Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
846/12.7GACSC.L1-5
Relator: JOÃO FERREIRA
Descritores: CRIME DE ROUBO SIMPLES
PERDÃO DA LEI Nº 38-A/2023 DE 2 DE AGOSTO
ARTIGO 67.º-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
PRINCÍPIO DA APLICAÇÃO IMEDIATA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/19/2024
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: (da responsabilidade do relator)
I - O crime de roubo simples, independentemente da data do trânsito em julgado da sentença condenatória, está excluído do âmbito de aplicação da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, por aplicação do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea g).
II - O legislador, ao consagrar um regime de exceções no artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, fê-lo consagrando um conjunto de previsões de caráter objetivo – atento o crime em apreço ou a verificação de determinada agravante geral – e outro de âmbito subjetivo - atenta a qualidade dos intervenientes, condenado e vítimas.
II - O legislador, ao consagrar um regime de exceções no artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, fê-lo consagrando um conjunto de previsões de caráter objetivo – atento o crime em apreço ou a verificação de determinada agravante geral – e outro de âmbito subjetivo - atenta a qualidade dos intervenientes, condenado e vítimas.
III - Porque estamos perante âmbitos distintos, a leitura das mesmas terá de ser feita segundo um critério de complementaridade e nunca de exclusão. Dito de outro modo, a referência objetiva a determinados crimes não pode ser tida como um elemento de limite implícito à consagração das exceções de índole subjetiva, sob pena de estarmos a consagrar um regime de exceção à exceção que manifestamente não pode ser retirado da leitura do citado artigo 7.º.
IV - O artigo 67.º-A do Código de Processo Penal tem de ser entendido, para os efeitos ora em apreciação, como sendo uma norma processual penal próprio sensu e, nessa medida, sujeita, ao princípio da aplicação imediata, imposta pelo artigo 5.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, uma vez que não está em causa, pelas razões já supra expostas, qualquer uma das situações excecionais previstas no n.º 2 que a isso obstem.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I - RELATÓRIO
1. DESPACHO RECORRIDO
Por despacho proferido em 27.09.2023, no Processo Sumário n.º 846/12.7GACSC do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Cascais, foi decidido:
- julga-se parcialmente perdoada a pena aplicada nos presentes autos remanescendo a pena de um ano e seis meses de prisão para o arguido AA cumprir.
- Considerando que o perdão concedido se mostra subordinado à condição resolutiva de o beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente à sua entrada em vigor, notifique ainda o condenado de que, caso cometa qualquer infração até 01.09.2024, à pena aplicada subsequentemente acrescerá o cumprimento desta pena (na medida em que foi) perdoada (art. 8.º, n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto).
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2. O RECURSO
Inconformado, o Ministério Público recorreu do despacho, apresentando a sua motivação, extraindo as seguintes conclusões:
1. O arguido AA foi condenado pela prática, em coautoria material, de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo210º, nº 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, por factos cometidos no dia 12 de junho de 2012.
2. Por decisão proferida no dia 27 de setembro de 2023, o Tribunal a quo julgou perdoada em 1 (um) ano a pena aplicada ao arguido AA, permanecendo o mesmo condenado numa pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
3. O arguido AA nasceu no dia …/…/1989, contando à data da prática do crime por que foi condenado, com 23 (vinte e três) anos de idade – ou seja, menos de 30 anos de idade –, remontando os factos a 12 de junho de 2012 – a data anterior a 19/06/2023 – (artigo 2º, nº 1, da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto).
4. O arguido foi condenado na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, pelo que, em virtude de ter sido condenado numa pena inferior a 8 (oito) anos, se verifica preenchido o requisito previsto no artigo 3º, nº 1, da citada Lei.
5. O artigo 7º, nº 1, alínea g), da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto exclui do perdão os «condenados por crimes praticados contra (…) vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro»
6. De acordo com o disposto no artigo 67º-A, nº 3, do Código de Processo Penal «As vítimas de criminalidade violenta, de criminalidade especialmente violenta e de terrorismo são sempre consideradas vítimas especialmente vulneráveis (…)».
7. O crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, consiste num crime, cuja conduta dolosa se dirige, pelo menos, contra a integridade física da vítima, ao qual cabe, em abstrato, uma pena até 8 anos de prisão, integrando o conceito de criminalidade especialmente violenta (artigo 1º, alínea l), do Código de Processo Penal), sendo, consequentemente, a respetiva vítima sempre uma vítima especialmente vulnerável (artigo 67º-A, nº 3, alínea b), do Código de Processo Penal).
8. Deste modo, ainda que não se encontre excluído pela subalínea i), da alínea b), do nº1,do artigo 7º, da Leinº38-A/2023,de 2de agosto, o crime de roubo previsto no nº 1, do artigo 210º, do Código Penal encontra-se excluído do perdão das penas, por força da alínea g), do nº 1 do citado artigo 7º.
9. Face ao exposto, por força tipo de crime em que foi condenado, parece-nos, e ressalvando o devido respeito, que o arguido AA não poderá beneficiar do perdão de penas previsto nesse diploma legal.
10. A decisão recorrida deverá ser substituída por outra que exclua a pena em que foi condenado o arguido AA do perdão das penas e mantenha, na íntegra, a pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, em que foi condenado.
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O arguido respondeu ao recurso, apresentando a sua motivação, extraindo as seguintes conclusões:
1. Veio o Ministério Público recorrer da decisão que aplicou o perdão de um ano à pena de 2 anos e 6 meses de prisão em que o arguido foi condenado pela prática de um crime de roubo, p.p. pelo art. 210.º, n.º 1 do Código Penal, no âmbito da entrada em vigor da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
2. Fundamenta, em síntese, que, pese embora se verifiquem todos os critérios impostos para a sua aplicação, nomeadamente a data dos factos, idade do arguido à data dos factos e o tipo de crime, o perdão não pode ser aplicado, in casu, por força do art. 7.º, n.º 1, alínea g) da mencionada lei.
3. Nos termos do disposto no art. 7.º, n.º 1, alínea g) da referida lei, ficam excluídos do perdão os arguidos condenados por crimes praticados contra vítimas especialmente vulneráveis, tendo ainda alegado o Ministério Público que todas as vítimas de crimes de roubo se enquadram na definição de vítimas especialmente vulneráveis.
4. Ora, salvo melhor entendimento, não lhe assiste razão.
5. Isto porque, se assim fosse, não teria o legislador necessidade de especificar na letra da lei, nomeadamente no art. 7,º , n.º 1, alínea i), parte final, da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, que o roubo p.p. pelo art. 210.º n.º 2 do Código Penal está excluído para efeitos de perdão e amnistia nos termos legalmente previstos.
6. Significa isto que o legislador foi claro ao distinguir os n.ºs 1 e 2 do art. 210.º do Código Penal para efeitos de aplicação da lei de perdão das penas, dizendo claramente que apenas o roubo cometido nos termos do n.º 1 da mencionada norma é passível de perdão, à contrario sensu.
7. Dúvidas não restam que, se o legislador entendesse que todas as vítimas de crimes de roubo, sem distinção entre os n.º 1 e 2 do art. 210.º do Código Penal, são vítimas especialmente vulneráveis, tê-lo ia dito ou, por outro lado, não teria excluído especificamente da aplicação da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto o crime de roubo p.p. no n.º 1 do art. 210.º do Código Penal.
8. Pelo que é manifesto que improcedem os fundamentos do recurso apresentado pelo Ministério Público.
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Admitido o recurso nos termos legais, neste Tribunal da Relação, o Exm.º Procurador Geral Adjunto emitiu o seu parecer, defendendo a total procedência do recurso, nos termos propostos no recurso interposto pelo Ministério Público junto da 1.ª instância.
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Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o recorrido não reagiu.
Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos à conferência para decisão do recurso, nos termos do disposto no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do Código do Processo Penal.
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II – FUNDAMENTAÇÃO
QUESTÕES A DECIDIR:
Dos poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso
Conforme jurisprudência fixada, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. Acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ de 19/10/1995, in D.R., série I-A, de 28/12/1995).
Atentas as conclusões de recurso, a única questão a decidir é se estão reunidos os pressupostos para que o arguido/condenado pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal, beneficie do perdão previsto na Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto.
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DO DESPACHO RECORRIDO E DEMAIS FACTUALIDADE RELEVANTE
O despacho recorrido tem o seguinte teor:
“O arguido AA foi condenado nos presentes autos, por decisão pacificamente transitada em julgado, na pena de dois anos e seis meses de prisão, pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de roubo, p.p. pelo art. 210.º, n.º 1 do Código Penal.
Vejamos.
Por referência ao acima descrito e em virtude do disposto no art. 4.º do aludido diploma legal são amnistiadas as infrações penais cuja pena aplicável não seja superior a 1 ano de prisão ou a 120 dias de multa.
Para além do mais, e concretamente aplicável ao caso presente, prevê o art. 3.º, n.º 1 da mesma Lei n.º 38-A/2023 que é perdoado um ano de prisão a todas as penas de prisão até oito anos.
Acrescentando, para o que releva o n.º 2 do preceito elenca que: São ainda perdoadas: a) as penas de multa até 120 dias a título principal ou em substituição de penas de prisão; b) A prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa; c) A pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição; e d) As demais penas de substituição, exceto a suspensão da execução da pena de prisão subordinada ao cumprimento de deveres ou de regras de conduta ou acompanhada de regime de prova.
No caso dos autos foi o arguido condenado em pena de prisão à qual se impõe o cômputo de menos um ano de prisão.
Do mesmo modo, o tipo de crime por que o arguido foi condenado não integra nenhum dos elencados como estando excluídos do âmbito de aplicação da previsão legal (art. 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto) e a medida da sanção inclui-se no âmbito de aplicação da norma (art. 3.º, n.º 1 e 4 do mesmo diploma).
Sendo a amnistia e o perdão genérico medidas de clemência de que o Estado pode lançar mão em razão de critérios objetivos, devidamente enquadrados e que tem por efeito a extinção da responsabilidade criminal (art. 127.º do Código Penal), no caso presente, impõe-se tão só a constatação de estarem verificados os pressupostos de que depende a aplicação do regime jurídico validamente promulgado e entrado em vigor a 1.09.2023.
Em consequência, julga-se parcialmente perdoada a pena aplicada nos presentes autos remanescendo a pena de um ano e seis meses de prisão para o arguido cumprir.
Considerando que o perdão concedido se mostra subordinado à condição resolutiva de o beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente à sua entrada em vigor, notifique ainda o condenado de que, caso cometa qualquer infração até 01.09.2024, à pena aplicada subsequentemente acrescerá o cumprimento desta pena (na medida em que foi) perdoada (art. 8.º, n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto).
Notifique, comunique e D.N., pela via mais expedita (caso o PD seja devolvido e atenta a finalidade da notificação, nada sobrevindo, ter-se-á o arguido por notificado na pessoa do seu I. Defensor – art. 113.º, n.º 10 do CPP).
Sem custas, por não serem devidas.
Oportunamente boletins ao registo.
Tendo em consideração o exposto remanesce a pena aplicada de um ano e seis meses de prisão, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de crime de roubo, p.p. pelo art. 210º, nº 1, do CP.
Após trânsito deste despacho emita os competentes mandados para cumprimento de pena.
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Da sentença condenatória, proferida em 26.6.2012, consta a seguinte factualidade [transcrição parcial]:
AA, filho de BB e de CC, nascido a … de … de 1989, em ..., solteiro, desempregado, residente na ..., portador do título de residência n.º …, emitido pelo SEF, válido até …/...2012, […]
“Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
1 - No dia 12 de junho de 2012, pelas 12 horas e 45 minutos, os arguidos AA e DD caminhavam pela ..., em ..., área da comarca de Cascais, quando viram a ofendida EE, apercebendo-se que a mesma trazia um fio de ouro ao pescoço.
2 – Após uma troca de olhares, decidiram os arguidos AA e DD, através do uso da força, retirarem-lhe todos os objetos de valor que a ofendida tivesse na sua posse.
3 - Em cumprimento daquele desígnio, os arguidos AA e DD, de comum acordo e em partilha de tarefas, abordaram a ofendida EE por trás, sendo esta imobilizada pelo arguido AA, que lhe agarrou os braços e a arremessou ao solo, enquanto o arguido DD lhe puxava o fio de ouro.
4 - Já com a ofendida prostrada no solo, os arguidos AA e DD agarraram no fio de ouro que aquela trazia ao pescoço e, com força, puxaram o fio até o mesmo se partir.
5 - De igual modo, os arguidos AA e DD agarraram na mala de ombro que a ofendida trazia consigo e puxaram a mesma com força, não logrando levar a mesma consigo em virtude da pronta intervenção de FF que entretanto apareceu no local e os questionou sobre o que estavam a fazer.
6 - Os arguidos puseram-se em fuga levando consigo parte do fio de ouro e o crucifixo da ofendida.
7 - O fio retirado à ofendida tinha valor concretamente não apurado, não inferior a €102 (cento e dois euros).
8 - Os arguidos AA e DD agiram pretendendo fazer seu o fio de ouro que a ofendida transportava consigo bem sabendo que o mesmo não lhes pertencia e que agiam contra a vontade do respetivo dono.
9 - Para tanto, os arguidos AA e DD quiseram e efetivamente lograram usar de violência contra a ofendida bem como a colocaram na impossibilidade de resistir sabendo que tal conduta era apta a impedir que a ofendida conseguisse oferecer resistência.
10 - Os arguidos AA e DD lograram fazer seu o fio de ouro pertencente à ofendida.
11 - Os arguidos AA e DD sabiam que as suas condutas lhes estavam vedadas por lei e tendo capacidade de determinação segundo as legais prescrições, ainda assim não se inibiram de as realizar.
12 - Agiram os arguidos AA e DD deliberada, voluntária livre e conscientemente, bem sabendo serem as suas descritas condutas proibidas e punidas por lei.[…]
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III – DECISÃO
Pelo exposto, ao abrigo das disposições legais citadas, decide o Tribunal: […]
b) Condenar o arguido AA pela prática, em coautoria material, de um crime de roubo previsto e punido pelo art.º 210º, n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 2 (dois) e 6 (seis) meses de prisão efetiva;”
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III - APRECIAÇÃO DO RECURSO
No presente recurso, o Ministério Público pretende a revogação da decisão recorrida, na medida em que a mesma decidiu perdoar um ano à pena de prisão aplicada ao recorrido AA, por aplicação do regime instituído pela Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
Atento os termos do recurso, o cerne da questão controvertida centra-se em saber se a pena de dois anos e seis meses de prisão a que o arguido AA foi condenado nos presentes autos, por decisão de 26.6.2012, pacificamente transitada em julgado, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal, devia ter sido parcialmente perdoada em 1 ano, como decidido pelo Tribunal a quo, nos termos do disposto nos artigos 3.º, n.º 1 e 4 e 7.º a contrário, ambos da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto.
Com efeito, no dia 1 de setembro de 2023 entrou em vigor a Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto, que estabeleceu um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude (artigo 1º).
No que releva para a questão a decidir, teremos de atender ao disposto no artigo 2º, nº 1 do citado diploma, o qual refere que “estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre os 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3º e 4º” e nos termos do artigo 3º, nº 1,“Sem prejuízo do disposto no artigo 4.º, é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos.”.
No caso vertente, considerando que à data da prática dos factos objeto do presente processo – 12 de Junho de 2012 - o arguido tinha 23 anos de idade, encontram-se indubitavelmente preenchidos os pressupostos formais consagrados no supra referido artigo 2º, nº 1.
Impõe-se, então, analisar se o crime de roubo simples. p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 do Código Penal, pelo qual foi condenado, está ou não excecionado por alguma das alíneas constantes do artigo 7º.
A jurisprudência tem vindo a dividir-se em duas posições: a que entende que o roubo simples está abrangido pelo perdão1 e a que entende que está excluído2. Esta divisão jurisprudencial é o resultado de uma deficiente técnica legislativa que permite várias interpretações quanto a esta matéria.
Neste plano, para de nos debruçarmos, em concreto, sobre os méritos de cada posição, é necessário compreender qual o trajeto interpretativo que o julgador deve fazer para chegar à melhor solução interpretativa possível.
Para o efeito, devemos socorrer-nos do disposto no artigo 9.º do Código Civil, que refere “1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
Tendo presente este normativo, a solução encontrada terá sempre de ter apoio na letra da lei, uma vez que esta constitui sempre o limite inultrapassável a tal processo interpretativo. Cabe ao julgador analisar o texto da lei, os seus elementos semânticos e gramaticais. Se após este esforço de análise do texto da lei, o julgador chegar à conclusão que o sentido literal apenas admite apenas um sentido é possível, será sempre este o aplicado o caso concreto.
No caso em apreço, ambas as posições têm suporte legal, atenta a forma como a referida lei está redigida. Com efeito, a posição que entende que o roubo simples não está excluído do perdão assenta no facto de o artigo 7.º, alínea b), subalínea i) apenas excluir expressamente o crime de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 2 do Código Penal. Daqui resulta, para esta posição, a clara intenção do legislador de não incluir o roubo simples da exclusão. Para a posição oposta, a exclusão do roubo simples do regime de perdão resulta da previsão do artigo 7.º, n.º 1, alínea g), que exclui do perdão e da amnistia previstos na presente lei “os condenados por crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do art.º 67º-A do Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei nº 78/87, de 17 de fevereiro”. Para esta posição, o crime de roubo simples, dada a sua moldura abstrata aplicável, está abrangida nesta previsão uma vez que inclui-se na criminalidade especialmente violenta, por aplicação do disposto no artigo 1.º, alínea l) do Código de Processo Penal, e, nessa medida, as vítimas do mesmo são sempre consideradas especialmente vulneráveis, nos termos do disposto no artigo 67.º-A, n.º 3 do Código de Processo Penal.
Numa análise meramente literal de ambos os dispositivos legais – e sem entrar por ora na construção normativa dos mesmos – teremos de concluir que ambas as posições têm suporte legal.
Aqui chegados, chegando à conclusão que deste esforço interpretativo literal resulta a possibilidade de várias interpretações possíveis, cabe ao julgador ir além do texto da lei, analisando o processo legislativo que esteve na génese do texto legal, permitindo compreender o pensamento legislativo subjacente, alcançado a sua ratio legis. Deste modo, o julgador deverá optar pela solução que não só melhor respeita o processo legislativo subjacente, como é o mais coerente com o ordenamento jurídico envolvente, uma vez que nenhum diploma legal é criado e coexiste num vazio legal, antes o mesmo pressupõe uma normatividade pré-existente que impõe um determinado sentido jurídico.
Cotejado o processo legislativo subjacente à Lei da Amnistia e Perdão, ainda que o mesmo não seja imune a uma deficiente fixação dos termos de discussão relevantes, do mesmo podemos constatar que na primeira versão da Exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 97/XV/1.ª, refere-se expressamente que “Nestes termos, a presente lei estabelece um perdão de um ano de prisão a todas as penas de prisão até oito anos, excluindo a criminalidade muito grave do seu âmbito de aplicação3
Nesta primeira versão, o crime de roubo, simples ou qualificado, estava, em parte, expressamente referido no ponto i) da alínea b) do artigo 5.º que consagrava as exceções ao referido perdão de penas, ao incluir o “roubo em residências ou na via pública cometido com arma de fogo ou arma branca, previsto no artigo 210.º do Código Penal“, sendo certo, que os mesmos estariam, na sua globalidade, abrangidos pelas situações previstas no artigo 5.º, n.º 1, alínea g) que referia “Os condenados por crimes praticados contra vítimas especialmente vulneráveis, incluindo as crianças e os jovens, as mulheres grávidas e as pessoas idosas, doentes, pessoas com deficiência e imigrantes;”
Tendo por base esta primeira versão, dúvidas não restavam que uma interpretação literal das citadas normas nunca levaria a excluir os crimes de roubo simples e qualificado, do perdão de penas. O facto de os mesmos terem merecido uma referência expressa naqueles termos no ponto i) da alínea b) do citado artigo 5.º a isso, manifestamente, não obstava, sendo de concluir que todas as dimensões do roubo simples e qualificado se encontravam contempladas no citado normativo.
Aliás, a aplicação do perdão a esses crimes estaria frontalmente contra os objetivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio 2020-2022, em cumprimento da Lei n.º 17/2006, de 23.05, que aprovou a Lei-Quadro da Política Criminal, designadamente os referidos no seu artigo 3.º, n.º 1, alíneas a) e b), onde se poder ler, “Constituem objetivos específicos da política criminal, no período de 2020 -2022: a) Prevenir, reprimir e reduzir a criminalidade violenta, grave e altamente organizada, incluindo o homicídio, a ofensa à integridade física grave, a violência doméstica, familiar e no contexto das relações de proximidade, os crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, o roubo, o incêndio rural, a corrupção, o tráfico de influência, a cibercriminalidade, a criminalidade rodoviária, o branqueamento, os crimes cometidos com armas, o terrorismo e o seu financiamento, as organizações terroristas e a associação criminosa dedicada ao tráfico de pessoas ou de armas ou ao auxílio à imigração ilegal e os crimes contra a autoridade pública cometidos em contexto de emergência sanitária ou de proteção civil; b) Promover a proteção das vítimas especialmente vulneráveis, incluindo as crianças e os jovens, as mulheres grávidas e as pessoas idosas, doentes, pessoas com deficiência e imigrantes;».4 (sublinhado da autoria do Relator). Por sua vez, nos crimes de prevenção prioritária, inclui-se a “criminalidade violenta (…)” (artigo 4.º, alínea b)).
Esta orientação de política criminal manteve-se em vigor até à aprovação da Lei n.º 51/2023, de 28.8, que entrou em vigor em 1.09.20235, sendo certo que nesta Lei se manteve como objetivo específico, “Promover a proteção das vítimas de crime, em particular as vítimas especialmente vulneráveis, incluindo crianças e jovens, mulheres grávidas e pessoas idosas, doentes, pessoas com deficiência e imigrantes” (artigo 3.º, alínea b)), sendo que nos crimes de prevenção prioritária, se inclui, “A criminalidade violenta, especialmente violenta (…)” (artigo 4.º, alínea g)).
A primeira versão deste diploma sofreu alterações durante o processo de discussão parlamentar, no qual não podemos deixar de ter em atenção os pareceres emitidos pelas diversas entidades no decurso do processo legislativo, designadamente o Conselho Superior do Ministério Público, Conselho Superior da Magistratura e Ordem dos Advogados.6
Neste plano, há que fazer uma especial referência à posição assumida pelo Conselho Superior da Magistratura, que numa primeira leitura do texto legislativo, entendeu que “Em relação aos crimes contra o património [art.º 5, n.º 1, al. b)], para além de se registar o número restrito de crimes excecionados neste âmbito, afigura-se que deveriam constar todos os condenados por crimes de roubo previsto e punido pelo artigo 210º do Código Penal e roubo qualificado, face à enorme expressão e gravidade deste tipo de crimes, consabidamente causadores de grande alarme social”.7
Tal posição foi analisada pelo legislador na fixação do texto final. Com efeito, dos pareceres entregues pelos grupos parlamentares, constatamos:
O grupo parlamentar do PSD, expressamente indica no ponto ii) da alínea b) do artigo 5.º a exclusão do crime de roubo – simples ou qualificado – do perdão de penas, mantendo a exclusão dos crimes praticados contra vítimas especialmente vulneráveis;8
O grupo parlamentar do PS, altera o ponto i) da alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º, incluindo a menção “ e por roubo, previsto no n.º 2 do artigo 210.º do Código Penal”., alterando expressamente a alínea g) do n.º 1 o artigo 7.º aditando o seguinte segmente: “contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código Processo Penal;” 9
Se é certo que a proposta do Grupo Parlamentar do PSD foi rejeitada com os votos contra do PS, do Chega e do DURP do Livre, a verdade é que as alterações supra referidas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PS foram analisadas e votadas em conjunto, tendo merecido os votos a favor do PS, do PSD, da IL, do PCP e contra do Chega, na ausência do BE, da DURP do PAN e do DURP do Livre.10
Da análise deste processo legislativo, resulta claro que a proposta do Grupo Parlamentar do PSD foi rejeitada, sendo certo que a solução por si preconizada teve acolhimento no aditamento feito pelo Grupo Parlamentar do PS à alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º, uma vez que sendo o crime de roubo simples considerado legalmente como criminalidade especialmente violenta, sempre estaria incluído na referência das vítimas especialmente vulneráveis, por conjugação dos artigos 1,º, alínea l e 67.º-A, n.º 3 ambos do Código de Processo Penal. Só este entendimento permite compreender a votação a favor do Grupo Parlamentar do PSD a tais propostas.
Aliás, se dúvidas houvesse sobre o sentido a dar a tais soluções, a intervenção da deputada do PS, Marta Temido, dissipa-as, ao referir “O texto final global que hoje votamos resultou da discussão e votação na especialidade de uma proposta de lei que estabelece um perdão de penas e amnistia de infrações, por ocasião da realização, em Portugal, da Jornada Mundial da Juventude, e resultou, sobretudo, do esforço realizado por várias forças políticas, no sentido de acolher, por um lado, os argumentos expostos neste Plenário, aquando do debate na generalidade, e, por outro lado, as recomendações constantes dos pareceres do Conselho Superior da Magistratura, do Ministério Público e da Ordem dos Advogados.”1112
Nestes termos, a conciliação destes dois normativos exige a compreensão do seu sentido intrínseco.
O legislador, ao consagrar um regime de exceções no artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, fê-lo consagrando um conjunto de previsões de caráter objetivo – atento o crime em apreço ou a verificação de determinada agravante geral – e outro de âmbito subjetivo - atenta a qualidade dos intervenientes, condenado e vítimas.13
Porque estamos perante âmbitos distintos, a leitura das mesmas terá de ser feita segundo um critério de complementaridade e nunca de exclusão. Dito de outro modo, a referência objetiva a determinados crimes não pode ser tida como um elemento de limite implícito à consagração das exceções de índole subjetiva, sob pena de estarmos a consagrar um regime de exceção à exceção que manifestamente não pode ser retirado da leitura do citado artigo 7.º.
Neste sentido, a posição que entende que o roubo simples não está excluído do perdão, uma vez que não está previsto em qualquer uma das alíneas do artigo 7.º, pressupõe que a previsão da alínea b), subalínea i) tem uma dupla natureza: prescritiva, na parte em que expressamente consagra que o roubo qualificado está excluído do perdão, e norma limite à exceção prevista na alínea g), limite esse que, todavia, não resulta do próprio texto, nem tem qualquer cabimento no normativo legal aplicável.
Deste modo, apenas a leitura do citado artigo 7.º que vê ambas as previsões como complementares e não entre si excludentes, garante a coerência do regime de perdão de penas consagrado pela Lei n.º 38-A/2023, de 2.8, bem como de todo o regime sancionatório consagrado no Código Penal.
Com efeito, se não fosse dado o sentido aqui proposto para a alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º - que a mesma abrange toda a criminalidade violenta e especialmente violenta – incluindo aqui o roubo simples -, uma vez que as vítimas da mesma são sempre14 vulneráveis nos termos do disposto nos artigos 1.º, alínea j) e 67.º-A, n.º 3 ambos do Código de Processo Penal, far-se-ia uma redução do âmbito de aplicação da mesma que a sua interpretação literal não o permita, uma vez que em nenhum momento do texto do citado diploma legal, resulta que as demais alíneas do artigo 7.º são – ou sequer foram consideradas pelo legislador - como limites ao âmbito de aplicação da referida alínea g).
Neste plano, é preciso ter em atenção, conforme refere o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20/02/2024, que “As medidas de clemência, atenta a sua natureza de providências excecionais, devem ser interpretadas nos precisos termos em que estão redigidas, sem ampliações nem restrições, não comportando aplicação analógica (cf. artigo 11º do Código Civil), embora sempre com a salvaguarda dos princípios constitucionais de igualdade e proporcionalidade.” (disponível em www.dgsi.pt). No mesmo sentido refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2023, de 1 de Fevereiro, “atendendo à excecionalidade que caracteriza as leis de amnistia e de perdão, a interpretação das mesmas deverá, pura e simplesmente, conter-se no texto da respetiva lei, adotando-se uma interpretação declarativa em que “não se faz mais do que declarar o sentido linguístico coincidente com o pensar legislativo.”15
Aliás, esta redução do âmbito de aplicação da referida norma, colocaria graves problemas ao julgador para determinar em que situações a mesma permitiria tal exclusão e aquelas em que a mesma não permitiria. Estaríamos, assim, no campo da interpretação discricionária da norma, sem qualquer critério objetivo orientador que garantisse a previsibilidade na sua interpretação e, em consequência, a confiança do cidadão e dos destinatários das normas, na decisão judicial daí resultante.
Por outro lado, uma tal interpretação colocaria sérios problemas à necessária coerência do regime sancionatório penal, uma vez que como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.01.2024 (Proc.º 485/20.9T8CVD.P2), “não seria compreensível que crimes muito menos graves do que o de roubo previsto no art.º 210º, nº 1, do CP, como o de coação e de perseguição, dos art.ºs 154º e 154º-A do CP, puníveis com pena de prisão de 1 mês a 3 anos ou com pena de multa, ficassem excluídos do perdão, e já não aquele, indubitavelmente mais grave e gerador de alarme social, onde a violência sobre uma determinada pessoa pontifica como elemento do tipo, seja na forma de coação, de ofensa à integridade física, ou de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física da vítima, sendo ademais o mesmo punível com pena muito superior à prevista para aqueles crimes, ou seja, 1 a 8 anos de prisão.” (disponível em www.dgsi.pt). Aliás, daí resultariam situações incompreensíveis, mesmo para quem entendesse que o roubo simples não estava excluído do perdão, de considerar que outros crimes estariam abrangidos pela exceção da alínea g) do número 1, do artigo 7.º, como seja o crime p. e p. pelo artigo 311.º do Código Penal, o qual manifestamente tem especiais afinidades com o roubo simples. Deste modo, para aquela posição, o roubo simples estaria abrangido pelo perdão, mas o crime de violência depois da subtracção já estaria excluído, resultado interpretativo que manifestamente é contrário à necessária coerência do regime sancionatório penal (o mesmo ocorrendo com o crime de dano com violência, p. e p. pelo artigo 214.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal). Por fim, em que termos se iria incluir o artigo 210.º, n.º 3 do Código Penal, no regime do artigo 7.º? Por uma interpretação extensiva – por maioria de razão - do artigo 7.º, alínea b) subalínea i), ou pela remissão da alínea g) do citado normativo, contrariando a ideia que esta seria sempre excluída pela previsão da alínea b) subalínea i), uma vez que dúvidas não restam a qualquer jurista que o artigo 210, n.º 3 do Código Penal se encontra excluído do regime do perdão de penas.16
Contra esta posição poder-se-á argumentar que o crime de roubo simples não está abrangido na noção de criminalidade especialmente violenta, e, nessa medida, não pode ser aplicado a previsão do artigo 67.º-A, n.º 3 do Código Penal.17
Esta posição não só não é acolhida na doutrina18 ou jurisprudência maioritária19, como não tem qualquer acolhimento legal atenta o conteúdo literal do artigo 1.º, alínea l) do Código de Processo Penal. Com efeito, o conceito de criminalidade especialmente violenta assenta nos bens jurídicos protegidos (a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou a autoridade pública) e na moldura abstrata aplicável aos crimes, designadamente, ao seu máximo legal igual ou superior a 8 anos. Atentos ambos os critérios, é manifesto que o crime de roubo simples, se inclui neste conceito.
Com efeito, o crime de roubo simples implica sempre um atentado a um dos bens jurídicos referidos, seja a vida, a integridade física ou a liberdade pessoal. Com efeito, havendo “violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física” os bens jurídicos atingidos podem ser, desde logo, a vida e a integridade física. Por sua vez, ocorrendo uma situação de “impossibilidade de resistir”, o bem jurídico afetado é a liberdade pessoal.
Nestes termos, não podemos deixar de concluir que o crime de roubo simples está incluído no conceito de criminalidade especialmente violenta, e, deste modo, é aplicável a previsão do artigo 67.º-A, n.º 3 do Código de Processo Penal.
Em conclusão, entendemos que o crime de roubo simples está excluído do regime de perdão instituído pela Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, por aplicação do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea g).
Aqui chegados, é necessário discutir se tal conclusão é de manter quando, como ocorre no caso em apreço, a pena aplicada transitou em julgado em data anterior à entrada em vigor da Lei n.º 130/2015, de 04/09, que aditou ao Código de Processo Penal o artigo 67.º-A.
Como efeito, entendeu o Acórdão do Tribunal da Relação de 23.01.2024, relatado pela Juíza Desembargadora Maria José Machado, que “A não aplicação do perdão em virtude de as vítimas dos roubos simples cometidos pelo arguido poderem ser hoje consideradas vítimas especialmente vulneráveis, quando na data da condenação não tinham essa qualificação, traduz uma violação do princípio da não aplicação retroactiva da lei processual penal previsto no artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do C.P.P., quando da sua aplicação imediata, que é a regra, puder resultar agravamento da situação processual da situação do arguido.” (disponível em www.dgsi.pt).
Não podemos acompanhar este entendimento, por várias razões.
Em primeiro lugar, as leis da amnistia e do perdão transcendem a lógica das normas penais, não lhe sendo aplicáveis o regime da sucessão temporal das leis penais.
Com efeito, as mesmas integram-se no denominado direito de graça, fixando, aquando da sua entrada em vigor, as concretas condições da sua aplicação. No caso do denominado perdão genérico, a sua aplicação não tem qualquer efeito retroativo, antes pressupõe a existência de uma pena transitada em julgado, sem qualquer avaliação retroativa do mesmo. O perdão vale para o futuro, uma vez preenchidos os requisitos legais existentes à data da sua aplicação.
Com efeito, o arguido quando é condenado numa pena de prisão não tem qualquer expetativa de, no futuro, vir a beneficiar de uma qualquer lei de perdão. Este facto futuro incerto não está abrangido em qualquer esfera de expetativa jurídica do condenado a que a lei deva dar acolhimento com a aplicação do regime previsto no artigo 29.º, n.ºs 1, 3 e 4 da Constituição da República Portuguesa, e muito menos no sentido de impor que a norma do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal não devia ser tida em consideração para efeitos de aplicação da Lei do perdão em casos anteriores a 2015.
A aferição da verificação dos pressupostos para aplicação de uma Lei da amnistia ou perdão tem de se fazer à data da sua entrada em vigor, pressupondo o regime legal existente nessa data, não se colocando qualquer juízo de interpretação normativa dos mesmos em face do princípio da aplicação da lei penal mais favorável, uma vez que a mesma aplica-se a todos os casos, independentemente da data dos factos ou do trânsito em julgado do caso, desde que tais fatores não sejam, em si mesmo, requisitos para a sua concreta aplicação.
Em segundo lugar, ao ligar o artigo 67.º-A do Código de Processo Penal ao disposto no artigo 29.º, n.º 4 do Código Penal, aquele entendimento está a considerar que o referido normativo legal do Código de Processo Penal está abrangido por tal imposição constitucional, o que nos remete para a discussão das normas processuais penais próprio sensu ou formais e as normas processuais penais materiais.
Como referem Pedro Garcia Marques e Paulo Pinto de Albuquerque, “As normas processuais materiais estão sujeitas ao princípio da legalidade criminal. Essas normas são as normas processuais que representam, em termos materiais, uma verdadeira pré-conformação da penalidade a que o arguido poderá ficar sujeito (…) O artigo 29.º, n.º 4, da CRP não só proíbe que se aplique retroativamente normas processuais materiais menos favoráveis ao arguido, como impõe que se aplique retroativamente as normas processuais materiais mais favoráveis (ou menos desfavoráveis) ao arguido. Por outro lado, quando as normas processuais materiais vigentes no momento da prática do facto punível forem diferentes das estabelecidas em leis posteriores, é sempre aplicável “o regime que concretamente se mostrar mais favorável ao agente". Portanto, a comparação da lei nova e da lei velha deve ser feita em termos concretos (isto é, em face das características do caso concreto) e globais (ou seja, em face do conjunto das normas aplicáveis), analogamente ao disposto no artigo 2.º, n.º 4, do CP.”2021
No mesmo sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/01/2013 (ECLI:PT:STJ:2022:1085.14.8GAMTA.L1.S1.2C), refere, “Todavia, aceitar que tais princípios afectam a determinação do momento-critério da determinação da lei processual penal aplicável não significa que para todas possa, simplesmente, transpor-se o dispositivo constitucional da aplicação retroactiva da lei de conteúdo mais favorável ao arguido, pois, há tipos diversos de normas processuais materiais e a modulação de influência dos referidos princípios constitucionais reflecte-se na sua aplicação consoante a sua especificidade problemática.”
É esta ligação intrínseca aos direitos fundamentais do arguido, designadamente do seu direito de defesa, que deve nos servir de critério orientador na distinção das normas processuais penais. (neste sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 4/2009, de 19 de março, in DR., 1.ª série, n.º 55)
Se é certo que o artigo 67.ºA só foi aditado ao Código de Processo Penal em 2015, a verdade é que o conceito de vítima e vítima especialmente vulnerável já era um conceito com valor jurídico no ordenamento processual penal. Com efeito, o artigo 67.º-A do Código de Processo Penal visou a consagração no Código de Processo Penal de uma realidade já existente no ordenamento jurídico processual penal em sentido amplo desde a entrada em vigor da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro.
Com efeito, o artigo 2.º, alínea a) da citada Lei, considera vítima especialmente vulnerável, “a vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, da sua diminuta ou avançada idade, do seu estado de saúde ou do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua integração social;
O artigo 67.º-A do Código de Processo Penal teve como objetivo enquadrar este conceito no Código de Processo Penal, por forma a dar efetivo cumprimento ao imposto pela Diretiva 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 201222 (vide ainda a Decisão-Quadro 2001/220/JAI do Conselho de 15 de março de 2011, relativa ao estatuto da vítima em processo penal23).
Nestes termos, o artigo 67.ºA do Código de Processo Penal não só não contende com os direitos de defesa do arguido ou o seu estatuto jurídico-processual de forma a colocar em causa os direitos constitucionais de defesa, como apenas visa enquadrar no Código de Processo Penal uma figura já existente no ordenamento processual penal em sentido amplo.
É também neste sentido que deve ser compreendido o disposto no artigo 67.ºA, n.º 3 do Código de Processo Penal que mais do que inovador, é uma norma de caráter interpretativo do conceito de vítima especialmente vulnerável, fomentando a estabilização deste conceito, uma vez que opera ope legis.24
Com este normativo legal o legislador não quis corrigir ou reparar qualquer inércia punitiva anterior, intimamente ligada aos direitos processuais fundamentais do arguido, designadamente o seu direito de defesa ou alterar o seu estatuto jurídico-processual. Estamos antes perante a consagração da figura da vítima no Código de Processo Penal, como uma realidade normativa pré-existente e fundamental para permitir um processo mais justo, equilibrado e equitativo, não apenas baseado na figura do arguido, mas também na vítima.
Este recentrar da atuação do Estado neste domínio em nada altera o figurino de defesa do arguido e do seu estatuo jurídico-processual, uma vez que abarca uma realidade externa a ele, ainda que a final possa conflituar com a amplitude das consequências jurídico processuais resultantes dos direitos do arguido até aí existentes.
O que o legislador quis assumir com o aditamento do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal é que o resultado final de um qualquer processo penal, não depende apenas dos direitos que assistem ao arguido, mas também dos direitos que assistem às vítimas. Deste modo, não podemos sufragar o entendimento que o artigo 67.º-A do Código de Processo Penal não se possa aplicar imediatamente após a entrada em vigor da Lei que procedeu ao seu aditamento ao Código de Processual Penal, mesmo a processos já existentes nessa data, uma vez que isso negava um direito das próprias vítimas de intervir num processo que lhe diz respeito, seja através da possibilidade de ser informada dos trâmites do processo, seja de intervir no próprio processo nos termos que a lei consagra.
Nestes ternos, o artigo 67.º-A do Código de Processo Penal tem de ser entendido, para os efeitos ora em apreciação, como sendo uma norma processual penal próprio sensu e, nessa medida, sujeita, ao princípio da aplicação imediata, imposta pelo artigo 5.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, uma vez que não está em causa, pelas razões já supra expostas, qualquer uma das situações excecionais previstas no n.º 2 que a isso obstem.
Por fim, ainda que se entendesse que a lei de perdão inclui uma norma processual material, a sua aplicação teria de ser ponderada atento o caso em concreto e não em termos abstratos.
No caso em apreço, é relevante estarmos perante um processo já transitado em julgado em que a tramitação processual se encontra numa fase muito posterior à condenação penal transitada em julgado, e o estatuto jurídico-processual do arguido já está há muito estabilizado, pelo que a sua aplicação ao caso em apreço, por via indireta da aplicação do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea g) da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto, não só não viola qualquer direito do arguido constitucionalmente garantido, como se impunha em respeito dos princípios constitucionais que regem um direito processual moderno.
Por último, mesmo que não se entendesse que o disposto no artigo 67.º-A, n.º 3 do Código de Processo Penal seria de aplicar aos casos de roubo simples em abstrato, a verdade é que uma análise do caso concreto, permitiria concluir que estamos perante uma vítima especialmente vulnerável, uma vez que estamos perante uma mulher, à data dos factos com 53 anos, que é abordada pelos dois arguidos condenados, “sendo esta imobilizada pelo arguido AA, que lhe agarrou os braços e a arremessou ao solo, enquanto o arguido DD lhe puxava o fio de ouro”. Esta especial vulnerabilidade é patente em fase destas concretas circunstâncias, uma vez que a mesma estava especialmente indefesa perante os arguidos.
Em conclusão, pelas razões já supra expostas, somos do entendimento que o crime de roubo simples, independentemente da data do trânsito em julgado da sentença condenatória, está excluído do âmbito de aplicação da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
Em conformidade, a decisão recorrida ao ter aplicado o perdão aí previsto violou o âmbito normativo da referida Lei, o que implica a sua revogação, com a manutenção in totum da pena de prisão aplicada e seu efetivo cumprimento.
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IV – DISPOSITIVO
Em face do exposto, acordam os Juízes da 5ª Secção - Criminal - deste Tribunal da Relação:
1. Julgar procedente o recurso, decidindo-se pela revogação do despacho recorrido, nos termos da fundamentação antecedente, julgando não ser aplicável o perdão à pena em que o arguido AA foi condenado no âmbito dos presentes autos.
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Sem tributação.
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Lisboa, 19-03-2024,
João Ferreira
Rui Coelho
Maria José Machado (com voto de vencida)

Voto de vencida
Votei vencida por entender, desde logo, que o crime de roubo simples não está expressamente excluído do perdão previsto da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, apesar de no seio da discussão parlamentar que antecedeu a aprovação desta lei essa questão ter sido objecto de discussão e ter sido rejeitada a sua exclusão, o que é bem revelador de qual foi a vontade do legislador.
Depois, pelas demais razões que já expressei no acórdão deste tribunal de 23/01/2024, proferido no processo n.º 179/04.2PBLSB-A.L1, de que fui relatora, cujo sumário está parcialmente transcrito na nota de rodapé n.º17 do presente acórdão, e que se resumem a considerar que o crime de roubo não integra o conceito de criminalidade violenta previsto no artigo 1.º, alínea j) do Código de Processo Penal, não sendo por isso aplicável o n.º 3 do artigo 67.º do Código de Processo Penal, do que deriva que o roubo simples seja excluído da lei do perdão pela alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto e ao facto de entender que a não aplicação do perdão em virtude de a vítima do roubo simples cometido pelo arguido poder ser hoje considerada vítima especialmente vulnerável, quando na data da condenação não tinha essa qualificação, traduzir uma violação do princípio da não aplicação retroactiva da lei processual penal previsto no artigo 5.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo Penal, por no caso se traduzir no agravamento da situação processual do arguido.
Maria José Machado
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1. Neste sentido, vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24/01/2024 (Proc. n.º 614/15.4GBAGD-C.P1); Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 6/12/2023 (Proc.º 2436/03.6PULSB-D.L1), de 23/01/2024 (Proc.º 179/04.2PBLSB-A.L1-5), de 06/12/2023 (Proc.º 2436/03.6PULSB-D.L1-3); Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/01/2024 (Proc.º 1153/16.1PCBRG-B.G1) (disponíveis em www.dgsi.pt).↩︎
2. Neste sentido, vide Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/11/2023 (ECLI:PT:TRL:2023:7102.18.5P8LSB.A.L1.5.9A), de 14/12/2023 (Proc.º 27/22.1PJLRS-B.L1-5), de 23/01/2024 (Proc.º 2913/18.4PBLSB.L2 – não publicado), de 20/02/2024 (Proc.º 286/22.0SYLSB.L2-5); Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 17/01/2024 (Proc.º 379/19.0PAVFR.P2), de 10/01/2024 (Proc.º 485/20.9T8VCD.P2); Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/01/2024 (Proc.º 5310/19.0JAPRT-AI.G1); Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 20/02/2024 (Proc.º 22/19.8GBTMR-A.E1) (disponíveis em www.dgsi.pt). Sufraga este entendimento, Brito, Pedro José Esteves de (2023). “Notas práticas referentes à Lei n.º 38-A/20023, de 2 de agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude”, in JULGAR Online, pág. 31.↩︎
3. Cfr. Proposta de Lei n.º 97/XV/1.ª↩︎
4. Cfr. Lei n.º 55/2020, de 27 de agosto.↩︎
5. Cfr. Lei n.º 51/2023, de 28 de agosto↩︎
6. Cfr. Actividades Parlamentares - Iniciativas - Proposta de Lei 97/XV/1↩︎
7. Cfr. Parecer do Conselho Superior da Magistratura relativamente à Proposta de Lei n.º 97/XV/1.ª, pág. 16.↩︎
8. Cfr. Propostas de Alteração do Grupo Parlamentar do PSD↩︎
9. Cfr. Propostas de Alteração do Grupo Parlamentar do PS↩︎
10. Cfr. Relatório da Discussão e Votação da Especialidade da Proposta de Lei n.º 97/XV/1.ª↩︎
11. Cfr. Votação em 2023-07-19 na Reunião Plenária n.º 152↩︎
12. Realçando o valor das posições assumidas pelos intervenientes no processo legislativo, vide o referido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.01.2024 (Proc.º 485/20.9T8CVD.P2) (disponível em www.dgsi.pt).↩︎
13. Neste sentido vide, Brito, Pedro José Esteves de, ob cit., pág. 30↩︎
14. A utilização da expressão “sempre” pelo legislador não pode deixar de ser entendida como uma opção clara de subtracção de qualquer discricionariedade do julgador na integração e correlação de ambos os conceitos, e, muito menos, no âmbito de uma Lei da amnistia e perdão conforme já referido.↩︎
15. Cfr. https://files.diariodarepublica.pt/1s/2023/02/02300/0002200041.pdf↩︎
16. Acentuando esta e outras perplexidades decorrentes de uma interpretação que admite a aplicação do perdão de penas para o crime de roubo simples, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/01/2024 (Proc.º 5310/19.0JAPRT-AI.G1) (disponível em www.dgsi.pt)↩︎
17. Este é um dos argumentos enunciados no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23.01.2024, relatado pela Juíza Desembargadora Maria José Machado onde se pode ler que “1. O crime de roubo, à luz das alíneas j) e l) do artigo 1.º do Código de Processo Penal, não deve ser considerado como integrando o conceito de criminalidade violenta ou especialmente violenta. Isto porque cada um destes conceitos, para além de exigir uma determinada medida abstracta da pena prevista no tipo incriminador (igual ou superior a 5 ou a 8 anos, respectivamente), exige que as condutas em causa se dirijam dolosamente «contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou a autoridade pública», conceitos que o Código Penal utiliza para ordenar sistematicamente as condutas que incrimina. 2. No crime de roubo, para além de a violência, a subtracção ou a entrega da coisa ou animal alheios podem ser alcançadas por meio de ameaça com perigo para a vida ou para a integridade física ou pondo a vítima na impossibilidade de resistir (artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal), não envolvendo necessariamente uma ofensa da integridade física da vítima. Por isso, não se pode sequer dizer que o crime de roubo também tutela a integridade física da vítima para efeitos de o integrar na alínea j) do artigo 1º do Código de Processo Penal. Tutelará apenas nos casos em que a violência se traduzir na prática de lesões da integridade física e naqueles em que a colocação na impossibilidade de resistir implicar uma ofensa desse bem jurídico. Não poderia, por isso, o legislador ter estabelecido na alínea g) da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, uma cláusula de exclusão de conteúdo incerto. 3. Não integrando o roubo o conceito de criminalidade violenta, não se lhe aplica o n.º 3 do artigo 67.º do Código de Processo Penal, razão pela qual as vítimas desse crime não são necessariamente especialmente vulneráveis, do que deriva que o roubo simples não seja excluído pela alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto.” (www.dgsi.pt).↩︎
18. Neste sentido vide, Gama, António (2019) “Comentário Judiciário do Código de Processo Penal”. Almedina, Tomo I, pág. 77↩︎
19. Neste sentido, vide as referências jurisprudenciais citadas por Pedro José Esteves de Brito, ob. cit., na nota de rodapé n.º 48, pág. 31-32↩︎
20. Cfr. Albuquerque, Paulo Pinto (2023). “Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos Humanos”. Universidade Católica Editora, Volume I, pág. 66.↩︎
21. Estes autores dão como exemplo de normas processuais materiais: normas relativas à natureza pública, semipública ou particular do ilícito criminal e, nomeadamente, normas que transformem um crime público em crime semipúblico; normas relativas ao exercício, caducidade e desistência do direito de queixa e de constituição como assistente; normas relativas à prescrição do procedimento criminal e, nomeadamente, aos prazos, causas de interrupção e suspensão e efeitos da prescrição; normas relativas à aplicação, substituição e revogação de medidas de coação, com a exceção do termo de identidade e residência; normas relativas ao ónus da prova; normas relativas à fundamentação das decisões; normas relativas à reformatio in pejus em recurso interposto apenas pelo arguido; normas relativas à liberdade condicional e liberdade para prova; normas relativas à fixação do limite da pena aplicável no âmbito dos procedimentos sumários (ob cit, pág. 67). (outros exemplos são referidos no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9/04/2008 - ECLI:PT:STJ:2008:08P113.48)↩︎
22. Cfr. Diretiva 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho↩︎
23. Cfr. Decisão-Quadro 2001/220/JAI do Conselho de 15 de março de 2011, relativa ao estatuto da vítima em processo penal↩︎
24. Neste sentido, vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 7/04/2021 (ECLI:PT:TRC:2021:86.20.1T90FR.A.C1.CC), Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 28/02/2023 (ECLI:PT:TRE:2023:637.20.1PBFAR.E1.B2), 21/06/2022 (ECLI:PT:TRE:2022:2381.20.0T8PTM.E1.CB); Brito, Pedro, ob.cit., pág. 30.↩︎