INVOCADOS E PROVADOS
5.–O Tribunal a quo ignorou um conjunto de factos que se revelavam essenciais para a decisão, factos que foram (i) objeto de alegação e prova - factos essenciais, factos complementares / concretizadores daqueles e também factos instrumentais - e (ii) ainda outros factos instrumentais que resultaram da instrução da causa.
6.–O Tribunal não se pronunciou quanto ao conhecimento da licença de ocupação de via pública pela SANESTRADAS e das condicionantes aí previstas, também do conhecimento da SANESTRADAS, sendo o tema referente a esta licença constava do Ponto 4 e 5 dos Temas da Prova fixados no Despacho Saneador. Estes Pontos revelam-se essenciais para a aferir o incumprimento da obrigação por parte da Recorrida e a legalidade dos custos imputados à Autora no pedido reconvencional.
7.–Esta omissão consubstancia um erro de julgamento, constituindo uma omissão de pronúncia e de tomada de decisão, sendo que estes factos não foram incluídos no elenco dos factos provados e não provados na Sentença recorrida (artigo 615.°, n.° 1, alínea d) CPC).
8.–A verificação desta nulidade não implica que o Tribunal ad quem deixe de decidir sobre estes pontos da matéria de facto, dispondo de todos os elementos necessários para alterar a decisão quanto à matéria de facto, na medida em que foi produzida prova sobre todas as matérias sobre as quais o Tribunal a quo não se pronunciou (arts. 5, n.os 1 e 2 al. a), 607.°, 608.°, 662/1 e 665.° do CPC).
NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA QUANTO AO INCUMPRIMENTO DO CONTRATO DE SUBEMPREITADA PELA AUTORA
9.–O Tribunal fixou como Tema da Prova n.° 7 do "incumprimento da Autora dos planeamentos dos trabalhos acordados".
10.–Em sede de audiência de julgamento foi produzida prova bastante para se concluir pelo incumprimento do contrato por parte da SANESTRADAS, em particular o incumprimento dos trabalhos adjudicados e não executados e, bem assim, do incumprimento do prazo fixado pelas partes no Contrato de Subempreitada. Essa prova decorreu quer da prova documental, quer da prova testemunhal produzida através do depoimento de testemunhas credíveis e imparciais.
11.–O Contrato de Subempreitada em crise foi celebrado em regime de "série de preços" - Ponto 3 da Matéria de Facto Provado. O trabalho de escavação em rocha encontrava-se previsto na lista de trabalhos a executar, tendo a SANESTRADAS dado um preço para o referido trabalho. No contrato ficou apenas por definir quantidade do referido trabalho, pois essa aferição depende da efetiva realização do trabalho.
12.–O douto Tribunal assim não entendeu, não retirando as devidas consequências do regime de "série de preços" acordado pelas partes, em especial a ilicitude do comportamento da SANESTRADAS em fundamentar o seu incumprimento e abandono de obra com base num litígio inexistente e violador do contrato, da lei aplicável e dos mais elementares princípios de direitos transversais a todos os negócios jurídicos, como o princípio da boa- fé. da confiança e da proporcionalidade. Esta conduta por parte da SANESTRADAS constitui uma situação de incumprimento unilateral e definitivo por abandono de obra.
13.–Da prova testemunhal produzida, ficou demonstrado que, independentemente da questão relacionada com a existência de rocha e a quantidade da mesma, tal diferendo não se traduziria num fundamento para que procedessem ao abandono da obra.
14.–O Tribunal a quo limitou-se, nas últimas folhas da sentença, a discorrer sobre os requisitos da responsabilidade contratual, sem que, no entanto, tenha subsumido a matéria de facto produzida à norma invocada, analisando devidamente e individualmente o preenchimento ou não dos referidos requisitos.
15.–O abandono de obra com fundamento numa divergência nas quantidades configura um comportamento violador de deveres acessórios das partes no cumprimento do contrato e do princípio da boa-fé, da proporcionalidade e da confiança. Impunha-se, assim, ao douto Tribunal apreciar na matéria de facto quanto ao incumprimento da SANESTRADAS, em resposta à questão enunciada na alínea b) do Ponto 3 (Questões a decidir), o que não foi feito, padecendo a sentença em crise do vício de nulidade (cfr. art. 615/ 1, al. d) do CPC).
A NULIDADE POR OPOSIÇÃO ENTRE O FUNDAMENTO E A DECISÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
16.–O Tribunal a quo deu como provado que o contrato de subempreitada celebrado, em 22.01.2019, entre as partes foi celebrado em regime de série de preços.
17.–Ficou igualmente provado que o prazo de execução dos trabalhos era de 45 dias, em que que se tenha fixado o início dos trabalhos, sendo aplicáveis os art. 278.° e 279.° do CC.
18.–Ficou provado que os trabalhos tiveram início a 31.01.2019 (cfr. Ponto 10).
19.–O Tribunal dá como provado a existência de uma cláusula negociada entre as Partes nos termos da qual assistia à MAP o direito de rescindir sem aviso prévio o Contrato e adjudicar a outrem os trabalhos não realizados.
20.–Da prova produzida resultou de forma evidente que os trabalhos não foram concluídos, encontrando-se provado o abandono da obra, tanto por prova documental como por prova testemunhal.
21.–O Tribunal a quo não retirou qualquer ilação ou consequência jurídica da verificação da situação do abandono da obra e do não cumprimento do prazo de execução dos trabalhos, dando como não provada a matéria do abandono da obra, resultando evidente a contradição entre os fundamentos invocados e a decisão que o mesmo tomou quanto a este particular aspeto.
22.–Existem divergências entre os trabalhos/fornecimentos previstos na listagem anexa ao contrato e os trabalhos/fornecimentos efetivamente prestados assinalados nos pontos 4.1 a 4.4, 4.6, 4.9, 4.10, 4.15 e 4.23 dos Factos Provados, o que demonstra precisamente o abandono da obra e a não conclusão dos trabalhos contratados.
23.–Cabia à Autora fazer prova que os valores peticionados na ação são efetivamente devidos (art. 342.° CC); ao invés, ficou provado que a Autora não realizou todos os trabalhos, presumindo-se a sua culpa (cfr. art. 799.° CC).
24.–Existe uma clara contradição entre a decisão e a sua fundamentação, o que determina a aplicação do disposto no artigo 615.°, n.° 1, c), aplicável ex vi artigo 666.°, n.° 1, ambos do CPC, o que determinará a nulidade da sentença.

IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
25.–Muitos foram os factos que o Tribunal ignorou e não julgou, violando o disposto no arts. 607.°, n.° 3, e 608.°, n.° 2 do CPC.
26.–Deveriam ter sido dados como provados diversos factos a saber:
i.-As negociações entre a SANESTRADAS e a MAP tiveram início, pelo menos, em 03.12.2018 - Email de 03.12.2018, 17:01 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções
ii.- A 08.01.2019, a MAP enviou um email à SANESTRADAS: " (...) Salientamos que hoje é dia 08.01.2019, pelo que é urgente que se de início à execução dos trabalhos acordados. Como é do V/conhecimento este assunto é de extrema importância na medida em que condiciona a entrega da empreitada ao nosso cliente, cujo atraso resultará em prejuízos incalculáveis para a MAP Engenharia (destaques nossos). - Email de 08.01.2019, 15:34 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções
iii.- A 10.01.2019, a SANESTRADAS envia um novo email à MAP, as condições contratuais - Email de 10.01.2019 14:21 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções.
iv.- A 15.01.2019, a MAP envio um email à SANESTRADAS: com o seguinte teor:" (...) 4. Prazo de execução: Enquadrável no prazo de licença em anexo emitida pela CMC (15.01.12019 a 28.02.2019). - Email de 16.01.2019, 12:36 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções.
v.-Os trabalhos objeto do Contrato foram adjudicados a 16.01.2019 - Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
vi.-No email de 16.01.2019, a MAP solicita à SANESTRADAS que "agendem o início dos trabalhos o mais rapidamente possível face à validade da licença que vos remetemos e conclusão da empreitada com o nosso cliente." - Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
vii.-A MAP diligenciou no sentido da Sanestradas retomar os trabalhos nos dias subsequentemente a 14.03.2019 - cfr. Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
viii.-O prazo previsto para conclusão da obra era de 45 dias a contar da data da data de adjudicação dos trabalhos, a 16 de janeiro de 2019, ou no limite, a contar da data de assinatura do contrato, com início em 21 de janeiro e termo em 7.03.2019 - artigo 20.° da Oposição e artigo 35.° da Resposta às Exceções, no qual há confissão das datas de execução dos trabalhos.
ix.-A SANESTRADAS é uma empresa com vários anos de experiência, tendo realizado já diversas obras para o Município de Cascais e as Águas de Cascais - cfr. depoimento do Eng. “AA”, prestado na sessão de dia 20/12/2022.
x.-A SANESTRADAS é uma entidade credenciada junto das Águas de Cascais – cfr. depoimento do Eng. “AA”, prestado na sessão de dia 20/12/2022.
xi.-Em 18.03.2019 (segunda-feira), a MAP reuniu-se com a SANESTRADAS com vista à resolução dos diferendos - – cfr. Emails/DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
xii.-A reunião referida supra demorou poucos minutos, tendo a SANESTRADA recusado a conversar - – cfr. Emails / DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
xiii.-Após 14.03.2019, a Sanestradas não executou quaisquer trabalhos objeto do contrato de subempreitada – cfr. Emails juntos como DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
xiv.-No dia 21 de março de 2019, a Sanestradas remeteu um email à MAP, com o seguinte teor: “Bom dia/No seguimento da reunião efetuada em obra na passada segunda feira, para análise das quantidades e valores propostos, agradecíamos o vosso parecer sobre o os mesmos, de forma a podermos programar a conclusão dos trabalhos. - cfr. Emails/ DOC 3 da Resposta.
xv.-A SANESTRADAS elaborou e remeteu à Autora os dois autos de mediação, os quais foram aprovados pela MAP, no montante de € 23.058,75;
xvi.-Após 14.03.2019, a MAP contratou com terceiros a execução de trabalhos não executados pela SANESTRADAS – cfr. depoimento das testemunhas “BB”, “CC” e “DD” (sessões de 30.11.2019 e 20.12.2019).
xvii.-Em 01.04.2019, a MAP remeteu à SANESTRADA uma carta para resolução do contrato - Doc. 4 da Oposição.
xviii.-A MAP contratou a sociedade Axioalpotency para aluguer de maquinaria e manobrador alocados aos trabalhos de ligação de rede exteriores do Condomínio Santa Marta Residence - Docs. 66 a 68 da Oposição e depoimento de “CC”, na sessão de 30.11.2022.
27.–Tais omissões são fundamento de impugnação da decisão quanto à matéria de facto, devendo todos aqueles factos ser introduzidos no elenco da matéria de facto provada (arts. 662/1, 607/4, 663/2 do CPC).
DO ABANDONO DE OBRA – IMPUGNAÇÃO PONTO 1.º DA MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
28.–A SANESTRADAS para além de não concluir os trabalhos no prazo contratualmente estabelecido, a Requerente interrompeu os trabalhos e abandonou a obra, sem qualquer fundamento válido ou aviso prévio a 14.03.2019 (art. 31.º / Doc. 18 a Doc. 23. da Oposição à Injunção).
29.–Dar por concluídos os trabalhos não é o mesmo que concluir de facto; a conclusão dos trabalhos ocorre com a entrega da obra que pressupõe uma receção provisória/auto de entrega. Nada disso se verificou.
30.–A SANESTRADAS não juntou, para o efeito, qualquer documento para atestar o por si alegado, nem impugnou os emails juntos como Doc. 18 a Doc. 23.
31.–Em nenhum momento, a SANESTRADAS rebate acusação grave feita pelos trabalhadores da MAP, aceitando o abandono de obra.
32.–A SANESTRADAS, em email de 21.03. 2019, confessa que os trabalhos não foram totalmente concluídos, pese embora tenha retirado de obra toda a maquinaria e pessoal, quando refere "[n]o seguimento da reunião efetuada em obra na passada segunda feira, para análise das quantidades e valores propostos, agradecíamos o vosso parecer sobre o os mesmos, de forma a podermos programar a conclusão dos trabalhos. - cfr. Emails/DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
33.–A SANESTRADAS retirou máquinas e trabalhadores, não se poderá deixar de concluir pelo abandono de obra por parte da SANESTRADAS.
34.–A testemunha “BB”, afirmou que "A A Sanestradas o último troço não fez.", tendo ficado por fazer a "última caixa até à obra", a mesma testemunha confirma que "foi outra empresa a fazer" os trabalhos que faltavam, tendo ficado por fazer também "a ligação à água, do ramal de água. Não foi a Sanestradas que ligou". Esta testemunha confirma o abandono da obra quando refere "a Sanestradas desaparece, mas a Sanestrada tem um troço que está todo feito, podia ter deixado concluído, porque as caixas estavam feitas".
35.–Os depoimentos das testemunhas da SANESTRADAS revelaram incongruências com os depoimentos de outras testemunhas e com a própria prova documental junta aos autos. A testemunha “AA” (Diretor de Produção da A.) confessa o abandono da obra, quando refere expressamente que as obras pararam em março. O seu depoimento contraria também a prova documental com ao início dos trabalhos e os motivos pelo qual estes apenas começaram em 30.01.2019, tendo culpar a MAP quando o atraso inicial de 15 dias se deveu à SANESTRADAS.
36.–A SANESTRADAS fundamenta o abandono da obra por serem necessários trabalhos extra e sobrecustos, no entanto, esses fundamentos não legitimam o abandono da obra.
37.–Não houve uma conclusão dos trabalhos contratados ou a subsequente entrega da mesma, nem uma suspensão dos trabalhos, devidamente justificada. Verificou-se, sim, um abandono da obra, consubstanciado no levantamento de toda a maquinaria pesada (e outra), a deslocação dos trabalhadores e a não comparência em obra por diversos dias seguidos. A todos estes factos, acresce ainda a circunstância de a SANESTRADAS não ter respondido aos emails enviados pela MAP nos dias subsequentes ao abandono da obra, entre 14 e 16 de março, emails no qual a Subempreiteira era acusada de ter abandonado a obra. Segundo as regras de experiência comum, se não existisse uma situação de abandono, tais acusações seriam refutadas de imediato; não o tendo feito, a ausência de resposta reveste uma confissão tácita ou um forte indício de efetivo abandono de obra.
38.–O Ponto 1 da matéria de facto não provada deve ser considerado totalmente provado, passando a constar da matéria de facto provada que ""A A. interrompeu os trabalhos e abandonou a obra, sem qualquer razão ou aviso prévio em 14/03/2019." Caso assim não se entenda, o que apenas se equaciona por exacerbada cautela, deverá o Ponto da matéria de facto não provada ser considerado provado com a seguinte formulação: A A. abandonou a obra em 14/03/2019.".
DOS TRABALHOS PENDENTES DE AUTORIZAÇÃO DAS ÁGUAS DE CASCAIS - PONTO 14.g, 2.a PARTE DOS FACTOS PROVADOS
39.–O Ponto 14 dos Factos Provados tem a seguinte formulação: “A A. não executou, nem faturou os trabalhos referidos nos pontos 4.12, 4.13, 4.26, 4.27 3 4.33, porque a execução desses trabalhos estava dependente autorização/agendamento do trabalho referidos no ponto 4.12 das Águas de Cascais e esta só veio a ser emitida depois do facto referido em 12." O tribunal incorreu num erro de julgamento quanto e este facto.
40.–O Tribunal considerou os testemunhos de “AA” e “EE”, sendo que, estes revelaram incongruências com outros depoimentos, o que foi notório para o Tribunal, visto ter surgido a necessidade de chamar as testemunhas pela segunda vez. “EE” não tinha conhecimentos quanto às questões técnicas e/ou quanto as questões referentes à dependência entre os trabalhos em causa. O “AA” revelou desconhecer a data do início dos trabalhos, da licença de ocupação em via pública, o que não é consentâneo com os factos provados e apurados.
41.–Para dar como assente a matéria constante do Ponto 14 da Matéria de Facto Provado, o douto Tribunal faz uso de aferências que pressupõem conhecimentos técnicos que, o Tribunal, não suportado por técnico competente.
42.–Não poderá o douto Tribunal, sem mais, concluir que [e]mbora as referidas testemunhas “AA” e “EE” se tenham exclusivamente referido ao trabalho ponto 1.2.4 da listagem anexa ao contrato (ponto 4.12 dos factos provados) como estando dependente da referida autorização, afigura-se que existe entre o referido trabalho e os demais trabalhos descritos no ponto 15. uma conexão lógica e sequencial que os permite incluir no núcleo de trabalhos dependentes da referida vistoria/autorização.
43.–O próprio Tribunal refere que as testemunhas só prestaram depoimento sobre o ponto 1.2.4 do Contrato. Não obstante, concluiu que existe entre esse trabalho e o trabalho do ponto 15 uma conexão lógica e sequencial que os permite incluir no núcleo de trabalhos dependentes (nem se compreende sequer a que Ponto 15 o Tribunal a quo se está a referir). Esta inferência é contrária a todas as regras de Direito e de julgamento, desde logo por obscuridade na fundamentação, devendo, por conseguinte, ser, sem mais, alterada e considerada não provada.
44.–Os trabalhos incluídos no Ponto 4.15 da Matéria de Facto Provada, referente a escavação para abertura de valas para implantação da tubagem, em solo que qualquer natureza, não estavam sujeitos a autorização no sentido em que foi considerado pelo douto Tribunal. Os trabalhos estavam somente sujeitos a licença de ocupação da via pública, pois a execução destes trabalhos implicava o corte de passeios e vias ao trânsito.
45.–Do Ponto 14.° dos Factos Provados deverá passar a ter seguinte redação: "14. A A. não executou, nem facturou os trabalhos nos pontos 4.12, 4.13, 4.26, 4.27 e 4.23."
DOS TRABALHOS INCLUÍDOS NO OBJETO DO CONTRATO DE EMPREITADA - IMPUGNAÇÃO DOS PONTOS N.OS 2, 5, 7, 9, E 10 DA MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
46.–Na fundamentação da matéria não provada, é referido que "quanto aos factos 2 a 13 não foi produzida qualquer prova desses factos, sendo insuficiente para prova do facto referido no ponto 7 a mera referência feita pela testemunha “DD”, não minimamente quantificada, que havia rocha e terra no troço escavado pela A. E não apenas rocha.”
47.–Ficou demonstrado, por confissão e extensa prova documental e testemunhal, que a Autora abandonou a obra, antes da conclusão dos trabalhos a que se obrigou no Contrato de Subempreitada. Os pontos 2 a 13 são referentes aos trabalhos que a Sanestradas não executou e/ou executou em quantidade inferior ao contratado.
48.–No ponto 2 considerou-se como facto não provado: "A A. apenas forneceu 1 unidade das válvulas de seccionamento referidas em 4.5. dos factos provados". No requerimento datado de 15.10.2021, a Sanestradas confessa que os trabalhos previstos na rubrica 1.2.2. do Contrato, do valor adjudicado, no montante de €1.560,00, faturou €780,00, o que demonstra que a Sanestradas efetivamente só executou metade dos trabalhos adjudicados. Os trabalhados eram faturados à unidade, pelo que, resulta evidente que a Autora só forneceu 3 das 6 unidades contratadas e necessárias para a conclusão total dos trabalhos.
49.–O Ponto 3 deverá passar a ter a seguinte redação e passando a constar dos factos provados: "A A. apenas forneceu 3 unidade das válvulas de seccionamento referidas em 4.5. dos factos provados." Da mesma forma que o ponto 4.5 dos factos provados deverá passar a ter a seguinte redação: "4.5. Fornecimento, assentamento e instalação de válvulas de seccionamento nas redes exteriores de abastecimento de água enterradas, incluindo válvulas, ligações, acessórios e todos os trabalhos necessários à perfeita execução da tarefa, com diâmetro de 110mm, na quantidade de 3 unidades, ao valor de 260,00€ por unidade, totalizando um valor de 780,00€ (ponto 1.2.2. da listagem anexa ao contrato)."
50.–A A. não executou o trabalho descrito no ponto 4.14 dos factos provados. Os trabalhos incluídos no ponto 4.14 correspondem à execução de todos os ensaios e experiências exigidos no Caderno de Encargos ou pela Fiscalização, incluindo todos os materiais e trabalhos inerentes à tarefa em questão, no valor único de € 450,00 (ponto 1.8. da listagem anexa ao contrato e não Ponto 1.8 como referido na sentença recorrida).
51.–Este valor pressuponha necessariamente a realização de todos os ensaios.
Estes ensaios seriam entregues no final da obra, de forma a atestar a execução dos trabalhos em conformidade com o que teria sido contratado. 
52.–Ficou provado que foi necessário contratar uma entidade terceira para realizar esses ensaios e experiências aquando da vistoria da Águas de Cascais. A Autora não conclui os trabalhos, pelo que, este valor nunca lhe seria devido.
53.–Deve ser alterado o ponto 5 da matéria de facto não provada, passando a constar que "A A. não executou o trabalho descrito no ponto 4.14 dos factos provados". Consequentemente, deverá ser alterado o ponto 4.14 dos factos provados passando o mesmo a ter a seguinte redação: "Execução de todos os ensaios e experiências exigidos no Caderno de Encargos ou pela Fiscalização, incluindo todos os materiais e trabalhos inerentes à tarefa em questão, no valor único de € 450,00 (ponto 1.7. da listagem anexa ao contrato), não tendo a Autora executado estes trabalhos".
54.–O Ponto 7 da matéria dada como não provada consta que "A A. apenas executou 20,18m2 do trabalho descrito no ponto 4.16 dos factos provados, no valor total de €1.916,63." Os trabalhos incluídos no ponto 4.16 correspondem à escavação para abertura de valas para implantação de tubagem em rocha, incluindo entivação, rebaixamento do nível freático, se necessário, e remoção dos produtos escavados, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, no valor de € 95/m2. (ponto 2.1.1 da listagem anexa ao contrato).
55.–No requerimento da Autora de 15.10.2021, esta confessa que os trabalhos descritos no ponto 2.1.1. da listagem de trabalhos, a SANESTRADAS executou apenas 19,00m, avaliado em €279,68, tendo realizado menos 41,50 m do que se encontrava contratualmente previsto e necessário para a execução da obra. Do valor global previsto para este trabalho, no montante €1.251,00, apenas foi faturado € 279,68, correspondente a 19,00 m lineares.
56.–Esta matéria descrita no Ponto 7 dos Factos não provados corresponde, mutatis mutandis, à matéria do Ponto 4.15 da Matéria de Factos Provados, havendo aqui um claro erro do Tribunal na indicação da matéria.
57.–Não obstante, sempre se dirá que relativamente ao trabalho de escavação em rocha ficou provado, através de extensa prova testemunhal, em sede de julgamento, que os trabalhos em rocha reclamados pela SANESTRADAS não foram executados nos termos e nas quantidades peticionados pela subempreiteira, não tendo a SANESTRADAS lograr provar as quantidades dos trabalhos peticionados. Deverá ser eliminada a matéria não provada no ponto 7 em crise, porquanto este ponto é uma repetição do Ponto 4.15 da Matéria de Factos Provados.
58.–Ponto 9 da matéria de facto dada como não provada: "A A. apenas executou 8,30m2 do trabalho descrito no ponto 4.19 dos factos provados, no valor total de €91,30." Os trabalhos incluídos no ponto 4.19 correspondem ao "[a]terro por camadas de 0.20 m com terras provenientes da escavação incluindo compactação, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 11/m2, totalizando € 935,00 (ponto 2.1.4 da listagem anexa ao contrato)."
59.–Ficou demonstrado que a SANESTRADAS abandonou a obra antes da conclusão da totalidade dos trabalhos, em particular a compactação das terras provenientes da escavação, trabalhos estes que executados no final, após a abertura de vala, implantação de tubagem e, ulterior aterro da vala aberta.
60.–Deverá ser eliminado este ponto da matéria não provada, pelo que deverá ser alterado o ponto 4.19 dos factos provados passando o mesmo a ter a seguinte redação: "Aterro por camadas de 0.20 m com terras provenientes da escavação incluindo compactação, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 11/m2, totalizando € 935,00, não tendo sido executado pela Autora. (ponto 2.1.4 da listagem anexa ao contrato)."
61.–Ponto 10 da matéria de facto dada como não provada: "A A. apenas executou 74,35m2 do trabalho descrito no ponto 4.20 dos factos provados, no valor total de €1.003,73". Os trabalhos incluídos no ponto 4.20 correspondem ao transporte de terras sobrantes a vazadouro incluindo carga, transporte e espalhamento em vazadouro, e eventual indemnização por depósito, conforme descrito nas Condições Técnicas, na quantidade de 85,00 m2, ao valor de € 13,50/m2, totalizando €1.147,50 (ponto 2.1.4 da listagem anexa ao contrato).
62.–No Requerimento de 15.10.2021, a Autora confessou que os trabalhos previstos na rubrica 2.1.4. do Contrato, do valor adjudicado, faturou apenas €209,00. Aplicando a estes valores uma operação matemática, acrescido do facto da prova da necessária realização dos trabalhos em quantidade igual ou superior às quantidades previstas no Contrato, pode deduzir-se uma confissão de que a Autora apenas executou metade dos trabalhos previstos no Contrato e necessários para a conclusão dos trabalhos.
63.–Deverá ser eliminado o ponto 10 em crise e deverá ser alterado o ponto 2.1.4. dos factos provados passando o mesmo a ter a seguinte redação: "Transporte de terras sobrantes a vazadouro incluindo carga, transporte e espalhamento em vazadouro, e eventual indemnização por depósito, conforme descrito nas Condições Técnicas, na quantidade de 85,00 m2, ao valor de € 13,50/m2, totalizando €1.147,50 (ponto 2.1.4 da listagem anexa ao contrato)., tendo a A. apenas executados trabalhos no valor de €209,00".
DOS CUSTOS INCORRIDOS PELA MAP EM CONSEQUÊNCIA DO INCUMPRIMENTO DO CONTRATO DE EMPREITADA - IMPUGNAÇÃO DOS PONTOS N.OS 14 DA MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
64.–Cabia ao Tribunal avaliar se a Autora tinha incumprido o contrato em causa e, no caso de se confirmar esse incumprimento, deveria ser pago à Ré a quantia de €36.254,91, a título de indemnização dos prejuízos sofridos.
65.–O Tribunal deu como não provado o ponto 14., contanto que MAP alegadamente não, comprovou, mediante a junção de recibos e/ou comprovativos de transferências bancárias, que tenha pago qualquer dos alegados valores, não sendo os documentos juntos, que apenas incluem orçamento e faturas, suficiente para o efeito, tal como não o é a mera afirmação, não documentada, feita pela testemunha “CC” que as faturas emitidas pelo aluguer das máquinas e execução de ligação à rede pública foram pagas. Por outro lado, e sobretudo, a R. não comprovou que tenha incorrido em tais alegadas despesas pelo facto de a A. Ter inopinadamente interrompido os trabalhos adjudicados, facto causal que, pelas razões acima enunciadas, a R. não logrou provar.
66.–A MAP na sua Oposição juntou os DOCS. 24 a 38, os quais não são meros orçamentos e faturas. Os documentos emitidos pela PSP - Docs. 24 a 48 da Oposição - os quais têm a referência para pagamento, tendo os serviços sido efetivamente prestados, pois, de outra forma, os trabalhos não teriam sido concluídos.
67.–Quanto aos custos relativos à extensão da licença de OPV, a MAP fez prova, através de presunção judicial ou pelas regras da experiência, de que os custos que lhe foram imputados pelo Município de Cascais. Em caso de não pagamento, a Ré não conseguiria ter executado a obra e ter realizados os trabalhos ulteriores à data de abandono de obra pela Autora/Recorrida.
68.–Em sede de julgamento, foi produzida prova suficiente quanto aos custos incorridos pela MAP em resultado (direto) do cumprimento defeituoso e/ou incumprimento das obrigações da Autora, tal como o abandono de obra.
69.–“GG”, Diretor Financeiro na MAP, informou o tribunal que tinha na sua posse comprovativos de pagamento à PSP e ao Município de Cascais e das OVP. Foi pedido à testemunha que consultasse os referidos documentos, no entanto, por razões que se desconhece o Tribunal a quo disse que "não vale a pena diga só mais ou menos."
70.–Ainda que não tenha sido permita a consulta desses documentos, a testemunha explicou de forma clara sobre todos os valores pagos, custos, montantes, serviços englobados.
71.–As declarações prestadas pela testemunha, a forma detalhada, fazendo menção a valores concretos, firmas das sociedades ou prestadores de serviços e a referência a detalhes como "recibos verdes" são elementos juridicamente relevantes para se concluir, seja através da presunção judicial, seja através das regras da experiência que as referidas foram pagas.
72.–Resulta evidente que a PSP não presta serviços sem que seja efetuado o pagamento do valor devido pelo serviço. Dos presentes autos, constam diversos documentos que atestam a prestação de serviços à MAP por parte da PSP, de forma reiterada e prolongada por diversas semanas/meses.
73.–Em caso de não pagamento das faturas juntas aos autos - faturas essas que têm uma referência multibanco para que se proceda ao imediato pagamento aquando da requisição do serviço - a PSP não teria prestado os serviços, ou, no limite, durante todo aquele período. O mesmo raciocínio é aplicável aos custos com o prolongamento da licença de OVP, emitidas e juntas aos autos. Nenhum Município emite uma licença sem que seja efetuado o prévio pagamento das taxas devidas.
74.–Não poderia o douto Tribunal deixar de considerar como provados custos - ou, no mínimo, alguns dos custos - suportados pela MAP.
75.–Foi produzida prova, desde logo por confissão de que as despesas alegadas no artigo 37.°, da Oposição, foram efetivamente pagas. O representante da Axialpotency - Unipessoal Lda, depôs de forma clara que todos os trabalhados efetuados foram pagos pela MAP.
76.–O Tribunal não julgou ser necessário a junção dos comprovativos de pagamento, na posse da testemunha “GG”, o que estava obrigada a fazer - a menos que estivesse convencido do seu contrário - sob pena de violação do princípio do princípio do inquisitório que impõe ao juiz, quanto àqueles factos de que lhe é lícito conhecer, o poder/dever de realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio (artigo 411° do CPC). Existe um poder-dever de requisição, conferido/imposto ao Tribunal pelos artigos. 411°, 417°, n.° 1 e 436° do CPC, que pressupõe que os documentos ou elementos requisitados sejam (objetivamente) necessários ao esclarecimento da verdade, fazendo parte dos temas da prova.
77.–Em síntese: nunca o Tribunal a quo não podia dar como não provado, em bloco, que a MAP não incorreu em custos extraordinários, pelo que deveria o douto Tribunal socorrer-se das regras da experiência, do princípio da livre apreciação da prova e da prova por confissão produzida para dever em sentido diferente, quantificando, especificamente, os custos dados como provados.
78.–Em face do que precede e face à prova produzida, deverão ser reconhecidos os seguintes custos extraordinários à MAP, no montante global de €35.254,91, valor que será compensável com o valor eventualmente devido à SANESTRADAS, o que jamais de concede.

DIREITO

79.–Da prova produzida ficou claro que a Recorrida abandonou a obra sem ter executado todos os trabalhos contratados, o que revela uma intenção firme e definitiva de não cumprir a sua obrigação contratual de concluir a obra.
80.–Conforme tem sido entendimento do STJ: "I- O abandono da obra por parte do empreiteiro, se for revelador duma vontade inequívoca de não cumprir, pode constituir incumprimento definitivo do contrato de empreitada, não havendo nesse caso necessidade de interpelação admonitória por parte do credor."
81.–Da prova produzida no processo há factos que contêm uma descrição suficiente para caraterizar, um abandono da obra, por parte da Autora. Mesmo que assim não se entenda, o que apenas se equaciona por exacerbado cautela, há, em todo o caso, factos que comprova a existência de uma desistência tácita (art. 1229.° do CC), por parte da Autora, que, no mínimo, revelam um incumprimento das suas obrigações, causador de uma perda de interesse no seu cumprimento por parte da MAP, que traduz uma situação de incumprimento definitivo do contrato por parte da SANESTRADAS e imputável à mesma.
82.–A SANESTRADA poderia suspender os trabalhos ou abandonar a obra com fundamento numa eventual divergência nas medições dos trabalhos e/ou na existência de uma fatura em dívida. Tal comportamento viola flagrantemente o princípio da boa-fé, da proporcionalidade e da confiança.
83.–A SANESTRADAS incumpriu culposamente a sua obrigação e, bem assim, de que a MAP incorreu em custos, pelo que o pedido reconvencional tem de ser atendido.
84.–Analisada essa prova, concluiu-se que a MAP demonstra que a decisão relativa à decisão de facto proferida pelo tribunal "a quo" deverá ser alterada pelo Venerando tribunal "ad quem". Subsequentemente, deverá ser alterada a matéria de direito, em virtude da subsunção da matéria de facto dado agora como provada face às normas jurídicas aplicáveis.

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DA SANESTRADAS
85.–Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua, culpa essa que a SANESTRADAS não logrou afastar, face à prova produzida em sede de audiência de julgamento - prova testemunhal e confissão - e carreada aos autos em sede de articulados, nomeadamente através de prova documental.
86.–A SANESTRADA incumpriu o plano de trabalhos a que se vinculou e, bem assim, executou defeituosamente e/ou não executou determinados trabalhos.
87.–Uma vez revertida a decisão, em especial quanto ao ponto 1 e 14 dos Factos Não Provados, deve ser modificada a fundamentação de direito quanto à questão de saber se a SANESTRADAS é ou não responsável pelos custos extraordinários suportados pela MAP, em consequência direta do incumprimento definitivo da SANESTRADAS.
88.–A Sanestradas estava obrigada a cumprir integral, pontualmente e de boa-fé o convencionado no contrato - arts. 406.° n.° 1, 762.° n.° 2, e 763.°, n.° 1, do CC. A Sanestradas obrigou-se perante a MAP a realizar e entregar a obra no prazo de 45 dias, assinado em 22.01.2019., sendo que apenas tiveram início em 30.01.2019.
89.–Não tendo sido fixado o prazo de início e conclusão dos trabalhos, deverá o interprete socorrer-se das normas previstas nos artigos 278.° e 279.° do CC, normas essas que nos autorizam a concluir que o prazo de 45 dias têm início no dia seguinte à assinatura do contrato, ou seja, a 23.01.2019. A SANESTRADAS encontrava-se contratualmente obrigada a concluir os trabalhos até 08.03.2019, prazo esse que não foi cumprido.
90.–As questões suscitadas pela SANESTRADAS quanto ao desconhecimento das condições da licença de ocupação da via pública e, bem assim, quanto aos trabalhos de escavação em rocha, em quantidades previstas ao definido no Contrato não constituem fundamento para o incumprimento do prazo e, muito menos, do abandono de obra.
91.– A MAP enviou à SANESTRADAS, em anexo ao email de 15.01.2019 - DOCS. 2 e 3 do Requerimento de 10.07.2020, com a ref.- 36043689, - cópia da licença de ocupação da via pública, na qual estavam expressas as condições de execução dos trabalhos, a saber, o prazo de execução e o horário de execução dos trabalhos. Se a SANESTRADAS não tomou conhecimento de tais condições ou condicionamentos, tal deve-se apenas à própria e à sua falta de diligência, comportamento que é incompreensível e que não poderá ser positivamente relevado pelo Direito. A A. é uma empresa experiente neste tipo de trabalhos e que já tinha trabalhado anteriormente com o Município de Cascais e a empresa municipal Águas de Cascais.
92.–No que respeita aos trabalhos de escavação em rocha, releva, do mesmo modo, o facto de a SANESTRADAS saber, por experiência própria, que em Cascais, o subsolo é rochoso, não podendo criar uma expectativa contrária.
93.–O Contrato foi celebrado por série de preços, sendo os trabalhos aqui em causa remunerados de acordo com o metro cúbico efetivamente retirado. O subempreiteiro teria de comprovar as medições apresentadas, não sendo os valores a indicar nos autos arbitrários e insuscetíveis de prova e contraprova.
94.– O empreiteiro obriga-se à realização da obra, que constitui a prestação principal a seu cargo (art. 1207° do CC), obrigação esta que é de resultado. Tal pressupõe que cabe ao empreiteiro realizar a obra sem defeitos e vícios, de acordo com o que foi contratado.
95.–Exigia-se que a obra estive concluída num certo prazo, o qual não foi cumprido pela Recorrida.
96.–Quando há incumprimento definitivo e culposo, com a manifestação concludente da intenção do subempreiteiro não regressar à obra e retomar os trabalhos, não há necessidade de interpelação admonitória para que o contrato se considere resolvido, posição que tem vindo a ser assumida inclusive pelo presente Tribunal pugnado por "tendo a obrigação da empreiteira um prazo fixo, por acordo expresso das partes, aquela incorreu em incumprimento após o simples decurso do prazo sem a realização integral da prestação". O incumprimento do prazo é definitivo.
97.–Perante uma situação de incumprimento definitivo da obrigação, deixa de fazer sentido o apelo à interpelação admonitória (art. 808/1, do CC).
98.–A retirada de máquinas, material e pessoal do local da obra, em circunstâncias tais que revelem de forma inequívoca a sua intenção de não retomar os trabalhos da obra incompleta - como, de resto, resulta categoricamente da prova documental produzida e não infirmada, com acuidade, pelos trabalhadores da SANESTADAS, impõe, em primeiro lugar, como supra defendido que se considere provado que a Autora interrompeu - na medida em que os mesmo ainda não se encontravam integralmente concluídos à luz do Contrato de Subempreitada - e abandonou os trabalhos, sem qualquer razão ou aviso prévio em 14/03/2019.
99.–Perante uma conduta ou omissão com o aludido significado, o credor pode, desde logo, ter por não cumprida definitivamente a obrigação.
100.–Em consequência do incumprimento culposo da SANESTRADAS, é válida a resolução do Contrato que a MAP fez operar, tornando-se a SANESTRADAS responsável pelo prejuízo causado à MAP, quer em termos de danos  emergentes quer de lucros cessantes, quer ainda pelos danos não patrimoniais que lhe possa ter causado.
101.–O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação - ou que cumpre defeituosamente - torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo aquele provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
102.–O ónus da prova relativo aos factos integradores do incumprimento compete ao credor, competindo por sua vez ao devedor provar que o incumprimento não procede de culpa sua - art. 799°, n° 1 do CC. Baseando- se a responsabilidade do empreiteiro na culpa, haverá que ter em consideração a presunção de negligência do devedor, contida no citado art. 799°, n° 1, de tal forma que provado o defeito e a sua gravidade, prova que incumbe ao dono da obra (art. 342°, n° 1 do Cód. Civil), presume-se que o cumprimento defeituoso é imputável ao empreiteiro.
103.–A MAP demonstrou que os trabalhos não foram executados na totalidade, como o troço de cerca de 15 metros lineares que a SANESTRADAS não executou e, em alguns casos, executados com defeitos, nomeadamente, as caixas de visita, que não foram pintadas e as escadas de acesso que não estavam conformes ao legalmente exigido. Em consequência da execução defeituosa e da não execução dos trabalhos na sua totalidade, a MAP foi obrigada a contratar outra empresa para executar os trabalhos não executados pela SANESTRADAS.
104.–Tendo em conta o decurso do tempo, foi ainda necessário solicitar a prorrogação da licença de ocupação da via pública com os custos correspondentes às taxas devidas pela emissão das mesmas, bem como, os custos pela requisição da PSP, custos esses que não se verificariam caso a SANESTRADAS tivesse concluído a obra no tempo contratado e se esta não tivesse abandonado a obra.
105.– Como defende LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, [e]m geral, as máximas da experiência podem consistir em regras gerais de carácter científico com validade universal (e.g. regras de matemática, da física) ou podem consistir no princípio da normalidade, também designada por id quod plerumque accidit. Segundo este, os factos não se apresentam isolados, mas relacionados entre si, seja por relações de causa-efeito seja por uma ordem lógica e regular, existindo uma tendência para a repetição dos mesmos fenómenos. (...) O facto-base e o facto presumido devem estar vinculados entre si por uma relação lógica de causa-efeito, segundo uma regra de critério ou experiência humana. Em suma, verifica-se que, num elevado número de casos, um determinado facto encontra-se associado a outro facto segundo uma relação de antecedência, coexistência ou sucessão de modo que pode supor-se que os dois factos se apresentem constantemente relacionados de modo que se ocorre um também ocorrerá o outro [LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, Prova por Presunção no Direito Civil, 4.^ edição, 2023, Almedina, p. 59-60].
106.–Defende ainda o Autor que [a] máxima da experiência, como proposição enunciativa, estabelece uma relação de natureza epistemológica (que não ontológica) entre dois ou mais factos de natureza epistemológica (que não ontológica) entre dois ou mais factos com estrutura implicativa, construindo- se como um condicional: se ocorre x pode realizar a função de indicador ou de avisador do outro. A relação entre o antecedente e o consequente é de tal ordem que se este for certo então será totalmente compreensível e razoável a presença do antecedente/fato observado. A máxima da experiência constitui o critério de vinculação, ou anel de conjunção, entre o factum probandum e a conclusão que o juiz retira para formar o seu consentimento [LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, Prova por Presunção no Direito Civil, 4.^ edição, 2023, Almedina, p. 59-60].
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
107.–Reconhecendo-se o direito de crédito da MAP, emergente dos custos incorridos em virtude do incumprimento definitivo do Contrato por parte da SANESTRADAS, deverá o Tribunal de Lisboa conhecer do direito de compensação da MAP, e declarar que se encontram reunidos os requisitos legais, devendo a mesma operar, com as consequências legais e nos termos peticionados na Oposição da MAP. Caso assim, não se entenda, o que apenas por exacerbado dever de cautela se equacionada, deverá o douto Tribunal, por violação do princípio do inquisitório, da colaboração, da igualdade das partes e da descoberta material, ordenar a repetição do julgamento, com as devidas consequências legais (artigo 615.°, n.° 1 e 662.° 1 do CPC).

*
8.Dos autos não consta a apresentação de contra-alegações.

*
9.Nos termos do despacho proferido em 11-01-2024 foi admitido o requerimento recursório, como apelação.

*
10. Remetidos os autos a este Tribunal e inscritos os autos em tabela para julgamento, foram colhidos os vistos legais.

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2.Questões a decidir:

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC).
Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação).

Em face do exposto, identificam-se as seguintes questões a decidir:

I)Nulidades da sentença:

A)-Se a sentença é nula, por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC?
B)-Se a sentença é nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão proferida, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC?

II)Impugnação da decisão de facto:
C)-Se existe motivo para a rejeição do recurso, no tocante à impugnação da matéria de facto, quanto à preconizada inclusão nos factos provados dos pontos ix., x., xv., xvi. e xviii. da conclusão 26.ª da apelação e quanto à impugnação dos pontos 2, 5, 9, 10 e 14 dos factos não provados, por inobservância do disposto no artigo 640.º do CPC?
D)-Se devem ser dados como provados os seguintes factos:
-i.As negociações entre a SANESTRADAS e a MAP tiveram início, pelo menos, em 03.12.2018 - Email de 03.12.2018, 17:01 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções
-ii.A 08.01.2019, a MAP enviou um email à SANESTRADAS: " (...) Salientamos que hoje é dia 08.01.2019, pelo que é urgente que se de início à execução dos trabalhos acordados. Como é do V/conhecimento este assunto é de extrema importância na medida em que condiciona a entrega da empreitada ao nosso cliente, cujo atraso resultará em prejuízos incalculáveis para a MAP Engenharia (destaques nossos). - Email de 08.01.2019, 15:34 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções
-iii.A 10.01.2019, a SANESTRADAS envia um novo email à MAP, as condições contratuais - Email de 10.01.2019 14:21 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-iv.A 15.01.2019, a MAP envio um email à SANESTRADAS: com o seguinte teor:" (...) 4. Prazo de execução: Enquadrável no prazo de licença em anexo emitida pela CMC (15.01.12019 a 28.02.2019). - Email de 16.01.2019, 12:36 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-v.Os trabalhos objeto do Contrato foram adjudicados a 16.01.2019 - Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-vi.No email de 16.01.2019, a MAP solicita à SANESTRADAS que "agendem o início dos trabalhos o mais rapidamente possível face à validade da licença que vos remetemos e conclusão da empreitada com o nosso cliente." - Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-vii.A MAP diligenciou no sentido da Sanestradas retomar os trabalhos nos dias subsequentemente a 14.03.2019 - cfr. Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-viii.O prazo previsto para conclusão da obra era de 45 dias a contar da data da data de adjudicação dos trabalhos, a 16 de janeiro de 2019, ou no limite, a contar da data de assinatura do contrato, com início em 21 de janeiro e termo em 7.03.2019 - artigo 20.° da Oposição e artigo 35.° da Resposta às Exceções, no qual há confissão das datas de execução dos trabalhos.
-xi.Em 18.03.2019 (segunda-feira), a MAP reuniu-se com a SANESTRADAS com vista à resolução dos diferendos - – cfr. Emails/DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
- xii.A reunião referida supra demorou poucos minutos, tendo a SANESTRADA recusado a conversar - – cfr. Emails / DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
-xiii.Após 14.03.2019, a Sanestradas não executou quaisquer trabalhos objeto do contrato de subempreitada – cfr. Emails juntos como DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
-xiv.No dia 21 de março de 2019, a Sanestradas remeteu um email à MAP, com o seguinte teor: “Bom dia/No seguimento da reunião efetuada em obra na passada segunda feira, para análise das quantidades e valores propostos, agradecíamos o vosso parecer sobre o os mesmos, de forma a podermos programar a conclusão dos trabalhos. - cfr. Emails/ DOC 3 da Resposta.
- xvii.Em 01.04.2019, a MAP remeteu à SANESTRADA uma carta para resolução do contrato - Doc. 4 da Oposição?
E)Se a matéria que consta do ponto 1 dos factos não provados da decisão recorrida, deve ser dada como provada, passando a constar da matéria de facto provada que: "A A. interrompeu os trabalhos e abandonou a obra, sem qualquer razão ou aviso prévio em 14/03/2019" ou se deverá ser considerada provada com a seguinte redação: “A A. abandonou a obra em 14/03/2019"?
F)Se a matéria constante do ponto 14 dos factos provados deverá passar a ter a seguinte redação: "14. A A. não executou, nem facturou os trabalhos nos pontos 4.12, 4.13, 4.26, 4.27 e 4.23."?
G)Se deverá ser eliminada a matéria constante do ponto 7 dos factos não provados, por ser repetição do ponto 4.15 dos factos provados?

III)Impugnação da decisão de direito:
H)Se deveria ter sido julgado procedente o pedido reconvencional?
I)Se a decisão recorrida violou os princípios do inquisitório, da colaboração, da igualdade das partes e da descoberta material?

*
3.Fundamentação de facto:

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A DECISÃO RECORRIDA CONSIDEROU COMO PROVADA A SEGUINTE FACTUALIDADE:
1.A A. é uma sociedade comercial que se dedica à indústria de empreitadas de obras públicas e particulares, infraestruturas, saneamento, arruamento e pavimentações e compra, venda, compra para revenda ou permuta de imóveis rústicos ou urbanos. Produção e comercialização de betuminosos e outros materiais de construção civil.
2.No âmbito da sua actividade comercial, a A. celebrou com a R., em 22/01/2019, nas qualidades de «empreiteiro» e «subempreiteiro», respectivamente, um acordo escrito com a designação «contrato de subempreitada integral n.° 1293», cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, tendo por objecto a execução de «Trabalhos nas redes exteriores do Condomínio Santa Maria Residence, Cascais».
3.Neste contrato, ficou estipulado, além do mais, o seguinte:
«Cláusula Primeira - Dos valores e trabalhos a executar
1.-Pelo presente contrato o empreiteiro adjudica ao subempreiteiro - que se compromete a realizar os trabalhos de ‘Redes Exteriores’, em regime de ‘Série de Preço’ e sem direito a revisão de preços pelo valor de 28056,80€ (...), tudo de acordo com listagem de trabalhos anexa a este contrato e que é parte integrante do mesmo’
2.-(...).
«Cláusula Segunda - Dos prazos
1.-O subempreiteiro cumprirá os prazos estabelecidos no plano de trabalhos apresentados pelo empreiteiro, ao Dono da Obra, ou noutro estabelecido pelo Director da Obra, responsabilizando-se por todos os atrasos que lhe sejam imputáveis.
2.-Sem prejuízo no disposto no n.° 1, o prazo de execução dos trabalhos objecto do presente contrato é de 45 dias, sujeito a ulteriores modificações, acordadas entre as partes.
(...)
6.-(...) caso haja um atraso de 3 dias em relação ao plano de trabalhos, que tenham implicações negativas em relação ao trabalho de terceiros, assiste ao empreiteiro o direito de, independentemente de se ressarcir dos prejuízos causados, rescindir sem aviso prévio o presente contrato e adjudicar a outrem os trabalhos não realizados.
(...)
Cláusula quinta - pagamentos
1.-Os pagamentos ao subempreiteiro serão efectuados pelo empreiteiro ao final de 5 dias da data de recebimento das faturas respectivas (...).
2.-As facturas dos fornecimentos e serviços (...) devem vir sempre acompanhadas pelos autos de medição realizados pela Direção de Obra, sob pena de não serem conferidas e/ou aceites, e a data das mesmas deverá coincidir com a data do auto e do período de trabalho.
3.-Os autos devem ser realizados até ao fim de cada mês e nunca podem incluir fornecimentos e serviços executados e prontos respeitantes ao mês seguinte daquele que está em causa, e serão obrigatoriamente elaborados pelo empreiteiro, em concordância com o subempreiteiro, e rubricado por ambas as partes.
(...)
Cláusula oitava - Incumprimento, Suspensão e Resolução
1.-Em caso de incumprimento do presente contrato ou de atrasos repetidos por parte do subempreiteiro, o empreiteiro poderá rescindi-lo, total ou parcialmente, mediante simples aviso por escrito.
(...)
Cláusula Sétima - Condições particulares
1.-Consideram-se anulados os pontos 4. e 5. da Cláusula Segunda - Não são aceites penalizações por atraso.
(...)
3.-Cláusula quinta - Condições de pagamento: 30% do valor dos trabalhos com a adjudicação. Autos na última semana de cada mês e pronto pagamento dos mesmos (prazo máximo: 5 dias).
(...)».
4.-Nos termos do referido contrato, foram adjudicados à A. os seguintes trabalhos:
4.1.-Escavação para abertura de valas para implantação de tubagem, em solo de qualquer natureza, incluindo entivação, remoção dos produtos escavados, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 45 m2, ao preço de 10€/m2, totalizando €450,00 (ponto 1.1.1 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado €42m2, no valor de €420,00.
4.2.-Regularização do fundo de valas e aterro com almofada de areia, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 45m2, ao preço de 8€/m2, totalizando €360,00 (ponto 1.1.2, da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado €42m2, no valor de €336,00.
4.3.-Aterro com terra cirandada, compactada por camadas de 0,20 m de espessura, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 45 m2, ao preço de 8€/m2, totalizando € 360,00 (ponto 1.1.4 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado €42m2, no valor de €336,00.
4.4.-Fornecimento, assentamento e instalação de tubagem PEAD PE100 PN10 nas redes exteriores de abastecimento de água enterradas, incluindo válvulas, ligações, acessórios e todos os trabalhos necessários à perfeita execução da tarefa, com diâmetro DN110 mm, na quantidade de 45m2, ao preço de 16€/m2, totalizando € 720,00 (ponto 1.2.1. da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado 42m2, no valor de €672,00.
4.5.-Fornecimento, assentamento e instalação de válvulas de seccionamento nas redes exteriores de abastecimento de água enterradas, incluindo válvulas, ligações, acessórios e todos os trabalhos necessários à perfeita execução da tarefa, com diâmetro de 110mm, na quantidade de 6 unidades, ao valor de 260,00€ por unidade, totalizando um valor de 1560,00€ (ponto 1.2.2. da listagem anexa ao contrato).
4.6.-Fornecimento e assentamento de Flange Hawle sistema 2000 0110, na quantidade de 6 unidades, ao valor de € 180,00 por unidade, totalizando um valor de €1.080,00 (ponto 1.2.2 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas fornecido e facturado 4 unidades, no valor total de €720,00.
4.7.-Fornecimento e assentamento de Tampão 0110 da Hawle, na quantidade de uma unidade, ao valor de € 190,00 por unidade, totalizando € 190,00 (ponto 1.2.2 da listagem anexa ao contrato).
4.8.-Fornecimento e assentamento de T flangeado 0110, na quantidade de duas unidades, ao valor de € 260,00 por unidade, totalizando um valor de € 520,00 (ponto 1.2.2 da listagem anexa ao contrato).
4.9.-Execução de caixa de visita para alojamento de válvula, incluindo tampa em cantaria, de acordo com exigências das Aguas de Cascais/CM Cascais, na quantidade de 6 unidades, ao valor de €325,00 por unidade, totalizando €1.950,00 (ponto 1.2.2 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas fornecido e facturado 1 unidade, no valor de €325,00.
4.10.-Fornecimento e assentamento de fita de sinalização, na quantidade de 45 m2, ao valor de € 1,20/m2, totalizando € 54,00 (ponto 1.2.2 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado 42m2, no valor de €50,40.
4.11.-Transporte de terras sobrantes a vazadouro incluindo carga, transporte e espalhamento em vazadouro, e eventual indemnização por depósito, conforme descrito nas Condições Técnicas, na quantidade de 45 m2, ao valor de € 10,00/m2, totalizando € 450,00, tendo a A. apenas executado e facturado 42m2, no valor de €420,00 (ponto 1.2.2 da listagem anexa ao contrato).
4.12.-Execução de ligação à rede pública existente conforme indicações das Águas de Cascais, incluindo fornecimento de tubagem PEAD PE100 PN10, 0110 mm no troço correspondente, abertura e tapamento de vala, transporte de material sobrante a vazadouro e pagamento das respectivas taxas, levantamento e reposição de pavimento e todos acessórios, todos os trabalhos e acessórios necessários, de acordo com as especificações dos Serviços, no valor único de €650,00 (ponto 1.2.4 da listagem anexa ao contrato).
4.13.-Apoio Técnico, Telas Finais com mapa de nós, Compilação técnica, Manual de Instruções e Plano de Manutenção, incluindo todos os trabalhos de apoio técnico como a execução e fornecimento de desenhos de preparação, execução e fornecimento de telas finais, compilação técnica, apoio técnico, integração dos desenhos e compilação técnica, no valor único de €800,00 (ponto 1.3 da listagem anexa ao contrato).
4.14.-Execução de todos os ensaios e experiências exigidos no Caderno de Encargos ou pela Fiscalização, incluindo todos os materiais e trabalhos inerentes à tarefa em questão, no valor único de € 450,00 (ponto 1.7. da listagem anexa ao contrato).
4.15.-Escavação para abertura de valas para implantação de tubagem, em solo de qualquer natureza, incluindo entivação, rebaixamento do nível freático, se necessário, e remoção dos produtos escavados, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 14,72/m2, totalizando € 1.251,20 (ponto 2.1.1 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado 19 m2, no valor total de 279,68.
4.16.-Escavação para abertura de valas para implantação de tubagem em rocha, incluindo entivação, rebaixamento do nível freático, se necessário, e remoção dos produtos escavados, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, no valor de € 95/m2. (ponto 2.1.1 da listagem anexa ao contrato).
4.17.-Regularização do fundo de valas e aterro com almofada de areia, numa espessura de 0,10m, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 7,00/m2, totalizando € 595,00 (ponto 2.1.2 da listagem anexa ao contrato).
4.18.-Aterro com terra cirandada, compactada por camadas de 0,20m espessura envolvendo as tubagens até 0,50 m acima do extradorso do coletor, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 7,00/m2, totalizando € 595,00 (ponto 2.1.3 da listagem anexa ao contrato).
4.19.-Aterro por camadas de 0.20 m com terras provenientes da escavação incluindo compactação, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 11/m2, totalizando € 935,00 (ponto 2.1.4 da listagem anexa ao contrato).
4.20.-Transporte de terras sobrantes a vazadouro incluindo carga, transporte e espalhamento em vazadouro, e eventual indemnização por depósito, conforme descrito nas Condições Técnicas, na quantidade de 85,00 m2, ao valor de € 13,50/m2, totalizando €1.147,50 (ponto 2.1.4 da listagem anexa ao contrato).
4.21.-Fornecimento e assentamento de tubagem de PPC SN8 em rede enterrada, com proteção mecânica onde necessário, incluindo ligações com junta elástica de estanquidade e todos os acessórios necessários de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, com diâmetro de 200 m, na quantidade de 85,00 m2, ao valor de € 15/m2, totalizando € 1.275,00. (ponto 2.2.1. da listagem anexa ao contrato).
4.22.-Quedas guiadas nas câmaras de visita, incluindo fornecimento e montagem de curvas do mesmo material da tubagem, em rede enterrada, incluindo ligações com juntas autoblocantes e anilha de estanquidade, conexões e todos os acessórios conforme descrito nas condições técnicas, com execução de gamela e lajeta conforme indicação das Águas de Cascais, no valor único de €750,00 (ponto 2.2.2 da listagem anexa ao contrato).
4.23.-Construção de câmaras de visita completas, revestidas interiormente com argamassa de cimento e areia ao traço 1:3, incluindo a realização de meias- canas, tampa e aro em ferro fundido normalizadas NP-EN-124 da classe de resistência D400, degraus em aço plastificado, anéis de ligação da tubagem onde for necessário, escavação em terreno de qualquer natureza, aterro, entivação, rebaixamento do nível freático, se necessário, e remoção a vazadouro de sobrantes, tudo de acordo com pormenor e indicação das Águas de Cascais e C.M. Cascais (altura inferior a 2,50m, em colector diâmetro inferior a 500mm, câmara com diâmetro 1,00m em manilhas de betão, incluindo fundo em betão com espessura de 0,20m e malhasol), de acordo com as regras da Água de Cascais, na quantidade de 4 unidades, ao valor de € 835,00/unidade, totalizando € 3.340,00 (ponto 2.2.3 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas fornecido e facturado 3 unidades, no valor total de €2.505,00.
4.24.-Execução de ajuste e reposicionamento de Câmara de visita existente (CRE.A) e todos os trabalhos e acessórios necessários, de acordo com as especificações das Águas de Cascais e C.M. Cascais, no valor único de € 800,00 (ponto 2.3.1 da listagem anexa ao contrato).
4.25.-Execução de ligação à rede pública existente, incluindo fornecimento de tubagem PPC SN8, 0200 mm no troço correspondente, abertura e tapamento de vala, transporte de material sobrante a vazadouro e pagamento das respectivas taxas, levantamento e reposição de pavimento e todos acessórios, todos os trabalhos e acessórios necessários, de acordo com as especificações das Águas de Cascais e C.M. Cascais, no valor único de €400,00 (ponto 2.3.2 da listagem anexa ao contrato).
4.26.-Apoio Técnico, Telas Finais, Compilação técnica, Manual de Instruções e Plano de Manutenção, incluindo todos os trabalhos de apoio técnico como a execução fornecimento de desenhos de preparação, execução e fornecimento de telas finais compilação técnica, apoio técnico, integração dos desenhos e compilação técnica, no valor único de € 700,00 (ponto 2.3.3 da listagem anexa ao contrato).
4.27.-Execução de todos ensaios e experiências exigidos no Caderno de Encargos ou pela Fiscalização, incluindo todos os materiais e trabalhos inerentes à tarefa em questão, no valor único de € 600,00 (ponto 2.3.4 da listagem anexa ao contrato).
4.28.-Caixa de Visita multioperador (CVM), conforme peças desenhadas, em conformidade c/ o manual ITED 3.a Edição, no valor único de € 490,00 (ponto 2.1.1.2 da listagem anexa ao contrato).
4.29.-Levantamento e reposição de calçada em passeios, de acordo com o REGIS, com e/ou sem aproveitamento do material, fornecimento de material novo se necessário, assente sobre almofada de areia e cimento ao traço 1:6, com 0,07 m de espessura, incluindo os trabalhos de arranque, abertura de caixa em terreno de qualquer natureza e por qualquer processo de escavação, compactação, rega, recalque e remoção de produtos sobrantes a vazadouro, na quantidade de 11,40 m2, ao valor de 24€/m2, totalizando € 273,60 («Diversos» na pág. 7 da listagem anexa ao contrato).
4.30.-Arranque e reposição de lancis devido à implantação de infraestruturas, na quantidade de 4,00 ml, ao valor de € 27€/ml, totalizando €108,00 («Diversos» na pág. 7 da listagem anexa ao contrato).
4.31.-Execução de camada de base com AC 32 Base 50/70 (MB) Macadame Betuminoso, com 0,11m de espessura, incluindo rega de impregnação, na zona das valas, na quantidade de 62,50 m2, ao valor de € 25/m2, totalizando €1.562,50 («Diversos» na pág. 7 da listagem anexa ao contrato).
4.32.-Implementação de estaleiro e de desvios de trânsito, incluindo, se necessário, o estudo, execução e fornecimento dos elementos que instruem o processo de licenciamento de intervenção na via pública, de acordo com as regras da CM Cascais e REGIS em vigor, tudo no valor único de €2.500,00 (pág. 8 da listagem anexa ao contrato) nomeadamente:
a)-Execução e implementação de Plano de Desvio de Trânsito/Sinalização Temporária, para pedido de licença de OVP;
b)-instalação de elementos de segurança activa e passiva; - Memória Descritiva e Justificativa; - Planta de Pavimentos, indicando a área e o tipo de pavimentos a serem afetados pela intervenção;
c)-Acompanhamento técnico e contacto com as Aguas de Cascais e Câmara Municipal de Cascais, com exclusão do «pagamento de taxas e licenças» e «policiamento», da responsabilidade da R.
4.33.-Execução de processo de telas finais, em suporte informático, de acordo com as regras das Aguas de Cascais/CMC, incluindo trabalho de topografia, no valor único de €750,00 (pág. 8 da listagem anexa ao contrato).
4.34.-Execução de sondagens para reconhecimento de infraestruturas, em escavação manual e cuidadosa, suspensão de infraestruturas existentes, incluindo todos os trabalhos necessários, à quantidade de 2 unidades, ao valor de 80€/unidade, totalizando €160,00 (pág. 8 da listagem anexa ao contrato).
4.35.-Instalação de um passadiço para passagem de peões sobre a vala, no valor único de €230,00 (pág. 8 da listagem anexa ao contrato).
5.-Em 30/10/2018, a R. solicitou à Câmara Municipal de Cascais a emissão de uma Licença de Ocupação da Via Pública para execução de trabalhos na Av. 25 de Abril, 1111 Cascais.
6.-A referida licença foi concedida em 10/01/2019, permitindo o corte parcial ou total da zona viária pelo período correspondente a 45 dias, entre 15/01/2019 e 28/02/2019, das 09h30 às 17h00.
7.-A R. requereu à CMC, que as deferiu, sucessivas prorrogações do prazo da referida licença até 30/04/2019, tendo a primeira terminado em 08/03/2019 e a segunda em 15/03/2019.

8.-No decurso das negociações prévias à celebração do contrato referido em 2. supra, a R. enviou à A. comunicação electrónica datada de 15/01/2019, com o seguinte teor:
«Caro “AA”,
No seguimento do telefonema, vimos por este meio propor:
1.Condições de pagamento: (...)
2.Retenções: (...).
3.Prazo de execução: Enquadrável no prazo da licença em anexo emitida pela CMC (15.01.2019 a 28.02.2019).
4.Prazos/penalizações: (...).
5.Outros: (...)».

9.-Em resposta, a A. comunicou à R., por correio electrónico enviado na mesma data, o seguinte:
«No seguimento do vosso email, informamos que não temos condições para alterar qualquer dos pontos indicados no nosso email anterior, pelo que para podermos programar a data de início dos trabalhos necessitamos de aprovação das condições por nós indicadas.
Caso sejam aprovadas as condições indicadas por nós até final da presente semana e adjudicados os trabalhos conforme nossa proposta, poderemos iniciar os trabalhos na última semana do presente mês».

10.-Assinado o contrato de subempreitada em 22/01/2019, a A. iniciou os trabalhos em 30 de Janeiro de 2019.
11.-A A. deu por concluídos os trabalhos contratados e adjudicados a 12/03/2019, tendo, nesta data, remetido à R., para conferência, o auto de medição n.° 2 dessa mesma data.
12.-Por carta registada de 03/04/2019, que aqui se dá por integralmente reproduzida, a R. comunicou à A. a resolução do contrato referido em 1. supra.
13.-Em 6 de Junho de 2019, a A. enviou à R. a factura n.° 099/2019, de 03/06/2019, no valor de €15.846,75, anexando a ela o auto de medição final, tendo a R., por carta de 28/06/2019, devolvido à A. a referida factura, invocando o seguinte motivo: ««Auto de Medição Inválido. Auto de medição não executado/validado pela Direcção de Obra da MAP Engenharia».
14.-A A. não executou, nem facturou os trabalhos referidos nos pontos 4.12., 4.13., 4.26, 4.27 e 4.33., porque a execução desses trabalhos estava dependente autorização/agendamento do trabalho referido no ponto 4.12 das Águas de Cascais e esta só veio a ser emitida depois do facto referido em 12.
15.-No final de cada dia de trabalho, pelas 17h00, a A. tinha que deixar a via transitável, ou seja, tinha a obrigação de tapar a vala aberta e, no dia seguinte, voltar a destapá-la.

*
A DECISÃO RECORRIDA CONSIDEROU COMO NÃO PROVADA A SEGUINTE FACTUALIDADE:
1.A A. interrompeu os trabalhos e abandonou a obra, sem qualquer razão ou aviso prévio em 14/03/2019.
2.A A. apenas forneceu 1 unidade das válvulas de seccionamento referidas em 4.5. dos factos provados.
3.A A. apenas forneceu 3 unidades de Flange Hawle referidas em 4.6. dos factos provados.
5.A A. não executou o trabalho descrito no ponto 4.14 dos factos provados.
6.A A. apenas forneceu 1 unidade de T flangeado referido em 4.8. dos factos provados.
7.A A. apenas executou 20,18m2 do trabalho descrito no ponto 4.16 dos factos provados, no valor total de €1.916,63.
8.A A. apenas executou 69,40m2 do trabalho descrito no ponto 4.18 dos factos provados, no valor total de €1.916,63.
9.A A. apenas executou 8,30m2 do trabalho descrito no ponto 4.19 dos factos provados, no valor total de €91,30.
10.A A. apenas executou 74,35m2 do trabalho descrito no ponto 4.20 dos factos provados, no valor total de €1.003,73.
11.A A. apenas executou 67,40m2 do trabalho descrito no ponto 4.21. dos factos provados, no valor total de €1.011,00.
12.A A. não executou o trabalho descrito no ponto 4.28 dos factos provados.
13.a A. apenas executou 51,45m2 do trabalho descrito no ponto 4.29 dos factos provados, no valor total de €1.234,80.
14.Em consequência do facto referido no ponto 1. supra, a R. suportou os seguintes custos adicionais: €808,60, com o policiamento na via pública de 11/03/2019 a 15/03/2019; €161,72, com o policiamento na via pública em 22/03/2019; €808,60, com o policiamento na via pública de 25/03/2019 a 29/03/2019; €808,60, com o policiamento na via pública de 01/04/2019 a 05/04/2019; €808,60, com o policiamento na via pública de 08/04/2019 a 12/04/2019; €678,64, com o policiamento na via pública de 15/04/2019 a 18/04/2019 e prolongamento; €161,72, com o policiamento na via pública em 24/04/2019; €485,16, com o policiamento na via pública de 26/04/2019 a 30/04/2019; €80,86, com o policiamento na via pública em 06/05/2019; €161,72, com o policiamento na via pública em 02/07/2019; €1.282,40, com a prorrogação da licença de ocupação da via pública de 09/03/2019 a 15/03/2019; €2.055,20, com a prorrogação da licença de ocupação da via pública de 16/03/2019 a 29/03/2019; €1.066,80, com a prorrogação da licença de ocupação da via pública de 30/03/2019 a 05/04/2019; €2.133,60, com a prorrogação da licença de ocupação da via pública de 06/04/2019 a 18/04/2019; €1.710,00, com a prorrogação da licença de ocupação da via pública de 19/04/2019 a 30/04/2019; €212,60, com o policiamento na via pública em 14/05/2019; €800,00, relativo ao tempo despendido pelo Coordenador de Produção e Director de Obra na resolução do problema motivado pelo abandono da obra por parte da A., nomeadamente com novas adjudicações e reuniões com entidades; €1.679,00, relativo à execução de ligação à rede pública existente, conforme indicações da Água de Cascais; €2.242.50, relativo às tubagens enterradas, incluindo limpeza e inspecção vídeo para confirmação dos trabalhos, nos dias 05/05/2019 e 02/07/2019; €17.229,88, relativo à mão de obra e materiais para conclusão dos seguintes trabalhos, entre os dias 15.03.2019 e 30.04.2019: Execução do troço final do ramal de ligação à rede pública de esgotos residuais; Conclusão dos trabalhos em caixas de visita, nomeadamente pinturas e escadas de acesso; Mobilização de equipas, equipamentos, e todos os meios necessários à execução dos trabalhos, tudo no valor global de €35.254,91.

*
4.Fundamentação de Direito:

*
I)Nulidades da sentença:

*
A)Se a sentença é nula, por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC?

Nas conclusões recursórias 5.ª a 15.ª, a apelante concluiu o seguinte:
“(…) NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA E DE DECISÃO QUANTO A FACTOS ESSENCIAS/COMPLEMENTARES E CONCRETIZADORES E INSTRUMENTAIS INVOCADOS E PROVADOS
5.–O Tribunal a quo ignorou um conjunto de factos que se revelavam essenciais para a decisão, factos que foram (i) objeto de alegação e prova - factos essenciais, factos complementares / concretizadores daqueles e também factos instrumentais - e (ii) ainda outros factos instrumentais que resultaram da instrução da causa.
6.–O Tribunal não se pronunciou quanto ao conhecimento da licença de ocupação de via pública pela SANESTRADAS e das condicionantes aí previstas, também do conhecimento da SANESTRADAS, sendo o tema referente a esta licença constava do Ponto 4 e 5 dos Temas da Prova fixados no Despacho Saneador. Estes Pontos revelam-se essenciais para a aferir o incumprimento da obrigação por parte da Recorrida e a legalidade dos custos imputados à Autora no pedido reconvencional.
7.–Esta omissão consubstancia um erro de julgamento, constituindo uma omissão de pronúncia e de tomada de decisão, sendo que estes factos não foram incluídos no elenco dos factos provados e não provados na Sentença recorrida (artigo 615.°, n.° 1, alínea d) CPC).
8.–A verificação desta nulidade não implica que o Tribunal ad quem deixe de decidir sobre estes pontos da matéria de facto, dispondo de todos os elementos necessários para alterar a decisão quanto à matéria de facto, na medida em que foi produzida prova sobre todas as matérias sobre as quais o Tribunal a quo não se pronunciou (arts. 5, n.os 1 e 2 al. a), 607.°, 608.°, 662/1 e 665.° do CPC).
NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA QUANTO AO INCUMPRIMENTO DO CONTRATO DE SUBEMPREITADA PELA AUTORA
9.–O Tribunal fixou como Tema da Prova n.° 7 do "incumprimento da Autora dos planeamentos dos trabalhos acordados".
10.–Em sede de audiência de julgamento foi produzida prova bastante para se concluir pelo incumprimento do contrato por parte da SANESTRADAS, em particular o incumprimento dos trabalhos adjudicados e não executados e, bem assim, do incumprimento do prazo fixado pelas partes no Contrato de Subempreitada. Essa prova decorreu quer da prova documental, quer da prova testemunhal produzida através do depoimento de testemunhas credíveis e imparciais.
11.–O Contrato de Subempreitada em crise foi celebrado em regime de "série de preços" - Ponto 3 da Matéria de Facto Provado. O trabalho de escavação em rocha encontrava-se previsto na lista de trabalhos a executar, tendo a SANESTRADAS dado um preço para o referido trabalho. No contrato ficou apenas por definir quantidade do referido trabalho, pois essa aferição depende da efetiva realização do trabalho.
12.–O douto Tribunal assim não entendeu, não retirando as devidas consequências do regime de "série de preços" acordado pelas partes, em especial a ilicitude do comportamento da SANESTRADAS em fundamentar o seu incumprimento e abandono de obra com base num litígio inexistente e violador do contrato, da lei aplicável e dos mais elementares princípios de direitos transversais a todos os negócios jurídicos, como o princípio da boa- fé. da confiança e da proporcionalidade. Esta conduta por parte da SANESTRADAS constitui uma situação de incumprimento unilateral e definitivo por abandono de obra.
13.–Da prova testemunhal produzida, ficou demonstrado que, independentemente da questão relacionada com a existência de rocha e a quantidade da mesma, tal diferendo não se traduziria num fundamento para que procedessem ao abandono da obra.
14.–O Tribunal a quo limitou-se, nas últimas folhas da sentença, a discorrer sobre os requisitos da responsabilidade contratual, sem que, no entanto, tenha subsumido a matéria de facto produzida à norma invocada, analisando devidamente e individualmente o preenchimento ou não dos referidos requisitos.
15.–O abandono de obra com fundamento numa divergência nas quantidades configura um comportamento violador de deveres acessórios das partes no cumprimento do contrato e do princípio da boa-fé, da proporcionalidade e da confiança. Impunha-se, assim, ao douto Tribunal apreciar na matéria de facto quanto ao incumprimento da SANESTRADAS, em resposta à questão enunciada na alínea b) do Ponto 3 (Questões a decidir), o que não foi feito, padecendo a sentença em crise do vício de nulidade (cfr. art. 615/ 1, al. d) do CPC).”.

Vejamos se, no caso, o juiz do Tribunal recorrido deixou de se pronunciar sobre questões de que devesse conhecer.
A nulidade da sentença por omissão de pronúncia só se compreende com referência às questões objeto do processo, não com atinência a todo e qualquer argumento esgrimido pela parte, supondo que o juiz silencia, em absoluto, questão de cognição obrigatória, isto é, que a questão tenha passado despercebida ao tribunal, já não preenchendo esta concreta nulidade a decisão sintética e escassamente fundamentada a propósito dessa questão (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01-03-2007, Pº 07A091, rel. SEBASTIÃO PÓVOAS).
Caso o tribunal se pronuncie quanto às questões que lhe foram submetidas, isto é, sobre todos os pedidos, causas de pedir e exceções que foram suscitadas, ainda que o faça genericamente, não ocorre o vício da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia. Poderá, todavia, existir mero erro de julgamento, atacável em via de recurso, onde caso assista razão ao recorrente, se impõe alterar o decidido, tornando-o conforme ao direito aplicável.

Conclui-se – como se fez no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-05-2019 (Processo 1211/09.9GACSC-A.L2-3, relatora MARIA DA GRAÇA SANTOS SILVA) - que: “A omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito e não quanto a todo e qualquer argumento aduzido. O vocábulo legal -“questões”- não abrange todos os argumentos invocados pelas partes. Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir”.

No entender da recorrente, a nulidade por omissão de pronúncia advém do seguinte:
1º)-De o Tribunal ter ignorado “um conjunto de factos que se revelavam essenciais para a decisão”, não se tendo pronunciado “quanto ao conhecimento da licença de ocupação de via pública pela SANESTRADAS e das condicionantes aí previstas, também do conhecimento da SANESTRADAS, sendo o tema referente a esta licença constava do Ponto 4 e 5 dos Temas da Prova fixados no Despacho Saneador”, considerando a recorrente que esta “omissão consubstancia um erro de julgamento, constituindo uma omissão de pronúncia e de tomada de decisão (…)”; e
2º)-De o Tribunal não ter apreciado na matéria de facto do incumprimento da autora em resposta à questão enunciada na alínea b) do Ponto 3 (Questões a decidir), “o que não foi feito, padecendo a sentença em crise do vício de nulidade”.
Vejamos:
O artigo 607.º, n.º 4, do CPC impõe ao julgador que na fundamentação da sentença declare “quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”
“A exigência de fundamentação da matéria de facto provada e não provada com a indicação dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do julgador, devem ser feitas com clareza, objectividade e discriminadamente, de modo a que as partes, destinatárias imediatas, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo Tribunal” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-02-2019, Pº 1316/14.4TBVNG-A.P1.S2, rel. FONSECA RAMOS).

Ora, conforme se sublinhou no já citado Acórdão do STJ de 26-02-2019, Pº 1316/14.4TBVNG-A.P1.S2, rel. FONSECA RAMOS): “Sendo os temas da prova enunciados de maneira sucinta, ainda que pressuponham ampla matéria de facto, a exigência de fundamentação desta justifica-se, de modo mais acentuado, porquanto não acontece, como no passado, quando a análise da peça processual onde se respondia aos quesitos permitia, em regra, saber de modo discriminado (os quesitos eram enumerados) o que tinha ficado provado e não provado e a fundamentação, que sempre se reputou não ter que ser exaustiva, mas devendo dar a conhecer os meios de prova em que acentuou a convicção quanto à prova submetida a julgamento”.

Por seu turno, refere Francisco Manuel Lucas de Ferreira de Almeida (Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, pp. 350-351) que: “A estatuição do citado nº4 do art- 607º (1º- segmento) é, contudo, meramente indicadora ou programática, não obrigando o tribunal a descrever de modo exaustivo o iter lógico-racional da apreciação da prova submetida ao respectivo escrutínio; basta que enuncie, de modo claro e inteligível, os meios e elementos de prova de que se socorreu para a análise crítica dos factos e a razão da sua eficácia em termos de resultado probatório. Trata-se de externar, de modo compreensível, o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pelo tribunal na apreciação da realidade ou irrealidade dos factos submetidos ao seu escrutínio. Deve, assim, o tribunal enunciar os meios probatórios que hajam sido determinantes para a emissão do juízo decisório, bem como pronunciar-se: - relativamente aos factos provados, sobre a relevância deste ou daquele depoimento (de parte ou testemunhal), designadamente quanto ao seu grau de isenção, credibilidade, coerência e objectividade; - quanto aos factos não provados, indicar as razões pelas quais tais meios não permitiram formar uma convicção minimamente segura quanto à sua ocorrência ou convencer quanto a uma diferente perspectiva da sua realidade ou verosimilhança […].Não impõe, contudo, a lei que a fundamentação das conclusões fácticas decisórias seja indicada separadamente por cada um dos factos, isolada e autonomamente considerado (podendo sê-lo por conjuntos ou blocos de factos sobre os quais a testemunha se haja pronunciado)”.

Conforme se assinalou no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26-10-2020 (Pº 258/18.9T8PNF-A.P1, rel. EUGÉNIA CUNHA): “Podendo ser objeto de instrução tudo quanto, de algum modo, possa interessar à prova dos factos relevantes para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, vedado está aquilo que se apresenta como irrelevante (impertinente) para a desenhada causa concreta a decidir, devendo, para se aferir daquela relevância, atentar-se no objeto do litígio (pedido e respetiva causa de pedir e matéria de exceção); Havendo enunciação dos temas de prova, o objeto da instrução são os temas da prova formulados, densificados pelos respetivos factos, principais e instrumentais (constitutivos, modificativos, impeditivos ou extintivos do direito afirmado) –v. arts 410º, do CPC e 341º e seguintes, do Código Civil e, ainda, artigo 5º, daquele diploma legal”.
Nesta linha é, pois, crucial que, concluída a instrução, seja feita a indicação e especificação dos factos provados e não provados e a indicação dos fundamentos por que o Tribunal formou a sua convicção acerca de cada facto que estava em apreciação e julgamento, de acordo com os temas da prova fixados.

Mas, como se deu conta no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23-11-2017 (Pº 3811/13.3TBPRD.P1, rel. MADEIRA PINTO), “sendo certo que a instrução tem por objecto os temas de prova enunciados e que no NCPC estes não se confundem apenas com factos podendo ser conclusões jurídicas ou versões contrárias de factos ou conclusões, é seguro para nós e de acordo com a generalidade da doutrina e da jurisprudência, que a enunciação dos temas de prova não constitui despacho que faça caso julgado formal sobre os factos essenciais, instrumentais ou complementares que interessam à decisão de direito segundo as diferentes soluções possíveis e alegados pelas partes de acordo com as regras dos artº 5º, nºs 1 e 2 e 607º, nº 4, NCPC”.
De facto, “os temas da prova não vinculam o juiz (no sentido de o limitarem) à apreciação dos factos em discussão em sede de instrução da lide. Donde, também não podem condicionar a prática de atos probatórios inúteis (de resto, proibidos nos termos do artigo 130.º do CPC) em ordem a apurar factos desnecessários para dirimir o litígio” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11-11-2021, Pº 293/13.3TMFAR-B.E1, rel. MARIA ADELAIDE DOMINGOS).
Assim, a circunstância de, no entender da recorrente, o Tribunal não ter apreciado determinado tema da prova, não conduz à verificação da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, muito embora possa conduzir à existência de erro (relativamente à matéria de facto selecionada pelo Tribunal/relativamente às questões de direito esgrimidas no pleito) de julgamento.

Conforme se referiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-03-2021 (Pº 850/14.0YRLSB.S3, rel. JOSÉ RAINHO), traduzindo consolidada orientação jurisprudencial, “Não há que confundir entre nulidades de decisão e erros de julgamento, e daqui que improcede a arguição de nulidade se o que o recorrente faz através da arguição é simplesmente dissentir da decisão”.

Ou seja, em suma: A não apreciação de algum fundamento fáctico ou argumento jurídico, invocado pela parte que, possa, eventualmente, prejudicar a boa decisão sobre o mérito das questões – de facto e/ou de direito - suscitadas não conduz à existência do vício de omissão de pronúncia, a que se refere o artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, por estar em causa, quando muito, um erro de julgamento e, não, uma falta de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar.

Conforme se escreveu, com inteiro acerto – entendimento que ora se subscreve – no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04-05-2022 (Pº 2774/16.8T8PRT.P2, rel. PEDRO DAMIÃO E CUNHA), “[s]egundo o disposto no art. 615º, nº 1, al. d) do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Neste âmbito, importa ter bem presente que as questões submetidas à apreciação do tribunal a que o legislador se refere se identificam com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. Nessa medida, embora a não apreciação de algum fundamento fáctico ou argumento jurídico, invocado pela parte, possa, eventualmente, prejudicar a boa decisão sobre o mérito das questões suscitadas, daí apenas pode decorrer um eventual erro de julgamento (“error in iudicando”), mas não já um vício (formal) de omissão de pronúncia. Ou seja, este tipo de omissão pode, eventualmente, conduzir a um erro de julgamento quanto à matéria de facto e/ou quanto às questões de direito esgrimidas nos autos e, portanto, logicamente, nessa medida, só em sede de impugnação da decisão de facto ou de dissídio jurídico perante a decisão, se pode/deve colocar a questão (…)”.
No caso, relativamente ao 1.º) ponto acima assinalado como fundamento da nulidade da sentença arguida, não assiste fundamento para a declaração da nulidade, por omissão de pronúncia.
De facto, resulta, desde logo, dos pontos 4.32, 5, 6, 7 e 8 dos factos provados e 14 dos factos não provados que, a temática da licença de OVP foi objeto de apreciação factual pelo Tribunal recorrido, sendo que, quanto ao conhecimento da licença pela contraparte, verteu-se na decisão recorrida o que consta, singelamente, expresso no ponto 8 dos factos provados, retirando-se, depois, em sede de fundamentação de direito, as consequências de uma tal sequência factual.

Vejam-se, neste sentido, em particular, as seguintes considerações da fundamentação de direito da sentença proferida:
“(…) No caso vertente, a R./reconvinte alegou que a R. abandonou a obra sem a concluir, causando-lhe, com esse comportamento, prejuízos no valor global de €35.254,91, respeitantes a custos de policiamento (entre 11/03/2019 e 06/05/2019), custos com a prorrogação de licença de ocupação da via pública (de 30/03/2019 a 14/05/2019), custos com o tempo despendido na resolução do problema motivado pelo abandono da obra e custos decorrentes de novas adjudicações, por trabalhos não concluídos e reparação de trabalhos desconformes.
Contudo, não provou, como lhe competia, que a R. tenha, desde logo, violado culposamente qualquer obrigação contratual, nem sequer que efectivamente suportou os custos acrescidos em que alegadamente incorreu, em virtude disso.
Ora, não estando verificados os pressupostos de que depende a responsabilidade contratual da A/reconvinda, deve a reconvenção improceder, sem necessidade de mais considerações.”.

Assim, não procede a invocação de omissão de pronúncia do Tribunal recorrido, quer quanto aos factos enunciados no capítulo 3.1. das alegações – que, aliás, sustentam a impugnação de facto deduzida pela apelante – quer, também, quanto à omissão de apreciação factual referenciada no 2.º ponto, tal como, também, não o procede o invocado relativamente à ausência de pronúncia sobre temas da prova, estando, quando muito, em causa um erro de julgamento, mas não, o vício de nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.
No caso, o dissenso da apelante traduz, precisamente, a sua discordância com o julgamento efetuado, mas não patenteia algum vício de nulidade por omissão de pronúncia sobre questão que o Tribunal devesse apreciar.
Em face do exposto, improcede a nulidade arguida (omissão de pronúncia), com fundamento no disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC.

*
B)Se a sentença é nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão proferida, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC?

Conclui, ainda, a apelante, nas alegações do recurso, o seguinte:
“(…) A NULIDADE POR OPOSIÇÃO ENTRE O FUNDAMENTO E A DECISÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
16.–O Tribunal a quo deu como provado que o contrato de subempreitada celebrado, em 22.01.2019, entre as partes foi celebrado em regime de série de preços.
17.–Ficou igualmente provado que o prazo de execução dos trabalhos era de 45 dias, em que que se tenha fixado o início dos trabalhos, sendo aplicáveis os art. 278.° e 279.° do CC.
18. Ficou provado que os trabalhos tiveram início a 31.01.2019 (cfr. Ponto 10).
19.–O Tribunal dá como provado a existência de uma cláusula negociada entre as Partes nos termos da qual assistia à MAP o direito de rescindir sem aviso prévio o Contrato e adjudicar a outrem os trabalhos não realizados.
20.–Da prova produzida resultou de forma evidente que os trabalhos não foram concluídos, encontrando-se provado o abandono da obra, tanto por prova documental como por prova testemunhal.
21.–O Tribunal a quo não retirou qualquer ilação ou consequência jurídica da verificação da situação do abandono da obra e do não cumprimento do prazo de execução dos trabalhos, dando como não provada a matéria do abandono da obra, resultando evidente a contradição entre os fundamentos invocados e a decisão que o mesmo tomou quanto a este particular aspeto.
22.–Existem divergências entre os trabalhos/fornecimentos previstos na listagem anexa ao contrato e os trabalhos/fornecimentos efetivamente prestados assinalados nos pontos 4.1 a 4.4, 4.6, 4.9, 4.10, 4.15 e 4.23 dos Factos Provados, o que demonstra precisamente o abandono da obra e a não conclusão dos trabalhos contratados.
23.–Cabia à Autora fazer prova que os valores peticionados na ação são efetivamente devidos (art. 342.° CC); ao invés, ficou provado que a Autora não realizou todos os trabalhos, presumindo-se a sua culpa (cfr. art. 799.° CC).
24.–Existe uma clara contradição entre a decisão e a sua fundamentação, o que determina a aplicação do disposto no artigo 615.°, n.° 1, c), aplicável ex vi artigo 666.°, n.° 1, ambos do CPC, o que determinará a nulidade da sentença.”.

Apreciando:

Nos termos da alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do Código de Processo Civil, relativo às causas de nulidade da sentença, a mesma será nula se os fundamentos estiverem em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
“A nulidade da sentença a que se refere a 1.ª parte da alínea c), do n.º 1, do art.º 615.º do C. P. Civil, remete-nos para o princípio da coerência lógica da sentença, pois que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica. Não está em causa o erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito aplicável, mas antes a estrutura lógica da sentença, ou seja, quando a decisão proferida seguiu um caminho diverso daquele que apontava os fundamentos. A ambiguidade da sentença exprime a existência de uma plurissignificação ou de uma polissemia de sentidos (dois ou mais) de algum trecho, e a obscuridade traduz os casos de ininteligibilidade. A estes vícios se refere a 2.ª parte [da alínea c)] do n.º 1, do art.º 615.º do C. P. Civil” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 03-11-2016, Pº 1774/13.4TBLLE.E1, rel. TOMÉ RAMIÃO).
Ou seja: Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica pelo que se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decide em sentido divergente, ocorre tal oposição (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11-01-94, rel. CARDOSO ALBUQUERQUE, in BMJ nº 433, p. 633, o Acórdão do STJ de 13-02-97, rel. NASCIMENTO COSTA, in BMJ nº 464, p. 524 e o Acórdão do STJ de 22-06-99, rel. FERREIRA RAMOS, in CJ 1999, t. II, p. 160).
Trata-se de um erro lógico-discursivo na medida em que, ocorrendo tal vício, a decisão segue uma determinada fundamentação e linha de raciocínio, mas vem, a final, a decidir em conflito com tal fundamentação.
Esta nulidade verificar-se-á, assim, quando a fundamentação aponta num certo sentido que é contraditório com o que vem a decidir-se, constituindo um vício de natureza processual.
Relativamente ao segmento atinente à ocorrência de alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, tem entendido a doutrina que “a sentença é obscura quando contém um passo cujo sentido é ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos” (cfr. Pais do Amaral, Direito Processual Civil, 11ª ed., 2013, Almedina, p. 400).
“Diz-se que a sentença padece de obscuridade quando algum dos seus passos enferma de ambiguidade, equivocidade ou de falta de inteligibilidade: de ambiguidade quando algumas das suas passagens se presta a diferentes interpretações ou pode comportar mais do que um sentido, quer na fundamentação, quer na decisão; de equivocidade quando o seu sentido decisório se perfile como duvidoso para um qualquer destinatário normal. Mas só ocorre esta causa de nulidade constante do 2º segmento da al. c) do nº. 1 do artº. 615º, se tais vícios tornarem a “decisão ininteligível” ou incompreensível” (assim, Francisco Ferreira de Almeida; Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, p. 371).
Ora, na decisão recorrida, o julgador, depois de selecionar os factos provados e os não provados, cuja decisão, motivou nos moldes constantes da sentença sob recurso, procedeu ao enquadramento jurídico das pretensões de ambas as partes, subsumindo os factos apurados ao direito aplicável.
Em particular, o Tribunal enunciou no n.º 3 dos factos provados a cláusula 1.ª do contrato de subempreitada, referindo o compromisso do subempreiteiro ao empreiteiro a realizar os trabalhos em regime de “série de preço” (este tipo de empreitada, também designada “por medição”, ocorrerá “quando a remuneração resultar da aplicação dos preços unitários previstos no contrato para cada espécie de trabalho a realizar, às quantidades desse trabalho realmente executadas, segundo se comprovar por medição periódica”assim, Licínio Lopes Martins, O contrato de empreitada por preço global no Código dos Contratos Públicos”, in Revista de Direito Público e Regulação, n.º 5, Março 2010, CEDIPRE/FDUC, 2010, p. 48).
Também se deu como provado no referido facto provado n.º 3, que no contrato dos autos ficou estipulado na cláusula 2.ª que: 1.-O subempreiteiro cumprirá os prazos estabelecidos no plano de trabalhos apresentados pelo empreiteiro, ao Dono da Obra, ou noutro estabelecido pelo Director da Obra, responsabilizando-se por todos os atrasos que lhe sejam imputáveis. 2.-Sem prejuízo no disposto no n.° 1, o prazo de execução dos trabalhos objecto do presente contrato é de 45 dias, sujeito a ulteriores modificações, acordadas entre as partes (…). 6. (...) caso haja um atraso de 3 dias em relação ao plano de trabalhos, que tenham implicações negativas em relação ao trabalho de terceiros, assiste ao empreiteiro o direito de, independentemente de se ressarcir dos prejuízos causados, rescindir sem aviso prévio o presente contrato e adjudicar a outrem os trabalhos não realizados”.
Sucede que, por outro lado, o Tribunal recorrido fez constar no n.º 1 dos factos não provados, nomeadamente, que a autora (Sanestradas) tenha interrompido os trabalhos e abandonado a obra, sem qualquer razão ou pré aviso em 14/03/2019, tendo explicado, na motivação da decisão de facto, a razão de uma tal enunciação:
“O Tribunal não julgou, por seu lado, provados os factos constantes do ponto 4.2. supra, por não ter sido produzida prova demonstrativa da sua verificação.
Com efeito,
- quanto ao facto constante do ponto 1., embora a testemunha “DD” tenha afirmado que a A. não executou o troço final da obra, com cerca de 15m, retratado na linha diagonal que liga a estrada ao edifício construído pela R. constante do documento junto, por determinação do Tribunal, na audiência de 29/11/2022, não ficou desde logo provado que este troço estava incluído na lista de trabalhos anexo ao contrato de 22/03/2019. Ao invés, decorreu dos depoimentos prestados, com conhecimento directo dos factos, pelas testemunhas “AA” e “EE”, funcionários da A. que acompanharam a negociação/execução dos trabalhos, que tal troço não chegou a ser adjudicado, aquando da contratação, por falta de elementos, correspondendo aos pontos 2.3.1 e 4.3.1. da lista anexa ao contrato, tendo o orçamento desses trabalhos (no valor de €1600,00 cada) sido comunicados à R., que optou por adjudicá-los a terceiros por um valor alegadamente mais barato, razão por que, tendo sido executados os demais trabalhos (com excepção do referido no ponto 1.2.4 da listagem anexa), saíram da obra (…)”.

Em face desta singela enunciação verifica-se total congruência, compatibilidade e coerência entre o resultado probatório alcançado e a motivação expressa pelo Tribunal recorrido, sem a ocorrência de alguma contradição.
Também aqui o que salienta, singelamente, é a mera discordância da apelante sobre o resultado probatório – cfr. conclusão 20.ª da apelação – alcançado pelo Tribunal recorrido, mas tal discordância, podendo basear a impugnação de mérito, não sustenta a ocorrência da nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão.
Pode dizer-se que o Tribunal recorrido não tirou ilação ou consequência jurídica da verificação de abandono da obra por parte da ré, pois, de facto, não deu como provado um tal abandono, tudo, em perfeita congruência com os fundamentos que expressou.

Aliás, em plena compatibilidade com o resultado decisório alcançado, o Tribunal recorrido veio a consignar na motivação da sua convicção sobre os factos apurados, que, no que concerne às “divergências entre os trabalhos/fornecimentos previstos na listagem anexa ao contrato e os trabalhos/fornecimentos efectivamente prestados assinalados nos pontos 4.1. a 4.4, 4.6., 4.9, 4.10, 4.15 e 4.23 também não demonstram que a A. abandonou a obra sem a concluir. Com efeito, confrontando o auto de medição de 12/03/2019, enviado à R. nesta mesma data, e o auto final de medição de 29/03/2019, anexo à factura n.° FO 2019/99, verifica-se que elas decorrem de ajustamentos marginais efectuados pela A. em relação ao conteúdo do próprio auto de medição, seguramente na sequência de discordâncias manifestadas pela R. em reunião ocorrida entre ambas as partes no período que decorreu entre uma e outra data, conforme atestado pela testemunha “AA”, que nela teve intervenção, na qualidade de director de produção da A., juntamente com “DD”, à data director de obra da R., entre outros”.

Como resulta do exposto, existe perfeita congruência entre a fundamentação exarada e o decisório alcançado pelo Tribunal, sendo este, plenamente compatível, com aquela.
Para além de inteligível, existe, como decorre do exposto, compatibilidade entre o decidido e os fundamentos em que, o mesmo, se balizou.
Pode concluir-se que: Não se verificando que os fundamentos de facto e/ou de direito invocados pelo julgador devessem conduzir logicamente a resultado oposto ao expresso na decisão, não ocorre a nulidade a que se refere a primeira parte, da alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC.
Assim, de acordo com o exposto, conclui-se não se vislumbrar contradição entre a decisão e os fundamentos, pelo que, improcede a nulidade arguida, com arrimo na alínea c) do n.º 1, do artigo 615.º do CPC.

*
III)Impugnação da matéria de facto:

Conclui a recorrente, na alegação de recurso – conclusões 25.ª a 27.ª – que:
“25.–Muitos foram os factos que o Tribunal ignorou e não julgou, violando o disposto no arts. 607.°, n.° 3, e 608.°, n.° 2 do CPC.
26.–Deveriam ter sido dados como provados diversos factos a saber: (…)
27.–Tais omissões são fundamento de impugnação da decisão quanto à matéria de facto, devendo todos aqueles factos ser introduzidos no elenco da matéria de facto provada (arts. 662/1, 607/4, 663/2 do CPC) (…)”.

Com a alegação produzida, a recorrente/apelante pretende colocar em crise a factualidade selecionada pelo Tribunal a quo.

Sucede que, para que a reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal de recurso ocorra, deve, previamente, o recorrente/apelante, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir os ónus de impugnação a seu cargo, plasmados no artigo 640.º do CPC, o qual dispõe que:
1–Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2–No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a)- Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b)- Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3–O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.

Assim, aos concretos pontos de facto, concretos meios probatórios e à decisão deve o recorrente aludir na motivação do recurso (de forma mais desenvolvida), sintetizando-os nas conclusões.
As exigências legais referidas têm uma dupla função: Delimitar o âmbito do recurso e tornar efetivo o exercício do contraditório pela parte contrária (pois, só na medida em que se sabe especificamente o que se impugna, e qual a lógica de raciocínio expendido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a contraparte a poder contrariá-lo).
O recorrente deverá apresentar “um discurso argumentativo onde, em primeiro lugar, alinhe as provas, identificando-as, ou seja, localizando-as no processo e tratando-se de depoimentos a respectiva passagem e, em segundo lugar, produza uma análise crítica relativa a essas provas, mostrando minimamente por que razão se “impunha” a formação de uma convicção no sentido pretendido” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-03-2014, Processo nº 3785/11.5TBVFR.P1, relator ALBERTO RUÇO).
Os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (cfr. o Acórdão do STJ de 28-04-2014, P.º nº 1006/12.2TBPRD.P1.S1, relator ABRANTES GERALDES).
Não cumprindo o recorrente os ónus do artigo 640º, n.º 1 do C.P.C., dever-se-á rejeitar o seu recurso sobre a matéria de facto, uma vez que a lei não admite aqui despacho de aperfeiçoamento, ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, face ao disposto no artigo 639.º, n.º 3 do CPC (cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 19-06-2014, P.º n.º 1458/10.5TBEPS.G1, relator MANUEL BARGADO).
Dever-se-á usar de maior rigor na apreciação da observância do ónus previsto no n.º 1 do artigo 640.º do CPC (de delimitação do objeto do recurso e de fundamentação concludente do mesmo), face ao ónus do n.º 2 (destinado a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado em exigência ao longo do tempo, indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exata das passagens da gravação relevantes) (neste sentido, Ac. do STJ de 29-10-2015, P.º n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, relator LOPES DO REGO).
O ónus atinente à indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, pelo que a falta de indicação, com exatidão, só será idónea a fundamentar a rejeição liminar se dificultar, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, ou o exame pelo tribunal, sob ---pena de ser uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável (cfr. Acs. do STJ, de 26-05-2015, P.º nº 1426/08.7CSNT.L1.S1, relator HÉLDER ROQUE, de 22-09-2015, P-º nº 29/12.6TBFAF.G1.S1, relator PINTO DE ALMEIDA, de 29-10-2015, P.º n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, relator LOPES DO REGO e de 19-01-2016, P.º nº 3316/10.4TBLRA-C1-S1, relator SEBASTIÃO PÓVOAS).
A apresentação de transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC (neste sentido, Ac. do STJ de 19-02-2015, P.º nº 405/09.1TMCBR.C1.S1, relatora MARIA DOS PRAZERES BELEZA), o mesmo sucedendo com o recorrente que procede a uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas considerados relevantes pelo tribunal para a prova de quesitos, sem única alusão às passagens dos depoimentos de onde é depreendida a insuficiência dos mesmos para formar a convicção do juiz (cfr. Ac. do STJ de 28-05-2015, P.º n.º 460/11.4TVLSB.L1.S1, relator GRANJA DA FONSECA).
Nas conclusões do recurso devem ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação, bastando que os demais requisitos constem de forma explícita da motivação (neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ de 19-02-2015, P.º nº 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES, de 01-10-2015, P.º nº 824/11.3TTLRS.L1.S1, relatora ANA LUÍSA GERALDES, de 11-02-2016, P.º nº 157/12-8TVGMR.G1.S1, relator MÁRIO BELO MORGADO).
Como resulta do n.º 1 do já citado artigo 640.º do CPC, no caso de impugnação sobre a decisão de facto, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera terem sido incorretamente julgados, bem como, os concretos meios de prova que impunham diversa decisão, indicando a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre tais questões de facto.
Contudo, na linha do que se vem referindo, firmou-se uniforme jurisprudência no sentido de que “nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa” (assim, o Acórdão do STJ n.º 12/2023, D.R, 1.ª Série, n.º 220, p. 44 e ss.).
De acordo com o previsto no n.º 2 do mesmo artigo, quando os meios de prova invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, cabe ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso na parte respetiva, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o recurso (sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes).
Quanto ao cumprimento deste ónus impugnatório, o mesmo deve, tendencialmente, fazer-se nos seguintes moldes: “(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-02-2015, Processo 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES).
Do mesmo modo, se entendeu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 26-04-2018 (processo 1716/15.2T8BGC.G1, relatora MARIA DA PURIFICAÇÃO CARVALHO) escrevendo-se o seguinte:
“1.–O art.º 640.º do C.P.C. enumera os ónus que ficam a cargo do recorrente que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto, sendo que a cominação para a inobservância do que aí se impõe é a rejeição do recurso quanto à parte afectada.
2.–Ao impor tal artigo um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância.
3.–Ao cumprimento do ónus da indicação dos concretos meios probatórios não bastará somente identificar os intervenientes, efectuar uma apreciação do que possam ter dito ou impugnar de forma meramente genérica os factos em causa, devendo antes precisar-se, em primeiro lugar, detalhadamente cada um dos pontos da matéria de facto constante da decisão proferida colocados em crise, indicando-se depois, relativamente a cada um deles, as passagens concretas e determinadas dos depoimentos em que se funda a impugnação que impõem decisão diversa (e não que meramente a possibilitariam) e procurando-se localizar, ao menos de forma aproximada, o início e termo de tais passagens por referência aos suportes técnicos, conforme o preceituado no referido n.º4.
4.–Se o recorrente não cumpre tais deveres, não é exigível ao Tribunal que aprecia o recurso que se lhe substitua e tudo reexamine, quando o que lhe é pedido é que sindique concretos erros de julgamento da peça recorrida que lhe sejam devidamente apontados com referência à prova e respectivos suportes”.
Refira-se, no mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 28-06-2018 (Processo 123/11.0TBCBT.G1, rel. JORGE TEIXEIRA) concluindo que: “Tendo o recurso por objecto a reapreciação da matéria de facto, deve o recorrente, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivá-lo através da indicação das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, determinam decisão dissemelhante da que foi proferida pelo tribunal “a quo”. Nestas situações, não podendo o Tribunal da Relação retirar as consequências que a impugnação da matéria de facto, deve entender-se que essa omissão impõe a rejeição da impugnação do pertinente recurso, por não cumprimento dos ónus estabelecidos no art. 640º do CPC e consequente inviabilização do cumprimento do princípio do contraditório por parte do recorrido, quando a esses pontos da matéria de facto não concretizados”.
Conforme se referiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-09-2012 (processo 245/09.8 GBACB.C1, relator BRÍZIDA MARTINS): O recorrente que queira impugnar a matéria de facto tem que (…) indicar, dos pontos de facto, os que considera incorretamente julgados – o que só se satisfaz com a indicação individualizada dos factos que constam da decisão, sendo inapta ao preenchimento do ónus a indicação genérica de todos os factos relativos a determinada ocorrência”.
Assim, pode concluir-se que, “como decorre do art. 640.º do CPC o recorrente não satisfaz o ónus impugnatório quando omite a especificação dos pontos de facto que entende terem sido incorrectamente julgados, uma vez que é essa indicação que delimita o objecto do recurso” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-09-2018, Pº 2611/12.2TBSTS.L1.S1, rel. SOUSA LAMEIRA).
De todo o modo, de harmonia com o princípio da prevalência da substância pela forma a que se refere o artigo 6.º do vigente CPC (cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, 2018, p. 32, nota 5), tem-se admitido que, se da conjugação da motivação e das conclusões é viável a percepção de quais os pontos da matéria de facto impugnados, não deverá ter lugar a rejeição da impugnação: “Na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no artigo 640º do CPC, os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal. Tendo a recorrente identificado, no corpo das alegações e nas conclusões, os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, identificando e transcrevendo parcialmente os depoimentos das testemunhas, em conjugação com a prova documental, que, no seu entender, impõem decisão diversa e retirando-se da leitura das alegações e conclusões, qual a decisão que deve ser proferida a esse propósito, mostra-se cumprido, à luz da orientação atrás referida, o ónus de impugnação previsto no artigo 640º do CPC” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-12-2020, Pº 274/17.8T8AVR.P1.S1, rel. ILÍDIO SACARRÃO MARTINS, na linha do Acórdão do mesmo Tribunal de 12-07-2018, Pº 167/11.2TTTVD.L1.S1, rel. FERREIRA PINTO).
Sobre a indicação concreta de meios de prova que se pretendem utilizar, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-09-2018 (Processo 15787/15.8T8PRT.P1.S2, rel. GONÇALVES ROCHA) decidiu que: “A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, exige que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos”.
E, conforme se concluiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-02-2015 (Processo 405/09.1TMCBR.C1.S1, rel. MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA), não observa o ónus legalmente exigido, “o recorrente que identifica os pontos de facto que considera mal julgados, mas se limita a indicar os depoimentos prestados e a listar documentos, sem fazer a indispensável referência àqueles pontos de facto, especificando os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado”.
Finalmente – refira-se – que, conforme se deu nota no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-06-2018 (Pº 552/13.5TTVIS.C1.S1, rel. PINTO HESPANHOL): “A rejeição da impugnação da decisão sobre a matéria de facto prevista no n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil não está dependente da observância prévia do princípio do contraditório. Para que a Relação conheça da impugnação da matéria de facto é imperioso que o recorrente, nas conclusões da sua alegação, indique os concretos pontos de facto incorretamente julgados, bem como a decisão a proferir sobre tais pontos de facto”.
Estas as linhas gerais em que se baliza a reapreciação da matéria de facto na Relação.

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C)Se existe motivo para a rejeição do recurso, no tocante à impugnação da matéria de facto, quanto à preconizada inclusão nos factos provados dos pontos ix., x., xv., xvi. e xviii. da conclusão 26.ª da apelação e quanto à impugnação dos pontos 2, 5, 9, 10 e 14 dos factos não provados, por inobservância do disposto no artigo 640.º do CPC?
No caso dos autos, a recorrente visa impugnar os factos selecionados pelo Tribunal recorrido, nos termos sobreditos, pugnando, desde logo, pela inclusão no rol dos factos provados, daqueles que enuncia.
Conforme se evidenciou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-10-2021 (Pº 4750/18.7T8BRG.G1.S1, rel. FÁTIMA GOMES), “[a]inda que não constitua uma impugnação de matéria de facto, no sentido típico, pode o recorrente entender que a matéria de facto provada e não provada não está completa, para a boa decisão da causa, invocando essa desconformidade em recurso. Com essa pretensão o recorrente quer ver incluídos factos alegados e sobre os quais versou o julgamento na matéria de facto, a partir de alegações e meios de prova, o que significa que o tribunal de recurso carece de ter elementos concretos sobre a indicada pretensão – quais os factos a aditar e porquê; quais os meios de prova que sustentam o aditamento”.

Ora, no presente caso, consta das alegações e das conclusões da apelante a matéria pretendida aditar aos factos provados, elencada na conclusão 26.ª da apelação.
Contudo, relativamente à preconizada inclusão nos factos provados dos pontos ix., x., xvi. e xviii. da conclusão 26.ª da apelação, encontrando-se embora referenciados os depoimentos (com mera alusão à pessoa que os prestou e à data em que ocorreram) que, no entender da apelante, sustentariam a respetiva prova, não se mostra concretizado o ónus de impugnação a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, com a conformação que lhe é conferida pela alínea a) do n.º 2 do mesmo preceito legal, não sendo identificadas, com exatidão, as passagens da gravação em que se funda o recurso, nem, igualmente, quanto a tais pontos, é efetuada alguma transcrição dos respetivos depoimentos genericamente mencionados.
Tal não é sequer efetuado – não sendo referido algum meio de prova – quanto ao ponto xv. da conclusão 26.ª da apelação, gizado incluir na factualidade provada pela recorrente.
Por seu turno, relativamente à impugnação dos pontos 2, 5, 9 e 10 dos factos não provados, a recorrente limita-se a tecer considerações genéricas – sustentadas no seu entendimento sobre a prova do facto não provado n.º 1 - sobre a referida factualidade e as razões pelas quais entende que a mesma deverá ser dada como provada, sem contudo, identificar algum concreto meio de prova que determinasse a alteração probatória.
A impugnação em questão, embora significando uma declaração de vontade da apelante no sentido da impugnação da matéria de facto aquilatada pelo Tribunal recorrido, por não observar os ónus de impugnação consignados na alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, não passa de “mera manifestação de inconsequente inconformismo”, sobre o resultado probatório alcançado pelo Tribunal.
Conforme refere Abrantes Geraldes, (Recursos em Processo Civil, 6ª edição actualizada, 2020, pp. 199-200) impõe-se a “rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto”, designadamente quando se verifique “(…) Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados; (…) Falta de especificação dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); (…) Falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação (…)”, concluindo que, a observância dos requisitos acima elencados visa impedir “que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”.
De facto, não resultando, nem das conclusões, nem da motivação da apelação, quais os concretos meios probatórios, constantes do processo, que imporiam decisão diversa da recorrida, deve ser rejeitado o recurso referente à impugnação da matéria de facto, por inobservância do ónus de impugnação contido na alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.
Relativamente à impugnação deduzida pela recorrente a respeito do ponto 14 dos factos não provados, a apelante tece diversas considerações sobre a aludida matéria, quer na motivação do recurso – cfr. ponto 3.5 –, quer nas conclusões recursórias – cfr. conclusões 64.ª a 78.º.
Todavia, em face delas, não resulta identificada qual a decisão probatória gizada pela recorrente, limitando-se dizer que o Tribunal não poderia “dar como Não provado, em bloco, que a MAP não incorreu em custos extraordinários, pelo que, deverá o douto Tribunal socorrer-se das regras da experiência, do princípio da livre apreciação da prova e da prova por confissão produzida para dever decidir em sentido diferente, quantificando, os custos dados como provados” e que “deverão ser reconhecidos os custos extraordinários à MAP, no montante global de Eur. 35.254,91”.
A apelante, limitando-se a assinalar que o Tribunal (recorrido) não poderia ter dado como provado o constante do ponto 14 dos factos não provados e visando o reconhecimento de custos extraordinários no montante global referido, não tomou concreta posição, identificando-a, qual a decisão que deveria ser tomada por este Tribunal de recurso sobre a aludida factualidade, o que conduz à verificação da inobservância do ónus de impugnação a que se reporta a al. c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.
Quanto ao mais, cumpre apreciar – porque observados os respetivos ónus de impugnação – a impugnação deduzida pela apelante sobre a matéria de facto.
O supra exposto conduz, inelutavelmente, a que deva ser rejeitado o recurso, nos segmentos em que visou colocar em crise a matéria de facto aquilatada pelo Tribunal recorrido, quanto à preconizada inclusão nos factos provados dos pontos ix., x., xv., xvi. e xviii. da conclusão 26.ª da apelação e quanto à impugnação dos pontos 2, 5, 9, 10 e 14 dos factos não provados.

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D)Se devem ser dados como provados os seguintes factos:

-i. As negociações entre a SANESTRADAS e a MAP tiveram início, pelo menos, em 03.12.2018 - Email de 03.12.2018, 17:01 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções
-ii. A 08.01.2019, a MAP enviou um email à SANESTRADAS: " (...) Salientamos que hoje é dia 08.01.2019, pelo que é urgente que se de início à execução dos trabalhos acordados. Como é do V/conhecimento este assunto é de extrema importância na medida em que condiciona a entrega da empreitada ao nosso cliente, cujo atraso resultará em prejuízos incalculáveis para a MAP Engenharia (destaques nossos). - Email de 08.01.2019, 15:34 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções
-iii. A 10.01.2019, a SANESTRADAS envia um novo email à MAP, as condições contratuais - Email de 10.01.2019 14:21 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-iv. A 15.01.2019, a MAP envio um email à SANESTRADAS: com o seguinte teor:" (...) 4. Prazo de execução: Enquadrável no prazo de licença em anexo emitida pela CMC (15.01.12019 a 28.02.2019). - Email de 16.01.2019, 12:36 junto como Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-v. Os trabalhos objeto do Contrato foram adjudicados a 16.01.2019 - Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-vi. No email de 16.01.2019, a MAP solicita à SANESTRADAS que "agendem o início dos trabalhos o mais rapidamente possível face à validade da licença que vos remetemos e conclusão da empreitada com o nosso cliente." - Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-vii. A MAP diligenciou no sentido da Sanestradas retomar os trabalhos nos dias subsequentemente a 14.03.2019 - cfr. Email de 16.01.2019, 12:36 - Doc. 3 da Resposta às Exceções.
-viii. O prazo previsto para conclusão da obra era de 45 dias a contar da data da data de adjudicação dos trabalhos, a 16 de janeiro de 2019, ou no limite, a contar da data de assinatura do contrato, com início em 21 de janeiro e termo em 7.03.2019 - artigo 20.° da Oposição e artigo 35.° da Resposta às Exceções, no qual há confissão das datas de execução dos trabalhos.
-xi. Em 18.03.2019 (segunda-feira), a MAP reuniu-se com a SANESTRADAS com vista à resolução dos diferendos - – cfr. Emails/DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
-xii. A reunião referida supra demorou poucos minutos, tendo a SANESTRADA recusado a conversar - – cfr. Emails / DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
-xiii. Após 14.03.2019, a Sanestradas não executou quaisquer trabalhos objeto do contrato de subempreitada – cfr. Emails juntos como DOC 3 da Resposta às Exceções da SANESTRADA.
-xiv. No dia 21 de março de 2019, a Sanestradas remeteu um email à MAP, com o seguinte teor: “Bom dia/No seguimento da reunião efetuada em obra na passada segunda feira, para análise das quantidades e valores propostos, agradecíamos o vosso parecer sobre o os mesmos, de forma a podermos programar a conclusão dos trabalhos. - cfr. Emails/ DOC 3 da Resposta.
-xvii. Em 01.04.2019, a MAP remeteu à SANESTRADA uma carta para resolução do contrato - Doc. 4 da Oposição?
Sustenta a apelante que o Tribunal ignorou e não julgou diversos factos que, em seu entender, deveriam ter sido dados como provados, importando introduzir na matéria de facto “todos os factos alegados pelas partes com interesse para a boa decisão da causa – sejam essenciais, sejam complementares/concretizadores ou ainda instrumentais” e “aqueles factos instrumentais que resultaram da instrução da causa (ou, no mínimo, considerá-los para efeito de motivação de decisão)” (cfr. parágrafo 3.º do ponto 3.1. da motivação das alegações).

Vejamos:

No regime processual civil vigente, os factos principais essenciais têm se ser alegados na petição inicial (cfr. artigo 552.º do CPC). Por seu turno, o réu deve tomar posição sobre os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor (n.º 1 do art. 574.º do CPC).
“Os factos essenciais são os que apresentam, perante o quadro jurídico em que se fundamenta a acção ou a defesa, natureza constitutiva, impeditiva, modificativa ou extintiva do direito” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30-04-2019, Pº 3755/15.4T8LRA.C2.S1, rel. HENRIQUE ARAÚJO).
Alterações posteriores apenas serão admitidas nos estritos condicionalismos que o Código estabelece.
No caso, de acordo com a pretensão que a autora formulou no requerimento injuntivo, veio invocar a existência do direito de crédito que peticionou. A ré contestou um tal direito, pelas razões que expressou na oposição e veio deduzir reconvenção, sustentando incumprimento do contrato de subempreitada pela autora e invocar ter direito ao ressarcimento dos prejuízos a que tal incumprimento deu azo.
Ora, a factualidade invocada nos pontos i., ii., iii., iv., v., vi., vii., viii., xi., xii., xiii., xiv. e xvii. da conclusão 26.ª das alegações da apelante, tem claro pendor inovador, pois, ou a respetiva alegação não teve lugar em sede de dedução dos articulados das partes, ou, então, a sua dedução, corresponde a uma concretização, especificação ou repetição da alegação então efetuada.
Como se mostra patente, não tendo sido objeto de alegação nos articulados, a matéria atinente, não se incluindo no leque de factos oportunamente alegados, nem também, constituindo facto notório ou de que o tribunal tivesse conhecimento em virtude do exercício das suas funções, apenas poderia ser considerada, caso se entendesse verificada a previsão do n.º 2 do artigo 5.º do CPC, como “factos instrumentais que resultem da instrução da causa” (cfr. al. a)) ou como “factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar” (cfr. al. b)).
Conforme se referiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-07-2017 (Pº 442/15.7T8PVZ.P1.S1, rel. FONSECA RAMOS), “factos não alegados pelas partes podem (…) ser considerados pelo juiz. Esses factos, são os factos instrumentais que resultarem da instrução da causa (nº2 al. a) do art.5º), e os que sejam complementares ou concretizadores dos que as partes alegaram, quando resultarem da instrução causa, desde que sobre eles as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciar - al. b). Os factos que resultam da discussão da causa, como decorre da formulação do nº2 do art. 5º do Código de Processo Civil - “Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz” - são factos, passe a expressão, que só foram descobertos, que só chegaram ao conhecimento do Tribunal na fase instrutória da causa. Os factos instrumentais, mesmo que não constem da alegação das partes, podem ser tidos em consideração pelo julgador se resultarem da instrução da causa”.
Ora, se se configurar como matéria essencial, por respeitar ao núcleo da pretensão das partes, teria - considerando a causa de pedir invocada – natureza essencial e, nesta medida, não seria passível de inclusão nesta sede recursória.
Mas, mesmo que assim não se entendesse, e se considerasse que tal factualidade poderia ser introduzida nos autos, com a natureza de factos complementares – e ressalvada qualquer circunstância superveniente, que não se verifica - , teria de o ter sido até ao encerramento da discussão em 1.ª instância e uma tal consideração deveria ter sido anunciada às partes, com vista a que, sobre tais factos, pudessem exercer o respetivo contraditório. Não tendo tal introdução tido lugar até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento em 1.ª instância, precludida ficou a possibilidade da sua consideração nestes autos, não podendo tal factualidade ser objeto de inclusão nesta instância de recurso.
Note-se que, a ampliação da matéria de facto (artigo 662º, n.º 2, al. c), in fine, do Código de Processo Civil) tem por limite a factualidade tempestivamente alegada pelas partes, não constituindo um mecanismo sucedâneo do artigo 5º, n.º 2, al. b), do Código de Processo Civil).
Por outra parte, encarando-se como factualidade instrumental, também não se veria pertinência na sua inclusão nesta sede.
De facto, ao invés do alegado pela recorrente, a consideração do disposto no artigo 5.º, n.ºs. 1 e 2, do CPC, não significa que a decisão da matéria de facto (provada e não provada) deva comportar toda a matéria alegada pelas partes e, bem ainda, aquela que resulte da prova produzida, já que apenas a factualidade que assuma juridicidade relevante em razão das questões a conhecer é que deve ser objeto dessa decisão.
Isso mesmo enfatizam António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2018, p. 721), quando explicam que o juiz da causa deve optar “por uma descrição mais ou menos pormenorizada ou concretizada, de acordo com as necessidades do pleito, desde que seja assegurada uma descrição natural e inteligível da realidade que, para além de revelar o contexto jurídico em que se integra, permita a qualquer das partes a sua impugnação”. E, salientam os referidos Autores (ob. cit., p. 722) que “o regime consagrado no CPC de 2013 propugna uma verdadeira concentração naquilo que é essencial, depreciando o acessório, sendo importante que o juiz consiga traduzir em linguagem normal a realidade apreendida, explicitando, depois, os motivos que o determinaram, com destaque para a explanação dos factos instrumentais que o levaram a extrair as ilações ou presunções judiciais”.
A respeito da enunciação dos factos instrumentais, decorre do nº 4 do art.º 607º do CPC que, os mesmos, não carecem de ser discriminados no elenco de factos provados, mas apenas referidos na medida das ilações que forem tiradas dos mesmos, para a demonstração dos factos essenciais alegados pelas partes.
Isso mesmo explicam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2018, pp. 718-719), afirmando a necessidade de enunciação dos “factos essenciais (nucleares) que foram alegados para sustentar a causa de pedir ou para fundar as excepções, e de outros factos, também essenciais, ainda que de natureza complementar que, de acordo com o tipo legal, se revelem necessários para que a acção ou a excepção proceda”, bem como a necessidade de “enunciação dos factos concretizadores da factualidade que se apresente mais difusa” (e sendo que “a enunciação dos factos complementares e concretizadores far-se-á desde que se revelem imprescindíveis para a procedência da acção ou da defesa, tendo em conta os diversos segmentos normativos relevantes para o caso”), mas afirmando, igualmente, que, quanto aos factos instrumentais, “atenta a função secundária que desempenham no processo, tendente a justificar simplesmente a prova dos factos essenciais, para além de, em regra, não integrarem os temas da prova, nem sequer deverão ser objecto de um juízo probatório específico”, já que “o seu relevo estará limitado à motivação da decisão sobre os restantes factos, designadamente quando a convicção sobre a sua prova resulte da assunção de presunções judiciais”.
Ora, se assim é, compreende-se, por um lado, a razão da não inclusão da matéria pretendida incluir pela apelante, na seleção factual empreendida pelo Tribunal de 1.ª instância e, por outro lado, não se verifica, nesta sede recursória, existir motivo que justifique a alteração da mencionada seleção factual, por forma a que nela sejam incluídos tais factos, nos termos gizados pela apelante.
Assim, na decorrência do exposto, mostra-se improcedente a correspondente impugnação, inexistindo motivo para incluir nos factos provados, a matéria invocada nos pontos i., ii., iii., iv., v., vi., vii., viii., xi., xii., xiii., xiv. e xvii. da conclusão 26.ª das alegações da apelante.

*
E)Se a matéria que consta do ponto 1 dos factos não provados da decisão recorrida, deve ser dada como provada, passando a constar da matéria de facto provada que "A A. interrompeu os trabalhos e abandonou a obra, sem qualquer razão ou aviso prévio em 14/03/2019" ou se deverá ser considerada provada com a seguinte redação: “A A. abandonou a obra em 14/03/2019"?
Visa a apelante que a matéria constante do ponto 1 dos factos não provados transite para o rol dos factos provados ou, então, subsidiariamente, se consigne que a autora abandonou a obra em 14-03-2019 (cfr. conclusões 28.ª a 38.ª das alegações de recurso).
No referido ponto n.º 1 dos factos provados, o Tribunal recorrido enunciou que não se provou que a autora tenha interrompido os trabalhos e abandonado a obra, sem qualquer razão ou aviso prévio em 14-03-2019.

Enunciou o Tribunal recorrido, como fonte da sua convicção, a seguinte motivação:
“O Tribunal não julgou, por seu lado, provados os factos constantes do ponto 4.2. supra, por não ter sido produzida prova demonstrativa da sua verificação.
Com efeito,
- quanto ao facto constante do ponto 1., embora a testemunha “DD” tenha afirmado que a A. não executou o troço final da obra, com cerca de 15m, retratado na linha diagonal que liga a estrada ao edifício construído pela R. constante do documento junto, por determinação do Tribunal, na audiência de 29/11/2022, não ficou desde logo provado que este troço estava incluído na lista de trabalhos anexo ao contrato de 22/03/2019. Ao invés, decorreu dos depoimentos prestados, com conhecimento directo dos factos, pelas testemunhas “AA” e “EE”, funcionários da A. que acompanharam a negociação/execução dos trabalhos, que tal troço não chegou a ser adjudicado, aquando da contratação, por falta de elementos, correspondendo aos pontos 2.3.1 e 4.3.1. da lista anexa ao contrato, tendo o orçamento desses trabalhos (no valor de €1600,00 cada) sido comunicados à R., que optou por adjudicá-los a terceiros por um valor alegadamente mais barato, razão por que, tendo sido executados os demais trabalhos (com excepção do referido no ponto 1.2.4 da listagem anexa), saíram da obra.
Finalmente, resultou desses depoimentos, em termos não infirmados por qualquer das testemunhas da R., que na origem do litígio esteve essencialmente o facto de a R. não ter aceitado o preço cobrado pela escavação em rocha, que considerou excessivo, nem os custos adicionais cobrados pela A. em razão das limitações horárias impostas pela CMC, indicados no auto de medição n.° 2 que lhes foi enviado em Março de 2019. Aliás, a respeito da rocha, a própria testemunha “DD”, director de obra da R., confirmou a divergência entre as partes quanto a esse ponto, referindo expressamente que essa foi uma das razões por que o referido auto não foi aceite pela R.
Por último, as divergências entre os trabalhos/fornecimentos previstos na listagem anexa ao contrato e os trabalhos/fornecimentos efectivamente prestados assinalados nos pontos 4.1. a 4.4, 4.6., 4.9, 4.10, 4.15 e 4.23 também não demonstram que a A. abandonou a obra sem a concluir. Com efeito, confrontando o auto de medição de 12/03/2019, enviado à R. nesta mesma data, e o auto final de medição de 29/03/2019, anexo à factura n.° FO 2019/99, verifica-se que elas decorrem de ajustamentos marginais efectuados pela A. em relação ao conteúdo do próprio auto de medição, seguramente na sequência de discordâncias manifestadas pela R. em reunião ocorrida entre ambas as partes no período que decorreu entre uma e outra data, conforme atestado pela testemunha “AA”, que nela teve intervenção, na qualidade de director de produção da A., juntamente com “DD”, à data director de obra da R., entre outros.”.

Ora, a dificuldade inerente ao julgamento de facto, assenta na conjugação de fragmentos de factos probatórios, de índole diversa, por vezes, contraditória, uns apontando num sentido, outros noutro, que o julgador terá de compatibilizar, apreciando criticamente as provas.
Como dá nota Marta João Dias (“A fundamentação do juízo probatório – breves considerações”, in Julgar, n.º 13, 2011, p. 176): “Julgar de facto é a complexa operação de interpretação da realidade trazida ao processo pelas partes, isto é, permitindo às partes fazer prova dos factos alegados nos articulados, com o respeito pelo princípio do contraditório, tendo em conta as regras de repartição do ónus da prova e fazendo uso dos poderes de investigação que a lei lhe confere, o julgador afere a verdade dos factos, julgando-os provados ou não provados, e assim demarcando a realidade objecto do litígio (o thema decidendum)”.
Conforme decorre do n.º 5 do artigo 607.º do CPC, o critério de julgamento assenta na livre apreciação das provas, segundo a prudente convicção do julgador.
A convicção é o estado de certeza ou incerteza na verdade de um facto.
“No que toca à valoração da prova no âmbito de um processo judicial, este estado não pode ser um estado de fé, impõe-se que seja um estado crítico, formado de acordo com critérios de prudência. Assim, poderemos dizer que o julgador é livre na valoração da prova (na apreciação e na formação da convicção), na justa medida em que os meios de prova sujeitos à sua apreciação não têm um valor legal predeterminado, mas a decisão não o é, ou seja, a convicção exteriorizável pela decisão não pode ser uma “íntima convicção” compreendida como um feeling. Por outro lado, também não é uma “pura objectividade” lógico-racional, que se possa demonstrar. O estado de certeza da verdade, que há-de corresponder sempre a uma probabilidade, manifesta-se num juízo de certeza prático-emocional que, não obstante a inapagável nota pessoal, não cai num subjectivismo arbitrário, mas é antes marcada pela “objectividade da vida”, isto é, no decidir, o julgador convoca a sua experiência ou vivência pessoal, o que mais não é do que o património de saberes e experiências comum ou da comunidade em que se insere e que viabiliza o nosso conviver, pelo que a verdade a emergir há-de ser a intersubjectivamente partilhada e experimentada” (cfr. Marta João Dias; “A fundamentação do juízo probatório – breves considerações”, in Julgar, n.º 13, 2011, pp. 178-179).
A prudente convicção traduzirá, assim, a verificação dos seguintes postulados mínimos, para o controlo racional da decisão (cfr. Michele Taruffo; La prova dei fatti giuridici, Giuffrè Editore, Milão, 1992, p. 395 e ss.):
A decisão sobre os factos não pode assentar em critérios irracionais (v.g. intuições, palpites ou crenças);
A decisão tem de assentar na prova produzida no processo;
A decisão não pode importar uma violação das regras probatórias;
Os raciocínios ou inferências derivados da relação dos meios de prova entre si e destes com os factos devem ser lógicos e coerentes;
Os raciocínios devem apelar a um consenso, a máximas comummente aceites, por forma a que possam ser considerados verdadeiros fundamentos;
O julgador deverá fazer uma valoração conjunta ou ponderação dos diferentes meios de prova, confrontando-os, por forma a que, ainda que de sentido contrário, daí resulte uma decisão linear e unívoca.
Na sindicância do julgamento operado em 1.ª instância, o Tribunal de 2ª instância “não deve subverter o principio da livre apreciação da prova devendo, apreciar os elementos de prova produzida e apurar da razoabilidade da convicção probatória do primeiro grau dessa mesma jurisdição, face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos e, a partir deles procurar saber se a convicção expressa pelo tribunal de 1ª instância tem suporte razoável naquilo que a prova testemunhal gravada e em outros elementos objetivos neles constantes, pode exibir perante si, sendo certo, que se impõe ao julgador que indique, os fundamentos suficientes para que, através das regras de ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento de facto como provado ou não provado.
Na verdade, só perante uma situação de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão é que se deverá considerar a existência de erro de julgamento; situação essa que não ocorre quando estamos na presença de elementos de prova contraditórios, pois nesse caso deve, em princípio, prevalecer a resposta dada pelo tribunal “a quo”, por estarmos então no domínio e âmbito da convicção e da liberdade de julgamento, que não compete a este tribunal “ad quem “ sindicar (artº 607º, nº 5, do CPC)” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 07-11-2019, Processo 1642/15.5T8PTG.E1, rel. CONCEIÇÃO FERREIRA).

A respeito da gravação da prova e sua reapreciação cumpre considerar que, funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, “tem autonomia decisória”, o que significa que deve fazer uma apreciação crítica das provas que motivaram a nova decisão, especificando, tal como o tribunal de 1ª instância, os fundamentos que foram decisivos para a formação da respetiva convicção (assim, Abrantes Geraldes; Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, p. 22).
Nessa apreciação, o Tribunal da Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de, oficiosamente, atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
Decorre deste regime legal que, o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais (assim, Abrantes Geraldes; Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, Coimbra, Almedina, 3.ª Ed., 2000, p. 272).
Cumpre ainda considerar, a respeito da reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto nos artigos 396.º do CC e 607.º, n.º 5, do CPC.
E, “[…] prova […] livre, quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei” (assim, Alberto dos Reis; Código de Processo Civil Anotado, vol IV, p. 569).
Daí impor-se ao julgador o dever de fundamentação das respostas à matéria de facto, quer sobre os factos provados, quer sobre os factos não provados (cfr. artigo 607.º, n.º 4, do CPC).
Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão, pois, é através da fundamentação de facto que o tribunal de recurso vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância.
Contudo, nesta apreciação, não pode o Tribunal da Relação ignorar que, na formação da convicção do julgador de 1ª instância, poderão ter entrado elementos que são intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo exterior do depoente que influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe, existindo, assim, atos comportamentais ou reações dos depoentes que apenas podem ser percecionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que não podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal, que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-05-2009, P.º 4303/05.0TBTVD.S1, rel. SANTOS BERNARDINO).
Por outro lado, porque se mantêm vigentes no Tribunal da Relação os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deverá restringir-se aos casos em que, os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente, determine decisão diversa da do tribunal recorrido e patenteiem um erro de julgamento ou de apreciação do julgador, que deva ser corrigido.
Sobre os termos de reapreciação da matéria de facto pela 2.ª instância, sintetizou-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-09-2017 (Processo 959/09.2TVLSB.L1.S1, rel. TOMÉ GOMES) o seguinte:
1.–É hoje jurisprudência corrente, mormente do STJ, que a reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada não se deve limitar à verificação da existência de erro notório, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa.
2.–No âmbito dessa apreciação, dispõe o Tribunal da Relação de margem suficiente para, com base na prova produzida, em função do que for alegado pelo impugnante e pela parte contrária, bem como da fundamentação do tribunal da 1.ª instância, ajustar o nível de argumentação probatória de modo a revelar os fatores decisivos da reapreciação empreendida.
3.–Todavia, a análise crítica da prova a que se refere o n.º 4 do artigo 607.º do CPC, mormente por parte do Tribunal da Relação, não significa que tenham de ser versados ou rebatidos, ponto por ponto, todos os argumentos do impugnante nem que tenha de ser efetuada uma argumentação exaustiva ou de pormenor de todo o material probatório. Afigura-se bastar que dessa análise se destaquem ou especifiquem os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do tribunal.
4.–Também nada obsta a que o tribunal de recurso secunde ou corrobore a fundamentação dada pela 1.ª instância, desde que esta se revele sólida ou convincente à luz da prova auditada e não se mostre fragilizada pela argumentação probatória do impugnante, sustentada em elementos concretos que defluam da prova produzida, em termos de caracterizar minimamente o erro de julgamento invocado ou que, como se refere no artigo 640.º, n.º 1, aliena b), do CPC, imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto diversa da recorrida.
5.–O nosso regime de sindicância da decisão de facto pela 2.ª instância tem em vista não um segundo julgamento latitudinário da causa, mas sim a reapreciação dos juízos de facto parcelares impugnados, na perspetiva de erros de julgamento específicos, o que requer, por banda do impugnante, uma argumentação probatória que, no limite, os configure”.
Conforme se mencionou no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 31-05-2004 (Processo 1861/04-1, rel. RICARDO SILVA), “a motivação de facto não tem de ser ou tentar ser uma recriação do julgamento, devendo antes de assegurar que o processo de decisão seja inteligível, de forma sucinta, ainda que tão completa quanto possível, o que importará maiores e melhores informações e explicações sempre que a complexidade do “thema decidendum“ e da prova que sobre ele tenha versado tal imponham, sendo certo que não se deve complicar o que é simples sob pena de se obscurecer o que já está claro”.
Ou seja: “O tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade adequada daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através dessa fundamentação, o juiz deve passar de convencido a convincente” (assim, Miguel Teixeira de Sousa; Estudos sobre o Novo Processo Civil; Lex, Lisboa, 1998, p. 348).
Relativamente à matéria que ficou consignada no ponto n.º 1 dos factos não provados – a interrupção dos trabalhos e abandono da obra pela autora, em 14-03-2019, sem razão ou pré-aviso - o Tribunal recorrido evidenciou, conforme se transcreveu – sublinhando-se, a negrito, os trechos de apreciação mais concludentes - de forma clara, precisa e congruente com os meios de prova produzidos, a conclusão a que chegou na sua apreciação probatória.
Ora, ouvida a gravação da audiência de julgamento nesta sede de apreciação da presente apelação, tendo sido escutados todos e cada um dos depoimentos prestados e conjugados os referidos depoimentos com a prova documental produzida, verifica-se que a conclusão probatória alcançada pelo Tribunal recorrido não merece, como se adianta, alguma censura, não se mostrando padecer de erro apreciativo.

Efetivamente, a apelante vem invocar como meios de prova que confluem na conclusão que refere, os seguintes:
- Documentos n.ºs. 18 a 23 da oposição à injunção;
- Documento n.º 3 da resposta às exceções da autora;
- Depoimento de “BB” (nos termos que extratou); e
- Depoimento de “DD”.
Cumpre, liminarmente, referir que, quanto ao testemunho de “DD”, a recorrente, não obstante lançar mão do mesmo, não concretiza qualquer afirmação desse testemunho que possa sustentar a prova da factualidade que assinala. O mesmo não poderá, por isso, ser, na falta de tal concretização, considerado.
Relativamente ao depoimento de “BB”, encarregado da obra pela ré, o mesmo disse que a autora não fez “o último troço” – da “última caixa até à obra (até ao edifício que estava a ser construído)”, ficando por fazer “10, 12, 13 metros”, nos demais termos que referenciou, dizendo ainda que a autora não concluiu “a conclusão das caixas” e ficou por fazer a ligação do ramal de água, mencionando que lhe cabe ter conhecimento do que é que faz cada empreiteiro, dizendo que adquiriu tal conhecimento por via do que “DD” lhe indicou. Contudo, disse desconhecer os termos contratuais e de orçamentação dos trabalhos referentes à subempreitada.
Ora, este depoimento, de cariz remissivo – ou seja, fundado no que “DD” lhe teria transmitido, em circunstâncias que não concretizou - , não permite afastar, com a necessária e suficiente consistência, a conclusão a que o Tribunal recorrido chegou – de forma compatível, aliás, com a prova produzida – relativamente à apreciação critica do testemunho de “DD”, por contraponto ao que resulta da lista de trabalhos anexa ao contrato.
Efetivamente, conforme resulta da lista de trabalhos anexa ao contrato de subempreitada dos autos – fls. 24 a 28 – mostravam-se “excluídos” da proposta que baseou tal contratação, diversos trabalhos, de entre os quais, os que constam aí identificados sob os pontos 2.3.1 (referente a Execução de ramal de ligação de drenagem de águas residuais, abertura e tapamento de vala, transporte de material sobrante a vazadouro autorizado, maciços em betão, levantamento e reposição de pavimentos e toda a construção civil inerente à perfeita execução da tarefa”, no ponto respeitante à “REDE DE DRENAGEM DE ÁGUAS RESIDUAIS”) e 4.3.1 (referente à “Execução de ligação à rede pública, incluindo fornecimento de tubagem PVC rígido, Ø200 mm no troço correspondente, abertura e tapamento de vala, transporte de material sobrante a vazadouro e pagamento das respectivas taxas, levantamento e reposição de pavimento e todos acessórios, todos os trabalhos e acessórios necessários, de acordo com as especificações dos Serviços”, no ponto referente à “REDE DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS”), segundo aí se lê, por “falta de elementos”. A razão para tal suceder foi, de forma cabal, objetiva e clara, explicada pelas testemunhas “AA” e “EE”: Tais trabalhos foram excluídos da referida prestação de trabalhos, porque, à data da proposta, não havia elementos para os incluir e, por isso, não foram considerados. Tais depoimentos têm integral coerência e compatibilidade com o que consta do aludido documento, elemento fundamental na contratação efetuada.
Tal como salienta o Tribunal recorrido, tais depoimentos de “AA” e de “EE”, revelando “conhecimento directo dos factos”, uma vez que “acompanharam a negociação/execução dos trabalhos”, não demonstrando alguma incoerência ou contradição, evidenciaram, de forma inequívoca, que o troço final da obra, com cerca de 15 metros, traçado na diagonal que liga a estrada ao edifício construído pela autora (a que se reporta, por exemplo, o troço sublinhado do desenho constante da página 132 dos autos – artigo 16.º do requerimento da ré, apresentado em juízo em 10-07-2020 e, bem assim, o segmento diagonal, a amarelo, constante da fotografia reproduzida a fls. 241 dos autos, requisitada durante o decurso do depoimento da testemunha “EE”) não foi incluído nos trabalhos a executar pela autora à ré.
E, esses meios de prova não foram, de forma cabal e convincente, contrariados por outros meios de prova.
Assim, se bem que, “DD” e “FF” tenham afirmado que à autora tinha sido contratada a execução do referido troço, certo é que, o primeiro, no decurso do seu depoimento e a respeito da análise que efetuou sobre o desenho constante de fls. 132 dos autos, acabou por admitir que os mencionados trabalhos não vieram a ser adjudicados à autora, não se mostrando concludente. O segundo depoente, por sua vez, também assinalou que, por um lado, os pontos 2.3.1 e 4.3.1 se encontravam excluídos da contratação com a autora, procurando, depois, fundar a existência de uma duplicação entre tais pontos e o constante do “capítulo 2”, mas, cuja identidade não é, de todo, existente, o que se afere, desde logo, pela mera comparação da leitura de tais pontos.
Aliás, conforme salienta o Tribunal recorrido, na motivação da decisão de facto e como decorre cristalino dos depoimentos convergentes de “AA” e de “EE”, a autora, a certa altura, forneceu preços para os referidos trabalhos excluídos da proposta, preços esses que, contudo, não foram aceites pela ré, que optou pela sua adjudicação a terceiros, aspeto que permite concluir, também, no sentido de que tais trabalhos não se inseriam nos trabalhos definidos inicialmente na prestação a cargo da autora. Aliás, “EE” foi concludente na afirmação de que a autora não iria fazer a ligação sem a adjudicação formal de tais trabalhos pela MAP.
E, assim, a autora deu por concluídos os trabalhos contratados e adjudicados a 12 de março de 2019, tendo remetido à ré, para conferência, o auto de medição n.º 2, dessa data (cfr. facto provado n.º 11).
Sucede que, a autora não executou diversos trabalhos – que também não faturou à ré – dado que os mesmos estavam dependentes da prévia intervenção das Águas de Cascais, que só veio a ser emitida depois de a ré ter comunicado a resolução do contrato, nos demais termos explicitados no facto provado n.º 14.
Sustenta, todavia, a apelante a prova do abandono da obra pela autora no que consta dos documentos de fls. 18 a 23 da oposição e no documento n.º 3 da resposta às exceções da autora.

Vejamos, cronologicamente, o que resulta de tais documentos:
- Doc. 18 da oposição – email datado de 14-03-2019, pelas 15:18h., remetido pela ré (“HH” – Adjunto de Diretor de Obra) para os diversos destinatários e conhecedores de tal comunicação aí mencionados, entre os quais, representantes da autora, daí constando:
“(…) Assunto: RE: O.346-Santa Marta Residence – Esclarecimento sobre o abandono dos trabalhos
(…)
Exmos. Srs.,
No seguimento da tentativa de contacto de hoje sem sucesso, continuamos a aguardar o vosso contacto urgente, para nos prestar os devidos esclarecimentos sobre o abandono da obra no dia de hoje. Como é do vosso conhecimento o prazo da OVP termina amanhã, razão pela qual não compreendemos o motivo da situação que se está a verificar.
Pelo atrás exposto, aguardamos o vosso contacto.
O Eng. “DD” estará em reunião na tarde de hoje, pelo que se tentarem contactar, o façam para o número abaixo indicado em assinatura (…)”.
- Doc. 19 da oposição – email datado de 15-03-2019, pelas 12:19h., remetido pela testemunha “FF” (da ré) para os diversos destinatários e conhecedores de tal comunicação aí mencionados, entre os quais, representantes da autora, daí constando:
“(…) Assunto: RE: O.346-Santa Marta Residence – Esclarecimento sobre o abandono dos trabalhos
(…) Exmos. Srs.
Conforme falado ontem ao final do dia e já hoje de manhã, registamos com surpresa esta V/atitude de abandono de obra desde o dia de ontem.
Segundo a V/posição esta situação deveu-se a falta de respostas por parte da MAP sobre Trabalhos Extra Contratuais efetuados por Vós.
Contudo, até prova em contraria da V/razão, não existe motivos para esta atitude radical, com reflexos diretos na data de conclusão de trabalhos, acrescendo o facto que a licença concedida pela CMC para conclusão dos trabalhos ocorre hoje. Consideramos esta V/atitude, intencional, totalmente irresponsável.
Além disso, e tendo em conta que as empresas se conhecem de há alguns anos de parcerias, existem ‘n’ maneiras de lidar com assuntos desta índole, estando à V/disposição diversos contatos, algo que preferiram não fazer.
Posto isto, e conforme combinado ontem, foi promovida uma reunião entre a MAP e Sanestradas hoje de manhã, com vista ao debate e tentativa de encerramento dos V/alegados trabalhos extra contratuais, cuja proposta irá ser enviado durante o presente dia.
Reforçamos que desde ontem estamos a pedir que retomem os trabalhos, informando a Sanestradas que só retomaria após discussão dos TEC (…)”;
- Doc. 20 da oposição/Doc. n.º 3 junto com o requerimento da autora de resposta às exceções – email datado de 15-03-2019, pelas 12:40h., remetido pela testemunha “AA” (da autora) para os diversos destinatários e conhecedores de tal comunicação aí mencionados, entre os quais, representantes da ré, daí constando:
“(…) Subject: RE: O.346-Santa Marta Residence – Esclarecimento sobre o abandono dos trabalhos
Bom Dia
Continuamos a aguardar resposta aos preços por nós apresentados para os trabalhos a mais a executar e sobrecustos relativos aos condicionamentos impostos pela C.MC. e desconhecidos na fase de apresentação da nossa proposta, pois desde o inicio ficou definido que só seriam executados trabalhos adicionais após os preços estarem aprovados por ambas as partes.
Como é do vosso conhecimento só faltam executar trabalhos inicialmente não previstos e que carecem de aprovação de valores.
Agradecíamos assim o envio da vossa análise á listagem de trabalhos enviada (…)”;
- Doc. 21 da oposição – email datado de 15-03-2019, pelas 13:49h., remetido pela testemunha “DD” (da ré) para os diversos destinatários e conhecedores de tal comunicação aí mencionados, entre os quais, representantes da autora, daí constando:
“(…) Assunto: RE: O.346-Santa Marta Residence – Esclarecimento sobre o abandono dos trabalhos
Boa tarde,
Em anexo enviamos a duas versões do auto n.º 2:
- Versão da Sanestradas, analisada hoje na reunião.
- Versão da MPA, com a nossa análise e comentários.
Aguardamos a V/célere análise e resposta.
Relativamente aos condicionamentos impostos pela C.M.C., recordamos que esta situação já era do V/conhecimento antes da formalização do contrato (email em anexo), o qual como se recordam, sofreu diversas alteração a V/pedido (…)”;
- Doc. 22 da oposição – email datado de 15-03-2019, pelas 17:32h., remetido pela testemunha “AA” (da autora) para os diversos destinatários e conhecedores de tal comunicação aí mencionados, entre os quais, representantes da ré, daí constando:
“(…) Subject: RE: O.346-Santa Marta Residence – Esclarecimento sobre o abandono dos trabalhos
Boa tarde
No seguimento dos valores apresentados por vós, informamos que discordamos com os mesmos, estando disponíveis para uma reunião segunda á tarde para tentarmos chegar a acordo (…)”;
- Doc. 23 da oposição – email datado de 15-03-2019, pelas 20:19h., remetido pela testemunha “DD” (da ré) para os diversos destinatários e conhecedores de tal comunicação aí mencionados, entre os quais, representantes da autora, daí constando:
“(…) Assunto: RE: O.346-Santa Marta Residence – Esclarecimento sobre o abandono dos trabalhos
Exmos. Srs,
Registamos mais uma vez o n/desagrado perante a V/postura em todo este processo.
Estamos obviamente disponíveis para reunir na próxima 2.ª feira pelas 14h, mas não podemos contudo deixar de salientar mais uma vez os graves prejuízos que esta V/atuação está a provocar à MAP Engenharia.
Como é do v/conhecimento o prazo da 2ª prorrogação terminou hoje e os trabalhos não concluíram claramente por V/inteira responsabilidade. Realçamos ainda que, e ao contrário do que referem na V/comunicação, os V/trabalhos contratuais ainda não se encontram concluídos ao dia de hoje, como facilmente se poderá constatar no local (…)”;

Ora, se bem se considerarem tais documentos, conjugados com o que resulta do documento n.º 2 junto com o requerimento de resposta às exceções da autora – constante a fls. 103vº dos autos – email datado de 12-03-2019, das 17:26h., remetido pela autora à ré, no qual a autora remete à ré “auto de fecho dos trabalhos previstos há data para a conclusão da obra, onde estão inseridos os trabalhos adicionais solicitados por V/Exas.”, enviando também “as respetivas medições para vossa análise” e solicitando “a rápida aprovação do mesmo de forma a não condicionar o andamento dos trabalhos” e dizendo que “nesta fase já só falta executar trabalhos não previstos e adicionais”, conclui-se que foi manifestada pela autora à ré a razão da não continuação da execução de trabalhos, fundada na circunstância de a ré não ter apresentado resposta sobre os preços para os trabalhos excluídos da proposta de subempreitada e anexos ao respetivo contrato, conforme inequivocamente se menciona no já citado documento n.º 20, junto com a oposição.
Aliás, conforme resulta do email de 12-03-2019 e do auto de medição que a autora então remeteu à ré, encontravam-se já efetuados, nessa data, os trabalhos contratualmente adjudicados – com exceção dos referidos nos pontos 4.12, 4.13, 4.26, 4.27 e 4.33 (estes dependentes da autorização/agendamento com as Águas de Cascais) dos factos provados. Conforme referiu, de forma compatível, a testemunha “EE”, por referência à data de 12-03-2019, “terminámos os trabalhos que era possível efetuar…”.
Perante os meios de prova produzidos não é possível concluir que tenha ocorrido erro, muito menos notório, na apreciação da prova, não inculcando tais meios de prova na demonstração de abandono de obra pela autora e que o mesmo ocorresse sem justificação. As referências que constam nos documentos n.º 18 a 23 da oposição e 3 da resposta às exceções a “abandono”, desde logo, no assunto têm que ser enquadradas na situação factual que se registava à data de 14 e 15-03, em que a autora aguardava indicações com vista à conclusão de trabalhos. E, nessa medida, não poderão fundamentar alguma convicção positiva sobre a pretensão de a autora sair, sem justificação ou aviso, da obra, aspeto que o Tribunal recorrido evidenciou.
Note-se que o Tribunal recorrido não deixou de fazer o necessário – e, diga-se, ajustado - confronto entre o auto de medição de 12-03-2019, remetido à ré nesta data – conforme resulta do mencionado documento n.º 2 junto com o requerimento de resposta às exceções da autora – e aquele que, com data de 29-03-2019, foi anexo à fatura n.º FO2019/99, não patenteando, tal confronto senão meras divergências marginais, que não sustentam base para a consideração da invocada situação de “abandono” da obra por banda da autora.
Em suma e de acordo com o exposto, a impugnação de facto deduzida a respeito do facto não provado n.º 1, soçobra.

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F)Se a matéria constante do ponto 14 dos factos provados
deverá passar a ter a seguinte redação: "14. A A. não executou, nem facturou os trabalhos nos pontos 4.12, 4.13, 4.26, 4.27 e 4.23."?
No ponto 14 dos factos provados, consignou-se, na decisão recorrida, o seguinte: “A A. não executou, nem facturou os trabalhos referidos nos pontos 4.12., 4.13., 4.26., 4.27 e 4.33., porque a execução desses trabalhos estava dependente autorização/agendamento do trabalho referido no ponto 4.12 das Águas de Cascais e esta só veio a ser emitida depois do facto referido em 12” (constando deste facto provado n.º 12 que, “Por carta registada de 03/04/2019, que aqui se dá por integralmente reproduzida, a R. comunicou à A. a resolução do contrato referido em 1. supra”).
O Tribunal recorrido expressou a motivação da convicção probatória sobre o referido facto provado n.º 14 nos seguintes termos:
“Os factos constantes do ponto 14., na parte atinente aos trabalhos não realizados, estão admitidos por acordo (cfr. artigos 2.°, pontos XII, XIII, XXVI, XXVII e XXXIII, e 3.° K, L, V, W e CC. do articulado aperfeiçoado da R. de 15/10/2021 e item 4. do articulado aperfeiçoado da A. de 15/10/2021). No mais, atendeu-se aos depoimentos prestados pelas testemunhas “AA” (director de produção da A.) e “EE” (director comercial da A) - que confirmaram, de forma credível, a razão pela qual o trabalho referido no ponto 4.12. não foi realizado - conjugado com o depoimento da testemunha “CC”, a quem a R. veio a adjudicar tal trabalho, o qual referiu que a ligação em causa dependia de autorização das Águas de Cascais, que só foi dada em Maio de 2019, tendo a ligação sido agendada para o dia 14 desse mês. Por outro lado, decorreu do depoimento prestado pela testemunha “DD” que a execução de ligação à rede pública (ponto 4.12) exigia uma prévia vistoria à tubagem a requerer pela R., o que esta não fez por não ter sido executado o troço final até ao edifício por si construído, com cerca de 15m, troço que a R. não logrou provar estar incluído nos trabalhos adjudicados à A, pelas razões adiante enunciadas. Embora as referidas testemunhas “AA” e “EE” se tenham exclusivamente referido ao trabalho ponto 1.2.4 da listagem anexa ao contrato (ponto 4.12 dos factos provados) como estando dependente da referida autorização, afigura-se que existe entre o referido trabalho e os demais trabalhos descritos no ponto 15. uma conexão lógica e sequencial que os permite incluir no núcleo de trabalhos dependentes da referida vistoria/autorização.”.

Considera a apelante que existiu erro de julgamento do Tribunal recorrido, expendendo, nesse sentido, os seguintes argumentos:
- Por o Tribunal se ter apoiado “nas declarações das testemunhas “AA” e “EE” que revelaram parciais, incoerentes, faltando, de forma notária, à verdade”;
- Por o Tribunal fazer “uso de aferências que pressupõem conhecimentos técnicos que, o Tribunal, não suportado por técnico competente, não poderá fazer”, não podendo concluir que, embora “AA” e “EE” se tenham exclusivamente referido ao trabalho ponto 1.2.4 da listagem anexa ao contrato (ponto 4.12 dos factos provados) como estando dependente da referida autorização, afigurar que existe entre o referido trabalho e os demais trabalhos descritos no ponto 15. uma conexão lógica e sequencial que os permite incluir no núcleo de trabalhos dependentes da referida vistoria/autorização (...) [não se percebendo, desde logo, se o Tribunal se refere ao ponto 4.15 ou ao ponto 15 dos Factos Provados]”, considerando que esta inferência “é contrária a todas as regras de Direito e de julgamento, desde logo por obscuridade na fundamentação, devendo, por conseguinte, ser, sem mais, alterado e considerado não provado o excerto do ponto em crise”.

Convoca, nesse sentido, os testemunhos de “CC”, “BB” e “DD”, nos excertos que identificou e ainda a circunstância de a ré ser “uma sociedade de construção experiente, com muitos anos de atividade, detendo relevante experiência em executar trabalhos no concelho de Cascais – concelho da sua sede social e trabalhos de saneamento, tão é assim que este tipo de trabalhos consta do seu objeto social – Ponto 4.1, Facto 1 dos Factos Provados”.
Antes de mais, cumpre apreciar que se afigura existir incorreção na referência constante da aludida motivação aos “demais trabalhos descritos no ponto 15.”, menção que se reporta, como as demais constantes desse facto provado n.º 14, ao rol dos factos provados (sendo que, aliás, inexiste algum ponto 15. na proposta de trabalhos anexa ao contrato de subempreitada celebrado, que pudesse ser objeto de consideração) e ao que também consta do ponto 14.
Com efeito, no ponto 15 dos factos provados não consta referenciado qualquer trabalho que estivesse dependente de autorização das Águas de Cascais, o que, aliás, a apelante salienta e se trata de uma evidência, por corresponder a um trabalho recorrente desde o início da empreitada, em razão das imposições decorrentes da OVP. Em tal ponto 15, apenas se dá conta de que, no final de cada dia de trabalho, pelas 17 horas, a autora tinha de deixar a via transitável, com a obrigação de tapar a vala aberta e, no dia seguinte, voltar a destapá-la.
Sucede que esta incorreção não afeta o sentido do julgamento probatório efetuado do aludido facto provado n.º 14, o qual faz expressa e concreta referência a cada um dos trabalhos que não foram executados.
Por outro lado, ao invés do invocado pela apelante, não se afere alguma contradição entre o depoimento de “AA” e a prova documental carreada para os autos, sendo que, o mesmo foi inequívoco, objetivo e justificado, mostrando-se credível nas afirmações produzidas, no sentido de que da listagem de trabalhos, a ligação das águas não foi efetuada, porque as Águas de Cascais não tinham dado data para fazer o corte de água e ligação (trabalho que estava adjudicado à autora) e na zona de ligação dos ramais de saneamento faltava fazer o saneamento (trabalho que não foi adjudicado à autora), em conformidade com o que resulta dos elementos documentais juntos aos autos, em particular, do contrato e listagem anexa ao mesmo.
“AA” foi reinquirido pelo Tribunal com vista a prestar esclarecimento na sequência do testemunho de “DD”, tendo, concludentemente, referido que a execução de trabalhos encomendada à autora não englobava o “ramal” de ligação ao edifício (esgoto), desenvolvendo, extensas e detalhadas considerações, dizendo que os pontos 2.3.1 e 4.3.1 não tinham ainda as infraestruturas, passeios e as condutas que referenciou, definidas, tendo sido essa a razão da não “cotação” inicial de valores, por falta de elementos (a fls. 24). Referiu que, ulteriormente, em sede de fecho de contas, deram cotação para tais rubricas, mas que o preço fornecido não foi aceite pela ré.
Este depoimento encontra-se em plena coerência com que se lê do documento de fls. 24 a 28 dos autos, de onde resulta expressa a exclusão dos pontos 2.3.1 e 4.3.1 da execução de trabalhos pela autora, por “falta de elementos”.
O mesmo se diga, relativamente ao testemunho de “EE”, diretor de produção da autora, o qual, referiu – minuto 12 e ss. e minuto 15 e ss. da primeira inquirição – com objetividade, segurança e clareza – e com plena sintonia com o testemunho de “AA” - que nem todos os trabalhos constantes do documento anexo ao contrato – fls. 24 a 28 – foram executados, nos termos que concretizou: “…das águas…, porque a gente estávamos a aguardar que as Águas dissesse…quando é que se ia fazer a ligação, mas quem decide isso não somos nós, a Águas de Cascais é que marca depois o dia… Quem tinha de pedir essa marcação era a MAP… nós nunca chegámos a ser informados quando era para ser feita a ligação…”.
“EE” foi reinquirido, com vista a esclarecer aspetos que teriam ficado por esclarecer aquando da primitiva inquirição - não, por incongruências verificadas no depoimento – esclarecendo, nessa reinquirição, que a ligação de ramal (constante na diagonal do documento de fls. 241) foi excluída da proposta de trabalhos adjudicada à autora, porque não havia elementos para saber onde se localizava da caixa de ligação, nos demais termos que concretizou. Mais referiu que a SANESTRADAS apenas faturou os trabalhos que executou.
Não se verifica, em face do exposto, que os aludidos depoimentos se tenham, de algum modo, revelado “parciais, incoerentes” ou que tenham faltado “à verdade”, soçobrando o invocado pela apelante, a este respeito.
“CC”, da empresa Axelpotency (a que se referem as faturas constantes de fls. 72 e 77 dos autos), contratada pela ré para concluir a ligação à rede de saneamento, referiu que a empresa, nomeadamente (para além do aluguer de equipamentos à ré), efetuou “a ligação de uma tubagem de água, que já existia, mas não tinha água…à rede pública”, conforme concretizou (cfr., em particular, minutos 24 e 25 do respetivo depoimento) - logicamente, daqui se inferindo que tais trabalhos não foram realizados pela autora e que a ligação se efetuou em data ulterior à data da carta de 03-04-2019 (fls. 30vº-31vº) - , o que se encontra em plena compatibilidade com a posição das testemunhas de ambas as partes. Nesse sentido, inculcaram também, os depoimentos das demais testemunhas referenciadas pela apelante, em particular, “DD”, que, concludentemente, referenciou que, não estando completa a rede de esgotos, à data de 14-03-2019, a MAP não estava em condições de solicitar a vistoria à rede de esgotos, a qual tem de estar completa, o que não sucedia, mencionando que, de todo o modo, a autora não efetuou a faturação de tais trabalhos.
Perante a apreciação crítica efetuada sobre os depoimentos prestados a respeito desta temática e atentos os referidos documentos, bem como o acordo das partes, resultante do que consta mencionado – sem mácula – na motivação da convicção a respeito do aludido facto provado n.º 14 (cfr. requerimentos das partes de fls. 181-188 e 207-208), compreende-se, plenamente, o sentido probatório alcançado e as inferências que, a partir deles, o Tribunal recorrido retirou, no sentido de que, os trabalhos referidos nos pontos 4.12., 4.13., 4.26., 4.27 e 4.33. dos factos provados (correspondentes, respetivamente, ao que consta dos pontos 1.2.4, 1.7., 2.3.3., 2.3.4 e o trabalho referenciado em segundo lugar na página 27vº do documento que consta de fls. 24 a 28 dos autos) não foram executados pela autora.
Não se afere, no mais, alguma indevida inferência do Tribunal, ou, noutra perspetiva, alguma imposição de formalidade probatória que implicasse o “suporte por técnico competente” para que o Tribunal recorrido pudesse concluir, como o fez, no sentido de que, perante o testemunho de “AA” e “EE”, em “conexão lógica e sequencial” com o trabalho referido no ponto 1.2.4 da listagem anexa ao contrato, se encontravam os demais trabalhos referenciados no aludido ponto 14 (4.13, 4.26, 4.27 e 4.33 dos factos provados), o que se torna, aliás, evidente em face da leitura da descrição de cada um desses trabalhos.
Na realidade, ao contrário do que já sucedeu em Portugal (cfr. artigo 2512.º do Código Civil de Seabra) não se encontra enunciado na lei um patamar mínimo de meios de prova a produzir no sentido de se obter um dado resultado probatório, podendo o julgador, claro está, de forma suficiente e motivada, fundar a sua convicção na prova de um determinado facto, com base num único documento ou num único testemunho (para mais desenvolvimentos, vd. Fernando Pereira Rodrigues; A Prova em Direito Civil; Coimbra Editora; 2011, p. 149 e ss.), tendo o Tribunal recorrido explicitado, cabalmente, a fonte da sua convicção probatória.
Conforme se dá nota no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07-01-2019 (Processo 3239/17.9T8VFR.P1, rel. CARLOS GIL), “o limiar relevante da prova em matéria civil requer a denominada probabilidade prevalecente; isto é, sempre que se defrontem hipóteses contraditórias relativamente à realidade de um certo facto, a decisão do tribunal deve apoiar-se na hipótese que se apresente com uma probabilidade mais forte. A livre apreciação da prova não significa apreciação arbitrária da prova, mas antes a ausências de critérios rígidos que determinam uma aplicação tarifada da prova, traduzindo-se tal livre apreciação numa valoração racional e criticamente fundamentada das provas de acordo com as regras da experiência comum e com a corroboração pelos dados objectivos existentes, quando se trate de questão em que tais dados existam”.
Dito de outra forma: “Prova livre, quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei (…). Para por em causa a convicção formada pelo Tribunal recorrido, é necessário demonstrar que a mesma assenta em pressupostos que são logicamente inaceitáveis ou impossíveis, designadamente, por contrariarem regras de experiência comum” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27-04-2020, Processo 1740/18.3T8VNG.P1, rel. JERÓNIMO FREITAS).
Ora, isso não resulta, de algum modo, evidenciado em face das considerações tecidas pela apelante.
Por fim, não se alcança – e a apelante também não o explicita – em que medida é que o consignado no ponto 1 dos factos provados pode constituir válido elemento ou argumento para a alteração preconizada pela apelante a respeito do facto provado n.º 14.
Em suma, não se justifica alguma alteração à redação do facto provado n.º 14 expressa na decisão recorrida, devendo, consequentemente, improceder a impugnação deduzida quanto a tal ponto.

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G)Se deverá ser eliminada a matéria constante do ponto 7 dos factos não provados, por ser repetição do ponto 4.15 dos factos provados?
Pugna ainda a apelante no sentido de ser eliminada da matéria de facto não provada o ponto 7, por entender que se trata de uma repetição do ponto 4.15 dos factos provados, invocando o seguinte:
“(…) Os trabalhos incluídos no ponto 4.16 correspondem à escavação para abertura de valas para implantação de tubagem em rocha, incluindo entivação, rebaixamento do nível freático, se necessário, e remoção dos produtos escavados, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, no valor de € 95/m2. (ponto 2.1.1 da listagem anexa ao contrato).
No requerimento junto pela Autora a convite do Tribunal, com a ref.- Citius 19687504, datado de 15/10/2021, a Autora confessa que os trabalhos descritos no ponto 2.1.1. da listagem de trabalhos, a SANESTRADAS executou apenas 19,00 metros, avaliado em €279,68, tendo realizado menos 41,50 metro linear do que se encontrava contratualmente previsto. Assim, do valor global previsto para este trabalho, no montante €1.251,00, apenas foi faturado € 279,68, correspondente a 19.00 metros lineares.
Esta matéria descrita no Ponto 7 dos Factos não provados corresponde, mutatis mutandis. à matéria do Ponto 4.15 da Matéria de Factos Provados, havendo aqui um claro erro do Tribunal na indicação da matéria.
Não obstante, sempre se dirá que relativamente ao trabalho de escavação em rocha ficou provado, através de extensa prova testemunhal (depoimentos de “BB”, e Ricardo Guimarães), em sede de julgamento, que os trabalhos em rocha reclamados pela SANESTRADAS não foram executados nos termos e nas quantidades peticionados pela subempreiteira, não tendo a SANESTRADAS logrado provar as quantidades dos trabalhos peticionados.

Vejamos:

- No ponto 4.15 dos factos provados da decisão recorrida, consta o seguinte:
“[4.Nos termos do referido contrato, foram adjudicados à A. os seguintes trabalhos:] (…) 4.15.Escavação para abertura de valas para implantação de tubagem, em solo de qualquer natureza, incluindo entivação, rebaixamento do nível freático, se necessário, e remoção dos produtos escavados, de acordo com peças desenhadas e condições técnicas, na quantidade de 85 m2, ao valor de € 14,72/m2, totalizando € 1.251,20 (ponto 2.1.1 da listagem anexa ao contrato), tendo a A. apenas executado e facturado 19 m2, no valor total de 279,68”; e
- No ponto 7 dos factos não provados da decisão recorrida, ficou consignado que não se provou o seguinte:
“7. A A. apenas executou 20,18m2 do trabalho descrito no ponto 4.16 dos factos provados, no valor total de €1.916,63”.
A apelante pretenderá referir-se, não ao ponto 4.15 dos factos provados, mas sim, ao ponto 4.16, conforme expendeu na motivação da alegação.
Sucede que, quer por referência ao ponto 4.15, quer por atinência ao ponto 4.16 dos factos provados, não se encontra alguma repetição.
Por outro lado, o requerimento da autora de 15-10-2021, não consente a conclusão avançada pela apelante, não conduzindo, a posição aí expressa pela autora, igualmente, a que deva ser eliminada da matéria de facto, o que consta do facto não provado n.º 7 (que, conforme consta da motivação da decisão recorrida, resultou incluído no rol dos factos não provados, pela inconcludência retirada pelo Tribunal acerca do depoimento de “DD”, não permitindo os demais meios de prova produzidos, diversa consideração).
A impugnação correspondentemente deduzida a respeito do aludido facto não provado n.º 7 é, pois, insubsistente, devendo ser julgada improcedente.

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III)Impugnação da decisão de direito:

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H)Se deveria ter sido julgado procedente o pedido reconvencional?
O Tribunal recorrido, em sede da questão de saber se a autora tinha sobre a ré, um direito de crédito, no valor de € 15.846,75, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, veio a reconhecer a existência de um tal crédito.
Depois de enquadrar juridicamente a relação entre as partes, no âmbito do contrato de subempreitada, veio o Tribunal recorrido a concluir que não procediam as razões invocadas pela ré para o não pagamento da fatura n.º FO99/2019, do referido valor de € 15.846,75, pelas considerações que desenvolveu e que constam da fundamentação jurídica da decisão recorrida, para onde se remete.
Em particular, relativamente à invocação da ré de que a autora não concluiu os trabalhos no prazo estipulado e abandonou a obra sem os concluir, vindo a resolver o contrato, teceram-se na decisão recorrida, as seguintes considerações:
“(…) De acordo com a alegação da R. à mora seguiu-se uma atitude configurável como incumprimento definitivo do contrato (abandono da obra sem conclusão dos trabalhos), que veio a determinar a resolução do contrato.
Porém, a R. não logrou provar, como lhe competia (artigo 342.°, n.° 2, do Código Civil), que a R. interrompeu a execução dos trabalhos que lhe haviam sido adjudicados e abandonou a obra sem a concluir, não relevando como tal os trabalhos cuja realização estava dependente de outros trabalhos extracontratuais que não lhe foram adjudicados (os referidos nos pontos 2.3.1 e 4.3. da lista de trabalhos anexa ao contrato) e subsequente autorização das Águas de Cascais (como o referido no ponto 1.2.4. da mesma lista e trabalhos conexos), que só foi prestada depois de a R. ter resolvido o contrato em questão.
Por outro lado, embora a verificação de um atraso de três dias na execução dos trabalhos pudesse legitimar, de acordo com o estipulado no n.° 6 da cláusula segunda do contrato de subempreitada, a resolução do contrato e a adjudicação a terceiros do trabalho não executado, certo é que a R. não resolveu o contrato por esse motivo, como se comprova pelo teor da carta de resolução.
De todo o modo, embora se tenha provado que a R. deu por concluídos os trabalhos que lhe foram adjudicados em 12/03/2019, isto é, 4 dias depois do termo do prazo previsto no n.° 2 da cláusula segunda do referido contrato (45 dias), que ocorreu em 08/03/2019, a R. não alegou, nem provou que esse atraso teve implicações negativas em relação ao trabalho de terceiros, como exigido pelo citado n.° 6 da cláusula segunda do contrato de subempreitada como condição do direito à resolução do contrato.
Ora, não tendo a R. provado que a A. violou o contrato invocado como causa de pedir e, muito menos, em termos que justificassem, à luz da lei e do contrato, a sua resolução (artigos 432.°, n.° 1, e 808.° do Código Civil, este último aplicável, por identidade de razões, às hipóteses de expressa recusa em cumprir, nas quais o abandono da obra, no caso da empreitada, claramente se subsume), deve reconhecer-se à A. o direito a receber da R. a quantia de €15.846,75 (artigo 406.°, n.° 1, do Código Civil), acrescida dos juros de mora vencidos, à taxa legal supletiva para os juros comercias, sobre o capital, desde dia 11/06/2019 até integral pagamento (cfr. cláusula quinta, n.° 1, do contrato, e artigo 806.°, n.° 1, do Código Civil).
Porém, tendo o procedimento de injunção se transmutado em acção declarativa, a taxa de justiça paga por esse procedimento e despesas com advogado devem ser oportunamente reclamadas em sede de custas de parte.”.

A recorrente veio impugnar a decisão recorrida, de facto e de direito.
E, em sede de impugnação da decisão de direito, a apelante começa por tecer diversas considerações em torno do conceito de “abandono de obra”, pressupondo, conforme decorre da respetiva alegação, a prévia procedência da impugnação da decisão de facto que gizou, concluindo que, subsequentemente, deveria “ser alterada a matéria de direito, em virtude da subsunção da matéria de facto dado agora como provada”.
Ora, conforme decorre claramente do exposto, a procedência desta impugnação da decisão de direito assentava, na perspetiva do recorrente, no provimento do recurso que deduziu a respeito da impugnação da matéria de facto.
Contudo, como se viu, a impugnação da matéria de facto que deduziu foi improcedente, pelo que, logicamente, soçobram as considerações da apelante, relativamente à decisão de direito, que pressupunham decisão diversa da tomada quanto à impugnação da matéria de facto.
Em particular, não se comprovou a gizada situação de abandono da obra por banda da autora, nem, igualmente, os factos provados, determinam ser de cogitar a alguma situação de “desistência tácita” da autora (com fundamento no artigo 1229.º do CC, preceito que, aliás, se reporta à desistência por parte do dono da obra, ou, no caso de subempreitada, referente à posição jurídica do empreiteiro e, não, à posição da autora, que figura no contrato dos autos como subempreiteira).
De facto, decorre dos factos provados, que a autora deu por concluídos os trabalhos em 12-03-2019, data em que remeteu à ré, para conferência, o auto de medição n.º 2 dessa data, não se apurando que a autora tenha interrompidos os trabalhos e abandonado a obra sem qualquer razão ou aviso prévio em 14-03-2019, sendo que, conforme salientou o Tribunal recorrido, não relevou para diversa conclusão, a circunstância de não terem sido realizados outros trabalhos extracontratuais, que não lhe foram, na realidade, adjudicados, como sucedeu com os trabalhos constantes dos pontos 2.3.1. e 4.3.1 da lista de trabalhos anexa ao contrato.
Entende, todavia, a recorrente que, a autora “incumpriu o plano de trabalhos a que se vinculou e, bem assim, executou defeituosamente e/ou não executou determinados trabalhos”, considerando que a autora obrigou-se perante a ré “a realizar e entregar a obra no prazo de 45 dias, assinado em 22 de Janeiro de 2019. Não tendo sido fixado o prazo de início e conclusão dos trabalhos, deverá o intérprete socorrer-se das normas previstas nos artigos 278º e 279º do CC, normas essas que nos autorizam a concluir que o prazo de 45 dias têm início no dia seguinte à assinatura do contrato, ou seja, a 23 de Janeiro”, pelo que – prossegue a ré – a autora estaria contratualmente obrigada a concluir os trabalhos “até 8 de março”, prazo que – o qual entende como absoluto - não foi cumprido, “não existindo qualquer perturbação da sua prestação que permitisse justificar juridicamente o referido atraso e, consequente, incumprimento”, concluindo pela licitude da resolução contratual que (a ré), subsequentemente, efetuou.
Desde logo, cumpre assinalar que o prazo de execução dos trabalhos era de 45 dias (cfr. cláusula 2ª, n.º 2), mas, esse prazo estava sujeito a “ulteriores modificações”, que as partes pudessem acordar.
Ora, nos termos do contrato de subempreitada celebrado, a autora vinculou-se a cumprir os prazos estabelecidos no plano de trabalhos apresentado, “responsabilizando-se por todos os atrasos que lhe sejam imputáveis” (cfr., Cláusula 2.ª, n.º 1) e, “em caso de atraso do subempreiteiro, o empreiteiro, independentemente de se ressarcir dos prejuízos causados, poderá realizar diretamente os trabalhos, deduzindo do contrato com o subempreiteiro, os prejuízos correspondentes” (cfr., Cláusula 2.ª, n.º 3).
Sucede que, a autora iniciou os trabalhos em 30-01-2019 (cfr. facto provado n.º 10).
Ao invés do pugnado pela recorrente não se afere que o início de contagem do prazo de 45 dias deva ter lugar no dia seguinte ao da assinatura do contrato, não tendo aplicação, nesse sentido, o prescrito nos artigos 278.º e 279.º do CC.
Com efeito, tendo em conta o previsto na Cláusula 16.ª do contrato, aos casos omissos era aplicável o previsto no caderno de encargos da empreitada e, subsidiariamente, o disposto no Código dos Contratos Públicos.
Releva, pois, na falta de outra indicação a este respeito do caderno de encargos, o disposto no n.º 1 do artigo 362.º do Código dos Contratos Públicos, onde se dispõe que: O prazo de execução da obra começa a contar-se da data da conclusão da consignação total ou da primeira consignação parcial ou ainda da data em que o dono da obra comunique ao empreiteiro a aprovação do plano de segurança e saúde, nos termos previstos na lei, caso esta última data seja posterior”.
Ora, os autos não dão elementos sobre a data em que se operou a consignação da obra, muito embora se tenha apurado, como se disse, que a obra se iniciou em 30-01-2019, tendo-se por facultado o acesso aos locais da obra nessa data (cfr. artigo 356.º e ss. do Código dos Contratos Públicos).
Contabilizando, desde então, o referido prazo de 45 dias, verifica-se que, o mesmo apenas terminaria em 16-03-2019.
A autora deu, contudo, por concluídos os trabalhos a 12-03-2019 (cfr. facto provado n.º 11).
Não resulta, pois, evidenciado que a autora tenha inobservado o aludido prazo para execução da obra.
De todo o modo, mesmo que assim não ocorresse, certo é que – como bem se assinala na decisão recorrida - a ré, não veio a resolver o contrato por qualquer atraso, conforme resulta do teor da carta de 03-04-2019, cuja cópia consta junta aos autos, não sustentando, pois, tal situação, fundamento resolutivo do contrato.
E, ademais, conforme igualmente se salientou na decisão recorrida, a rescisão apenas era legitimada nos termos do n.º 6 da Cláusula 2.ª do contrato de subempreitada dos autos, se houvesse um atraso de 3 dias relativamente ao plano de trabalhos – o qual, não se evidenciou – e que o mesmo tivesse “implicações negativas em relação ao trabalho de terceiros”, o que a ré não evidenciou.
Noutra perspetiva, os direitos do dono da obra no contrato de empreitada (ou do empreiteiro no âmbito da subempreitada) traduzem-se na aquisição e receção da obra - correspondendo à satisfação do interesse primordial do dono da obra no contrato de empreitada, resultando do artigo 1208.º do CC, que a obra deve ser realizada de acordo com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor ou a sua aptidão para o fim convencionado – e à faculdade de fiscalização do processo de execução da obra
O direito à entrega da obra implica não só o cumprimento do projeto convencionado, mas o cumprimento das regras da arte aplicáveis à atividade do empreiteiro, que está integrado no dever de cumprir pontualmente a obrigação (cfr. artigo 762.º, n.º 1, do CC).
Os principais deveres do dono da obra (ou do empreiteiro no âmbito da subempreitada) consistem no pagamento do preço, na verificação, comunicação e aceitação da obra e no “dever de prestar ao empreiteiro a colaboração essencial, que permita àquele a correta execução do projeto” (assim, Pedro de Albuquerque e Miguel Assis Raimundo; Direito das Obrigações; Contratos em Especial, Vol. II, Almedina, 2012, p. 286). De facto, por vezes, “torna-se necessário que o comitente colabore na execução dos trabalhos do empreiteiro, a fim de este poder realizar a obra a que se obrigou. Por exemplo, fornecer o terreno, o plano ou os materiais e utensílios, comunicar instruções e colaborar para obter autorizações” (assim, Pedro Romano Martinez; Contrato de Empreitada; Almedina, 1994, p. 80).
No pólo oposto, entre os direitos do empreiteiro no contrato de empreitada (em cuja posição que equivale o subempreiteiro, no âmbito do contrato de subempreitada), contam-se o de receção do preço e de retenção sobre a obra e demais objetos que deva entregar por força da execução do contrato.
Por seu turno, o empreiteiro na empreitada tem como deveres principais, o de realização da obra sem vícios nem faltas de qualidade, de acordo com o plano convencionado (cfr. artigo 1208.º do CC) e cumprindo as regras da arte e todas as necessárias (v.g., regras urbanísticas e outras normas administrativas) para se poder afirmar ter cumprido de harmonia com o interesse do dono da obra, o dever de fornecimento dos materiais e utensílios (na falta de estipulação em contrário – cfr. artigo 1210.º, n.º 1, do CC), o dever de guarda e conservação da coisa objeto do contrato desde o momento em que a recebe do dono da obra até ao momento da entrega, o dever de entregar a coisa e outros deveres acessórios (como o de fornecimento de todos os elementos e informações solicitadas pelo dono de obra, o de aviso do dono de obra contra intervenções desmedidas, desproporcionadas ou arriscadas e, o de entrega de todos os documentos pertinentes à obra).
“A obrigação de realização da obra tem, prazo certo, estabelecendo as partes, normalmente, termo inicial e final para essa execução. Nessa eventualidade, o não cumprimento pelo empreiteiro no prazo estipulado determina mora debitoris (805.º/2, alínea a]), salvo se a ultrapassagem do prazo se dever ao dono da obra. Nessa hipótese o empreiteiro terá direito à prorrogação do prazo de cumprimento” (assim, Pedro de Albuquerque e Miguel Assis Raimundo; Direito das Obrigações; Contratos em Especial, Vol. II, Almedina, 2012, p. 302), ficando ainda ressalvadas, nos termos gerais, as hipóteses de impossibilidade temporária, de caso fortuito ou de força maior.
Os atrasos podem ser devidos a causas mais diversas, como sejam: (1) imputáveis ao dono da obra, se resultarem de causas da responsabilidade deste; (2) imputáveis ao empreiteiro, se resultarem de causas da responsabilidade do empreiteiro; (3) imputáveis a terceiros: casos de força maior, imprevistos ou fortuitos, que podem resultar de actos de terceiros” (assim, João Pedro Pereira Maia Couto; Incumprimento dos prazos na construção; Universidade do Minho, 2007, p. 276, texto consultado em: http://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/7292).
Assim, “[s]e por exemplo um empreiteiro, por motivo a ele imputável, completar a obra com atraso face à data estipulada, haverá, verificados os respetivos pressupostos, responsabilidade contratual por mora no cumprimento (artigos 805.º/2/a) e 804.º do Código Civil)” cfr., Pedro de Albuquerque e Miguel Assis Raimundo; Direito das Obrigações; Contratos em Especial, Vol. II, Almedina, 2012, p. 371).
Releva, em regra (a não ser que para a satisfação do interesse do credor releve o cumprimento de prazos parcelares – o que, no caso, perante os elementos contratuais acordados entre as partes, não se verificava), apenas o atraso referente ao prazo de execução final “e não os prazos parcelares, afirmação que se justifica se se tiver presente poder ser sempre possível recuperar os atrasos [parcelares], não gerando, assim, à partida, nenhum prejuízo para o dono da obra” (cfr., neste sentido, Pedro de Albuquerque e Miguel Assis Raimundo; Direito das Obrigações; Contratos em Especial, Vol. II, Almedina, 2012, p. 371, nota 1428).
No mesmo sentido, refere Agostinho Cardoso Guedes (“A responsabilidade do construtor no contrato de empreitada”, in Contratos: Actualidade e Evolução, Actas do Congresso Internacional organizado pelo Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa, de 28 a 30 de novembro de 1991, Universidade Católica Portuguesa, Porto, 1997, ISBN 972-8069-11-1, p. 325) que, assim, “se o construtor exceder o prazo contratualmente fixado para a conclusão da obra (mas já não quando são apenas ultrapassados prazos parcelares), constitui-se em mora, de acordo com o art. 805.º, 2, alínea a)”.
O ónus da prova (cfr. artigo 342º do CC) traduz-se, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 27-04-2017, Pº 9996/15.7T8CBR.C1, rel. ANTÓNIO CARVALHO MARTINS).
A respeito da articulação das regras dos artigos 798.º e 799.º do CC e 342.º do CC, no âmbito da execução de um contrato de empreitada, concluiu-se no Acórdão do STJ de 14-04-2011 (Pº 3830/06.6TBBRG.G1.S1, rel. LOPES DO REGO) que:
“Como decorre da sequência dos arts 798º e 799º do CC, a presunção de culpa do devedor está normativamente estruturada para funcionar no âmbito das acções de incumprimento propostas pelo credor, tendo como elemento da causa de pedir complexa em que se fundam precisamente o inadimplemento da obrigação contratualmente assumida por parte do devedor /demandado – e recaindo sobre este, por via da dita presunção legal, o ónus de alegar os factos que demonstram a inexistência de culpa da sua parte , impeditivos da ilação que está subjacente à presunção contida no art 799º.
Demandado o dono da obra pelo empreiteiro para pagamento do preço convencionado para a empreitada e excepcionando o réu, por via da compensação, um crédito sobre o autor, emergente do funcionamento de cláusula penal estipulada para o incumprimento pelo empreiteiro do prazo imposto para a conclusão dos trabalhos, incumbe ao réu, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º, a prova dos factos genéticos ou constitutivos do invocado contra-crédito, alegadamente extintivo do direito ao preço, incluindo a culpa do empreiteiro na demora na conclusão da obra, perspectivada como idónea para desencadear o funcionamento da referida cláusula penal”.
Em semelhante sentido, veja-se ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-09-2004 (Pº 03B3497, rel. LUCAS COELHO), concluindo que, “demandado o dono da obra pela empreiteira para pagamento de parte do preço não solvida, e excepcionando o réu em compensação um crédito sobre a autora devido a multa que lhe aplicara por incumprimento de prazo - prazo este cuja aplicabilidade dependia de não serem introduzidas alterações à obra no período considerado -, incumbe ao réu, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º, a prova dos factos genéticos ou constitutivos do aludido contra-crédito, quiçá extintivo do direito ao preço (…)”.
Este entendimento formulado numa situação (na vigência do CPC anterior ao atualmente em vigor) de invocação da exceção de compensação, não se altera pela circunstância de a pretensão da ré – e ora apelante - ter sido deduzida, nos presentes autos, por via reconvencional.
Em suma: No âmbito de contrato de subempreitada, demandado o empreiteiro pelo subempreiteiro para pagamento de parte do preço não solvido por aquele, e pedindo o réu, em reconvenção, o reconhecimento de um crédito, visando a sua compensação com o crédito do autor, incumbe ao réu, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do CC, a prova dos factos genéticos ou constitutivos do aludido crédito, enquanto extintivos do direito ao preço reclamado pela contraparte.
Incumbia, pois, à apelante/ré a prova dos factos genéticos ou constitutivos do contra-crédito invocado como fundamento da sua pretensão reconvencional e relativamente à qual pretendia exercer o seu direito de compensação com o contra-crédito da contraparte.
Ora, tal demonstração da ré, não ocorreu.
Não evidenciada alguma situação determinativa de incumprimento da prestação devida pela autora, não era legítimo à ré resolver o contrato, pelo que, bem decidiu o Tribunal recorrido, ao reconhecer à autora o crédito reclamado por esta, soçobrando, no mais, as considerações expendidas pela apelante, em particular, as atinentes quer à validade (licitude) da resolução contratual efetuada, quer quanto ao invocado incumprimento definitivo culposo da autora.
No mais, perante a circunstância de a ré não ter demonstrado que a autora violou culposamente alguma obrigação contratual, nem que tenha suportado os custos acrescidos que invocou, não poderia a pretensão reconvencional obter procedência, não assistindo fundamento para a correspondente pretensão, incluindo o reconhecimento da invocada compensação de créditos.
A sentença recorrida decidiu, pois, corretamente, não se mostrando eivada de erro decisório.

*
I)Se a decisão recorrida violou os princípios do inquisitório, da colaboração, da igualdade das partes e da descoberta material?
No desfecho das respetivas alegações e conclusões recursórias, a apelante invoca que, caso se entenda não ser de reconhecer o direito de crédito e de compensação da ré, “deverá o douto Tribunal, por violação do princípio do inquisitório, da colaboração, da igualdade das partes e da descoberta material, ordenar a repetição do julgamento, com as devidas consequências legais (artigo 615.º, n.º 1 e 662.º 1 do CPC)”.
Aliás, precedentemente, a apelante, a determinado passo do recurso (cfr. conclusão 76.ª), veio referir que o Tribunal recorrido “não julgou ser necessário a junção dos comprovativos de pagamento, na posse da testemunha “GG”, o que estava obrigada a fazer – a menos que estivesse convencido do seu contrário – sob pena de violação do princípio (…) do inquisitório que impõe ao juiz, quanto àqueles factos de que lhe é lícito conhecer, o poder/dever de realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio (…)”, considerando que a violação desse dever pelo Tribunal tem o valor de nulidade que influi no exame e decisão da causa, invocando o n.º 1 do artigo 195.º do CPC.
Apreciando:
O princípio do dispositivo, consagrado no art.º 3.º do CPC, “além de fazer impender sobre os interessados o ónus da iniciativa processual, estende-se à conformação do objecto do processo integrado, não só pela formulação do pedido, como ainda pela alegação da matéria de facto que lhe sirva de fundamento” (assim, Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, I vol., 2.ª ed., p 50).
De acordo com tal princípio, a lei faz recair sobre a parte onerada com o ónus da prova os meios necessários a convencer o Tribunal da realidade dos factos alegados.
Todavia, no CPC em vigor, a lei veio atribuir ampliados poderes ao julgador, formulando exigências de cooperação entre as partes e entre estas e o Tribunal, em ordem a alcançar a verdade e uma decisão justa.
A prova dos factos deixou, no processo civil atual, de constituir monopólio das partes. O juiz pode amplamente determinar, por exemplo, a junção de documentos ao processo, quer estejam em poder da parte contrária, de terceiro ou de organismo oficial.
Não é alheia a este alargamento de poderes a progressiva alteração da fisionomia do nosso processo civil, que tem como objetivo alcançar a solução judicial que mais se ajuste à real situação litigiosa que é objeto de disputa.
Nesse sentido, de acordo com o nº 1 do artigo 6º do CPC, o juiz tem o dever de gestão processual dirigindo ativamente o processo e providenciando pelo seu andamento célere, promovendo as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for meramente dilatório ou impertinente, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável.
Por seu turno, dispõe o artigo 547.º do mesmo Código que o juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo.
Ambas as normas visam a justa composição do litígio e o desiderato de alcançar um processo célere justo e equitativo, de um ponto de vista formal e de gestão processual, não se confundindo com o princípio do inquisitório nem com o princípio da verdade material.
Por seu turno, o artigo 7.º do CPC prescreve que um princípio de cooperação entre os intervenientes processuais, podendo o juiz, “em qualquer estado do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência” (n.º 2), sendo que, o juiz deve, sempre que possível, providenciar por remover o obstáculo que se verifique, “sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual” (artigo 7.º, n.º 4, do CPC).
A consagração constitucional do direito a um processo equitativo (artigo 20.º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa) envolve a opção por um processo justo em cada uma das suas fases, constituindo o direito fundamental à prova uma das dimensões em que aquele se concretiza.
Como é jurisprudência constante do Tribunal Constitucional (cfr., entre outros, os Acórdãos do TC n.ºs 86/88, 157/2008 e 530/2008) o direito à tutela jurisdicional efetiva para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, genericamente proclamado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), implica um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultados de umas e outras.
O direito à prova significa que as partes em conflito, por via de ação e da defesa, têm o direito a utilizarem a prova em seu benefício e como sustentação dos interesses e das pretensões que apresentarem em tribunal e, ainda, o direito a contradizer as provas apresentadas pela parte contrária ou suscitadas oficiosamente pelo tribunal, bem como, o direito à contraprova.
O artigo 411.º do CPC – correspondendo, em parte, ao anterior artigo 265.º do CPC de 1961 – estatui sobre o denominado “princípio do inquisitório” em sede de instrução do processo, prescrevendo que: “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”.
Apreciando este princípio – aliás, expresso ou manifestado perante outros normativos legais (v.g. arts. 6.º, 7.º, 436.º, 452.º, 467.º, 490.º, 526.º, 590.º, n.º 2, al. c) e 3 e 607.º, nº 1) - , refere-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10-07-2019 (Processo 68/12.7TBCMN-C.G1, rel. CONCEIÇÃO SAMPAIO) que: “O processo é constituído por uma série de atos dirigidos a um fim - a decisão judicial que resolve o conflito entre as partes -, devendo obedecer a formas e requisitos adequados a esse escopo. Sem regras o processo fica sujeito à indisciplina das partes e cria insegurança, e presta-se a manobras que prejudiquem a obtenção da decisão em tempo razoável e útil.
Tem portanto o processo exigências técnicas, designadamente sujeitando as partes a um tecido de ónus necessários à boa administração da justiça.
Um dos princípios do processo civil é precisamente o da auto-responsabilidade das partes, segundo o qual estas sofrem as consequências jurídicas prejudiciais da sua negligência ou inépcia na condução do processo, que fazem a seu próprio risco.
O princípio do inquisitório traduz uma ideia de divisão subordinada de trabalhos, dominante em matéria probatória, entre o juiz e as partes (estas num primeiro plano).
Recebeu consagração legal no art. 411.º ao dispor que incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
O princípio do inquisitório exerce atualmente, é certo, um importante papel no processo civil português mas, a nosso ver, funciona subordinado ao princípio do dispositivo, parecendo-nos excessiva a sua configuração como um sistema processual híbrido, que se coaduna em par em torno dos dois princípio).
O nosso sistema processual civil é norteado pelo princípio do dispositivo, competindo-lhe o “monopólio” dos factos e dos meios de prova.
Como escreve Mariana França Gouveia esteirada nos ensinamentos dos mais ilustres processualistas, “O princípio dispositivo é a tradução processual do princípio constitucional do direito à propriedade privada e da autonomia da vontade. Subjacente ao processo civil está um litígio de direito privado, em regra disponível, pelo que são as partes que têm o exclusivo interesse na sua propositura em tribunal. O interesse público, neste âmbito, limita-se à correta aplicação do seu Direito para que haja segurança e paz nas relações privadas. Assim, o exato limite da intervenção estadual é fixado pelas partes que não só têm a exclusiva iniciativa de propor a ação (e de se defender), como delimitam o seu objeto. O princípio dispositivo traduz-se, assim, na liberdade das partes de decisão sobre a propositura da ação, sobre os exatos limites do seu objeto (tanto quanto à causa de pedir e pedidos, como quanto às exceções perentórias) e sobre o termo do processo (na medida em que podem transacionar). No fundo, é um princípio que estabelece os limites de decisão do juiz — aquilo que, dentro do âmbito de disponibilidade das partes, estas lhe pediram que decidisse. Só dentro desta limitação se admite a decisão.”

Compreende-se, assim, por que o princípio do inquisitório deve ser interpretado como um poder-dever limitado, restringindo-se, em matéria probatória, na busca pelas provas dentro dos factos alegados pelas partes (factos essenciais), com vista à justa composição do litígio e ao apuramento da verdade.
Assim, se a necessidade de promoção de diligências probatórias pelo juiz não for patentemente justificada pelos elementos constantes dos autos, a promoção de qualquer outra diligência resultará, apenas, da vontade da parte nesse sentido, a qual, não se tendo traduzido pela forma e no momento processualmente adequados, não deverá agora ser substituída pela vontade do juiz, como se de um seu sucedâneo se tratasse” (assim, Nuno Lemos Jorge; “Os poderes Instrutórios do Juiz: Alguns Problemas”, in Julgar, nº 3, p. 70).
“Ou seja, o juiz não se encontra obrigado a proceder à inquirição de uma testemunha só porque a parte, que não apresentou oportunamente o rol, invoca a importância daquela inquirição para a descoberta da verdade. (….). Esse uso decorrerá da ponderação feita pelo juiz, em face das circunstâncias concretas que em cada caso se deparem; o que afasta a sua aplicação automática na sequência de simples requerimento, em sede de julgamento, de uma das partes (ou de ambas)” (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 04-03-2013 Processo 293/12.0TBVCT-J.G1, rel. ANA CRISTINA DUARTE).
Não pode, pois, o juiz ao abrigo do princípio do inquisitório suprir o incumprimento de formalidades essenciais pelas partes, permitir o atropelo de normas legais e postergar o princípio da auto-responsabilização das partes.
Conforme se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 18-02-2016 (Processo n.º 788/14.1T8VNG, rel. PEDRO MARTINS): “O princípio do inquisitório (art. 411 do CPC) não pode ser utilizado para, objectivamente, auxiliar uma das partes, prejudicando a outra, permitindo àquela introduzir no processo documentos que não apresentou atempadamente nos termos do art. 423 do CPC”.
O disposto no artigo 411º do CPC não descaracteriza, nem invalida, o princípio base do processo civil que é o do impulso processual, competindo às partes em toda a sua extensão, nomeadamente no tocante à indicação e realização oportuna das diligências probatórias.
Assim, conforme se afirmou no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20-03-2018 (Processo 14/15.6T8VRL-C.G1, rel. JOÃO DIOGO RODRIGUES):
“1- De acordo com o princípio do inquisitório, consagrado na lei processual civil, o juiz tem a iniciativa da prova, podendo realizar e ordenar oficiosamente todas as diligências necessárias para o apuramento da verdade.
2- Esta amplitude de poderes/deveres, no entanto, não significa que o juiz tenha a exclusiva responsabilidade pelo desfecho da causa. Associada a ela está a responsabilidade das partes, sobre as quais a lei faz recair ónus, inclusive no domínio probatório, que se repercutem em vantagens ou desvantagens para as mesmas e que, por isso, aquelas têm interesse direto em cumprir.
3- Neste contexto, a investigação oficiosa não deve ser exercida com a finalidade da parte poder contornar a preclusão processual decorrente da sua inércia”.
Por sua vez, o artigo 417º do CPC, sob a epígrafe (Dever de cooperação para a descoberta da verdade) estipula:
“1.– Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os atos que forem determinados (…)”.
A propósito desta norma, escrevem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 3ª edição, p. 221) que: “O dever de cooperação para a descoberta da verdade, de que trata este artigo (que reproduz, com a mera alteração dum tempo verbal, a redação do artigo 519º do CPC de 1961), constitui, enquanto radicado nas partes, emanação do dever geral de cooperação consagrado no art. 7 no campo da instrução da causa. Tal como o dever de esclarecer imposto pelo nº 2 do art.7 respeita ao plano da cooperação material, dele se distinguindo, porém, por respeitar, já não ao esclarecimento da alegação, mas ao esclarecimento dos factos, isto é, à prova (veja-se o nº 3 do comentário ao art. 7). Além disso incumbe também a terceiros”.

Deste modo, sem se postergarem as regras atinentes ao ónus da prova, em sede de apreciação dos poderes de requisição constantes do artigo 436.º do CPC, o que releva em face dos mencionados princípios processuais da colaboração, do inquisitório e da boa-fé processual, é saber se a prova a solicitar à parte (ou a terceiro), por intermédio do tribunal, é, ou não, relevante e adequada à prova dos factos.
Diferente questão é, contudo, a de saber se deve o tribunal substituir-se à parte logo que esta o requeira, com vista a determinar a atuação que lhe seja solicitada, posto que o exercício do inquisitório há-de ser conjugado com os termos da cooperação exigível ao Tribunal, desde logo, em face do comando normativo constante do n.º 4 do artigo 7.º do CPC.
Ora, em termos formais, no que atina com a invocabilidade da arguida nulidade, verifica-se que a mesma é extemporânea, atento o disposto no artigo 199.º do CPC.
Com efeito, sobre o prazo geral de arguição de nulidades (secundárias ou não principais, sendo estas, aquelas a que se reportam os artigos 186.º, 187.º, 193.º e 194.º do CPC, conforme deriva do artigo 198.º do mesmo Código), estabelece o n.º 1 do artigo 199.º do CPC que: “Quanto às outras nulidades, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência”.
Conforme referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 239), “o sistema de arguição das demais nulidades [não referidas no artigo 198.º] está estruturado em função da presença ou não da parte ou do seu mandatário no momento em que são cometidas. Se a parte está presente (por si ou por mandatário), é-lhe exigível aperceber-se da nulidade, pelo que tem o ónus de fazer a respetiva arguição enquanto o ato não terminar. O ato pode ser uma audiência (prévia ou final) ou outra diligência avulsa (presidida ou não pelo juiz). Tratando-se de audiência com mais do que uma sessão, o limite da arguição é o da própria sessão em que a nulidade ocorra (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anot., 3.ª ed., vol. I, p. 390)”.
Tendo o depoimento da testemunha “GG” tido lugar, em sessão da audiência de discussão e julgamento que decorreu em 20-12-2019, na presença da ré e da sua mandatária, a ré deveria ter arguido a nulidade que veio invocar – apenas em sede de alegações - a respeito do depoimento desta testemunha, no decurso desta sessão, pelo que, a invocação da aludida nulidade, apenas nesta sede recursória, conduz à verificação da extemporaneidade na arguição de tal vício, atento o disposto no artigo 199.º, n.º 1, do CPC.
Contudo, para além deste aspeto, certo é que, não se verifica que tenha sido postergado algum dos princípios invocados pela apelante.
Efetivamente, ouvido por este Tribunal o depoimento prestado pela testemunha “GG”, nele se verifica que esta testemunha referiu que tinha consigo os comprovativos de pagamento à PSP e ao Município de Cascais e das licenças de ocupação de via pública, sendo que, embora o Tribunal recorrido não tenha determinado a sua junção aos autos, não se verifica que tenha sido, de algum modo, inviabilizado o acesso e a consulta de tais documentos pela testemunha, não podendo assinalar-se que tenha sido inobservado pelo Tribunal alguma das prescrições que decorrem da observância do princípio do inquisitório.
Note-se que, aliás, em nenhum momento, a ré promoveu a junção aos autos de tais elementos, que, agora, ilustra como essencial, não se podendo considerar que tenha ocorrido alguma “inércia” do Tribunal recorrido no facto de não ter determinado a requisição de tais documentos à mencionada testemunha.
Note-se, igualmente, que, não foi alegada, no decurso dos autos, alguma justificada dificuldade na apresentação dos documentos em questão, que determinasse algum condicionamento da ré no exercício dos seus direitos ou faculdades e que pudesse inculcar ter o Tribunal recorrido omitido o cumprimento do princípio da cooperação processual expresso no artigo 7.º do CPC.
Não se afigura que, a respeito da inquirição de tal testemunha, ou noutro momento processual, os princípios do inquisitório, da cooperação, da igualdade das partes e da descoberta [da verdade] material, invocados pela recorrente, tenham sido postergados, sendo certo que, a recorrente também não concretiza em que termos é que perceciona a aludida violação dos mesmos.
Em face do exposto, soçobram as conclusões recursórias expendidas pela apelante.

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A apelação improcederá, em conformidade com o exposto, com manutenção da decisão recorrida.

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De acordo com o estatuído no n.º 2 do artigo 527.º do CPC, o critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade e, apenas subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual.
Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for. “Vencidos” são todos os que não obtenham na causa satisfação total ou parcial dos seus interesses.
Conforme se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-12-2017 (Pº 1509/13.1TVLSB.L1.S1, rel. TOMÉ GOMES), cujo entendimento se subscreve: “O juízo de procedência ou improcedência da pretensão recursória não é aferível em função do decaimento ou vencimento parcelar respeitante a cada um dos seus fundamentos, mas da respetiva repercussão na solução jurídica dada em sede do dispositivo final sobre essa pretensão”.
Em conformidade com o exposto, a responsabilidade tributária inerente incidirá sobre a apelante (ré), que, para este efeito, decaiu integralmente na presente instância recursória – cfr. artigo 527.º, n.ºs. 1 e 2, do CPC.

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5.–Decisão:

Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem o coletivo desta 2.ª Secção Cível, em:

a)-Julgar não verificadas as nulidades da sentença invocadas;
b)-Rejeitar o recurso, nos segmentos em que visou colocar em crise a matéria de facto aquilatada pelo Tribunal recorrido, quanto à preconizada inclusão nos factos provados dos pontos ix., x., xv., xvi. e xviii. da conclusão 26.ª da apelação e quanto à impugnação dos pontos 2, 5, 9, 10 e 14 dos factos não provados;
c)-Julgar improcedente a impugnação da matéria de facto quanto à matéria invocada nos pontos i., ii., iii., iv., v., vi., vii., viii., xi., xii., xiii., xiv. e xvii. da conclusão 26.ª das alegações da apelante e quanto ao invocado pela apelante a respeito do facto provado n.º 14 e dos factos não provados n.ºs. 1 e 7; e
d)-Julgar improcedente a apelação deduzida e, em consequência, em manter a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique e registe.
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Lisboa, 21 de março de 2024.



Carlos Castelo Branco - Relator (assinado eletronicamente).
Rute Sobral - 1.º Adjunto (assinado eletronicamente).
Higina Castelo - 2.º Adjunto (assinado eletronicamente).