Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12197/23.7T8LRS.L1-6
Relator: CARLOS CASTELO BRANCO (VICE-PRESIDENTE)
Descritores: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
LPCJP
RESIDÊNCIA DA CRIANÇA
MUDANÇA DE RESIDÊNCIA
MEDIDA DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/02/2024
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Decisão: RESOLVIDO
Sumário: 1) Deriva do artigo 79.º da LPCJP que é competente para a aplicação das medidas de promoção e proteção a comissão de proteção ou o tribunal da área da residência da criança ou do jovem no momento em que é recebida a comunicação da situação ou instaurado o processo judicial, sendo, contudo, permitida a remessa do processo ao tribunal da nova residência da criança, desde que essa mudança de residência ocorra após a aplicação da medida definitiva e que essa mudança seja por um período superior a três meses.
2) Não tendo sido aplicada à criança alguma medida (não se verificando os pressupostos para a consideração da situação particular – a que se refere o n.º 4 do artigo 79.º da LPCJP – que determinaria a remessa do processo em conformidade com o aí previsto), a competência para a aplicação de medida de promoção e proteção radica junto do tribunal (ou da comissão de proteção, se for o caso) da área da residência da criança ou do jovem, no momento em que é recebida a comunicação da situação ou instaurado o processo judicial.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I. O Juízo de Família e Menores de Almada – Juiz “X” suscita a resolução de conflito negativo de competência entre ele próprio e o Juízo de Família e Menores de Loures - Juiz “Y” para a tramitação do presente processo de promoção e proteção de criança, com fundamento em que ambos se declararam incompetentes para dele conhecer.
O Juízo de Família e Menores de Loures – Juiz “Y” declarou-se incompetente, em razão do território, com fundamento, em síntese, em que resulta do teor do relatório da CPCJ que, quando o processo foi remetido a juízo, já os progenitores e o menor se encontravam a residir em Almada, pelo que, nos termos do disposto no artigo 79º, nº 1, da LPCJP (Lei de Proteção das Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro), é competente para a aplicação das medidas de promoção e proteção o tribunal da área da residência da criança no momento em que é instaurado o processo judicial.
Por sua vez, o Juízo de Família e Menores de Almada – Juiz “X” declarou-se incompetente para a tramitação do presente processo, com fundamento, em síntese, em que resulta das declarações prestadas pelos progenitores do menor que os pais e a criança residem em São João da Talha – localidade da comarca de Loures - há mais de um ano e que, no ano de 2023 ali sempre residiram, sendo a morada atribuída à mãe e sita em Almada, apenas a morada que a mesma fornece para efeitos de documentação/oficiais, declarando a incompetência territorial ao abrigo do disposto no artigo 79.º n.º 1 da LPCJP.
O Ministério Público, notificado nos termos do disposto no artigo 112.º, n.º 2, do CPC, pronunciou-se no sentido de assistir razão ao Exmo. Juiz do Juízo de Família e Menores de Almada, considerando o estatuído no artigo 79º, nº 1, da LPCJP e o facto de o menor residir em S. João da Talha.
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II. Mostra-se apurado, com pertinência para a resolução do conflito, o seguinte:
- Em 24-11-2023, o Ministério Público instaurou processo de promoção e proteção, relativo à criança “A”, mencionando que o mesmo era residente na Praceta (…), em São João da Talha;
- No processo aberto junto da CPCJ de Loures referente à mencionada criança – cuja cópia consta junta à petição inicial – a mesma é identificada com residência na Praceta (…), em São João da Talha.
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III. Conhecendo:
Nos termos do n.º 2 do artigo 109.º do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão.
Não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência (cfr. artigo 109.º, n.º 3, do CPC).
Quando o tribunal se aperceba do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolução junto do presidente do tribunal competente para decidir (cfr. artigo 111.º, n.º 1, do CPC).
Entendem ambos os tribunais, não serem competentes em razão do território, para dirimir o conflito, com fundamento no disposto no artigo 79.º, n.º 1, da LPCJP.
Dispõe o mencionado artigo 79.º da LPCJP que:
“1 - É competente para a aplicação das medidas de promoção e proteção a comissão de proteção ou o tribunal da área da residência da criança ou do jovem no momento em que é recebida a comunicação da situação ou instaurado o processo judicial.
2 - Se a residência da criança ou do jovem não for conhecida, nem for possível determiná-la, é competente a comissão de proteção ou o tribunal do lugar onde aquele for encontrado.
3 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a comissão de proteção ou o tribunal do lugar onde a criança ou o jovem for encontrado realiza as diligências consideradas urgentes e toma as medidas necessárias para a sua proteção imediata.
4 - Se, após a aplicação de medida não cautelar, a criança ou o jovem mudar de residência por período superior a três meses, o processo é remetido à comissão de proteção ou ao tribunal da área da nova residência.
5 - Para efeitos do disposto no número anterior, a execução de medida de promoção e proteção de acolhimento não determina a alteração de residência da criança ou jovem acolhido.
6 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a comissão de proteção com competência territorial na área do município ou freguesia de acolhimento da criança ou jovem, presta à comissão que aplicou a medida de promoção e proteção toda a colaboração necessária ao efetivo acompanhamento da medida aplicada, que para o efeito lhe seja solicitada.
7 - Salvo o disposto no n.º 4, são irrelevantes as modificações de facto que ocorrerem posteriormente ao momento da instauração do processo”.
Nos termos do disposto no n.º. 1 do artigo 85.º do Código Civil, o menor tem domicílio no lugar da residência da família; se ela não existir, tem por domicílio, o do progenitor a cuja guarda estiver.
Deriva do artigo 79.º da LPCJP que é competente para a aplicação das medidas de promoção e proteção a comissão de proteção ou o tribunal da área da residência da criança ou do jovem no momento em que é recebida a comunicação da situação ou instaurado o processo judicial, sendo, contudo, permitida a remessa do processo ao tribunal da nova residência da criança, desde que essa mudança de residência ocorra após a aplicação da medida definitiva e que essa mudança seja por um período superior a três meses.
Ora, no presente caso, não tendo sido aplicada à criança alguma medida (não se verificando os pressupostos para a consideração da situação particular – a que se refere o n.º 4 do artigo 79.º da LPCJP – que determinaria a remessa do processo em conformidade com o aí previsto), a competência para a aplicação de medida de promoção e proteção radica junto do tribunal (ou da comissão de proteção, se for o caso) da área da residência da criança ou do jovem, no momento em que é recebida a comunicação da situação ou instaurado o processo judicial.
Quando foi recebida a comunicação da situação pela CPCJ de Loures, a criança foi identificada com residência em Loures, dando origem a processo junto dessa CPCJ, o mesmo sucedendo quando o processo da respetiva comissão foi remetido a Tribunal, o que independe da circunstância de, ulteriormente, no desenrolar do processo, ter ocorrido indicação da existência de residência em Almada.
Assim sendo, por força do disposto no artigo 79.º, n.º 1, da LPCJP, continua a ser competente para a tramitação do presente processo, o Juízo de Família e Menores de Loures – Juiz “Y”, não existindo motivo para a aplicação do regime resultante do n.º 4 do referido normativo.
Pelo exposto, decido este conflito, declarando competente para apreciação e prosseguimento do presente processo, o Juízo de Família e Menores de Loures – Juiz “Y”.
Sem custas.
Notifique-se (cfr. artigo 113.º, n.º 3, do CPC).
Baixem os autos.

Lisboa, 04-04-2024,
Carlos Castelo Branco (Vice-Presidente, com poderes delegados).