Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
23376/17.6T8LSB.L3-4
Relator: LEOPOLDO SOARES
Descritores: ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/06/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I – Não ocorre nulidade de sentença por omissão de pronúncia quando a questão /questões que tenham ficado por decidir por o seu conhecimento ter ficado prejudicado pelo conhecimento de outras anteriormente dirimidas.
II – O nosso Código Civil nos seus artigos 236.º a 238.º consagra, embora de forma mitigada, o princípio da impressão do destinatário.
III – A remissão abdicativa surge como um contrato, que pode ser oneroso ou gratuito, entre o credor e o devedor, destinado a extinguir determinada relação obrigacional entre eles existente.
IV - Nas obrigações de meios o devedor só se compromete a desenvolver prudente e diligentemente actividade tendente à obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza. Nas obrigações de resultado, em contraponto, o devedor fica obrigado a conseguir um certo efeito útil, um determinado resultado.
V - Nas obrigações de meios, uma vez que o devedor está em melhores condições do que o credor para provar se usou ou não a diligência devida e, no caso negativo, se foi impedido por algum facto que lhe não seja imputável incumbe-lhe o ónus de provar que o fez . Contudo, compete ao credor provar que diligência deveria ter usado, em face da obrigação que assumiu, ou seja, o ónus de provar o conteúdo da obrigação.
VI – No âmbito de uma pretensão fundada no enriquecimento sem causa, compete ao peticionante alegar e provar os seus pressupostos, ou seja: a) a existência de um enriquecimento; b) a obtenção desse enriquecimento à custa de outrem; c) a ausência de causa justificativa para o enriquecimento.
(sumário da autoria do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:

AA intentou[1] acção, com processo comum , contra X Limited (X UK).
Pede a sua  condenação no pagamento de € 357.592,00 ou se assim não se entender no montante de €133.292,84 a título de enriquecimento sem causa, sendo tais  valores ,em qualquer dos casos, acrescidos de juros de mora.
Alega, em suma , que foi trabalhadora da R.
Trabalhou em Espanha e posteriormente foi transferida para Londres, onde foi inscrita na segurança social do Reino Unido.
Veio a ser acordado o seu destacamento para Lisboa onde foi prestar serviços a uma empresa do grupo.
Nem a R., nem a empresa para a qual foi destacada  efectuaram a  sua inscrição na segurança social portuguesa , antes a mantendo a fazer descontos na segurança social do Reino Unido.
Quando o seu contrato de trabalho cessou não lhe foi atribuído subsidio de desemprego.
A R. reconheceu essa ausência de descontos e assumiu a obrigação de proceder ao seu pagamento.
Assim, celebraram outro acordo em que estabeleceram o pagamento de uma quantia à A. como compensação por não ter recebido o subsídio de desemprego.
A segurança social portuguesa não aceitou os descontos na medida em que a R. não estava inscrita na segurança social em Portugal.
A  empresa do grupo para a qual trabalhou foi reembolsada das quantias pagas aquando do seu destacamento em Lisboa por ter entendido que tais valores eram devidos em Portugal, país onde o trabalho era prestado.
Também foi reembolsada dos valores despendidos na segurança social.
Sustenta  que os valores sobre os quais a R. e a empresa do grupo efectuaram descontos ficam aquém do valor devido.
Entende que falta  efectuar descontos sobre os rendimentos que elenca o que , por não ter ocorrido , lhe causa  danos,  pois, vai  ter reflexos na sua pensão de reforma.
Funda a condenação da R. nos valores em causa  na pensão de reforma que deveria receber caso os descontos tivessem sido efectuados.
A título subsidiário alega que , mesmo que assim não fosse , a R. sempre se locupletou à sua custa no valor das contribuições não despendidas para a segurança social.
Concluiu pela supra mencionada condenação.
Em 14 de Junho de 2028, realizou-se audiência de partes.[2]
A Ré contestou.[3]
Excepcionou a prescrição dos créditos.
Em sede de impugnação ,alegou, em síntese,  que foi opção da A., aquando do seu destacamento, receber 30% do seu ordenado no Reino Unido porque o valor das contribuições era menor .
Assim, as contribuições foram feitas nesse País.
Procurou  por todos os meios regularizar a situação da A, sendo que descreve as diligências tentadas para o efeito.
Pagou todas as contribuições e quotizações relativas a 70% dos rendimentos da A. referentes ao trabalho que desenvolveu em Portugal durante o destacamento.
A outra empresa do grupo não era a sua entidade empregadora.
Foram  devolvidas à Autora e à Ré as contribuições por parte da segurança social do Reino Unido.
Tudo fez , quanto estava ao seu alcance,  para regularizar a situação e compensar a Autora.
Impugna as considerações que a A. efectua para alcançar um valor de dano calculado com base na reforma que deixaria de auferir.
Invoca ainda os acordos celebrados com a Autora onde esta  dá quitação do que recebe e declara nada mais ter a receber .
Assim, sustenta que a mesma não tem legitimidade para exigir o pagamento de quaisquer outras quantias .
Conclui pedindo a condenação  da Autora como litigante de má fé na medida em que sabendo dos seus esforços  para regularizar a situação e tendo feito acordos consigo  . depois de os negociar , ainda assim a demanda sabendo não ter razão.
Deduziu  pedido reconvencional.
Solicitou  que a Autora seja  condenada a pagar as quotizações que entregou à segurança social portuguesa referentes ao trabalho que desenvolveu  em Portugal durante o destacamento.
A Autora respondeu.[4]
Finaliza nos seguintes moldes :
«
a) devem as invocadas exceções ser julgadas improcedentes, por não provadas, concluindo-se no mais como na petição;
b) e, bem assim, não admitido o pedido reconvencional deduzido pela R.;
c) ou, quando assim não se entenda, julgada improcedente por provada a exceção de prescrição ora invocada;
d) e ainda, quando também assim não se entenda, julgado a final improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido pela R,
Tudo com legais consequências» - fim de transcrição..
Em 21 de Setembro de 2018,  o valor da causa foi fixado em € 357.592,00.[5]
Foi proferido saneador   que julgou procedente a excepção peremptória de prescrição absolvendo a R. do pedido.[6]
Porém  , tal decisão  veio a ser revogada por acórdão da Relação de Lisboa, de 12 de Março  de 2019, que  determinou o apuramento de alguns factos para que a mesma fosse decidida. [7]
Foi arguida  nulidade do aresto que foi desatendida por acórdão de 12 de Junho de 2019.[8]
A Autora requereu  a realização de uma perícia que foi indeferida por despacho de 22 de Outubro de 2019.
Todavia , tal decisão foi objecto de recurso  o qual logrou provimento através de decisão sumária da Relação de Lisboa, de 18-12-2020 , que determinou a realização de perícia  e  anulou a sentença  entretanto proferida.[9]
Em 16/02/2023, através de requerimento, com a ref.ª Citius 35093479, a A. veio ampliar
o pedido nos seguintes moldes:
«
Termos em que, com os mais que resultarão do douto suprimento de V. Exa., deve admitir-se a ampliação do pedido principal ora requerida, para o montante de 391.747,20€, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação até efetivo e integral pagamento, seguindo-se os ulteriores trâmites.»
Em 21 de Março de 2023, por Despacho , com a ref.ª Citius 424232611, foi admitida a ampliação
do pedido formulada pela A. nos seguintes moldes :
« Nos termos do art 265º nº 2 do CPC admito a ampliação do pedido na medida em que é consequência do pedido primitivo.» - fim de transcrição.
Em 31 de Maio de 2023,  procedeu- se a  julgamento que foi gravado .[10]
Em 16 de Junho de 2023, foi proferida sentença que logrou o seguinte dispositivo:[11]
«
Por todo o exposto o tribunal julga a exceção de prescrição improcedente, a presente ação improcedente, e o pedido reconvencional improcedente, absolvendo A. e R. do pedido.
Custas a cargo da A. e da R. na proporção de 87% a cargo da A. e 13% a cargo da R..
Registe e Notifique. » - fim de transcrição.
As notificações da sentença foram expedidas em 19 de Junho de 2023, data em que o MºPº também foi notificado.
Em 7 de Setembro de 2023,  a Autora recorreu.[12]
Concluiu que:
«
1.ª - A Sentença não conheceu do pedido subsidiário formulado pela A. com base no enriquecimento sem causa da R.;
2.ª - Consequentemente, é nula por não se ter pronunciado sobre questão que deveria apreciar, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 615º n.º 1 al. d) e 608º n.º 2, ambas do CPC;
3.ª - Sem prejuízo da invocada nulidade, o Tribunal a quo fez uma errada subsunção dos factos ao direito;
4.ª - O que conduziu a um manifesto erro de julgamento;
5.ª - Como forma de regularizar a falta de cumprimento da sua obrigação legal de inscrever a A. como sua trabalhadora e efetuar os correspondentes descontos, a R. assumiu contratualmente perante a
A. o compromisso de efetuar o pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal a partir de 01.01.2010 até 31.01.2013, nos termos da cláusula 10.2. do Acordo de cessação
do contrato de trabalho;
6.ª - A R. vinculou-se, assim, juridicamente para com a A. a realizar determinada prestação, cujo compromisso corresponde uma obrigação de resultado;
7.ª - A R. não se comprometeu apenas a desenvolver certa atividade nem prometeu somente realizar determinado esforço ou diligência para realizar o pagamento das contribuições à Segurança Social portuguesa;
8.ª - Bem pelo contrário, a R. comprometeu-se a pagar tais contribuições;
9.ª - Assim, não tendo obtido o resultado a que se tinha comprometido, não realizou a prestação por si assumida;
10.ª - Consequentemente, não cumpriu a sua obrigação, como se dispõe no art. 762º n.º 1 do Cód. Civil;
11.ª - O facto de ter diligenciado pelo cumprimento é insuficiente para se concluir que cumpriu a sua obrigação;
12.ª - E a culpa da R., no incumprimento, presume-se nos termos do art. 799º n.ª 1 do Cód. Civil;
13.ª - O facto que impediu que a obrigação pudesse ser cumprida é imputável à R., não tendo ocorrido qualquer ato da A. ou de terceiro, de força maior ou caso fortuito, que provocasse a inexecução da
obrigação;
14.ª - A Segurança Social indeferiu a pretensão da R. única e exclusivamente por culpa desta, por não se ter inscrito em Portugal nem efetuado os descontos para a Segurança Social portuguesa
relativamente às retribuições auferidas pela A. durante o período de destacamento, apesar de ter sido alertada para tal, só tendo diligenciado nesse sentido quase dois anos depois;
15.ª - Não tendo, assim, a R. ilidido a presunção que contra si recaía;
16.ª - O Tribunal concluiu ainda erroneamente ao considerar que a obrigação da R. se tornou objectiva e legalmente impossível;
17.ª - Entende-se por impossibilidade legal da prestação a que decorre da lei por consistir num ato que produz efeitos jurídicos proibidos ou inválidos, traduzindo-se numa conduta não jurídica;
18.ª – A obrigação da R. de pagar as contribuições à Segurança Social não está proibida por lei;
19.ª - A obrigação a que a R. se vinculou também não se tornou objetivamente impossível;
20.ª - Entende-se por impossibilidade objetiva da prestação a que afeta a própria prestação, ninguém a podendo efetuar, conforme resulta do disposto no art. 401º n.º 1 do Cód. Civil;
21.ª - Não é manifestamente o que ocorre no caso dos autos, pois a própria Segurança Social sugeriu à R. que o pagamento das contribuições e quotizações em dívida fosse efetuado por intermédio da sociedade X Employee Benefits – Mediação de Seguros Unipessoal Lda.;
22.ª - Tendo esta sociedade – mais de 2 anos depois – procedido ao pagamento de parte das contribuições e quotizações devidas pelo trabalho desenvolvido pela A. aquando do destacamento;
23.ª - O que comprova plenamente que era possível realizar a prestação por terceiro;
24.ª - Portanto, ao contrário do decidido pelo Tribunal, a prestação da R. não se tornou objectivamente impossível;
25.ª - A concluir-se pela impossibilidade da prestação, sempre tal resultaria por culpa da R.;
26.ª - Não tendo a R. ilidido a presunção de culpa que sobre si recaía, sempre seria responsável pela reparação dos prejuízos causados à A., tal como se estipula no art. 801º n. º 1 do Cód. Civil;
27.ª - A declaração da A, que consta do acordo de fls. 166 a 167vº dos autos, não constitui “uma espécie de remissão abdicativa da A. demandar a R. como faz nesta ação”;
28.ª - Lendo-se integralmente os termos e pressupostos do referido Acordo, e não apenas a cláusula de onde consta essa declaração, conclui-se forçosamente que a A. não renunciou a exigir ou reclamar o cumprimento da prestação da R. a pagar as contribuições e as quotizações devidas à Segurança Social portuguesa nem, no caso da R. não realizar a prestação a que se vinculou, a exigir ou reclamar uma indemnização pelos danos causados decorrentes do não cumprimento;
29.ª - Nesse Acordo, a R. assume que não tinha até essa data realizado a prestação a que se havia vinculado;
30.ª - Desse modo, a R. reconheceu a realidade de um facto que lhe é desfavorável, o que constitui uma confissão, conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 352.º e 358º n.º 2 do Cód. Civil;
31.ª - E tendo a R. reconhecido que foi pela circunstância de não terem sido pagas, por si, as contribuições à Segurança Social portuguesa que não foi atribuído subsídio de desemprego à A., aceitou adiantar determinado valor correspondente ao montante de subsídio de desemprego que a A. teria direito a receber;
32.ª - Nesse mesmo Acordo, a R. reafirmou estar a desenvolver todas as ações para que a Segurança Social aceitasse as contribuições por si devidas;
33.ª - Logo, a R. não negou que fosse sua obrigação pagar tais contribuições nem pretendeu, com a celebração desse Acordo, ficar desonerada da realização dessa sua obrigação e seus efeitos;
34.ª – Com a declaração de quitação conferida na Cláusula 2.ª desse mesmo Acordo, a A. não estava a desobrigar a R. da realização da sua prestação nem muito menos a renunciar à reclamação do seu cumprimento ou, caso a mesma não fosse cumprida, à indemnização pelos prejuízos causados;
35.ª - De outro modo, tal Acordo seria intrinsecamente contraditório e absurdo, tornando inconciliáveis os compromissos recíprocos assumidos e inverificáveis as consequências nele  previstas;
36.ª - O comportamento das partes imediatamente anterior e posterior a esse Acordo demonstra que a cláusula em causa não pode ser entendida como uma “espécie de remissão abdicativa da A. demandar a R. como faz nesta ação”;
37ª - A correspondência que as partes trocaram entre si, relativamente a este assunto, evidencia que a A. não abdicou de reclamar o cumprimento da obrigação assumida pela R. nem de exigir em Juízo o ressarcimento dos prejuízos decorrentes de um eventual incumprimento da obrigação assumida e reafirmada pela R. no acordo de onde consta essa declaração;
38.ª - Quer antes do Acordo quer depois da sua celebração, a A. continuou a reclamar à R. a regularização do pagamento das contribuições à Segurança Social;
39.ª - E a R. nunca afirmou perante a A. que já não tinha essa obrigação em virtude do Acordo que havia sido celebrado entre ambas;
40.ª - A R. bem sabia que a sua obrigação de efetuar o pagamento das contribuições à Segurança Social portuguesa se mantinha, não tendo a A. renunciado abdicativamente ao cumprimento dessa sua obrigação com a celebração do Acordo;
41.ª - A remissão tem natureza contratual, por força do disposto no art. 863.º do Cód. Civil, exigindo- se por isso duas manifestações de vontade consonantes;
42.ª - Tal declaração deve revestir carácter indiscutível e ser concludente;
43.ª - Tendo de ser interpretada de acordo com a vontade real do declarante;
44.ª - A A. apenas declarou estar ressarcida das quantias que lhe foram adiantadas a título de subsídio de desemprego, que, nesse momento, teria direito a receber, caso a R. tivesse oportunamente procedido ao pagamento das contribuições à Segurança Social;
45.ª - A remissão abdicativa exige que o devedor dê a sua aquiescência à renúncia do credor exigir a prestação devida;
46.ª - O que não ocorre na cláusula em apreciação nos presentes autos, não havendo qualquer declaração da R. no sentido de aceitar o eventual “perdão” da A.;
47.ª - Em sede do direito laboral, a Jurisprudência tem sido exigente, não atribuindo a qualificação de remissão abdicativa às declarações emitidas de forma vaga e genérica, sem menção expressa ou
concretização dos créditos remitidos;
48.ª - Estando em causa o direito à pensão de reforma da A., sempre seria nula tal declaração, por versar sobre um direito indisponível, nos termos do art.º 280.º do Cód. Civil;
49.ª - A conduta da A. de demandar a R. não pode ser entendida como abusiva de direito;
50.ª - A instauração da presente ação corresponde a um exercício legítimo do direito de a A. demandar a R., reclamando a reparação dos danos causados pelo não cumprimento de uma obrigação que recaía sobre esta;
51.ª - Sendo manifesto que, ao fazê-lo, não excede os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, tal como é definido no art.º 344º do Cód.  Civil;
52.ª - A A., ao assinar o referido Acordo, não fez crer à R. que não a demandaria caso esta não cumprisse com a obrigação a que se vinculara;
53.ª – A R. estava ciente que a A. iria exigir a reparação dos danos que lhe causou o não cumprimento da obrigação, uma vez que sempre, antes e depois do aludido Acordo, reclamou insistentemente junto da R. a realização da prestação a que esta se vinculou;
54.ª - A instauração da presente ação não corresponde a qualquer pretensão da A. contrária à sua anterior atuação;
55.ª - Sendo indiscutível que a R. não cumpriu com a sua obrigação de pagamento das contribuições e quotizações devidas em Portugal, a presente ação deveria ter sido julgada procedente.
56.ª - A falta de cumprimento da obrigação decorre de culpa da R., como os autos evidenciam, pois que não se inscreveu na Segurança Social portuguesa atempadamente, o que impediu que pudesse regularizar a situação contributiva da A. nos termos em que se obrigou;
57.ª - Culpa que de resto se presume, nos termos do art. 799º do Cód. Civil;
58.ª - Tendo faltado culposamente ao cumprimento, a R. tornou-se responsável pelo prejuízo causado à A., por força do disposto no art.º 798º do Cód. Civil;
59.ª - A igual conclusão se terá de chegar caso se entenda que a obrigação da R. se tornou impossível, porquanto a impossibilidade da prestação teria ocorrido por causa imputável à R., sendo, por isso, responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da sua obrigação, tal como se prevê no art.º 801.º do Cód. Civil;
60.ª - A R. está obrigada, por força do disposto no art.º 562º do Cód. Civil, a reparar o dano causado à A., reconstituindo a situação que existiria, caso tivessem sido pagas as contribuições e as
quotizações à Segurança Social;
61.ª - O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que a A. deixará de obter em consequência da lesão, tal como se prevê no art.º 564.º n. º 1 do Cód. Civil;
62.ª - Foi dado por provado que, durante o período de 01.01.2010 e 31.01.2013, a A. auferiu retribuições pagas pela R. e pela X Employee Benefits – Mediação de Seguros Unipessoal Lda., que totalizam €979.191,87;
63.ª - Está também provado que a R. requereu a sua inscrição e da A. para efeitos de pagar todas as contribuições-quotizações em atraso;
64.ª - Apenas em relação a parte das retribuições auferidas pela A. nesse mesmo período, a X Employee Benefits pagou as contribuições e as quotizações devidas sobre o valor de €417.958,83
referente ao trabalho desenvolvido pela A. em Portugal;
65.ª - Ficaram assim em falta os descontos relativos às restantes retribuições auferidas pela A., no montante de € 561.233,04 (€979.191,87 - €417.958,83);
66.ª - Os descontos em falta totalizam a quantia global de € 195.028,48 (561.233,04 x 34,75%);
67.ª - E que a R. se propunha pagar na totalidade;
68.ª - Não o tendo feito, a R. deixou de pagar a referida quantia de € 195.028,48, poupando ainda os montantes relativos aos juros e multas que resultariam do atraso no pagamento, que também assumiu;
69ª - A referida quantia que a R. deixou de pagar correspondia à prestação a que se vinculou;
70ª - A R., ao não ter realizado a sua prestação, obteve um benefício equivalente ao que deixou de pagar;
71.ª - Em 23.02.2017 o HMRC reembolsou a R. das quantias que pagou a título de contribuições da A. durante o período do destacamento em Lisboa, no montante global de £ 77.321,45;
72.ª – O incumprimento da R. afetou significativamente a pensão de reforma da A.
73.ª - A circunstância dos danos serem futuros não obsta à fixação da indemnização, conforme se salvaguarda na primeira parte do n. º 2 do art.º 564º do Cód. Civil;
74.ª - Em resultado da Perícia Colegial e dos Factos Provados 39 e 40, aditados pelo Tribunal a quo, a conduta da R. causou danos à A., no montante global de € 522.329,60;
75.ª - A indemnização a atribuir à A. deve corresponder a, pelo menos, 75% do referido valor, ou seja, € 391.747,20;
76.ª - De qualquer modo, sempre o Tribunal poderia julgar procedente a ação, relegando a liquidação dos danos para ulterior decisão, conforme se permite no n.º 2, in fine, do art.º 564º do Cód. Civil;
77.ª - Caso o Tribunal não julgue procedente o pedido principal, deverá então conhecer do pedido subsidiário formulado pela A., condenando a R. no pagamento à A. de uma indemnização com base
no enriquecimento sem causa;
78.ª - Decidindo, como decidiu, a decisão recorrida violou designadamente o disposto nos arts. 280º, 334º, 397º, 398º n.º 1, 401º, 479º n.º 2, 480º, 562º, 564º, 566º, 762º, 798º, 799º e 801º do Código
Civil; e os arts. 10º n.º 1, 11º n.os 1 e 2, 13º, 14º, 24º n.º 1, 27 n.º 1, 38º n.º 1, 39º, 40º n.º 1 e 42º nºs 1 e 2 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.» - fim de transcrição.
Assim, defende que o recurso deve ser  julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida.
Em 9 de Outubro de 2023, a Ré contra alegou.[13]
Concluiu que:
«
I. O Tribunal a quo não tinha que apreciar a questão suscitada pela Recorrente relativa ao alegado enriquecimento sem causa da Recorrida, por considerar válida e eficaz a remissão abdicativa da Recorrente.
II. A remissão abdicativa tem um efeito extintivo, pelo que a sentença a quo não se encontra, ferida de qualquer nulidade.
III. A obrigação assumida pela Recorrida no acordo de revogação celebrado é uma obrigação de meios, e não de resultados, não estando o efectivo cumprimento do compromisso assumido pela Recorrida na disponibilidade desta, mas sim na esfera de decisão das autoridades tributárias.
IV. Prova cabal de que a obrigação assumida pelas Partes era de meios, e não de resultado, está expressa nos Considerandos f) e h) do acordo celebrado entre as Partes em 09.09.2013.
V. Diz o Considerando f) que “a 1.ª Contratante [Recorrida] está a desenvolver todas as acções legais perante a segurança social portuguesa por forma a que esta entidade aceite as contribuições devidas por aquela”.
VI. Concluindo o Considerando h) que o pagamento feito à Recorrente por força de tal acordo deverá ser restituído de imediato à Recorrida “caso a segurança social aceite as contribuições da 1.ª Contratante” (!).
VII. Já em 09.09.2013, era claro, para ambas as Partes, que, por um lado,
(i) a Segurança Social não estava a aceitar a entrega das contribuições pela Recorrida e que, por outro lado, (ii) havia a hipótese de tal nunca vir a acontecer!
VIII. A inclusão da expressão “caso aceite” no texto do acordo celebrado entre as Partes demonstra que a Recorrente se conformou com o risco de a Segurança Social nunca vir a aceitar as contribuições da Recorrida.
IX. A Recorrente recebeu o pagamento que julgou adequado para cobrir tal risco, e declarou-se total e integralmente quitada perante a Recorrida.
X. A obrigação de entrega de contribuições à Segurança Social não se tornou impossível por facto imputável à Recorrida.
XI. Tal como se comprometeu contratualmente, a Recorrida envidou todos os esforços ao seu alcance para regularizar a situação da Recorrente junto da segurança social portuguesa.
XII. A Recorrida apenas assumiu o dever de tentar, por todos os meios, regularizar a situação, não tendo assumido qualquer outra obrigação.
XIII. A Recorrida não podia, não pode, nem nunca poderá “forçar” a segurança social, ou qualquer outra entidade pública, a aceitar a entrega de contribuições em falta.
XIV. A obrigação tornou-se impossível por falta de cooperação e/ou capacidade das entidades públicas competentes.
XV. A Recorrida não está numa situação de incumprimento contratual.
XVI. Apenas a inexistência de um incumprimento determina a improcedência, pela Juiz a quo, da excepção de prescrição invocada pela Recorrida.
XVII. A presente acção não versa sobre o eventual incumprimento legal da Recorrida.
XVIII. Em causa não está a responsabilidade da Recorrida perante as autoridades portuguesas, nomeadamente a segurança social, mas sim a responsabilidade contratual da Recorrida perante a Recorrente, nos termos dos contratos entre ambas assinados.
XIX. A X Portugal não tem a obrigação de assumir qualquer responsabilidade sobre os eventuais incumprimentos contratuais da Recorrida, sendo totalmente alheia ao presente litígio.
XX. O facto de a X Portugal ter colaborado com a Recorrida na resolução do tema em apreço, não a torna responsável pela regularização cabal do mesmo.
XXI. A Recorrente já foi devidamente ressarcida de quaisquer prejuízos que possa ter tido com a execução e cessação do contrato de trabalho celebrado com a Recorrida, pretendendo, de uma forma claramente abusiva, locupletar-se com valores que sabe não lhe serem devidos.
XXII. A “possibilidade” de um terceiro se sobrepor ao devedor para permitir a realização da prestação diz respeito a uma possibilidade física e objectiva, no sentido de “capacidade”.
XXIII. Tal conceito pode ser entendido como uma possibilidade tendente à assunção de uma determinada qualificação jurídica (no caso sub judice, de empregadora) ou à transferência de uma dívida.
XXIV. Entendimento diverso é falacioso, não sendo claramente esse o espírito da norma legal aplicável.
XXV. A Recorrente declarou, em dois momentos distintos, nada mais ter a haver ou a reclamar da Recorrida no âmbito, designadamente, da relação laboral que entre elas existiu.
XXVI. Na cláusula 7. do acordo de revogação de contrato de trabalho celebrado entre as Partes, a Recorrente declarou expressamente que “[…] não há quantias devidas a si ou qualquer acordo segundo o qual possa ser devida uma quantia a si pela Empresa ou por qualquer empresa do Grupo […] e que nem a Empresa, nem qualquer empresa do Grupo […] são ou serão responsáveis por efectuar qualquer
pagamento […]”.
XXVII. Também na cláusula 15 do acordo de revogação assinado pelas Partes, sob a epígrafe “Quitação Integral e Definitiva”, a Recorrente reconhece expressamente:
(iii) aceitar a resolução total e final de todas (se houver) as queixas de qualquer natureza que tenha ou possa vir a ter contra a Empresa ou qualquer outra empresa do Grupo, decorrentes ou relacionadas com o seu emprego e a sua rescisão, qualquer queixa legal, ou qualquer outra questão, incluindo quaisquer queixas por danos pessoais que possam ser apresentadas num tribunal de Trabalho;
(iv) Que a celebração do acordo abrange todas essas queixas, conhecidas ou desconhecidas.
XXVIII. A quitação dada pela Recorrente foi totalmente livre e esclarecida, porquanto, na data de assinatura do acordo, já tinha conhecimento de que a sua situação perante a Segurança Social portuguesa estava irregular.
XXIX. Na cláusula 2.ª do segundo acordo celebrado entre as Partes em 09.09.2013, a Recorrente expressamente declarou que: “não tem quaisquer outros créditos ou reclamações emergentes do contrato de trabalho revogado, do presente acordo, ou de qualquer forma relacionados com os referidos acordos ou com qualquer outra relação e, bem assim, não tem quaisquer outros montantes a reclamar da 1.ª CONTRATANTE [aqui Recorrida] ou de qualquer outra empresa do grupo Marsh & McLennan, designadamente da X Employee Benefits, Lda, X Portugal, Lda. ou X Limited, seja a que título ou de que natureza for”.
XXX. A Recorrente deu quitação integral em três cláusulas distintas.
XXXI. A sua pretensão é ilícita e abusiva.
XXXII. Não há contexto, histórico ou pressupostos que colidam com a clareza das declarações dadas pela Recorrente no âmbito dos acordos celebrados ou com a verdadeira intenção das Partes no momento da respectiva celebração.
XXXIII. O facto de a Recorrida ter continuado a diligenciar no sentido de tentar regularizar a situação contributiva da Recorrente em momento posterior à celebração dos acordos não obsta ao entendimento supra descrito.
XXXIV. Tal apenas prova que aquela continuou a diligenciar no sentido de cumprir a obrigação de meios a que se comprometeu.
XXXV. O facto de a Recorrente continuar a reclamar o pagamento de valores adicionais, e de a Recorrida, de boa-fé, continuar a tentar regularizar o tema, não subtrai validade legal às declarações de quitação anteriormente feitas por aquela.
XXXVI. A(s) remissão(ões) abdicativas dada(s) pela Recorrente são válida(s), suficiente(s) e vinculativa(s), tendo sido contratual e bilateralmente acordadas entre as Partes,
nos termos e para os efeitos do no n.º 1 do artigo 863.º do Código Civil.
XXXVII. A instauração da presente acção é claramente abusiva.
XXXVIII. Por um lado - e sabendo que a sua situação perante a Segurança Social portuguesa não estava regularizada -, a Recorrente aceita o pagamento de valores como compensação pelos prejuízos que pudessem decorrer de tal facto, e, por outro, reclama os prejuízos em si, por meio da presente acção judicial.
XXXIX. A procedência do pedido da Recorrente não seria nunca justa ou equitativa, na medida em que a Recorrida se veria na contingência de ter de ressarcir a Recorrente duas vezes pelo mesmo facto.
XL. A Recorrente está, manifestamente, a exceder os limites impostos pela boa-fé, nos termos e para os efeitos do artigo 334.º do Código Civil, divulgando uma pretensão que é claramente contrária à sua anterior actuação.
XLI. A conduta da Recorrente, que afirma, a troco de determinada compensação pecuniária, que recebe, nada mais ter a receber ou a reclamar da Recorrida e depois vem intentar a presente acção, que visa precisamente obter um benefício resultante dessa situação, afigura-se como abuso de direito » - fim de transcrição.
Assim, sustenta  a  improcedência do recurso  e a manutenção da sentença proferida pelo Tribunal a quo.
Em 6 de Novembro de 2023,foi  proferido o seguinte despacho:[14]
«
A decisão é recorrível;
O recorrente tem legitimidade;
O requerimento de interposição é tempestivo.
Admite-se, por conseguinte, o recurso que é de apelação e sobe imediatamente - art. 79.º - A, n.º 1; 80.º; 81.º e 83.º, n.º, 1, 1.ª parte, do CPT.
***
Admitem-se as contra-alegações (art. 81.º, n.º 2 e 3 do CPT).
***
Nulidades alegadas no requerimento de interposição de recurso:
Nada cumpre suprir (77.º, n.º 3, do CPT).
***
Cumpridas as formalidades legais, subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.
***
Notifique.» - fim de transcrição.
A Exmª Procuradora Geral Adjunta formulou o seguinte parecer:[15]
«
Inconformada com a sentença absolutória datada de 16/6/23, proferida nos presentes autos, veio a A AA dela interpor recurso de apelação, alegando em síntese, nas respectivas conclusões que :
- a sentença dos autos padece de nulidade nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC por não se ter pronunciado sobre o pedido subsidiário formulado pela A com base no enriquecimento sem causa, questão que deveria
ter apreciado;
- o Tribunal fez uma errada subsunção dos factos ao Direito o que conduziu a um manifesto erro de julgamento;
Requerendo a final a procedência do recurso e revogação da sentença recorrida.
*
A Ré “ X Limited (X UK)” apresentou contra alegações, tendo pugnado pela manutenção da sentença recorrida.
*
As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 639º nº 1 e 635º nº 4 do CPC.
*
DA NULIDADE
Estabelece o artigo 615º nº 1 al. d) do CPC que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Ora, – A nulidade por omissão de pronúncia ocorre quando o juiz não se pronuncia sobre todas as questões que lhe tenham sido submetidas pelas partes, excluindo aquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução já dada a outras, ou não se pronuncie sobre questões que a lei lhe imponha o conhecimento.- Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14/1/21, processo nº 1928/19.0T8STR-B. E1.
“A omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito e não quanto a todo e qualquer argumento aduzido.
O vocábulo legal -“questões”- não abrange todos os argumentos invocados pelas partes.
Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir.”- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 8/5/19, processo nº 1211/09.9GACSC-A.L2-3.
“A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia (art. 615º, nº 1, d), 1ª parte do NCPC) não se verifica se a questão que devesse apreciar estiver prejudicada pela solução dada a outra (art. 608º, nº 2, 1ª parte, do mesmo código)”.- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 8/7/21, processo nº 5281/19.3T8VIS.C1. “ A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes.”- Acórdão do STJ de 10/12/20, processo nº 12 131/18. 6T8LSB.L1.S1.
A Recorrente alega que a sentença recorrida é nula porque tendo a A formulado na respectiva petição inicial, um pedido subsidiário, prevenindo a improcedência do pedido principal, o Tribunal deveria ter igualmente apreciado o mencionado pedido.
Resulta da sentença objecto de recurso que o acordo celebrado entre a Recorrente e a Recorrida, datado de Setembro de 2013 3 constante a fls. 166 a 167v. dos autos, através do qual a primeira declara que “ não tem quaisquer outros créditos ou reclamações emergentes do contrato de trabalho revogado, do presente acordo ou de qualquer forma relacionados com os referidos acordos ou com qualquer outra relação e bem assim que não tem quaisquer montantes a reclamar” corresponde a uma remissão abdicativa do direito da Recorrente a demandar a Recorrida.
E com fundamento no mencionado Acordo considera o Tribunal que a Recorrente não tem direito a exigir da Recorrida o pagamento dos valores que reclama, seja a quantia de 357 5892, 00 euros, reclamada a título de diferença na sua pensão de reforma relativa ao período de 18 anos e 8 meses que decorre entre os 66,4 anos (idade da reforma) e os 85 anos (esperança média de vida)d a A., em resultado do não pagamento das contribuições para a Segurança Social portuguesa devidas pela R no período compreendido entre 1/1/10 e 31/1/13 ou o valor de 133 292, 84 euros correspondente ao montante que deveria ter desembolsado a título de contribuições para a Segurança Social no mencionado período.
Ora, fundando-se a absolvição da Recorrida no entendimento que o Acordo celebrado em Setembro de 2013 contém uma cláusula de remissão abdicativa, que é uma causa de extinção as obrigações e se traduz na renúncia do credor ao direito de exigir a prestação que lhe seja devida, a apreciação do pedido subsidiário mostra-se prejudicada pela apreciação do teor do mencionado Acordo e nomeadamente do seu alcance na medida em que, na perspectiva do Tribunal, a celebração do dito Acordo impedia a Recorrente de demandar a Recorrida, seja para o pagamento da quantia de 357 592, 00 euros, seja para o pagamento da quantia de 133 292,84 euros.
Temos em que se nos afigura não se verificar a nulidade invocada.
*
DO ERRO DE JULGAMENTO
Defende a Recorrente que, através do Acordo firmado em 27/2/13 a Recorrida não se comprometeu apenas a envidar esforços no sentido da realização dos descontos para a Segurança Social portuguesa no período compreendido entre 1/1/10 e 31/3/13 mas que também assumiu a responsabilidade de pagar tais contribuições não tendo realizado a prestação por si assumida perante a Recorrente por via do mencionado acordo.
Entende ainda que, presumindo-se a verificação de culpa da Recorrida no incumprimento da prestação, nos termos do artigo 799º nº1 do CC, a mesma é responsável pela reparação dos prejuízos que a sua conduta provocou, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 801º do CC.
Consta da Cláusula em discussão o seguinte:
“A empresa compromete-se a efectuar o pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal desde 1/1/10 até à data da cessação (do contrato de trabalho) acrescidas das penalizações e juros.
A empresa está a Trabalhar com a PwC para calcular e informar o valor das responsabilidades às autoridades portuguesas, reclamar o reembolso das contribuições do Reino Unido e requerer a cooperação com a trabalhadora para prestar informações adicionais que sejam requeridas pelas autoridades portugueses ou do Reino Unido tendo em vista a conclusão do referido assinto em ambos os países.”
Do texto da referida Cláusula parece ser evidente que a obrigação da Recorrida não se resumiu à implementação de diligências para a realização dos descontos na Segurança Social portuguesa mas também à efectiva concretização de tais descontos.
Como alega a Recorrente não ficou demonstrada a impossibilidade da realização de tais descontos como decorre do facto provado sob o nº 25, tendo sido permitido que os mesmos se concretizassem, ainda que de forma parcial, por intermédio de outra empresa do grupo, a “X Employee Benefits-Mediação de Seguros Unipessoal, Lda”.
Ora, a possibilidade da realização dos descontos para a Segurança Social portuguesa por intermédio de empresa terceira é demonstrativa da inexistência da impossibilidade objectiva da realização da prestação a que alude o artigo 790º do CC
Assim, não tendo a Recorrida cumprido o acordado e procedido ao pagamento dos descontos devidos perante a Segurança Social portuguesa, sendo certo que o poderia ter feito, tal conduta determina, ao abrigo do artigo 798º do CC, a obrigação da indemnização ao credor, neste caso à Recorrente.
A indemnização à Recorrente terá por medida o valor das prestações futuras que a mesma irá deixar de auferir a título de reforma por velhice, por via da falta da realização dos competentes descontos em Portugal relativamente ao trabalho aqui prestado no período compreendido entre 1/1/2010 e 31/3/13, data da cessação do vínculo laboral com a Recorrida.
Nessa parte afigura-se-nos que assiste razão à Recorrente.
Termos em que deverá ser dado provimento parcial ao recurso e a sentença recorrida substituída por outra que condene a Recorrida no pagamento dos valores que se vier a apurar serem devidos, tendo ainda em conta que parte dos descontos devidos já se mostram realizados, como decorre do facto provado sob o nº 25.» - fim de transcrição.
A X LIMITED veio responder o que fez da seguinte forma:[16]
«
1.
O Ministério Público tece, ao longo do Parecer, várias considerações relativas ao mérito da sentença recorrida.
2.
A propósito do argumento da Recorrida, segundo o qual a obrigação assumida entre as partes se tornou impossível, o referido Parecer refere que “a possibilidade da realização dos descontos para a Segurança Social portuguesa por intermédio de empresa terceira é demonstrativa da inexistência da impossibilidade objectiva da realização da prestação” [sublinhado nosso].
3.
Salvo melhor opinião, tal entendimento consubstancia uma subversão da generalidade das normas previstas no ordenamento jurídico vigente, designadamente no que diz respeito às regras aplicáveis à responsabilidade, civil ou outra.
4.
De facto, ao entender-se que o facto de uma obrigação poder ser cumprida por uma entidade terceira, alheia à relação negocial, exclui a sua qualificação como “impossível”, está-se a criar um precedente que não podemos deixar de considerar perigoso ou imprudente.
5.
Refira-se que não estamos perante uma situação de responsabilidade subsidiária, mas sim de um cumprimento voluntário, por parte de uma empresa do Grupo, promovido com o único intuito de, internamente, desbloquear a situação, em benefício da Recorrente.
6.
Não existe, pois, qualquer transferência de responsabilidade da Recorrida para um terceiro.
7.
O cumprimento da obrigação por parte da Recorrida continua a ser impossível, permanecendo, pois, o elemento de exclusão de ilicitude invocado. Senão vejamos:
8.
Foi a Segurança Social – entidade competente na matéria – que determinou a impossibilidade objectiva de a Recorrida entregar as contribuições consideradas devidas, por não estarem reunidos os pressupostos para o efeito.
9.
A impossibilidade é determinada intuito personae, o que significa que a obrigação é impossível de ser cumprida por aquela determinada pessoa ou entidade.
10.
O facto de um terceiro ter a capacidade de dar cumprimento a uma obrigação no lugar da Recorrida não pode retirar, em nosso entendimento, a natureza impossível daquela, sob pena de se admitir que, enquanto for passível de ser cumprida por qualquer entidade legalmente constituída, nenhuma obrigação é impossível.
Termos em que deve o recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se a sentença recorrida.» - fim de transcrição.
Foram colhidos os vistos .
Nada obsta ao conhecimento.
***
Eís a matéria de facto dada como assente [ que não se mostra impugnada]:
1. A R. (X UK) é uma empresa de serviços de consultoria nas áreas de capital humano, benefícios, pensões e investimentos, fazendo parte do grupo Marsh & Mclennan Companies Inc.
2. Em Portugal, a X e o referido grupo económico, exercem a sua actividade por intermédio das seguintes sociedades comerciais:
- X (Portugal) – Recursos Humanos Lda, Nif 501192115, com o seguinte objecto social: “prestação de serviços de consultadoria em recursos humanos a entidades singulares ou colectivas. Tais serviços incluirão, nomeadamente, consultadoria actuarial e de benefícios sociais, consultadoria de financiamento e fundos semelhantes, consultadoria de indemnizações e de gestão de recursos humanos e, ainda, desenvolvimento de programas de computorização e o fornecimento de meios administrativos para os serviços acima referidos”; e
- X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda, Nif 506022609, com o seguinte objecto social: “actividade de mediação de seguros e a consultoria na área de recursos humanos”.-
3. A A. e a sociedade X Employee Benefits Lda celebraram um contrato de trabalho com efeitos a partir de 1.7.2002.
4. A A. foi contratada para exercer “o cargo de executiva de topo com a função de Gerente” correspondente à categoria Level 8 B (Partner Europeu).
5. Em 1.10.2004, a A. foi transferida para Espanha, tendo aí celebrado um contrato de trabalho com a X Human Source Consulting, S.L., que faz parte do mesmo grupo económico da R.
6. A A. esteve inscrita na Segurança Social em Espanha desde 1.10.2004 até 31.8.2009.
7. Em Junho de 2009, a A. aceitou ser transferida para Londres, para aí exercer as funções de UK H&B Leader Grade I, tendo celebrado um contrato de trabalho com a R., tendo este contrato iniciado os seus efeitos a partir de 1.9.2009.
8. Nesse contrato de trabalho foi salvaguardada a antiguidade da A. desde 1.7.2002.
9. A A. foi inscrita na HMRC do Reino Unido, tendo a R. iniciado os respetivos descontos a partir do mês de Setembro de 2009.
10. Em 2.7.2010 a A. e a R. acordaram no destacamento da A. para Lisboa.
11. O prazo do destacamento era de 3 anos, com início em 5.7.2010 e termo em 4.7.2013.
12. Foi acordado que durante o destacamento a A. desempenharia as funções de Sales Operation Manager nas instalações da Merecer Emplloyee Benefits – Mediação de Seguros Unipessoal, Lda, NIF 50602260.;
13. Nos termos do dito destacamento as partes acordaram que a autora receberia um salário base anual de € 166.568,00 e que os descontos efectuados seriam nos termos que constam da cláusula 3ª do dito documento que consta de fls. 23 verso a 27 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
14. Nem a ré nem a X Emplyee Benefits inscreveram a autora na Segurança Social em Portugal.
15. Tendo a R. continuado a fazer os descontos para a Segurança Social do Reino Unido (HM Revenue & Customs – daqui em diante designada abreviadamente por HMRC.
16. O contrato de trabalho da A. cessou por acordo inserido em processo de redução de efetivos, com efeitos a partir 31.1.2013, conforme consta da Declaração de Situação de Desemprego e da Declaração para efeitos do artigo 74º do DL 220/2006, ambas emitidas pela R.
17. Efetivamente, em 27.2.2013, a R. enviou para a morada da A. em Lisboa uma proposta de extinção do seu posto de trabalho, que foi aceite nessa mesma data pela A.
18. Com data de 27/02/2013 as partes celebraram o acordo de cessação do contrato de trabalho nos termos que constam de fls. 321 verso a 327 verso dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzidos, fazendo cessar o contrato a 31/01/2013.
19. No âmbito do dito acordo declararam ambas as partes na cláusula 10.2 que a ré se comprometia a efetuar o pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal a partir de 01/01/2010 até à data da cessação nos termos que constam da dita cláusula.
20. Autora e ré celebraram em Lisboa, em 09/09/2013, outro acordo em que estabeleceram o pagamento pela ré à autora da quantia de € 36.472,30 com os fundamentos que constam de fls. 166 a 167 verso dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
21. A ré não efectuou descontos por conta da autora na Segurança Social portuguesa.
22. No dia 01/04/2013 a ré inscreveu-se na Segurança social para efeitos de pagamento de contribuições devidas.
23. Por fax datado de 18/04/2013 a ré requereu junto do Centro Distrital da Segurança Social de Lisboa a sua inscrição e da sua trabalhadora, ora autora, para os efeitos de regularizar todas as contribuições-quotizações em dívida e/ou em atraso com a maior brevidade possível, em termos e condições que constam de fls. 263 a 267 verso dos autos e que se dão por integralmente reproduzidos.
24. A Segurança Social Portuguesa respondeu à ré negando essa pretensão em 30/04/2013 e com os fundamentos que constam de fls. 271 verso e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
25. A X Employee Benefits pagou, em 08/05/2015, à Segurança Social Portuguesa as contribuições e quotizações devidas sobre o valor de € 417.958,83 referente ao trabalho desenvolvido pela autora em Portugal durante o destacamento.
26. Por carta datada de 26.01.2017, o HMRC comunicou à A. que lhe era devido o reembolso das quantias que lhe foram retidas pela R. a título de contribuições para a Segurança Social, no montante de £ 21.636,39.
27. Tendo-lhe devolvido essa quantia em 23.2.2017.
28. Tendo o HMRC reembolsado também nessa data a R. das quantias que pagou a título de contribuições da A. durante o período do destacamento em Lisboa, no montante global de £ 77.321,45.
29. Com efeito, no âmbito do contrato de trabalho, a R. e a X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda/ Nif 506022609 pagaram à A. os seguintes rendimentos entre 1.1.2010 e 31.1.2013:
2010: € 259.471,22 (€ 212.708,73 pagos pela R. e € 46.762,49 pagos pela X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda);
2011: € 263.590,94 (€ 83.572,80 pagos pela R. e € 180.018,14 pagos pela X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda);
2012: € 321.479,68 (€ 134.592,24 pagos pela R. e € 186.887,44 pagos pela X Employee Benefits – Mediação de Seguros Unipessoal Lda;
2013: € 134.650,03 (integralmente pagos pela X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda);
30. No período que decorreu entre 1.1.2010 e 31.1.2013, as taxas contributivas para a Segurança Social, aplicáveis às relações de trabalho subordinado, eram de 11% para o trabalhador e 23,75% para o empregador, no total de 34,75%.
31. O valor das contribuições e quotizações pagas, mencionadas no ponto 16. inclui o total de 34,75% referido no ponto 19.
32. A autora nasceu no dia 01/08/1960.
33. Do extracto anual de remunerações da autora consta que o seu início de descontos se reporta a 1985 em termos que constam do documento de fls. 62 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
34. À data de Agosto de 2017 o INE considerou que a esperança média de vida de uma pessoa de 65 anos do sexo feminino, entre 2014 e 2016, se cifra em 20.73, em termos que constam de fls. 63 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
35. No dia 11/01/2011 a ré apresentou o requerimento junto da HMRC solicitando a emissão do certificado A1 que permitiria que esta continuasse a fazer descontos para a segurança Social daquele país.
36. A resposta a tal pretensão ocorreu em 06/07/2011 e consta de fls. 261 e 354 dos autos, tendo negado tal pretensão invocando que o pagamento das contribuições deve ser feito no país em que o trabalho é desenvolvido.
37. A autora não pagou à ré nem à Segurança Social o valor correspondente a 11% sobre os montantes entregues e referidos nos pontos 16., 19. e 20.
38. Autora e ré trocaram as correspondências que constam de fls. 282 a 283 verso (documentos 19 a 21) dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
39. A A. teria direito a receber a titulo de pensão de reforma por velhice, tendo por base a sua carreira contributiva e as retribuições por si auferidas entre 1/1/2010 e 31/1/2013 sobre as quais não incidiram descontos para a segurança social, partindo do pressuposto que as remunerações auferidas até 31/1/2013 estão incluídas no período referente aos melhores 10 anos dos últimos 15 anos antes da reforma, à quantia de €5.676,64.
40. A A. terá direito a receber a título de pensão de reforma por velhice tendo unicamente por base a carreira contributiva da A. e no pressuposto que as remunerações auferidas até 31/1/2013 estão incluídas no período referente aos melhores 10 anos dos últimos 15 anos à data da reforma o valor de €3.574,71.
***
Mais se consignou:
«
Nenhum facto de relevo para a decisão da causa ficou por provar pois as partes acordaram em toda a matéria de facto nos autos, não restando matéria controvertida, sendo que os artigos 39 e 40 resultaram da prova pericial feita por unanimidade e que nenhum reparo merece.» - fim de transcrição.
***
É sabido que o objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 635º e 639º do Novo CPC [17]  ex vi do artigo 87º do CPT .
Mostra-se interposto um  recurso pela Autora , sendo que a Ré não recorreu motivo pelo qual, desde logo, se mostra transitado o segmento da sentença atinente ao pedido reconvencional.
Nas suas conclusões a recorrente suscita cinco  questões.
A primeira consiste em saber se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia no tocante ao pedido subsidiário.
A segunda consiste em saber se deve considerar-se que a Autora operou uma remissão abdicativa de todos os seus créditos , nomeadamente os peticionados na presente acção.
A terceira é saber  se deve reputar-se que a Autora litiga em abuso de direito na  modalidade de « venire contra factum proprium».
A quarta , cuja apreciação pode ficar prejudicada , pelo que se dirimir em relação às duas anteriores , consiste em saber se a pretensão deduzida pela Autora a título principal , baseada no incumprimento contratual por parte da Ré, deve proceder.
A quinta [ e derradeira]  , cuja apreciação também pode vir a ficar prejudicada pela decisão que for conferida à anterior, tem a ver com a decisão a perfilhar em relação ao pedido deduzido a título subsidiário.
***
Passemos, pois, a dilucidar a primeira que consiste em saber se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia , contemplada na alínea d) do nº1 do artigo 617º do CPC, ex vi do artigo 77º do CPT, no tocante ao pedido subsidiário.
Nas suas alegações a recorrente referiu:
«
Com efeito, o art. 554º, n.º 1, do CPC, define o pedido subsidiário do seguinte modo:
1 - Podem formular-se pedidos subsidiários.
Diz-se subsidiário o pedido que é apresentado ao
tribunal para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder um pedido anterior.
Desse modo, tendo julgado improcedente o pedido principal, a Meritíssima Juiz deveria ter tomado em consideração o pedido subsidiário, apreciando assim o alegado enriquecimento sem causa da R.
Para fundamentar esse pedido, a A., na petição inicial, alegou, além do mais, o seguinte:
68º - Quando assim se não entenda, o que se admite por mera hipótese de raciocínio, sempre se teria de concluir que a R. obteve um enriquecimento ilícito à custa do empobrecimento da A.
69º - Na verdade, ao não ter efetuado os descontos devidos sobre o valor global de € 561.233,04, a R. locupletou-se à custa da A., sem qualquer causa justificativa, com a quantia de € 133.292,84 (561.233,04 × 23,75%).
70º - Tanto mais que a R. já recuperou no corrente ano de 2017 as contribuições relativas ao período de 1.1.2010 a 31.1.2013 que pagou no Reino Unido, no montante global de € 91.415,67.
71º - Acresce que o enriquecido responde também pelas quantias que o empobrecido deixe de receber quando o enriquecido tem conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento e da falta do efeito que se pretendia obter com a prestação (art.º 480 do C. Civil).
72º - Ora, é manifesto que a R., enquanto empregadora, tem conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento e dos efeitos da falta de pagamento das contribuições devidas à Segurança Social na reforma dos trabalhadores.
73º - Consequentemente, de acordo com as regras aplicáveis no âmbito do instituto do
enriquecimento sem causa, e tendo em consideração o limite imposto pelo artigo 479 nº 2 do C. Civil, a R. sempre teria de entregar à A. a quantia de € 133.292,84.
Por requerimento apresentado em 16/02/2023, com a ref.ª Citius 35093479, a A. veio ampliar
o pedido do seguinte modo:
Termos em que, com os mais que resultarão do douto suprimento de V. Exa., deve admitir-se a ampliação do pedido principal ora requerida, para o montante de 391.747,20€, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação até efetivo e integral pagamento, seguindo-se os ulteriores trâmites.
Por Despacho datado de 21.03.2023, com a ref.ª Citius 424232611, foi admitida a ampliação
do pedido formulada pela A. nos termos que se transcrevem:
«
Nos termos do art 265º nº 2 do CPC admito a ampliação do pedido na medida em que é consequência do pedido primitivo.
Não obstante, a Meritíssima Juiz não apreciou a questão suscitada pela A., subsidiariamente,
quanto ao enriquecimento sem causa da R. nem se pronunciou acerca da procedência ou
improcedência desse pedido subsidiário.
Na verdade, apenas conheceu da questão do invocado enriquecimento sem causa da A. que
sustenta o pedido reconvencional formulado pela R., julgando-o improcedente.
Mas trata-se, manifestamente, de questão diversa da invocada pela A.
Nessa medida, a Meritíssima Juiz deixou de se pronunciar sobre questão que devia apreciar.
Consequentemente, a Sentença é nula nos termos previstos das disposições conjugadas dos arts. 615º, n.º 1, al. d) e 608º, n.º 2, ambas do CPC, aplicáveis ex vi do art. 1º, n.º 2, al. a) do CPT» - fim de transcrição.
Anote-se , agora, que, em sede de direito , a sentença discreteou da seguinte forma:
«
2. DE DIREITO
Assentes os factos cumpre proceder ao enquadramento jurídico dos mesmos.
Uma questão que não ficou ainda resolvida nos autos consiste no conhecimento da exceção de prescrição invocada.
Mas cremos que a exceção se encontra praticamente decidida. Em primeira decisão quanto à mesma, objeto de recurso, foi entendido aplicar o prazo prescricional do Código de trabalho afastando a aplicação do prazo do código civil, e aplicando o prazo prescricional de três anos à pretensão da A., sob o prisma de análise do enriquecimento sem causa mas contando a aplicação de tal prazo desde a data do conhecimento do seu enriquecimento ilícito. E fosse por via da aplicação do prazo do art. 337º do CT, fosse por via do prazo prescricional do CC do enriquecimento sem causa, a pretensão estaria prescrita.
Porém, a exceção no âmbito do enriquecimento sem causa, foi entendida superiormente que não foi formulada, e nessa medida declarada a nulidade da decisão nesse tocante. E foi decidido que o conhecimento da exceção se deve verificar no âmbito do disposto no art. 498º do CC na medida em que a ilicitude não decorre unicamente da omissão do cumprimento de um dever legal mas
sim tem como fundamento o acordo celebrado aquando da cessação do contrato de trabalho. Não emergindo diretamente do contrato, entendeu o douto acórdão do tribunal da relação afastar a aplicação do disposto no art. 337º do CT e aplicar o prazo do código civil. No entanto, refere a decisão do V. tribunal da Relação que importa apurar o incumprimento definitivo do novo acordo celebrado, ou a mora ressarcível.
Ora, importa atentar nos factos assentes para se apurar isso mesmo aqui apontado pelo tribunal da Relação e cremos que a decisão relativa à exceção invoca passa pela própria resolução jurídica da questão dos autos pois uma importa a análise da outra.
Aferir se existe incumprimento deste contrato passa necessariamente pela análise do mesmo.
E o que temos como factualidade, resumidamente, concerne a uma trabalhadora, ora A. que tendo trabalhado para uma entidade patronal inglesa, ora R., veio a determinada altura a ser destacada para trabalhar em Portugal numa empresa do grupo da R.
O que sucedeu foi que os descontos efetuados para a segurança social por conta desse período de destacamento foram feitos no Reino Unido, mas em determinado momento vieram a ser devolvidas tais contribuições à R. e à A. por entenderem que estas deviam ser pagas no país onde o serviço era prestado.
Quando a R. tenta regularizar a situação junto da segurança social portuguesa esta indeferiu tal pretensão.
Em termos temporais o destacamento teve lugar de 5 de Julho de 2010 a 31 de Janeiro de 2013, por força do acordo de cessação do contrato de trabalho datado de 27 de Fevereiro de 2013, e que consta de fls. 321 verso a 327verso dos autos.
A A. sempre efetuou os seus descontos no Reino Unido, e foi inscrita na segurança social de Espanha, na altura em que lá trabalhou. Fê-lo posteriormente no Reino Unido.
Em Janeiro de 2011 a R. requer o certificado que permite continuar a fazer descontos para a Segurança Social do Reino Unido, o que veio a ser indeferido em Julho de 2011.
É nessa sequência que surge o acordo de cessação do contrato de trabalho datado de 27/2/2013 de fls. 321 a 327, onde a cláusula 10.2 contém o acordo das partes relativa a esta matéria, e o segundo acordo datado de 9/9/2013 e que consta de fls. 166 e 167.
Em abril de 2013 a R. requereu junto da segurança social portuguesa a sua inscrição e da A. para efeitos de regularizar as contribuições em dívida, pretensão que veio a ser indeferida 30/4/2013.
Donde, a análise da exceção de prescrição, assim como a pretensão da A. passa pela análise destes factos sucedidos e dos acordos celebrados.
Vejamos então.
Cremos ser inevitável concluir que a R. tinha, enquanto entidade empregadora, o dever legal de proceder ao pagamento das quotizações para a segurança social pelo trabalho prestado. E de facto a R. assim o fez, mas junto da segurança social do reino unido e não em Portugal, e aquela veio a devolver tais quantias. Ou seja, acabou a R. por não o fazer no local certo, por erro, já que considerou ser o Reino Unido o local onde poderia e deveria efetuar tais descontos.
Incumpriu esse dever legal e contratual, perante a A., de proceder ao pagamento das contribuições sobre o trabalho prestado. Sem qualquer dúvida que tal sucedeu, e não a isenta o facto de se encontrar em erro, pois, como é prática e voz popular, “o desconhecimento da lei não aproveita a ninguém”. E não existe nenhuma causa que possa legitimar esse seu desconhecimento.
É certo que se poderá sempre alegar que o dever legal de proceder ao pagamento de quotizações impende quer sobre a entidade empregadora, quer sobre a trabalhadora, pois a cada um cabe uma parte nesse pagamento e consequentemente o dever legal de o fazer. Mas veja-se. Em termos práticos cremos que é um dever desprovido de conteúdo pois o trabalhador não consegue efetuar o pagamento da sua quota-parte junto da segurança social, sem que a entidade empregadora esteja registada em Portuga, já que se a segurança social não pode receber as contribuições da empregadora também não pode receber da trabalhadora.
Donde, em última análise a violação do dever de proceder ao pagamento da segurança social impende sempre, em primeira mão, sobre a empregadora.
No entanto, a situação não é tão simples na medida em que ao incumprimento deste dever legal sobrepôs-se a vontade das partes patente no acordo celebrado em 27/2/2013 e onde expressamente ambas acordam algo neste tocante.
É que é preciso notar que em causa não está a responsabilidade da R. perante as autoridades portuguesas, nomeadamente a segurança social, mas sim a responsabilidade contratual da R. perante a A. sua então trabalhadora.
E a cláusula do mencionado acordo refere que a R. se compromete a pagar as contribuições para a segurança social e menciona as diligências que irá fazer nesse sentido e quanto a esta matéria: calcular o valor das mesmas e informar as autoridades portuguesas, reclamar o reembolso das contribuições do reino unido, requerer a cooperação com informações necessárias, e acordam o compromisso da A. e fornecer a documentação necessária, tudo em termos que constam da cláusula 10.2 do dito acordo, e que consta de fls. 324.
Ora, este compromisso aqui assumido sobrepõe-se à violação do dever legal e contratual perante a A. pois ambas as partes neste momento acordaram que iriam resolver o assunto do modo que dele consta. Concordamos aqui com a A. quando afirma que é uma obrigação de meios e não uma obrigação de resultado.
Note-se, e repete-se, que o que releva nesta sede não é o dever legal da R. perante a segurança social mas sim o dever contratual que a R. tem perante a A. sua trabalhadora.
E este fica expresso no acordo celebrado.
Donde, a R. compromete-se a diligenciar para efetuar o pagamento das contribuições para a Segurança social.
E este compromisso, cremos, não foi incumprido.
É que a R. efetivamente tenta efetuar esse pagamento mas a pretensão foi recusada pela segurança social por falta de inscrição da R. no registo nacional de pessoas coletivas, de Portugal, e por falta de inscrição na segurança social portuguesa.
E é esse compromisso que cumpre saber se foi observado.
Desde logo importa ter presente que a R. comprometeu-se, e “compromisso” é isso mesmo: fazer o que está ao alcance e não obter o resultado final.
É uma obrigação de meios.
Nunca de resultado, posto que o próprio resultado nunca estaria ao alcance da R., não dependia de si, dependia das autoridades tributárias.
Nessa medida o que cumpre aferir é se o compromisso contratual foi observado, se a R. foi diligente quanto a esse compromisso a que se vinculou por forma a descortinar se existe incumprimento contratual nesta matéria.
E a existir será dessa data que se contará o prazo prescricional como afirma o acórdão do tribunal da relação.
Ora, este compromisso foi em Fevereiro de 2013 e em Abril de 2013 a R. requer o pagamento das contribuições à Segurança Social portuguesa.
Ou seja, poucos meses depois do acordo que a R. firmou com a A., e no qual a A. aceitou a situação, recebeu uma compensação pela cessação do contrato, a R. diligencia junto da segurança social a regularização da situação.
E esta indefere e não permite o pagamento das contribuições em apreço. Ou seja, a obrigação contratual a que a R. se vinculou por força deste acordo tornou-se legal e objetivamente impossível por facto a ela não imputável. E tal obsta ao cumprimento da sua prestação no contrato.
E nessa medida, não havendo incumprimento desta obrigação o prazo prescricional da responsabilidade por facto ilícito não pode ser contado e não decorreu.
E nessa medida improcede a exceção de prescrição com esse fundamento.
Mas de igual modo improcede a pretensão da A. com base no incumprimento contratual, pois a prestação devida tornou-se impossível mas não por culpa da R.
No entanto, as partes vão mais longe e celebram em setembro, de 2013 um outro acordo relativo a esta matéria. O acordo consta de fls. 166 a 167v dos autos e expressamente acordam o pagamento de um valor como compensação pelo facto de a A. não ter conseguido obter o subsídio de desemprego e que caso o obtenha compromete-se a restituir tal importância. E anuem ainda em algo essencial: que a A. reconhece e declara que em virtude de não ter recebido o subsídio de desemprego “não tem quaisquer outros créditos ou reclamações emergentes
do contrato de trabalho revogado, do presente acordo ou de qualquer forma relacionados com os referidos acordos, ou com qualquer outra relação e bem assim que não tem quaisquer outros montantes a reclamar “da R. ou outra empesa do grupo.
Ora, nesta cláusula vê a R. uma espécie de remissão abdicativa do direito da A. demandar a R. como faz nesta ação.
E sempre diremos que lhe assiste razão.
É que veja-se.
Em Fevereiro de 2013 a A. aceita que a R. apenas se comprometa a regularizar a situação. O que sucede e efetivamente a R. tenta fazê-lo mas sem sucesso.
Não releva pois que em 2011 já a segurança social do reino unido tenha informado que as contribuições não podiam ser feitas.
Não releva precisamente porque em momento posterior ambas as partes celebram dois acordos quanto a esta matéria.
Num, existe apenas o compromisso de regularizar.
No segundo existe algo mais.
Existe o pagamento do valor correspondente ao subsídio de desemprego à A., a assunção por ambas as partes que as contribuições para a segurança social não conseguem ser pagas, e o reconhecimento expresso de a A. declarar não ter mais créditos ou reclamações emergentes do contrato e desse acordo ou dos acordos relacionados com esse.
Ou seja, em Setembro de 2013 a A. é sabedora da dificuldade em regularizar a situação, sabe já que a segurança social indeferiu essa pretensão e como tal recebe o valor como compensação pelo subsídio de desemprego e declara não ter nada a reclamar quanto a tal, nem nenhum crédito nessa matéria.
No entanto a presente ação é precisamente sobre essa matéria.
Donde, afigura-se como abuso de direito a conduta da A. que afirma, a troco de determinada compensação pecuniária que recebe, nada mais ter a receber ou reclamar da R. e vir depois intentar a presente ação que visa precisamente obter um beneficio resultante dessa situação.
E por essa via sempre improcederia a pretensão da A.
Mas mais se dirá.
É que a pretensão improcede precisamente porque o acordo que as partes fizeram não foi incumprido. A R. compromete-se a pagar a segurança social e o compromisso, que consiste em fazer o que está ao seu alcance para tal, foi observado.
O que não foi alcançado foi o resultado final desse compromisso. A regularização da Segurança social não foi obtida por motivo não imputável à R..
E tal tornou a sua prestação impossível.
Donde, não havendo incumprimento contratual não pode a A. exigir da R. algo os valores que peticiona com base no mesmo.
E assim se vê que improcede a sua pretensão.
E o que dizer do pedido reconvencional?
Não cremos, de igual modo, que exista fundamento para a pretensão da R.
Este pedido assenta na condenação da A. na devolução das quantias que a R. entregou à segurança social portuguesa e correspondente às quotizações da A.
Importa ter presente que a R. veio a conseguir pagar 70% do valor dos rendimentos recebidos pela A., pagando a sua parte e a parte da A.. E vem na presente ação peticionar a condenação da A. a pagar-lhe a parte que lhe cabia ter pago.
Mas salvo o devido respeito não cremos que faça sentido.
Não existem dúvidas que existe uma parte das contribuições que está a cargo do trabalhador e uma parte que se encontra a cargo da entidade empregadora.
Mas quando a R. avança com o pagamento integral está a assumir, por motivos que desconhecemos, um pagamento que não lhe cabe fazer e que devia ter sido descontado em momento próprio, ou ter sido deixado a cargo da A..
Donde, se a obrigação legal de pagamento dessa parte das quotizações cabe à A. perante a segurança social, não foi a A. quem enriqueceu à custa do R., mas esta que decidiu proceder a tal pagamento, numa altura em que a A. já nem era sua trabalhadora, e por motivos que se desconhecem, mas que não ficam provados não terem sido por uma mera liberalidade e com o objetivo de serem devolvidos.
Note-se. O enriquecimento sem causa é um instituto jurídico residual, subsidiário na medida em que inexista outro meio ao dispor do lesado de obter o seu pagamento e supõe, como fonte de obrigação (473º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Civil) a verificação cumulativa de três requisitos: existência de um enriquecimento; enriquecimento esse obtido à custa de alguém; e falta de causa justificativa.
Acompanhando de perto o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 2/11/2010, in dgsi.pt (e de onde aliás o douto acórdão de fls. 1248 dos autos foi buscar o enquadramento jurídico do enriquecimento sem causa) é de notar que o enriquecimento tanto pode traduzir-se num aumento do activo patrimonial como numa diminuição do passivo, como ainda numa poupança de despesas.
E dado não se ter provado que a R. pagou com o compromisso da A. vir a devolver tais quantias, tal qual se tratasse de um mútuo, tendo-o feito num momento em que a relação laboral terminou, a entrega de dinheiro por parte da R. em nome da A. não pode ser entendida como uma sub-rogação de credor desde logo porque se desconhece se essa foi a vontade da A. e se para tanto anuiu o se a R. o fez como parte de compensação da situação gerada.
E não se provando que existiu autorização e vontade da A. em que a R. agisse em seu nome não pode a mesma exigir tal pagamento da A., assim improcedendo o pedido reconvencional deduzido» - fim de transcrição.
Em resumo:
- julgou-se improcedente o pedido reconvencional formulado pela Ré:
- julgou-se improcedente a invocada excepção de prescrição;
- entendeu-se  como abuso de direito a conduta da A. que afirmou , a troco de determinada compensação pecuniária que recebeu, nada mais ter a receber ou reclamar da R. no que tange aos créditos que emergissem do contrato de trabalho que mantiveram e desse acordo ou dos acordos relacionados com esse.
Ora a Ré veio a intentar a presente acção que visa  obter um beneficio resultante dessa situação.
Mais se entendeu que a R.  se comprometeu a pagar a segurança social e o compromisso, que consistia em fazer o que estava ao seu alcance para tal, foi observado.
O que não foi alcançado foi o resultado final desse compromisso.
Como tal a regularização da Segurança social não foi obtida por motivo não imputável à R., o que tornou a sua prestação impossível.
Assim, não havendo incumprimento contratual não pode a A. exigir da R. algo os valores que peticiona com base no mesmo.
Ora , a nosso ver, apesar de a invocada pretensão subsidiária ter como causa de pedir não um incumprimento contratual por parte da Ré , mas um enriquecimento sem causa seu a expensas da Autora , uma vez que lhe foram restituídos os valores que a primeira havia entregue à Segurança Social inglesa – entidade para a qual não o devia ter feito -  a verdade é que a sentença recorrida pelo menos na parte que considera que ao intentar a presente acção a Autora está agir em abuso de direito, na modalidade de « venire contra factum proprium», prejudica , desde logo, a dilucidação da pretensão formulada a título subsidiário o que implica que , em rigor , não se verifica a arguida nulidade de sentença por omissão de pronúncia.
Tal como se refere em aresto do STJ , de 30-11-2023, proferido no âmbito do processo nº 10967/17.4T8PRT.P1.S1, Nº Convencional: 7.ª Secção, Relator Conselheiro Oliveira Abreu acessível em www.dgsi.pt:
« I. A nulidade do aresto, sustentada na ininteligibilidade do discurso decisório, quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, está diretamente relacionada com o comando fixado na lei adjetiva civil, segundo o qual o Tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras) e aqueloutras que a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso.» - fim de transcrição.
Ali se refere:
«
Tem pleno cabimento enfatizar que no caso da omissão de pronúncia, o vício a que se reporta a alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do Código de Processo Civil, traduz-se no incumprimento do dever prescrito no art.º 608º n.º 2 do Código de Processo Civil “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”, sendo que as questões suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos) qual o seu objeto (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado (causa de pedir), donde, só a falta de apreciação das questões (desde que não estejam prejudicadas pela solução dada a outras), integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das razões ou argumentos invocados para concluir sobre as questões, traduzindo-se, assim, num vício que encerra um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutiliza o julgado na parte afetada.» - fim de transcrição.
Ora , a nosso ver, salvo melhor opinião, no caso concreto , independentemente da bondade  jurídica da solução perfilhada na sentença recorrida, verifica-se a supra mencionada prejudicialidade.
Desta forma, não se verifica a arguida nulidade.
*****
A segunda questão suscitada no recurso , a nosso ver, consiste em saber se a declaração constante do documento , datado de 9 de Setembro de 2013, inserido de fls. 166 a 167 v dos autos, consubstancia uma remissão abdicativa dai decorrendo o supra mencionado abuso de direito.
Segundo a recorrente tratou-se de uma mera quitação.
Refere que:
« 27.ª - A declaração da A, que consta do acordo de fls. 166 a 167vº dos autos, não constitui “uma espécie de remissão abdicativa da A. demandar a R. como faz nesta ação”;
28.ª - Lendo-se integralmente os termos e pressupostos do referido Acordo, e não apenas a cláusula de onde consta essa declaração, conclui-se forçosamente que a A. não renunciou a exigir ou reclamar o cumprimento da prestação da R. a pagar as contribuições e as quotizações devidas à Segurança Social portuguesa nem, no caso da R. não realizar a prestação a que se vinculou, a exigir ou reclamar uma indemnização pelos danos causados decorrentes do não cumprimento;
29.ª - Nesse Acordo, a R. assume que não tinha até essa data realizado a prestação a que se havia vinculado;
30.ª - Desse modo, a R. reconheceu a realidade de um facto que lhe é desfavorável, o que constitui uma confissão, conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 352.º e 358º n.º 2 do Cód. Civil;
31.ª - E tendo a R. reconhecido que foi pela circunstância de não terem sido pagas, por si, as contribuições à Segurança Social portuguesa que não foi atribuído subsídio de desemprego à A., aceitou adiantar determinado valor correspondente ao montante de subsídio de desemprego que a A. teria direito a receber;
32.ª - Nesse mesmo Acordo, a R. reafirmou estar a desenvolver todas as ações para que a Segurança Social aceitasse as contribuições por si devidas;
33.ª - Logo, a R. não negou que fosse sua obrigação pagar tais contribuições nem pretendeu, com a celebração desse Acordo, ficar desonerada da realização dessa sua obrigação e seus efeitos;
34.ª – Com a declaração de quitação conferida na Cláusula 2.ª desse mesmo Acordo, a A. não estava a desobrigar a R. da realização da sua prestação nem muito menos a renunciar à reclamação do seu cumprimento ou, caso a mesma não fosse cumprida, à indemnização pelos prejuízos causados;
35.ª - De outro modo, tal Acordo seria intrinsecamente contraditório e absurdo, tornando inconciliáveis os compromissos recíprocos assumidos e inverificáveis as consequências nele  previstas;
36.ª - O comportamento das partes imediatamente anterior e posterior a esse Acordo demonstra que a cláusula em causa não pode ser entendida como uma “espécie de remissão abdicativa da A. demandar
a R. como faz nesta ação”;
37ª - A correspondência que as partes trocaram entre si, relativamente a este assunto, evidencia que a A. não abdicou de reclamar o cumprimento da obrigação assumida pela R. nem de exigir em Juízo
o ressarcimento dos prejuízos decorrentes de um eventual incumprimento da obrigação assumida e reafirmada pela R. no acordo de onde consta essa declaração;
38.ª - Quer antes do Acordo quer depois da sua celebração, a A. continuou a reclamar à R. a regularização do pagamento das contribuições à Segurança Social;
39.ª - E a R. nunca afirmou perante a A. que já não tinha essa obrigação em virtude do Acordo que havia sido celebrado entre ambas;
40.ª - A R. bem sabia que a sua obrigação de efetuar o pagamento das contribuições à Segurança Social portuguesa se mantinha, não tendo a A. renunciado abdicativamente ao cumprimento dessa sua obrigação com a celebração do Acordo;
41.ª - A remissão tem natureza contratual, por força do disposto no art. 863.º do Cód. Civil, exigindo- se por isso duas manifestações de vontade consonantes;
42.ª - Tal declaração deve revestir carácter indiscutível e ser concludente;
43.ª - Tendo de ser interpretada de acordo com a vontade real do declarante;
44.ª - A A. apenas declarou estar ressarcida das quantias que lhe foram adiantadas a título de subsídio de desemprego, que, nesse momento, teria direito a receber, caso a R. tivesse oportunamente procedido ao pagamento das contribuições à Segurança Social;
45.ª - A remissão abdicativa exige que o devedor dê a sua aquiescência à renúncia do credor exigir a prestação devida;
46.ª - O que não ocorre na cláusula em apreciação nos presentes autos, não havendo qualquer declaração da R. no sentido de aceitar o eventual “perdão” da A.;
47.ª - Em sede do direito laboral, a Jurisprudência tem sido exigente, não atribuindo a qualificação de remissão abdicativa às declarações emitidas de forma vaga e genérica, sem menção expressa ou
concretização dos créditos remitidos;
48.ª - Estando em causa o direito à pensão de reforma da A., sempre seria nula tal declaração, por versar sobre um direito indisponível, nos termos do art.º 280.º do Cód. Civil;» - fim de transcrição.
Cumpre , pois, interpretar a  declaração negocial constante do documento em causa , datado de 9 de Setembro de 2013., sendo que a parte mais relevante redigida em língua portuguesa tem o seguinte teor;
« Entre X, Limited(…)
e
AA
 (…)
Considerando que:
A .  A cessação do contrato de trabalho da 1ª contratante ao serviço da 2ª contratante produz efeitos a 31.01.2013;
B – Em resultado de tal cessação a 2ª contratante recebeu uma compensação pecuniária global;
C – Em 5.7.2010 , a 2ª contratante foi destacada para Portugal pela  1ª contratante   .
Portugal foi o país em que desempenhou a sua actividade até à cessação do seu contrato de trabalho;
D – As contribuições para a segurança social respeitantes à  2ª contratante não foram pagas em Portugal , designadamente pela  1ª contratante;
E – Por força do mencionado em D) não foi concedido subsídio de desemprego à  2ª contratante por parte da segurança social portuguesa;
F – A 1ª contratante está a desenvolver todas as acções legais perante a segurança social portuguesa por forma a que esta entidade aceite as contribuições devidas por aquela;
G – Como gesto de boa vontade a  1ª contratante   está disposta a adiantar à 2ª contratante   a quantia total a que esta teria direito a receber a título de subsidio de desemprego;
H – O pagamento mencionado em G está sujeito à condição de a 2ª contratante    restituir de imediato à 1ª contratante   os montantes adiantados com a segurança social excepto as contribuições da 1ª contratante   e pagar à 2ª contratante   o subsidio de desemprego;
É celebrado o presente Acordo , o qual se rege nos termos das seguintes cláusulas:

1– No prazo de 28 dias após receber uma cópia assinada deste acordo  a  1ª contratante   pagará à   2ª contratante   a quantia de € 36.472,30(….) , da qual a 2ª contratante  dará a correspondente quitação por forma a compensar a 2ª contratante   pelo facto de não ter recebido até à presente data subsídio de desemprego. 
2 – A 2ª contratante  assume expressamente a obrigação de restituir à 1ª contratante  quaisquer montantes que venha a receber da segurança social portuguesa a título de subsídio de desemprego pela cessação do contrato de trabalho identificado no considerando A , até ao limite máximo mencionado em 1 . supra.
3 – Caso a 2ª contratante  não cumpra a obrigação prevista no nº 2 , a 2ª contratante  expressamente reconhece ser devedora à 1ª contratante  da quantia de € 36.472,30(….) ,

A 2ª contratante  pelo presente reconhece e expressamente declara que  com o cumprimento, do disposto na cláusula  nº 1 supra , não tem quaisquer  outros créditos ou reclamações emergentes do contrato de trabalho revogado , do presente acordo  ou de qualquer forma relacionados com os referidos acordos ou com qualquer outra relação , e , bem assim, não tem quaisquer outros montantes a reclamar da 1ª contratante  ou de qualquer outra empresa do grupo X e McLennon , designadamente X Employes Bennefits, Ldª   , X Portugal , Ldª ou X Limited seja a que título for ou de que natureza for.
3ª  –
As partes obrigam-se a manter os termos do presente negócio confidenciais , não revelando o seu conteúdo a terceiros , a não ser que a divulgação do mesmo seja necessária para  o cumprimento de obrigações legais ou fiscais e limitando tal divulgação ao estritamente necessário para o cumprimento de tais obrigações».
****
Com relevo sobre esta questão  saliente-se , agora, que  os artigos 236.º a 238.º do Código Civil [18]consagram, embora de forma mitigada, o princípio da impressão do destinatário.[19]
Tal como decorre do nº 1º do artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil, a impressão do destinatário deve corresponder àquela que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, deduziria do teor da declaração em causa e do contexto factual em que a mesma é emitida.
***
Refira-se ainda que nos termos do artigo 787º  do Código Civil:
Direito à quitação
1. Quem cumpre a obrigação tem o direito de exigir quitação daquele a quem a prestação é feita, devendo a quitação constar de documento autêntico ou autenticado ou ser provida de reconhecimento notarial, se aquele que cumpriu tiver nisso interesse legítimo.
2. O autor do cumprimento pode recusar a prestação enquanto a quitação não for dada, assim como pode exigir a quitação depois do cumprimento.
A quitação ou recibo é, pois, um documento particular na qual o credor declara ter recebido a prestação.
De acordo com douto aresto do STJ a quitação é um documento em que o credor declara ter recebido a prestação que lhe é devida, constituindo uma simples declaração de ciência certificativa do facto de que a prestação foi cumprida pelo devedor e recebida pelo credor , em princípio, não é uma declaração de vontade significativa da aceitação da prestação recebida pelo credor como satisfação do seu crédito.[20]
Porém, em regra essa declaração encontra-se subjacente ao documento de quitação.[21]
Por sua vez, o artigo 863º do Código Civil ( natureza contratual da remissão) regula:
"1 - O credor pode remitir a dívida por contrato com o devedor.
2 - Quando tiver o carácter de liberalidade, a remissão por negócio entre vivos é havida como doação, na conformidade dos artigos 940 e seguintes".
Tal como se refere no Comentário ao Código Civil  - Direito das Obrigações , Das Obrigações em geral , Universidade Católica Editora , Dezembro de 2018, anotação de Joana Vasconcelos, pág. 1297:
«  A remissão é a quinta das seis causas extintivas da obrigação além do cumprimento, previstas e reguladas nos artigos 837º e ss.
E diferencia-se deste e das quatro que a antecedem (dação em cumprimento, consignação em depósito, compensação e novação) por náo satisfazer o interesse do credor visado pela prestação devida , já que consiste na abdicação por este , com o acordo do devedor do direito de exigir a respectiva realização » - fim de transcrição . 
Temos, pois, que a remissão é a renúncia do credor ao direito de exigir a prestação, feita com aquiescência da contraparte.[22]
E provoca a extinção das obrigações visadas.
Porém, segundo o Professor Antunes Varela "não basta …. a declaração abdicativa ou renunciativa do credor para extinguir a obrigação.
Esse efeito só resulta do acordo entre os dois titulares da relação creditória, ainda que a lei seja especialmente aberta à prova da aceitação do devedor (art 234º)".[23]
Ainda segundo este Professor  "a vontade de remitir por parte do credor pode resultar de uma manifestação tácita de vontade revelada, por exemplo, através da entrega de um recibo da dívida ou da restituição do título dela.
Não basta, porém, qualquer destes factos, pois, qualquer deles é de significação equívoca.
Não exige a lei que o consentimento do devedor seja manifestado por forma expressa.
Ele está, portanto, sujeito às regras gerais sobre declarações negociais".[24]
 Nas palavras de Menezes Cordeiro:
"a remissão surge como um contrato entre o credor e o devedor, destinado a extinguir determinada relação obrigacional entre eles existente.
É um contrato consensual" .[25]
Para Almeida Costa:
"a remissão tem por fonte um contrato, oneroso ou gratuito, exigindo-se consequentemente a aceitação do devedor, que, no entanto, como a vontade de remitir, pode ser manifestada de forma expressa ou tácita (arts 217º e 218º)." [26]
Cumpre ainda salientar que « a remissão abdicativa será onerosa ou gratuita , consoante se  faça contra uma prestação do devedor ou de terceiro ou nada recebendo o credor pela mesma  ( Brandão Proença , 2017, 57; Cunha de Sá , 2002, 234; Vaz Serra , 1954, 36).
Quando onerosa , a remissão « assume o carácter de elemento de uma novação ou transação ou o de dação em cumprimento» ou ainda de qualquer outro contrato – abdicando o credor da dívida originária em troca da criação de outra obrigação que a substitui , de uma outra vantagem , da realização de uma diversa prestação (Vaz Serra , 1954, 36 » -  Comentário ao Código Civil  - Direito das Obrigações , Das Obrigações em geral , Universidade Católica Editora , Dezembro de 2018, anotação de Joana Vasconcelos, pág. 1298.
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Dito isto, com respeito por opinião diversa, afigura-se-nos que das declarações constantes das cláusulas constante do acordo inserido a fls. 166 a 167 v decorre inequivocamente que o montante então pago pela Ré à Autora se refere a valores atinentes ao subsídio de desemprego que esta última não havia recebido da Segurança Social Portuguesa porque a Ré não lhe havia operado os devidos descontos perante essa entidade.
Todavia, subsídio de desemprego é uma coisa e pensão de reforma é outra…
Anote-se ainda que a menção à compensação pecuniária de natureza global pela cessação do contrato de trabalho ali constante se circunscreve,  obviamente , a créditos dimanados da execução do contrato de trabalho, não respeitando assim nem a subsídio de desemprego e muito menos a valor respeitante a pensão de reforma.
Desta forma, a  nosso ver , com respeito por opinião distinta, a menção ali feita de a 2ª contratante ter recebido uma compensação pecuniária de natureza global pela cessação do contrato de trabalho que produziu efeitos em 31.1.2013 não releva para os supra mencionados efeitos.
Dir-se-á o mesmo da menção ínsita na clª 2ª  que como tal, a nosso ver, não se pode nem deve considerar como uma declaração remissiva onerosa  emitida pela Autora , com  a aquiescência, mais que não fosse implícita da Ré, no tocante aos montantes referentes à reforma, sendo que esses , aliás, em rigor , não decorrem do contrato de trabalho , mas dos devidos  descontos , oportunamente , operados.
A nosso ver, é esse o sentido que se pode – e deve – extrair dessa declaração de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 236º do Código  Civil , sendo o que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pode e podia deduzir do comportamento dos declarantes.
Anote-se que estando nós perante um negócio oneroso  tal sentido é o que conduz ao maior equilíbrio das prestações, visto que de outra forma a Autora fica desprovida de reforma relativa ao período de tempo em causa não a recebendo nem pelo sistema de segurança social inglês nem pelo português.
E a verdade é que trabalhou e os descontos deviam ter sido operados e não foram por facto que não lhe é directamente imputável. 
Por essa razão , ao invés do considerado na sentença recorrida também não entendemos que a Autora litigue em abuso de direito num claro « venire contra factum proprium».
Desde  logo, porque subsídio de desemprego e pensão de reforma por velhice são coisas distintas, sendo que esta última  embora possa lograr  conexão com o contrato de trabalho não depende necessariamente dele, mas dos descontos oportuna e devidamente efectuados por quem tem de o efectuar.
Recorde-se que segundo o artigo 63º da nossa Lei Fundamental :
(Segurança social e solidariedade)
1. Todos têm direito à segurança social.
2. Incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado, com a participação das associações sindicais, de outras organizações representativas dos trabalhadores e de associações representativas dos demais beneficiários.
3. O sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.
4. Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado.
5. O Estado apoia e fiscaliza, nos termos da lei, a actividade e o funcionamento das instituições particulares de solidariedade social e de outras de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo, com vista à prossecução de objectivos de solidariedade social consignados, nomeadamente, neste artigo, na alínea b) do n.º 2 do artigo 67.º, no artigo 69.º, na alínea e) do n.º 1 do artigo 70.º e nos artigos 71.º e 72.º
Entendemos, pois, inverificada a remissão abdicativa pelo que recurso procede neste particular.
***
Acontece o mesmo no tocante à verificação do abuso de direito  [terceira problemática suscitada no recurso].
O artigo 334º do Código Civil preceitua que:
«
É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito».
Nas palavras de Antunes Varela "para que o exercício do direito seja abusivo, é preciso que o titular, observando embora a estrutura formal do poder que a lei lhe confere, exceda manifestamente os limites que lhe cumpre observar.
É preciso, como acentuava M. Andrade que o direito seja exercido «em termos clamorosamente ofensivos da justiça»"  - Das Obrigações em Geral,  vol  I, 4ª ed, pág 466.
É, pois, necessária a existência de uma contradição entre o modo ou fim com que o titular exercer o seu direito e o interesse a que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito.
E não é sequer necessária a consciência, por parte do agente, de se excederem com o exercício do direito os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social desse direito; basta que objectivamente se excedam tais limites – A. Varela, ob. cit,  pág 465.
A boa fé como princípio significa essencialmente que as pessoas devem ter um comportamento honesto, correcto, leal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legítima confiança ou expectativa dos outros.
Uma das hipóteses da concretização desta cláusula geral é a da proibição de "venire contra factum proprium", impedindo-se uma pretensão incompatível ou contraditória com a conduta anterior do pretendente; aquilo... com que se veta o exercício de um direito subjectivo ou duma pretensão, quando o seu titular, por os não ter exercido durante muito tempo, criou na contraparte uma fundada expectativa de que já não seriam exercidos (revelando-se, portanto, um posterior exercício manifestamente desleal e intolerável) ". - vide Jorge Manuel Coutinho de Abreu, Do Abuso de Direito, Almedina, pág 59/60.
O abuso do direito tem as consequências de um acto ilegítimo podendo dar lugar à obrigação de indemnizar, à nulidade, à legitimidade de posição; ao alongamento do prazo de prescrição ou de caducidade".- vide acórdão do STJ de 28-11-96, CJ, Acórdãos do STJ, Ano III, pág 118.
Nas palavras de A. Varela "os efeitos do exercício irregular do direito serão os correspondentes à forma de actuação do titular" - obra citada, pág 467.
Mas será que  ao intentar a presente acção a Autora está a actuar em abuso de direito na supra referida modalidade ?
A nosso ver, a resposta é negativa sendo que tal conduta a verificar-se sempre estaria indissociavelmente ligada à já abordada  remissão abdicativa.
Uma vez que esta não se verifica , igualmente , não se pode reputar que a Autora litiga em abuso de direito.
Procede, igualmente , o recurso nesta vertente.
****
Mas e quanto à responsabilização da Ré pela inobservância do acordo lavrado em 9 de Setembro de 2013  mencionado no artigo 22º da petição inicial[27] e no facto assente nº 20 [ vide fls. 166 a 167 verso] ?
A Autora esse mesmo articulado sustentou   [ vide artigos 57º a 67º [28] que têm o seguinte teor:
57º
Do que vem de ser dito resulta que a R. tem a obrigação de indemnizar a A. pelo
incumprimento da obrigação de regularizar os pagamentos das contribuições devidas para a Segurança Social em Portugal desde 1.1.2010 até 31.1.2013, no montante global de € 195.028,48 (561.233,04 x TSU 34,75%).
58º
Obrigação essa que decorre do compromisso por si assumido autonomamente
no acordo revogatório do contrato de trabalho, reiterada no acordo celebrado entre A. e R. em 9.9.2013.
59º
Dispõe o artigo 798 do C. Civil que o devedor que falta culposamente ao
cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.
60º
Presumindo o legislador que a culpa é do devedor (artº 799 nº 1 do C. Civil).
61º
Ora, como atrás se deixou demonstrado, o não pagamento das contribuições
devidas no período de 1.1.2010 e 31.3.2013 implica uma redução de € 1.824,45/mês na pensão de reforma por velhice da A.
62º
Efectivamente, atendendo à idade da A. e à situação profissional em que se
encontra, é muito previsível que na data da reforma (1.12.2026) o período de 1.1.2010 a 31.1.2013 esteja incluído no período referente aos “melhores 10 anos dos últimos 15 anos” de contribuições da A.
63º
Isso significa que no período de 18 anos e 8 meses que decorre entre os 66,4
anos (idade da reforma) e os 85 anos (esperança média de vida) a A., em resultado do não pagamento das contribuições devidas pela R., deixará de auferir a quantia global de € 476.789,60 [(18 x 14 x 1824,45 + (8/12 x 1824,45 x 14)].
64º
O dever de indemnizar abrange os danos futuros, desde que sejam previsíveis
(artigo 564 nº 2 do C. Civil).
65º
Assim sendo, tem de se concluir que a R. tem o dever de indemnizar a A. no
montante de € 476.789,60.
66º
Tendo em consideração que se trata da indemnização de um dano futuro com
largos anos de previsão, cujo pagamento será antecipado, deverá ajustar-se esse valor de acordo com os critérios da equidade, tal como tem vindo a ser entendido pela Jurisprudência em casos semelhantes.
67º
Nessa medida, convocando-se os critérios da equidade e de acordo com o
entendimento seguido pela Jurisprudência, a indemnização a atribuir deverá corresponder a 75% do referido valor de € 476.789,60, ou seja, deverá ser fixada em valor nunca inferior a € 357.592,20 (vide, nesse sentido, Acórdão do TRE de 15.5.2012 proferido no Processo nº12/07.3TAPRL.E1 in www.dgsi.pt ).» ] que a Ré tem a obrigação de regularizar os pagamentos das contribuições devidas à Segurança Social em Portugal  desde 1.1.2020 até 31.1.2013 no montante global de € 195.028.48.
Obrigação essa que decorre do compromisso por si assumido autonomamente no acordo revogatório   do contrato de trabalho reiterada no acordo celebrado entre ambas em 9.9.2013.
Dispõe o artigo 786º do CC que o devedor que falta culposamente
[ …]
Anote-se ainda que no acordo revogatório do contrato de trabalho de 27.2.2013 constante de fls. 321 a 327 v [ vide facto provado nº 18 ] no ponto 10.2 se consignou[29] que:
«
A Companhia compromete-se a efectuar o pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal a partir de 1 de Janeiro de 2010 até à data da cessação , juntamente com quaisquer penalidades e juros associados.
E Empresa irá trabalhar com a PWC para calcular e informar o valor dessas responsabilidades às autoridades portuguesas ,’bem como para reclamar o reembolso das contribuições do Reino Unido para o mesmo período , e irá requerer a sua cooperação com qualquer tipo de informação adicional que possa ser solicitada pelas autoridades portuguesas ou do Reino Unido para resolver a questão em ambos os países.
Ao assinar este  contrato você compromete-se a prestar tal garantia e a fornecer documentação conforme razoavelmente exigido pela empresa nas suas diligências junto das autoridades portuguesas ou do Reino Unido ao abrigo do ponto 10.2».
****
Segundo a recorrente encontramo-nos no âmbito da responsabilidade decorrente da violação de obrigações contratuais, ou seja perante o incumprimento de obrigação que a Ré assumiu em 10.2 do acordo de cessação e na clª 2 ª do acordo posterior de 8.9.2013, sendo essa a causa de pedir invocada nesse particular .
Recorde-se que nos termos do artº 798º do Código  Civil:
“o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”.
Para a ocorrência de responsabilidade civil contratual (tal como na extracontratual), é necessária a verificação dos seguintes requisitos: facto objectivo (acção ou omissão), a ilicitude, a culpa, o prejuízo do devedor e o nexo de causalidade entre o facto e o prejuízo.
Na responsabilidade contratual, a ilicitude advém da relação de desconformidade entre a prestação debitória devida e o comportamento observado.
O cerne da questão neste aspecto consiste em saber se dos  acordos em causa , celebrados em 27.2.2012 e 9.9.2013, no que toca ao pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal a partir de 1 de Janeiro de 2010 até à data da cessação , juntamente com quaisquer penalidades e juros associados, decorria para a  Ré a assunção de uma obrigação de meios ou de resultado ?
***
Nas palavras do Prof. Almeida Costa (Direito das Obrigações, 7ª ed., pág. 933), nas obrigações de meios o devedor apenas se compromete a desenvolver prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza.
Em contraponto verificam-se obrigações de resultado, quando se conclua da lei ou do negócio jurídico que o devedor está obrigado a conseguir um certo efeito útil, um determinado resultado.
Por outro lado, tal como se refere em aresto da Relação de Lisboa , de 28-06-2012, proferido no processo nº 2859/09.7TJLSB.L1-8, Relator Ilídio Sacarrão Martins, acessível em www.dgsi.pt, [30],
que passamos a transcrever longamente na parte que reputamos relevante[31]
«
….. obrigação de meios – em que o devedor apenas se compromete a desenvolver, prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza –, em contraposição com a obrigação de resultado – que se verifica quando se conclua da lei ou do negócio jurídico que o devedor está vinculado a obter um certo efeito útil[8].
Nas obrigações de resultado, bastaria ao credor demonstrar a não verificação do resultado para estabelecer o incumprimento do devedor, sendo este que, para se exonerar da sua responsabilidade, teria que demonstrar que a inexecução não é devida a uma causa que lhe é imputável. Nas obrigações de meios, não seria suficiente a não verificação do resultado para responsabilizar o devedor, havendo que demonstrar que a sua conduta não correspondeu à diligência a que se tinha vinculado[9].
Tal distinção tem sido objecto de algumas críticas, nomeadamente por Manuel Gomes da Silva, segundo o qual, mesmo “as obrigações de meio têm sempre em vista um fim e quando este falha por completo, pode presumir-se a culpa. Assim, o depositário está adstrito a uma obrigação de diligência, ou de meio, e contudo, se perder a coisa depositada, dificilmente se isentará de responsabilidade se não provar que procedeu com toda a diligência[10]”.
“É um erro prescindir inteiramente da ideia de resultado para caracterizar certas obrigações. Quando ao devedor se exigem simples cautelas, simples actos de prudência e de diligência, é o fim em vista a directriz que o orienta na determinação dos actos que deve praticar, e desempenha por isso papel importantíssimo na estrutura da obrigação[11]”.
Segundo Vaz Serra, o ónus da prova de culpa impende sempre sobre o devedor, mesmo nas alegadas “obrigações de meios”:
“O devedor responde pelo não cumprimento da obrigação, definitivo ou provisório, ou pelo cumprimento defeituoso dela, a não ser que prove falta de culpa da sua parte. A prova da ausência de culpa pode ser feita com a demonstração de que o devedor cumpriu, com a diligência a que estava obrigado, os deveres que lhe cabiam.
A doutrina do parágrafo anterior é aplicável mesmo que o devedor se tenha obrigado apenas a despender determinada diligência, e não a fazer obter ao credor certo resultado, cabendo então ao credor provar que diligência devia ter usado o devedor, em face da obrigação que assumiu, e ao devedor demonstrar que usou essa diligência e, se foi impedido de a empregar, que tal se deu por facto a si não imputável[12]”.
Já Luís Manuel Menezes Leitão defende não haver base no nosso direito para proceder a tal distinção: “em ambos os casos aquilo a que o devedor se obriga é a uma conduta (a prestação) e o credor visa sempre um resultado que corresponde ao seu interesse (art. 398º, nº2). Por outro lado, ao devedor cabe sempre o ónus da prova de que realizou a prestação (art. 342º nº2) ou de que a falta de cumprimento não procede de culpa sua, sem o que será sujeito a responsabilidade[13]”.
Manuel Carneiro da Frada[14] aplica a presunção de culpa do art. 799º às obrigações de meios e às obrigações de resultado, atribuindo-lhe, contudo, um alcance distinto em cada um dos casos:
- nas obrigações de resultado, a presunção de culpa do art. 799º compreenderia: a) a presunção de que a conduta do devedor é ilícita (presunção de ilicitude); b) a presunção de que a conduta ilícita do devedor constituiu a causa da falta de cumprimento ou de cumprimento defeituoso; c) a presunção de que a conduta ilícita do devedor é censurável (presunção de culpa).
- nas obrigações de meios, a presunção de culpa do art. 799º cingir-se-ia à censurabilidade pessoal da conduta do agente.
Ou seja, segundo o referido autor, nas obrigações de meios, não é suficiente que o credor demonstre a falta de verificação do resultado, carecendo de demonstrar que os meios não foram empregues pelo devedor ou que a diligência prometida com vista a um resultado não foi observada.
Por sua vez, Nuno Manuel Pinto Oliveira rejeita que o nº1 do art. 799º possa conter alguma presunção de ilicitude.
Segundo tal autor, “o problema da aplicabilidade ou inaplicabilidade do nº1 do art. 799º às obrigações de meios relaciona-se com o conteúdo das relações jurídicas: nas obrigações de meios a alegação e prova da inobservância dos deveres contratuais envolve a alegação e prova da inobservância do dever de cuidado ou diligência; nas obrigações de resultado, não[15]”.
“Na responsabilidade contratual, os critérios da ilicitude e culpa dependem de se considerar o dever violado como obrigação de resultados ou de meios: na primeira hipótese, aplicar-se-á um critério de ilicitude referido ao resultado (a omissão do cuidado exterior é apreciada em sede de culpa, e só em sede de culpa); na segunda, aplicar-se-á um critério de ilicitude referido à conduta (a omissão da mais elevada medida de cuidado exterior é apreciada em sede de tipicidade e de ilicitude)[16]”.
Por sua vez, Ricardo Lucas Ribeiro defende que na responsabilidade pelo não cumprimento das obrigações de resultado, o devedor tem, tão só, de provar que a obrigação se constituiu e tem de demonstrar os danos sofridos. Nas obrigações de resultado, a presunção de culpa do art. 799º tem o significado de uma presunção de responsabilidade – tem o alcance de abranger a ilicitude e ainda o nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano –, pelo que impende, desde logo, sobre o devedor o ónus de provar o cumprimento da obrigação[17].
Nas obrigações de meios, o credor terá de provar a ilicitude, isto é, que o devedor violou um dever objectivo de cuidado que no caso sobre ele juridicamente impendia, bem como o nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano. Quanto à culpa, aplicar-se-á a presunção prevista no nº1 do art. 799º, mas reduzida à censurabilidade pessoal da conduta do devedor – incumbirá ao devedor demonstrar que não assumiu uma atitude interior de descuido ou de leviandade perante a norma de comportamento[18].
Por fim, Sinde Monteiro, admitindo o interesse da distinção entre obrigações de meios e obrigações de resultado, adverte o aplicador do direito para que a utilize “sempre com a maior cautela, pois não é a qualificação que deve determinar a solução; ao invés, há-de aquela resultar da interpretação da lei ou do contrato, concebendo-se situações que não se adaptem a esses figurinos[19]”.
De qualquer modo, segundo o referido autor, “contra o que com alguma frequência se lê, a presunção de culpa do art. 799º, nº1, continua a ter pleno cabimento no domínio das obrigações de meios[20]”.
Seguiremos de perto a doutrina preconizada pelo Prof. Vaz Serra: mesmo nas obrigações de meio, o devedor está em melhores condições do que o credor para provar se usou ou não a diligência devida e, no caso negativo, se foi impedido por algum facto que lhe não seja imputável. Assim, cabendo ao credor provar que diligência deveria ter usado, em face da obrigação que assumiu (trata-se da prova do conteúdo da obrigação, a qual compete ao credor), e ao devedor provar que usou essa diligência, isto é, que cumpriu a obrigação[21].
Nas obrigações de meios, o devedor prometerá adoptar certas medidas, com vista à obtenção de um certo resultado. Ao credor incumbe a prova da existência da obrigação – quais as concretas medidas a que o devedor se obrigou –, e ao devedor incumbe a prova de cumpriu tal medidas, sendo que, na ausência de prova do cumprimento de tais medidas, se presume a culpa..» - fim de transcrição.
Concorda-se com tal raciocínio.
Todavia, também aqui cumpre interpretar as declarações negociais constantes dos
acordos , sendo que as considerações acima tecidas acerca da interpretação das declarações negociais aqui logram inteira aplicação.
Será que deles resulta que a Ré apenas se comprometeu a desenvolver, prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se iria produzir ou será que se deve considerar que através dos supra citados acordos se vinculou a obter um certo efeito útil  ?.
Ora conjugando as declarações feitas nos dois supra citados acordos afigura-se-nos que a Ré assumiu uma obrigação de meios até porque – como é óbvio - o resultado final não dependia só dela, mas também da posição assumida sobre o assunto pela Segurança Social portuguesa.
Do ponto 10.2 do acordo de cessação
[
A Companhia compromete-se a efectuar o pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal a partir de 1 de Janeiro de 2010 até à data da cessação , juntamente com quaisquer penalidades e juros associados.
E Empresa irá trabalhar com a PWC para calcular e informar o valor dessas responsabilidades às autoridades portuguesas ,’bem como para reclamar o reembolso das contribuições do Reino Unido para o mesmo período , e irá requerer a sua cooperação com qualquer tipo de informação adicional que possa ser solicitada pelas autoridades portuguesas ou do Reino Unido para resolver a questão em ambos os países.
Ao assinar este  contrato você compromete-se a prestar tal garantia e a fornecer documentação conforme razoavelmente exigido pela empresa nas suas diligências junto das autoridades portuguesas ou do Reino Unido ao abrigo do ponto 10.2».] e do acordo de 9 de Setembro de 2013 [ vide F – A 1ª contratante está a desenvolver todas as acções legais perante a segurança social portuguesa por forma a que esta entidade aceite as contribuições devidas por aquela] , a nosso ver , resulta , com alguma clareza , que a Ré assumiu uma obrigação de meios.
Coisa distinta consiste em saber se  , tal como lhe incumbia, nesse caso na qualidade de devedora , a Ré  provou que  usou a diligência devida ou que foi impedida  de cumprir a sua obrigação por  algum facto que lhe não é imputável.
A nosso ver, a Ré – como devedora – provou que   cumpriu as medidas necessárias para o efeito, sendo , aliás, que isso resulta dos documentos constantes como nº 6 e seguintes juntos com a contestação [ vide fls. 268 e segs – II Volume]..
É o que resulta da matéria apurada em 17 a 25
[
17. Efetivamente, em 27.2.2013, a R. enviou para a morada da A. em Lisboa uma proposta de extinção do seu posto de trabalho, que foi aceite nessa mesma data pela A.
18. Com data de 27/02/2013 as partes celebraram o acordo de cessação do contrato de trabalho nos termos que constam de fls. 321 verso a 327 verso dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzidos, fazendo cessar o contrato a 31/01/2013.
19. No âmbito do dito acordo declararam ambas as partes na cláusula 10.2 que a ré se comprometia a efetuar o pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas em Portugal a partir de 01/01/2010 até à data da cessação nos termos que constam da dita cláusula.
20. Autora e ré celebraram em Lisboa, em 09/09/2013, outro acordo em que estabeleceram o pagamento pela ré à autora da quantia de € 36.472,30 com os fundamentos que constam de fls. 166 a 167 verso dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
21. A ré não efectuou descontos por conta da autora na Segurança Social portuguesa.
22. No dia 01/04/2013 a ré inscreveu-se na Segurança social para efeitos de pagamento de contribuições devidas.
23. Por fax datado de 18/04/2013 a ré requereu junto do Centro Distrital da Segurança Social de Lisboa a sua inscrição e da sua trabalhadora, ora autora, para os efeitos de regularizar todas as contribuições-quotizações em dívida e/ou em atraso com a maior brevidade possível, em termos e condições que constam de fls. 263 a 267 verso dos autos e que se dão por integralmente reproduzidos.
24. A Segurança Social Portuguesa respondeu à ré negando essa pretensão em 30/04/2013 e com os fundamentos que constam de fls. 271 verso e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
25. A X Employee Benefits pagou, em 08/05/2015, à Segurança Social Portuguesa as contribuições e quotizações devidas sobre o valor de € 417.958,83 referente ao trabalho desenvolvido pela autora em Portugal durante o destacamento] , cumprindo , de novo , atentar que apenas na ausência de prova do cumprimento de tais medidas, se presume a sua culpa.
Ora da matéria apurada em 23 e 24  resulta evidente que a Ré efectivamente tentou regularizar a situação da Autora  no tocante ao período em causa .  
Anote-se , aliás , que a Autora , na qualidade de credora , também não provou que diligência diversa da que usou a Ré devia ter usado em face da obrigação que assumiu .
Improcede , assim, o recurso nesse ponto não cumprindo, pois, condenar a Ré na pretensão deduzida a título principal.
***
Mas e quanto à pretensão formulada pela Autora a título subsidiário nos artigos 68º a 73º  da petição inicial [32] nos seguintes moldes:
«
68º
Quando assim se não entenda, o que se admite por mera hipótese de raciocínio, sempre se teria de concluir que a R obteve um enriquecimento ilícito à custa do
empobrecimento da A.
69º
Na verdade, ao não ter efectuado os descontos devidos sobre o valor global de € 561.233,04, a R. locupletou-se à custa da A., sem qualquer causa justificativa, com a quantia de € 133.292,84 ( 561.233,04 x 23,75%).
70º
Tanto mais que a R. já recuperou no corrente ano de 2017 as contribuições relativas ao período de 1.1.2010 a 31.1.2013 que pagou no Reino Unido, no montante global de € 91.415,67.
71º
Acresce que o enriquecido responde também pelas quantias que o empobrecido deixe de receber quando o enriquecido tem conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento e da falta do efeito que se pretendia obter com a prestação (artº
480 do C. Civil).
72º
Ora, é manifesto que a R., enquanto empregadora, tem conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento e dos efeitos da falta de pagamento das contribuições devidas à Segurança Social na reforma dos trabalhadores.
73º
Consequentemente, de acordo com as regras aplicáveis no âmbito do instituto do enriquecimento sem causa, e tendo em consideração o limite imposto pelo artigo 479 nº 2 do C. Civil, a R. sempre teria de entregar à A. a quantia de € 133.292,84. » - fim de transcrição.
Atento o anteriormente decidido no presente acórdão tal apreciação   não se mostra prejudicada.  
A Autora funda tal pretensão no  instituto do enriquecimento sem causa.
Neste ponto seguiremos de perto o raciocínio exarado no aresto do STJ , de 02-07-2009 , proferido no âmbito do processo nº 123/07.5TJVNF.S1, Nº Convencional: 2ª Secção, Relator Conselheiro Serra Baptista , acessível em www.dgsi.pt , no qual se referiu:[33]
«
Ora, é princípio geral do nosso direito civil o da proibição do enriquecimento injustificado, sendo o mesmo, como já dito, uma das fontes das obrigações - secção IV, do capítulo II, do Título I, do Livro II do Código Civil. (3)
Preceituando a respeito o art. 473º deste mesmo diploma legal:
“1. Aquele que sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.
2. A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.”
Sendo, assim, pressupostos do enriquecimento sem causa:
a) a existência de um enriquecimento;
b) a obtenção desse enriquecimento à custa de outrem;
c) a ausência de causa justificativa para o enriquecimento (4).
Não bastando, pois, que uma pessoa tenha obtido vantagem económica à custa de outra, sendo ainda necessária a ausência de causa jurídica justificativa da deslocação patrimonial (sendo apenas esta e não qualquer outra situação de enriquecimento que aqui poderá estar em causa).
Sendo, pois, necessária, repete-se, a ausência de causa jurídica para a recepção da prestação que foi realizada.
Cabendo ao autor que pede a restituição com base no enriquecimento da ré à sua custa sem causa justificativa, por força do preceituado no art. 342º, nº 1 do CC, o ónus de alegação e prova dos referidos pressupostos.
Designadamente, o ónus da prova da ausência de causa da sua prestação pecuniária (5)., sendo a carência de causa justificativa da deslocação patrimonial facto constitutivo de quem requer a restituição.
Onerando, assim, o autor, que invocou o direito em referência, com a sua prova (citado art. 342º, nº 1).
Tendo, pois, a falta de causa de ser não só alegada, como também provada, por quem pede a restituição.
Não bastando, segundo as regras do onus probandi, que não se prove a existência de uma causa da atribuição, sendo preciso convencer o tribunal da falta de causa (6).
Ora, a ausência de causa justificativa é, seguramente, o conceito mais indeterminado no âmbito do enriquecimento sem causa. Sendo o mesmo muito controvertido e difícil de definir (7).
Considerando, em regra, a doutrina que o enriquecimento não terá causa justificativa quando, segundo os princípios legais, não haja razão de ser para ele; quando, segundo o sistema jurídico, deve pertencer a outrem e não ao efectivo enriquecido.
Acontecendo a falta de causa justificativa do enriquecimento quando não existe uma relação ou um facto que, à luz do direito, da correcta ordenação jurídica dos bens ou dos princípios aceites pelo ordenamento jurídico, legitime tal enriquecimento, por dever pertencer a outra pessoa, por se tratar de uma vantagem que estava reservada ao titular do direito.
Verificando-se a falta de causa justificativa do enriquecimento quando, segundo a lei, este não deve pertencer àquele que dele beneficia, mas a outrem. (8)
Devendo o enriquecimento ser reputado sem justa causa quando o direito o não consente ou aprova e quando no caso concreto se não configure uma relação ou um facto que, de acordo com os princípios do sistema jurídico, justifique a deslocação patrimonial operada (9)
Traduzindo-se, em suma, a falta de causa justificativa na inexistência de uma relação ou de um facto que, à luz dos princípios aceites no sistema, legitime o enriquecimento (10)/ (11)
Devendo, in dubio, considerar-se que a deslocação patrimonial verificada teve justa causa (12).
Pois, se o onerado com o ónus em apreço não fizer a prova dos factos que lhe são impostos, a causa será julgada contra ele (13).
Tudo isto, mesmo não tendo a ré logrado provar a matéria que concretamente alegou a propósito da justificação da entrega do dinheiro por banda do autor.
Pois, como dissemos, o ónus da prova cabe a este (14).» - fim de transcrição.[34]
Por outro lado, cumpre ainda atentar que tal como se refere em aresto do STJ , de 14-03-2023, proferido no processo nº 5837/19.4T8GMR.G2.S1, Nº Convencional:1.ª Secção,Relator Conselheiro Pedro de Lima Gonçalves , acessível em www.dgsi.pt:
«
I - A obrigação de restituir ancorada no enriquecimento sem causa ou locupletamento à coisa alheia apenas nasce quando ocorre a verificação cumulativa dos seguintes três requisitos:
1.º Tem de existir um enriquecimento, que consiste na obtenção de uma vantagem de carácter patrimonial, que tanto pode constituir um aumento do ativo patrimonial como uma diminuição do passivo, com origem num negócio jurídico, como num ato jurídico não negocial ou num simples ato material.
2.º O enriquecimento não apresenta causa justificativa, que tanto pode ser por a mesma nunca ter ocorrido, como por ter deixado de existir, apesar de inicialmente existir.
A causa justificativa do enriquecimento sem causa não tem uma definição legal concreta, mas podemos acolher como princípio geral de que a mesma não existe quando, de acordo com a lei, o enriquecimento deva pertencer a outra pessoa. Para aferirmos se tal ocorre, devemos efetuar sempre um juízo direcionado para o caso concreto, pois o mesmo depende sempre da fonte de que emerge, e deve ser interpretado e integrando a lei à luz dos factos apurados.
3.º A obrigação de restituir pressupõe que o enriquecimento tenha ocorrido à custa de quem requer a restituição, isto é, é exigida uma correlação entre o enriquecimento e o empobrecimento, pois que o benefício obtido pelo enriquecido deve decorrer de um prejuízo ou desvantagem do empobrecido.
II - A par destes requisitos não podemos deixar de considerar a subsidiariedade deste instituto, qual se mostra expressamente plasmada no art. 474.º do CC.» - fim de transcrição.
Ora tal como resulta do facto assente em 29 a  Ré ao  não ter efectuado os descontos devidos sobre o valor global de € 430.873,77 ,
[ vide facto nº 29 :
€ 212.708,73  + 83.572,60 + € 134.592,24] , sendo que a X Benefits pagou a quantia  mencionada no facto nº 25 [ € 417.958,83]  acabou por se locupletar , sem qualquer causa justificativa, à custa da A , com a quantia de € 102.332,52 ( € 430.873,77  x 23,75%).
Na realidade , tal como a Autora invoca provou-se que a R.  recuperou do HMRC as quantias referidas nos factos assentes nºs 26,27 e 28 que totalizam £ 98.957,84 [ £ 77. 321,45 + £ 21.636,39]., sendo evidente que a Ré devia ter pago tal quantia à Segurança Social e que não o tendo feito esse facto gera empobrecimento no património da Autora circunstância de que a Ré tem perfeito conhecimento e consciência , pois de outro modo não teria , embora sem sucesso , tentado regularizar a situação.
Assim, em face da matéria provada em 10 a 15, 21 , 26 a 29 , 31 e 35 e 36 [
10. Em 2.7.2010 a A. e a R. acordaram no destacamento da A. para Lisboa.
11. O prazo do destacamento era de 3 anos, com início em 5.7.2010 e termo em 4.7.2013.
12. Foi acordado que durante o destacamento a A. desempenharia as funções de Sales Operation Manager nas instalações da Merecer Emplloyee Benefits – Mediação de Seguros Unipessoal, Lda, NIF 50602260.;
13. Nos termos do dito destacamento as partes acordaram que a autora receberia um salário base anual de € 166.568,00 e que os descontos efectuados seriam nos termos que constam da cláusula 3ª do dito documento que consta de fls. 23 verso a 27 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
14. Nem a ré nem a X Emplyee Benefits inscreveram a autora na Segurança Social em Portugal.
15. Tendo a R. continuado a fazer os descontos para a Segurança Social do Reino Unido (HM Revenue & Customs – daqui em diante designada abreviadamente por HMRC.
21. A ré não efectuou descontos por conta da autora na Segurança Social portuguesa.
26. Por carta datada de 26.01.2017, o HMRC comunicou à A. que lhe era devido o reembolso das quantias que lhe foram retidas pela R. a título de contribuições para a Segurança Social, no montante de £ 21.636,39.
27. Tendo-lhe devolvido essa quantia em 23.2.2017.
28. Tendo o HMRC reembolsado também nessa data a R. das quantias que pagou a título de contribuições da A. durante o período do destacamento em Lisboa, no montante global de £ 77.321,45.
29. Com efeito, no âmbito do contrato de trabalho, a R. e a X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda/ Nif 506022609 pagaram à A. os seguintes rendimentos entre 1.1.2010 e 31.1.2013:
2010: € 259.471,22 (€ 212.708,73 pagos pela R. e € 46.762,49 pagos pela X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda);
2011: € 263.590,94 (€ 83.572,80 pagos pela R. e € 180.018,14 pagos pela X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda);
2012: € 321.479,68 (€ 134.592,24 pagos pela R. e € 186.887,44 pagos pela X Employee Benefits – Mediação de Seguros Unipessoal Lda;
2013: € 134.650,03 (integralmente pagos pela X Employee Benefits - Mediação de Seguros Unipessoal Lda);
35. No dia 11/01/2011 a ré apresentou o requerimento junto da HMRC solicitando a emissão do certificado A1 que permitiria que esta continuasse a fazer descontos para a segurança Social daquele país.
36. A resposta a tal pretensão ocorreu em 06/07/2011 e consta de fls. 261 e 354 dos autos, tendo negado tal pretensão invocando que o pagamento das contribuições deve ser feito no país em que o trabalho é desenvolvido.
] afigura-se-nos que a Autora no âmbito da  pretensão que deduziu  fundada no enriquecimento sem causa logrou não só alegar , mas também provar os seus pressupostos, isto é:
a) a existência de um enriquecimento;
b) a obtenção desse enriquecimento à custa de outrem;
c) a ausência de causa justificativa para o enriquecimento.
Assim, atento o que acabou de se enunciar afigura-se-nos , com respeito por entendimento diverso, que tal pretensão deve proceder no supra citado montante de € 102.332,52 sobre o qual devem acrescer   juros de mora desde a data da citação até integral pagamento.
****
Em face do exposto, acorda-se em julgar o presente recurso parcialmente procedente e em consequência condena-se a Ré a pagar à Autora , a título do pedido deduzido subsidiariamente , a quantia de cento e dois mil , trezentos e trinta e dois Euros e cinquenta e dois cêntimos [ € 102.332,52 ] a qual será acrescida de juros de mora , à taxa legal, devidos desde a data da citação até integral pagamento.
Custas , em ambas as instâncias, na proporção do decaimento.
Notifique.

Lisboa, 06-03-2024
Leopoldo Soares
Alda Martins
Paula Doria Pott
_______________________________________________________
[1] Em 27-10-2017 – fls. 65.
[2] Fls. 238-239 – I Volume.
[3] Vide fls. 245 a 259 – II Volume.
[4] Fls. 300 v a 319 v – II Volume.
[5] Vide fls. 361 – II Volume.
[6] Fls. 361 a 368 – II Volume.
[7] Vide fls. 434 a 448 – II Volume.
[8] Fls. 496 a 509 – II Volume.
[9] Vide fls. 696 a 716 v – III Volume.
[10] Fls 763-763 v – III Volume.
[11] Vide fls. 462 a 770 – III Volume.
[12] Fls. 777 a 804.
[13] Fls. 805 a 817 v.
[14] Fls. 820.
[15] Vide fls. 825 a 827.
[16] Vide fls. 830/831.
[17] Diploma aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.
[18] O artigo 236º  do CC ( Sentido normal da declaração ) estabelece:
1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.
Por sua vez, o artigo 237º do mesmo diploma (Casos duvidosos) regula:
Em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações.
Quanto ao artigo 238º do CC ( Negócios formais) estatui:
1. Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
2. Esse sentido pode, todavia, valer, se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade.
[19] Vide neste sentido c. do STJ de 14.3.2007, doc SJ200703140042794 in www.dgs.pt.
18 Vide acórdão do STJ de 12 de Maio de 1999, CJSTJ Ano VII, Tomo II, pág 281.
[21].Vide Código Civil, Anotado, Pires de Lima e Antunes Varela, 3 ª edição, pág 39 citado pelo STJ no aresto de 12.5.1999.
[22] Vide Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 3ª edição, Volume II, pág 210.
[23] Obra citada ,pág 211.
[24] Vide Código Civil, Anotado, Volume  II,  pág 135, 2ª edição.
[25] Direito das Obrigações – 1980 ,Vol II, pág 234
[26] Direito das Obrigações, 3ª edição, pág 810.
[27]Segundo o qual:
22º
E conforme consta expressamente desse acordo celebrado em 9.9.2013, o mesmo teve em conta, entre outros, os seguintes pressupostos:
d. As contribuições para a segurança social respeitantes à 2ª CONTRATANTE
não foram pagas em Portugal , designadamente pela 1ª CONTRATANTE;
e. Por força do mencionado em d) supra, não foi concedido subsídio de desemprego à 2ª contratante por parte da segurança social portuguesa;
f. A 1ª CONTRATANTE está a desenvolver todas as acções legais perante a
segurança social Portuguesa por forma a que esta entidade aceite as contribuições devidas por aquela;
g. Como gesto de boa vontade, a 1ª CONTRATANTE está disposta a adiantar à
2ª CONTRATANTE a quantia total a que esta teria direito a receber a título de
desemprego;  ----- Vide fls. 10 v.
[28] Fls. 8
[29] Fls. 324 e 324 v.
[30] Que logrou o seguinte sumário:
« – (…) apenas assumiu uma obrigação de meios – em que o devedor apenas se compromete a desenvolver, prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza –, em contraposição com a obrigação de resultado – que se verifica quando se conclua da lei ou do negócio jurídico que o devedor está vinculado a obter um certo efeito útil.
II - Mesmo nas obrigações de meios, o devedor está em melhores condições do que o credor para provar se usou ou não a diligência devida e, no caso negativo, se foi impedido por algum facto que lhe não seja imputável. Assim, cabendo ao credor provar que diligência deveria ter usado, em face da obrigação que assumiu (trata-se da prova do conteúdo da obrigação, a qual compete ao credor).» - fim de transcrição.
[31] As notas de rodap
E devem ali ser consultadas.
[32] Vide fls. 8 v e 9,
[33] Que logrou o seguinte sumário:
«
1 - Nada obsta que, em princípio, gorada a acção com base no mútuo nulo por falta de forma, venha o mesmo autor, agora com fundamento no enriquecimento indevido, pedir ao mesmo réu o reembolso da mesma quantia.
2 – O instituto do enriquecimento sem causa surge-nos como fonte autónoma das obrigações, sendo certo que, de acordo com o princípio da subsidiariedade, o empobrecido só pode recorrer à acção de enriquecimento à custa de outrem, quando não tenha outro meio para cobrir os seus alegados prejuízos.
3 – Tendo o autor estruturado a sua acção com base no enriquecimento sem causa, compete-lhe alegar e provar os seus respectivos pressupostos, ou seja:
a) a existência de um enriquecimento;
b) a obtenção desse enriquecimento à custa de outrem;
c) a ausência de causa justificativa para o enriquecimento.
4 – Tendo, assim, a falta de causa de ser não só alegada, como também provada por quem pede a restituição.
5 – Traduzindo-se a falta de causa justificativa na inexistência de uma relação ou de um facto que, à luz dos princípios aceites no sistema, legitime o enriquecimento.
6 – E, se o onerado com o ónus em apreço não fizer a prova dos factos que lhe são impostos, a causa será julgada contra ele.
7 - Mesmo que a ré não tenha logrado provar a matéria que concretamente alegou como causa justificativa do dinheiro que pelo autor lhe foi entregue e que não devolveu.» - fim de transcrição.
[34] As notas de rodapé devem ser consultadas no aresto.