Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ARLINDO CRUA | ||
Descritores: | EXTINÇÃO DE SOCIEDADE DISSOLUÇÃO LIQUIDAÇÃO RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS PASSIVO RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DIREITO DE REGRESSO ÓNUS DA PROVA | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/04/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | I – - Extinta uma sociedade, após o percurso das etapas de dissolução e subsequente liquidação, existem relações jurídicas que subsistem e que se prolongam para além do termo da sua personalidade ; II – a problemática do activo e passivo superveniente, regulada nos artigos 162º a 164º, do Cód. das Sociedades Comerciais, determinou que a responsabilidade e titularidade passem, em determinados termos para os sócios da sociedade extinta e, existindo acções pendentes, a instância perdura, sendo a sociedade substituída pela generalidade dos sócios ; III - assim, extinta a sociedade, mas mantidos os direitos ou obrigações desta, são os sócios os novos titulares deste activo e passivo, com direito ao saldo da liquidação, distribuído mediante partilha ; IV - pelo que, nessa partilha, caso tenham recebido mais do que era o seu direito, pois tais activos deveriam ter sido destinados a solver dívidas da sociedade, terão de ulteriormente satisfazer o passivo reclamado e, caso tenham recebido menos, em virtude de não ter sido partilhado todo o activo social, têm direito a reclamá-lo ; V - todavia, a responsabilidade de cada sócio no cumprimento do passivo da extinta sociedade é limitado ao montante que recebeu da partilha, ou seja, cada sócio é responsável pelo montante que pessoalmente recebeu na partilha, e não por aquilo que os demais sócios tenham recebido ; VI - tal responsabilidade é solidária, pelo que, podendo cada um dos sócios ser demandado até àquele limite recepcionado, caso a sua responsabilidade proporcional relativamente aos demais sócios seja ultrapassada, não pode, com tal fundamento, escudar-se ao pagamento, antes operando posteriormente as proporções mediante o direito de regresso inscrito no nº. 3, do artº. 163º, do CSC ; VII - ou seja, todos os sócios estão vinculados a responder pelas dívidas supervenientes, devendo responder em idêntica medida (com consequente perda) à que responderiam casos tais dívidas tivessem feito reduzir, ab initio, o activo partilhável; VIII - o que tem fundamento numa ideia de devolução, ou seja, caso os sócios, na liquidação efectuada, tenham recebido mais do que deveriam caso todos os débitos societários fossem pagos, estão vinculados à sua posterior satisfação, à custa dos bens ou direitos societários que lhe tenham sido anteriormente entregues ; IX - relativamente ao ónus probatório da (in)existência de bens ou activo partilhados na decorrência da liquidação da sociedade, ou seja, se compete aos credores o ónus de alegação e prova da existência de bens sociais capazes de responder pela dívida societária, como facto constitutivo do seu direito, ou se, ao invés, sendo chamados os sócios a responder pela dívida societária, terão estes de alegar e provar a inexistência de bens partilhados como facto impeditivo do direito dos credores, tem existido controvérsia, nomeadamente jurisprudencial ; X - entendemos, na ponderação dos argumentos em equação e tutela da posição dos credores sociais, que demandando estes os sócios, nos quadros do nº. 2, do artº 163º, do CSC, de forma a ser-lhes pago passivo superveniente, incumbe aos sócios demandados o ónus probatório de alegação e prova de que nada receberam na partilha, como facto impeditivo do direito dos credores (o nº. 2, do artº. 342º, do Cód. Civil) – tese do facto impeditivo ; XI - ou seja, aos credores sociais incumbe apenas o ónus probatório dos factos constitutivos do seu direito creditório sobre a sociedade extinta, incumbindo aos ex-sócios alegar e provar, como excepção peremptória de que se trata, que da liquidação da sociedade não resultou qualquer saldo positivo ; XII - ou que não resultou saldo suficiente ou bastante para fazer face ao crédito reclamado, isto é, que naquele momento os credores estão impedidos de obter o ressarcimento, total ou parcial, do seu crédito sob a sociedade, em virtude de na liquidação desta não ter resultado qualquer saldo, ou não ter resultado saldo suficiente capaz de solver o crédito reclamado ; XIII - e não aos credores sociais o ónus de alegação e prova da existência de bens ou direitos sociais, recebidos ou partilhados pelos ex-sócios, em detrimento da satisfação do seu crédito, como eventual facto constitutivo do seu direito (o nº. 1, do artº. 342º, do Cód. Civil) – tese do facto constitutivo ; XIV – tendo-se apurado a existência de um activo societário (montante pecuniário), não tendo os ex-sócios alegado e provado que este foi consumido na liquidação de dívidas do ente societário (de forma a nada sobrar para partilha entre os sócios), mas não tendo a credora demandante logrado demonstrar em que medida tal quantia teria sido partilhada entre os antigos sócios da sociedade Ré, tal situação de dúvida quanto a esta realidade factual é resolvida, nos quadros do artº. 414º, do Cód. de Processo Civil, contra quem aproveitaria ou beneficiaria com a mesma, ou seja, contra a ex-sócia (ora Recorrente), a quem incumbiria provar que o montante que lhe coube na partilha não seria suficiente para fazer face ao pagamento do passivo social superveniente reclamado. Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do artº. 663º, do Cód. de Processo Civil | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]: I – RELATÓRIO 1 – G..., S.A., com sede no Edifício ..., ..., Rua ..., ..., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra: - S..., Lda., com sede na Avenida ..., ..., deduzindo o seguinte petitório: a) ser declarada a resolução do contrato de arrendamento, vigente entre a Autora e a Ré, com fundamento na falta de pagamento da renda, por período superior a três meses; b) ser a Ré condenada a desocupar o locado, entregando-o à autora livre de pessoas e bens, e no mesmo estado em que o recebeu; c) ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de € 7.053,20, correspondentes às rendas em dívida, acrescida de juros vencidos e vincendos, até integral e efectivo pagamento, e bem assim no pagamento de todas as rendas que se vencerem até à declaração de resolução do contrato, e respectivos juros vincendos; d) ser a Ré condenada ao pagamento de indemnização pela ocupação do imóvel, calculada em quantia equivalente ao dobro do valor das rendas actualizadas, pelo período decorrido entre a data da decisão de despejo e a data de entrega efectiva do imóvel; e) ser a Ré condenada nas custas, em procuradoria e demais encargos. Subsidiariamente, e para o caso de se considerar nulo o contrato promessa de arrendamento, sem conceder, peticionou dever a Ré: a) ser condenada a restituir o imóvel desocupado à Autora, no mesmo estado em que se encontrava, à data da ocupação; b) ser condenada a pagar à Autora as quantias devidas pela ocupação do imóvel, em causa, a título de indemnização, correspondente ao valor das rendas estipuladas no contrato, pelo período dessa utilização, bem como o valor estipulado como renda por cada mês de utilização que na pendência da acção judicial ainda vier a fazer do mesmo imóvel, tudo acrescido dos respectivos juros à taxa legal, até efectivo e integral pagamento; c) ser a Ré condenada nas custas, em procuradoria e demais encargos legais. Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte: - É proprietária do imóvel, sito na Av. ..., em ..., Lugar ..., por o ter adquirido à Caixa Geral de Depósitos ; - após a aquisição, foi confrontada com a existência de um contrato-promessa de arrendamento ; § tal contrato teria sido celebrado pelo anterior proprietário BB e a sociedade Ré, detida pelo mesmo BB em conjunto com a irmã, em 01-10-1991, com a validade de 5 anos, automaticamente renovável, e com a renda mensal de 10.000$00 (€ 49,88), a ser paga no primeiro dia útil anterior àquele a que respeita ; - a Autora, anteriormente à presente acção, procedeu a uma proposta de actualização da renda para o NRAU e interpôs, em 2014, no Balcão Nacional de Arrendamento, um procedimento simplificado de despejo por falta de pagamento de rendas que veio a ser considerado improcedente por o tribunal ter considerado não ter havido prévia notificação da alteração do senhorio ; - procedeu, então, à notificação da inquilina, em 06-07-2016, dessa alteração do proprietário do imóvel, seguindo-se o procedimento para actualização da renda ao abrigo do NRAU que, considerando os diversos requisitos legais e as características do imóvel, e tendo seguido os procedimentos legais que descreve, se fixou em € 1.750,89, com referência a 30-09-2016 ; - todavia, a inquilina não procedeu ao pagamento nem das rendas anteriores no valor unitário de € 49,88 nos meses de Julho a Setembro de 2016, nem das rendas posteriores, no valor actualizado de € 1.750,89, nos meses de Outubro de 2016 a Janeiro de 2017 ; - entende, por isso, encontrar-se em dívida, à data da entrada da acção (03-01-2017), o valor total de € 7.053,20, acrescido de juros de mora, o que justifica o pedido de resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas ; - bem como a condenação da Ré no pagamento das rendas vencidas, e ainda das rendas que se vencerem na pendência da acção e até ser decretada a resolução do contrato de arrendamento e, a partir daí, o valor correspondente ao dobro das rendas mensais, até efectiva entrega do locado. 2 – Devidamente citada, veio a Ré apresentar contestação, por impugnação e excepção, invocando questões referentes à liquidação da taxa de justiça, à ineptidão da p.i. e à ilegitimidade passiva por não ter sido demandada a subarrendatária do imóvel, ao valor da causa e à pendência de causa prejudicial nos tribunais tributários em que se discute a validade da venda do imóvel à Autora, tendo, ainda, impugnado parcialmente os factos alegados no articulado da Autora. Mencionou, igualmente, acerca da correspondência trocada entre as partes aquando do processo de transição para o NRAU e actualização da renda, reproduzindo parte dessas missivas, e alegando ter a Autora desconsiderado os argumentos então apresentados para se opôr a esse procedimento e que mantém actualidade. Mais alegou encontrar-se a proceder ao pagamento da renda ao senhorio por si conhecido em virtude de não ser claro ser a Autora a proprietária do imóvel, bem como a receber a renda da subarrendatária, sem que a questão da reavaliação fiscal do imóvel se mostre resolvida, entendendo, por isso, não poder proceder a acção de despejo por estarem pagas as rendas. Finalmente, requereu a intervenção nos autos da subarrendatária e a título de reconvenção pediu que fosse reconhecida a existência de uma servidão legal de passagem onerando o prédio em causa (arrendado) em favor de um prédio rústico confinante, “em benefício da proprietária desse imóvel, bem como dos legais representantes da Ré, bem como de CC e seus amigos, para que não sejam privados do direito que exercem há mais de 27 anos”. Conclui, no sentido de serem conhecidas e declaradas as nulidades e excepções invocadas, com a sua consequente absolvição da instância, ou, em alternativa, ser julgada improcedente a acção, com a sua consequente absolvição dos pedidos formulados. 3 – Conforme fls. 71, 72 e 76 a 78, veio a Autora apresentar réplica, bem como, correspondendo a convite, responder às excepções e ao pedido de suspensão da instância. Invocou a legal inadmissibilidade do pedido reconvencional, pois a proprietária do prédio vizinho é AA, igualmente titular de 75% das quotas da sociedade Ré, pelo que não tem esta mesma Ré legitimidade e interesse na dedução dessa pretensão. Apresentou, ainda, articulado de resposta às excepções no sentido de não se verificarem quaisquer dessas excepções, designadamente, por a causa pendente nos tribunais tributários não interferir na situação de incumprimento do contrato de arrendamento, conforme já fora decidido na anterior acção de despejo, acrescentando que, ao contrário do alegado na contestação, ocorreu a iniciativa do senhorio para que o contrato de arrendamento transitasse para o NRAU, mantendo-se a Ré sem pagar qualquer renda. 4 – Conforme despachos de fls. 82 e 83, 90 e 91 e 133 a 135: - dispensou-se a realização de audiência prévia ; - deferiu-se o incidente de intervenção principal de CC ; - determinou-se a junção aos autos de documentação para conhecer acerca da requerida suspensão da instância ; - julgou-se improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial ; - decidiu-se pela não admissibilidade da reconvenção deduzida pela Ré ; - fixou-se o valor da causa ; - julgou-se improcedente o Tribunal, em razão do valor, determinando-se a remessa dos autos ao Tribunal julgado competente (Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Cível ...). 5 – Em 28/06/2018, a Autora comunicou aos autos ter a Ré sido objecto de dissolução administrativa, e publicada o cancelamento da matrícula em 30-01-2018, com a consequente extinção da personalidade jurídica e caducidade do arrendamento, com efeitos na subsistência do alegado contrato de subarrendamento, pelo que peticionou a restituição imediata do imóvel. 6 – Por decisão de 06/09/2018, determinou-se: - não suspender a instância por se encontrar pendente o processo n.º 1322/08.... no Tribunal Tributário ... ; - atenta a dissolução da Ré arrendatária, há mais de seis meses, declarou-se extinto por inutilidade superveniente da lide o pedido de resolução do contrato de arrendamento, condenando-se a Interveniente a desocupar o locado e a entregá-lo livre de pessoas e bens ; - relativamente aos demais pedidos formulados na acção – condenação no pagamento das rendas vencidas e vincendas –, consignou-se que caberia à Autora, caso pretendesse o prosseguimento da acção para o efeito, alegar e provar que a sociedade Ré, entretanto extinta, tinha bens que foram partilhados pelos sócios, e, identificando os visados, requerer o prosseguimento da acção contra esses. 7 – Dessa decisão foi interposto recurso pelas Ré e Interveniente, tendo esta Relação, por douto Acórdão de 28/02/2019, decidido julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão de não suspensão da instância por causa prejudicial, bem como a caducidade do contrato de arrendamento e a obrigação da Interveniente subarrendatária entregar o locado. 8 – No que se reporta ao pedido subsistente, veio a Autora requerer o prosseguimento da acção, em 29/10/2019, deduzindo-o contra: - AA, residente na Rua ..., em ..., e - BB, residente na Rua ..., em ..., na qualidade de sócios da Ré declarada extinta, por estes terem recebido no âmbito de um processo de falência créditos no valor de € 808.952,58, de que era titular a mesma Ré, acrescentando ter-lhe o imóvel sido, entretanto, entregue em 03-05-2019. Alegou, em resumo, o seguinte: - a Ré S... foi objecto de dissolução administrativa, em 2017, tendo sido averbado o registo da dissolução, encerramento da liquidação e cancelamento da sua matrícula, na Conservatória do Registo Comercial ..., em 30.01.2018 ; - a mesma Ré, manteve um contrato de arrendamento, com a A. em vigor até 30.04.2019, sendo que os sócios da mesma Ré, procederam à entrega do mesmo imóvel arrendado, aos representantes da A., em 03.05.2019 ; - a sociedade Ré, que até inicio de 2018 não tinha qualquer atividade, tendo por isso sido dissolvida, foi entretanto contemplada com o recebimento, em processo de falência, do valor de 808.952,58€, tendo os seus sócios recebido o valor, por conta da empresa, conforme documento de rateio da falência da So..., S.A. ; - tendo atualmente, ainda, um potencial crédito de 89.783,62€, que poderá receber, caso o Juízo de Comércio ..., no processo de falência 75/14...., assim o decida ; - o montante de 808.952,58€, atribuído em rateio à Ré S..., foi integralmente recebido pela sócia AA, em sua conta pessoal, no BCP ; - a manutenção do contrato de arrendamento, foi realizada no interesse exclusivo dos sócios da Ré, que apesar de terem sido demandados em Janeiro de 2017, judicialmente para desocuparem o imóvel, tudo fizeram para permanecer no mesmo, por mais de dois anos, sem pagarem qualquer renda, utilizando em seu exclusivo proveito ; - a A. durante vários anos, não só se viu impedida de obter qualquer rendimento do imóvel, onde tinha investido cerca de um milhão de euros, e cuja renda no mercado não seria inferior a 7,500E mensais, como continuou a ser penalizada com as contribuições e impostos elevados, relativos a uma mansão, em frente à praia, com piscina, bem como viu o mesmo imóvel deteriorado, aquando da sua entrega pelos ora Réus ; - à data da propositura da presente acção, em Janeiro de 2017, o valor em dívida em rendas era de 7.053,20€, sendo que no decurso da presente acção, até à entrega do locado, decorreram 27 meses de rendas em atraso, no montante mensal de 1.750,89€, o que perfaz o montante de 47.274,03€, o que somando ao valor de 7.053,20€, perfaz o total de 54.327,23€ em dívida, a que deverá acrescer o valor dos juros vencidos e vincendos, até ao integral e efetivo pagamento ; - pelo que está plenamente verificada a condição de prosseguimento da presente acção, contra os sócios da Ré, em nome pessoal, bem como na qualidade de representantes do sócio falecido, DD, do qual são herdeiros, na herança aberta por óbito do mesmo ; - requer a Autora, nos termos dos ares 162, n°s 1 e 2, e 163, n°s 1 e 2 do CSC, o prosseguimento dos presentes autos, porquanto a Ré S..., Lda, entretanto extinta, era titular de um ativo, a saber créditos no processo de falência da So..., S.A., a correr os seus termos sob o n° 75/ A...., no Juízo de Comércio ..., os quais foram pagos e partilhados pela sócios da mesma empresa, supra identificados, a saber AA e BB, em nome pessoal e na qualidade de herdeiros do terceiro sócio da Ré, DD, sócios estes que utilizaram, em beneficio próprio o imóvel arrendado, agravando o prejuízo da Autora. Conclui, pela substituição da Ré dissolvida pelos sócios ora indicados, os quais devem ser condenados “no pagamento das rendas vencidas, até 30.04.2019, no valor total de 54.327,23 €, em dívida, a que deverá acrescer o valor dos juros, vencidos e vincendos, até ao integral e efetivo pagamento, conforme peticionado na presente acção”. 9 – Proferido despacho a determinar o prosseguimento do processo contra os referidos sócios, nos termos dos arts. 162.º e 163.º do Código das Sociedades Comerciais, e tendo sido devidamente citados, vieram, em conjunto, contestar, alegando, em síntese, que: · reiteram a existência de causa prejudicial por não estar ainda decidida a acção pendente nos tribunais tributários a respeito da nulidade da venda mediante a qual a autora adquiriu o imóvel ; · existe inutilidade superveniente da lide, por apenas poderem ser responsáveis até ao montante que tenham recebido na partilha do património da sociedade existente na data da dissolução, o qual não existia por ter havido uma dissolução administrativa sem ter sido liquidado qualquer activo ou passivo ; · entendem que, sendo verdade que a mandatária judicial dos antigos sócios recebeu, em nome e interesse daqueles, em Maio de 2019, diversas quantias, não se pode afirmar que esses montantes foram recebidos pela Ré dissolvida, pois os sócios receberam por direito próprio ; · no que concerne à transição do contrato de arrendamento para o NRAU, de que era condição para tal a iniciativa do senhorio e o cumprimento das disposições do NRAU, inexistirem na data da entrada da acção em juízo quaisquer rendas em dívida por estarem a ser pagas ao anterior proprietário, reproduzindo a defesa já apresentada na contestação inicialmente apresentada pela Ré. 10 – A Autora veio responder ao articulado apresentado pelos Réus substitutos, bem como liquidar o valor total das rendas em dívida no montante total de € 56.028,48, correspondendo a 3 meses no valor mensal de € 49,88 (Julho a Setembro e 2016) e 32 meses no valor mensal de € 1.750,89 (Outubro de 2016 a Maio de 2019) acrescido de juros de mora (cfr. requerimento de rectificação apresentado em 24-10-2022), defendendo que a Ré dissolvida era já putativa credora no processo de falência em que foram realizados os pagamentos aos sócios, segundo o mapa de rateio que juntou aos autos, e que estes receberam os referidos valores por conta da Ré dissolvida. Acrescentou ter, entretanto, sido proferida sentença no processo pendente no tribunal tributário no sentido da improcedência do pedido de anulação da venda do imóvel em causa nos autos, pelo que carece de fundamento a insistência na suspensão da instância por causa prejudicial. 11 – Em resposta, os Réus substitutos alegaram ter a Ré dissolvida reclamado créditos nessa falência em 1993 mas apenas em 2019 ter sido efectuado o mapa de rateio que veio a ser objecto de diversas reclamações, apenas transitado posteriormente. 12 – Os Réus substitutos informaram não ter interposto recurso da decisão proferida pelo tribunal tributário, pelo que ficou prejudicada a invocada suspensão por causa prejudicial. 13 – Foi realizada a audiência prévia, conforme acta de 20/04/2022, no âmbito da qual: · proferiu-se saneador stricto sensu ; · fixou-se o objecto do litígio: “Decidir se os intervenientes passivos na qualidade sócios da sociedade arrendatária, dissolvida na pendência nos autos devem responder pelas rendas relativas à ocupação do imóvel desde Setembro de 2017 até à entrega do locado em 3 de Maio de 2019” ; · fixaram-se os temas da prova: “1. O contrato de arrendamento transitou para o NRAU e se o valor da renda se fixou em € 1.753,20 por mês. 2. Se encontram em dívida 31 rendas mensais, com vencimento nos respectivos meses de Setembro de 2017 a 03 de Maio de 2019, e se tal ascende ao valor total de € 54.327,23. 3. À sociedade arrendatária dissolvida foi reconhecido o direito a € 808.952,58, no âmbito do rateio efectuado no processo de insolvência da sociedade So..., S.A., com referência ao processo de falência 75/14..... 4. Esse montante foi recebido pelos sócios da sociedade ré dissolvida na pendência dos autos correspondentes aos ora intervenientes passivos” ; · apreciaram-se os requerimentos probatórios ; · designou-se data para a realização da audiência de julgamento. 14 – Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento com observância do formalismo legal, conforme actas de 26/10/2022 e 03/11/2022. 15 - Posteriormente, em 13/02/2023, foi proferida sentença, traduzindo-se a Decisão nos seguintes termos: “Pelo exposto, julgo a presente acção intentada por G..., S.A. contra S..., Lda., sociedade extinta no decurso dos autos e substituída pelos seus sócios AA e BB, parcialmente procedente no que se refere ao pedido subsistente e, consequentemente, condeno os réus substitutos a pagar a autora a quantia total de € 26.412,99, acrescida de juros de mora comerciais contados desde a data de vencimento de cada uma das rendas em dívida até integral e efectivo pagamento. Custas pela autora e pelos réus substitutos no que se refere ao pedido subsistente na proporção do respectivo decaimento. Notifique e registe”. 16 – Inconformada com o decidido, a Chamada Ré substituta AA interpôs recurso de apelação, em 28/03/2023, por referência à sentença prolatada. Apresentou, em conformidade, a Recorrente as seguintes CONCLUSÕES: “IV. Por Sentença datada de 13/02/2023, veio o Tribunal a quo a condenar “…os réus substitutos a pagar à autora a quantia total de € 26.412,99, acrescida de juros de mora comerciais contados desde a data do vencimento de cada uma das rendas em dívida até integral e efectivo pagamento.” V. Para tanto, deu o Tribunal a quo como provado que: VI. “21. No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de na sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu à extinta sociedade ré o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22. VII. 22. Tal transacção foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso. VIII. 23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que a sociedade ré receberia, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento. IX. 24. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB, seu irmão, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos em substituição da ré dissolvida e liquidada.” – Cfr. Pág. 11 da Sentença de 13/02/2023. X. O Tribunal a quo fundamentou a sua convicção no seguinte: XI. “Finalmente, no que respeita à extinção da ré sociedade e ao recebimento pelos sócios seus substitutos de activos de que esta fosse titular (temas da prova n.º 3 e 4), teve o tribunal em consideração a certidão do registo comercial da ré junta em 29-10-2019 da qual resulta ter esta sido dissolvida e, de imediato, decretada a sua dissolução e cancelamento da matrícula, com efeitos a 30-01-2018, bem como os elementos relativos ao processo de falência em que a ré era credora que foram trazidos aos autos pelas partes através do 2.º requerimento de 29-10- 2019, do requerimento de 26-10-2022 e dos documentos juntos na audiência de julgamento na mesma data, tendo ainda sido valorado o que resultou da confissão objecto do depoimento de parte prestado pelos réus substitutos em que admitiram ter sido aí reconhecido e pago um crédito no valor de € 897.836,22 (cfr. assentada). XII. De referir a este respeito que, sem prejuízo das partes se terem referido à dissolução administrativa da ré sociedade, tal circunstância não ficou cabalmente demonstrada por não ter sido apresentada qualquer prova documental respeitante à liquidação ter sido efectuada ao abrigo do DL n.º 76- A/2006, de 29-03, sendo certo que da leitura do registo comercial parece resultar que chegou a haver uma dissolução administrativa pendente em 2017 mas não ser claro se o cancelamento da matrícula em 2018 foi na sequência desse processo, sendo certo que em todo o caso não foi apresentado documento que ateste a inexistência de activo a partilhar nessa data. XIII. Em qualquer caso, decorre dos elementos juntos aos autos por referência ao processo de falência que correu termos no tribunal do comércio ..., no qual a ré sociedade já era parte e em que, como aqui, foi substituída pelos seus sócios em virtude da sua extinção na pendência do processo, ter aí sido celebrada uma transacção a respeito do mapa de rateio que foi homologada por sentença e levou a que os sócios da ré, em substituição desta, recebessem o mencionado valor, pelo que foi dado como provado que esta era titular de um activo no referido montante. XIV. No mais, resulta do requerimento apresentado nesses autos de falência pelos sócios (cfr. documento junto com o requerimento de 29-10-2019), e foi admitido em declarações de parte pelos próprios, que esse valor foi pago e deu entrada na conta bancária da mandatária nesses autos, correspondente à aqui ré substituta e igualmente mandatária, Dra. AA, que fez os pagamentos conforme combinado entre os sócios, não subsistindo, assim, dúvidas dos aqui réus substitutos terem recebido pessoalmente um valor que correspondia a um crédito da ré sociedade que lhe foi reconhecido no mencionado processo de falência. XV. Neste sentido, decorre da leitura da decisão proferida em 11-04-2019 no processo de falência e que terminou com a sentença homologatória da transacção parcial relativa ao mapa de rateio, os contornos em que esse acordo foi celebrado, sendo certo que resulta demonstrado, por um lado, que a ré sociedade já era titular de um crédito reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos aí proferida, e, por outro, que foi substituída pelos respectivos sócios no seguimento do cancelamento da sua matrícula, e que o tribunal ordenou a rectificação do mapa de rateio e o pagamento à ré sociedade, substituída pelos seus sócios, do referido montante de € 897.836,22, o qual foi pedido que fosse liquidado através de transferência para uma conta da aí ré substituta e mandatária, que o recebeu em nome dos sócios. Tal pagamento, por conseguinte, entendeu o tribunal dever-se a estes substituírem a ré sociedade naquilo que era o seu activo, tudo se passando como se se tratando de uma partilha de um activo societário de elevado valor que entrou na sua titularidade em razão da sua qualidade de sócios, sem que, no entanto, e apesar do tribunal ter tentado a conciliação das partes, os mesmos sócios tenham manifestado qualquer vontade de liquidar as alegadas rendas em dívida em valor correspondente a cerca de 1/16 desse montante.” – Cfr. Págs. 14 e 15 da Sentença de 13/02/2023. XVI. Sucede, porém, que a Sentença não poderá proceder, nem de Direito, nem de Facto. XVII. Com efeito: XVIII. Recuperando a Sentença n.º ...16, proferida nestes autos em 06/09/2018, “…caso (a autora) pretenda o prosseguimento da acção para a apreciação respectiva (dos demais pedidos para lá do despejo e restituição do locado), deverá alegar e provar que a sociedade ré, entretanto extinta, tinha bens que foram partilhados por todos ou por alguns sócios, identificar os visados e, requerer o prosseguimento do processo contra esses, conforme resulta das disposições conjugadas dos artºs 162, nºs 1 e 2 e 163, nºs 1 e 2 do CSC.” (o sublinhado é nosso). XIX. S.m.o., mostra-se evidente que a autora não alegou, nem provou, que a sociedade ré, entretanto extinta, tinha bens – naturalmente e por conjugação com o disposto nos mencionados arts. 162., 1 e 2 e 163.º, 1 e 2 do CSC – à data da sua extinção. XX. O que a autora veio invocar em 29/10/2019 foi que os antigos sócios da sociedade ré extinta em 30/01/2018, receberam em maio de 2019, a quantia de € 808.952,58, no âmbito de processo judicial alheio a este, “na qualidade de substitutos sucessores” da sociedade ré, configurando o predito direito (e recebimento) como de um crédito/activo superveniente da sociedade ré nos presentes autos. XXI. Ora, o que esteve em causa nos autos a que se alude – que correram termos sob o n.º 75/14...., pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ..., – não foi um crédito oportunamente reclamado nesses autos de falência pela sociedade ré, entretanto extinta, lhe tivesse sido “reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos aí proferida” – contrariamente ao que refere o Mmo. Sr. Juiz a quo na sua fundamentação – Cfr. Fls 15 da Sentença e que agora se transcreve apenas para efeitos de melhor correspondência: “…, decorre da leitura da decisão proferida em 11-04-2019 no processo de falência e que terminou com a sentença homologatória da transacção parcial relativa ao mapa de rateio, os contornos em que esse acordo foi celebrado, sendo certo que resulta demonstrado, por um lado, que a ré sociedade já era titular de um crédito reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos aí proferida, e, por outro, que foi substituída pelos respectivos sócios no seguimento do cancelamento da sua matrícula, e que o tribunal ordenou a rectificação do mapa de rateio e o pagamento à ré sociedade, substituída pelos seus sócios, do referido montante de € 897.836,22, o qual foi pedido que fosse liquidado através de transferência para uma conta da aí ré substituta e mandatária, que o recebeu em nome dos sócios…”, XXII. Mas uma verdadeira sub-rogação em créditos anteriormente reconhecidos pelo Tribunal da falência, na Sentença de Verificação e Graduação de Créditos, a favor de entidade terceira – CGD, substituída por C..., SA, por cedência de créditos –, que os prestadores de garantias imóveis acessórias desde há muito se vinham arrogando o direito de receber – Cfr. Despacho/Sentença n.º ...29, proferido pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ... em 11/04/2019, junto aos presentes autos de Despejo em sede de audiência de julgamento de 24/10/2022, e que pela relevância para os presentes efeitos agora se transcreve parcialmente: XXIII. “Esta transacção tem por objecto a reclamação apresentada no requerimento datado de 07.03.2019 com a referência ...79. XXIV. Este requerimento implica uma apreciação dos créditos relativos às inscrições das hipotecas C4 e C8, tendo em consideração todos os elementos juntos aos autos, o que vem referido na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, que prevê a possibilidade da S... e BB se sub-rogarem na posição da Caixa Geral de Depósitos na divisão pelos credores do produto que advenha da liquidação dos bens integrantes da massa falida, na medida em que prestaram garantias e nessa medida acabaram por pagar créditos da falida, desde que demonstrem que a Caixa Geral de Depósitos já obteve pagamento no âmbito da execução fiscal com a venda dos imóveis dados em garantia (hipotecas) porquanto a CGD deixará de ser credora nesta falência.” – o sublinhado é nosso. XXV. Como resulta claro e cristalino da mera leitura do referido aresto judicial, XXVI. Não estava em causa um crédito reclamado pela sociedade ré à falida nesses autos, XXVII. Portanto, uma expectativa de “crédito/activo” a que a sociedade ré pudesse aspirar por efeito de anterior reconhecimento em sentença de verificação e graduação de créditos, XXVIII. Mas verdadeiramente a invocação de exercício de dois direitos de sub-rogação, pela sociedade ré e por BB, na medida em que prestaram garantias e nessa medida acabaram por pagar créditos da falida, desde que demonstrem que a Caixa Geral de Depósitos já obteve pagamento no âmbito da execução fiscal com a venda dos imóveis dados em garantia (hipotecas) porquanto a CGD deixará de ser credora nesta falência. - – Cfr. Despacho/Sentença n.º ...29, proferido pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ... em 11/04/2019, junto aos presentes autos de Despejo em sede de audiência de julgamento de 24/10/2022. XXIX. Mais resulta do referido Despacho/Sentença, proferido nesse processo de falência em 11/04/2019, que XXX. “Resulta dos autos que a sociedade S..., Lda. foi liquidada. XXXI. Assim, esta passará a ser representada pelos seus sócios, pois nos termos do artigo 160º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, a sociedade considera-se extinta pelo registo de encerramento da liquidação. XXXII. Mais, determina o artigo 162º do mesmo diploma legal que as acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, não havendo lugar à suspensão da instância nem a habilitação. XXXIII. Assim, relativamente a esta sociedade credora será representada pelos seus sócios. XXXIV. No entanto, continuaremos a fazer referência à sociedade S.... XXXV. Conclui-se pois, que a sentença de verificação e graduação de créditos reconhece o direito de BB e S... S.A. se substituírem na posição da credora Caixa Geral de Depósitos, por referência às hipotecas por estes prestadas para garantir créditos daquela CGD, na medida em que esta obteve/foi ressarcida no âmbito do processo de execução fiscal uma vez os bens lhe foram adjudicados com a dispensa do pagamento do preço, tendo a Caixa Geral de Depósitos transmitido os bens, com a consequente extinção dos créditos reclamados nesta falência. XXXVI. Todos estes factos se encontram demonstrados nos autos – cfr. Documentos juntos. (…) XXXVII. A sub-rogação traduz-se numa forma de transferência de créditos, correspondentemente regulada no Código Civil no capítulo relativo à "transmissão de créditos e dívidas". XXXVIII. Pressuposto necessário e essencial da sub-rogação ou seu fundamento jurídico base é o cumprimento duma obrigação por terceiro – art. 592º, nº1, do Código Civil”. XXXIX. Tendo havido um outro credor nesses autos de falência que se havia oposto a tal pretensão de sub-rogação – a C..., S.A. - abriu-se espaço entre os reclamantes desavindos para elaboração de um acordo de transação nos termos da qual: XL. “Atenta a transacção junta aos autos, nos termos da qual, em suma, e tendo em consideração a parte que interessa aos presentes autos: XLI. - A C... cede à S... o valor que lhe coube no rateio por conta da inscrição da hipoteca C4 (4º lugar) no montante de 897.836,22 euros (oitocentos e noventa e sete mil, oitocentos e trinta e seis euros e vinte e dois cêntimos), desistindo desta parte do pedido a favor dos sócios da extinta S..., requerendo que no rateio este valor seja entregue aos mesmos. XLII. - Por sua vez os sócios da extinta S... e BB declaram, em suma, que com a entrega desta quantia nada mais têm a reclamar ou a requerer no âmbito deste processo de falência por conta das garantias que prestaram à Caixa Geral de Depósitos a respeito das quais lhes foi reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos o direito de se sub-rogarem na posição da referida Caixa Geral de Depósitos, na medida em que viessem demonstrar que esta foi paga no âmbito da execução fiscal e porquanto nesse caso deixaria de deter a qualidade de credora nestes autos.” XLIII. O despacho/sentença acima referido foi proferido em 11/04/2019, ou seja, muito para além da data de extinção da sociedade ré, que ocorreu em 30/01/2018. XLIV. Fica, assim, cabalmente demonstrado não só que: XLV. O valor recebido pela ora recorrente, em representação dos antigos sócios da sociedade ré e de BB – por ser sua mandatária forense e deter especiais poderes para esse efeito nos referidos autos de falência – não corresponde a qualquer crédito reclamado contra a falida no âmbito dos autos de falência, mas sim verdadeiramente a dois créditos transacionados com outro credor no âmbito desse mesmo processo, por exercício de direito de sub-rogação legal em crédito reconhecido a terceiro (CGD) e concorrente com o da entidade interveniente na transação (C..., S.A.), o que, de resto, se conclui pelas expressões “…desistindo desta parte do pedido a favor dos sócios da extinta S...” e “os sócios da extinta S... e BB declaram, em suma, que com a entrega desta quantia nada mais têm a reclamar ou a requerer no âmbito deste processo de falência por conta das garantias que prestaram à Caixa Geral de Depósitos”, não resultando do referido acordo que os antigos sócios da sociedade ré ou BB estivessem inibidos de reaver quaisquer outros créditos que houvessem de receber por conta de reclamações próprias que houvessem sido reclamadas, verificadas e reconhecidas no âmbito dos referidos autos; XLVI. E, ainda, que a transação homologada pelo despacho/sentença de 11/04/2019 foi celebrada entre os antigos sócios da sociedade ré extinta em 30/01/2018, BB e a C..., SA, termos em que os valores recebidos por força da transação nunca chegaram a integrar o “activo” da sociedade ré, extinta desde 30/01/2018, antes tendo sido transacionados e recebidos por estes por direito próprio – BB, enquanto proprietário original de dois dos imóveis dados em garantia e entretanto vendidos, e os antigos sócios da sociedade ré extinta em 30/01/2018, em termos individualmente considerados dos respectivos interesses, por força do disposto pelo art. 162.º e 164.º, ambos do CSC. XLVII. Decorre do supra exposto que a sociedade Ré nada recebeu por conta de créditos que houvesse reclamado nos autos n.º 75/14...., XLVIII. Nem que houvessem sido reconhecidos, bem como verificados, quaisquer créditos reclamados pela sociedade Ré no âmbito do predito processo de falência até 30/01/2018, data da sua extinção. XLIX. Por outro lado, ainda que os antigos sócios da sociedade ré houvessem recebido alguns valores referentes a créditos que tivessem sido reclamados, verificados e graduados para pagamento na falência referida, sempre o seriam por direito próprio, de representação automática e sucessiva na sequência da extinção da sociedade ré, nos termos do disposto pelo art. 162.º do CSC – de resto, em igualdade circunstancial com a prevista para o instituto da Representação Sucessória de herdeiros pré falecidos, prevista pelos arts. 2039.º, 2042.º, 2043.º e 2045.º, todos do Código Civil. L. Na representação sucessória, os descendentes representam o seu ascendente mesmo que tenham repudiado na sucessão deste, ou sejam incapazes em relação a ele – art. 2043.º CCivil. LI. E porquê? LII. Porque a sua qualidade de herdeiros por representação sucessória se dá por direito próprio e é independente da situação patrimonial do ascendente (herdeiro legitimário originário) pré falecido. LIII. Com efeito, se tais herdeiros houverem repudiado a sucessão do ascendente (herdeiro legitimário originário), ou mesmo que tenham sido declarados incapazes perante o representado sucessório, não serão chamados a pagar eventuais dívidas resultantes da sucessão deste último, fazendo seus por direito próprio os bens que lhe advenham por direito de representação em sucessão daquele que era, à partida, o putativo herdeiro da actual sucessão. LIV. Ora, no acervo patrimonial dos falecidos não são considerados quaisquer eventuais e futuros direitos de herança ou legado. O património sucessório corresponde ao acervo patrimonial efetivo existente na esfera jurídica do de cujus à data da sua morte – não sendo lícito contabilizar putativos direitos sucessórios de que o de cujus pudesse arrogar-se expectativas. LV. Da mesma forma, a sociedade comercial ré considera-se extinta pelo registo do encerramento da liquidação – art. 160.º, 2, do CSC. LVI. Os antigos sócios de sociedades comerciais extintas “…respondem pelo passivo social…até ao montante do que receberam na partilha…” – cfr. art. 163, 1, do CSC – ou seja, e fazendo o paralelismo com o papel dos titulares do direito de representação sucessória, responderiam pelas dívidas do representado pré-falecido no âmbito da vocação sucessória aberta pelo falecimento deste (designadamente, pelas dívidas que o ascendente pré falecido tivesse à data do respectivo falecimento, até ao montante do que houvessem recebido na partilha dos bens que integrassem o património do ascendente pré falecido à data do respetivo falecimento). LVII. A sociedade comercial ré extinguiu-se em 30/01/2018, por ter sido nessa data registado o encerramento da liquidação, o qual, por ter ocorrido por dissolução administrativa, foi imediato, tendo-se concluído que a sociedade não tinha activo nem passivo. LVIII. O que a autora veio alegar, na verdade, não foi que a sociedade ré, entretanto extinta em 30/01/2018, tivesse bens no seu activo em 30/01/2018, os quais foram ulteriormente partilhados pelos antigos sócios, LIX. Mas que esta sociedade havia reclamado créditos nuns autos de falência, que lhe foram pagos em 2019, diretamente aos antigos sócios. LX. O que, na verdade, é falso, LXI. Não só porque a sociedade ré não detinha quaisquer bens (ou créditos) a compor o seu activo em 30/01/2018, LXII. Como acresce que os valores recebidos pelos antigos sócios no âmbito do processo de falência em apreço não correspondem a quaisquer créditos por si reclamados nesses autos de falência, LXIII. Mas, antes, ao exercício de um direito de sub-rogação legal em créditos reclamados, verificados e graduados a outro credor (CGD), totalmente alheio quer à sociedade ré extinta, quer aos antigos sócios desta. LXIV. Termos em que mal andou o Tribunal a quo ao dar como provados os factos descritos sob o n.º 21. da Sentença ora em crise, na medida em que não sendo verdade que LXV. “…a sociedade C... cedeu à extinta sociedade ré o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22”, LXVI. Pois o que veio efetivamente a verificar-se foi que “… A C... cede à S... o valor que lhe coube no rateio por conta da inscrição da hipoteca C4 (4º lugar) no montante de 897.836,22 euros (oitocentos e noventa e sete mil, oitocentos e trinta e seis euros e vinte e dois cêntimos), desistindo desta parte do pedido a favor dos sócios da extinta S..., requerendo que no rateio este valor seja entregue aos mesmos…”, tendo “…Por sua vez os sócios da extinta S... e BB declaram, em suma, que com a entrega desta quantia nada mais têm a reclamar ou a requerer no âmbito deste processo de falência por conta das garantias que prestaram à Caixa Geral de Depósitos…” – Cfr. despacho/sentença de 11/04/2019, a Fls. 7, LXVII. E, ainda, que “…Convém salientar que esta transacção em nada interfere com a distribuição aos restantes credores porquanto apenas se cinge à distribuição dos valores por conta da das inscrições das hipotecas C4 e C8, sendo que: LXVIII. - Na inscrição da hipoteca C4 a C... reclamou um crédito o montante de 5.177.522,17 euros que foi verificado e ao ceder o valor de 897.836,22 euros à S... apenas vai receber o valor de 4.279.685,95 euros. LXIX. - Na inscrição da hipoteca C8 a C... reclamou um crédito no montante de 3.569.647,15 euros que foi verificado e a S... e BB ao renunciarem a quaisquer outros direitos significa que a C... vai receber o valor de 1.100.354,97 euros, acrescido do valor sobrante que ficou retido para despesas processuais.” – Cfr. despacho/sentença de 11/04/2019, a Fls. 8, LXX. Pelo que a redacção do Facto Provado sob o n.º 21. da Sentença ora em apreço deverá ser substituída por outra, fiel à verdade do que ficou provado, com a seguinte redacção: LXXI. 21. “No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o eventual direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, por extinção da sociedade ré em 30/01/2018, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu aos antigos sócios da extinta sociedade ré e a BB o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22, inscrita como C-4”. LXXII. Relativamente aos Factos Provados n.ºs 22. e 23., deverão igualmente ser alterados por se mostrar que não correspondem à prova produzida em julgamento. LXXIII. Efectivamente, na data em que o Juízo de Comércio ... proferiu a Sentença, 11/04/2019, havia já o conhecimento da extinção em 30/01/2018 da sociedade comercial ré S..., que havia dado um imóvel como garantia ao cumprimento de obrigações da aí falida à CGD. LXXIV. Porém, e para mero efeito de conveniência de exposição do raciocínio judicial, o Mmo. Sr. Juiz titular do processo de falência preferiu continuar a fazer referência à sociedade comercial extinta, para evitar a necessidade de sempre ter de fazer a referência adequada a “S..., Lda., sociedade extinta em 30/01/2018, agora substituída pelos antigos sócios AA e BB, por força do disposto pelo art. 160.º, 1, do CSC…”, conforme decorre do exposto a Fls. 5 do despacho/sentença de 11/04/2019, que agora se transcreve para melhor alcance: LXXV. “Salienta-se desde já, LXXVI. Resulta dos autos que a sociedade S..., Lda. foi liquidada. LXXVII. Assim, esta passará a ser representada pelos seus sócios, pois nos termos do artigo 160º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, a sociedade considera-se extinta pelo registo de encerramento da liquidação. LXXVIII. Mais, determina o artigo 162º do mesmo diploma legal que as acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, não havendo lugar à suspensão da instância nem a habilitação. LXXIX. Assim, relativamente a esta sociedade credora será representada pelos seus sócios. LXXX. No entanto, continuaremos a fazer referência à sociedade S....”, LXXXI. Mais concluindo, de Fls. 7 a Fls 8 do mesmo aresto judicial, que LXXXII. “Como se disse os sócios da extinta S... e BB têm direito a sub-rogar-se nos direitos da Caixa Geral de Depósitos como determinado na sentença de verificação e graduação de créditos. LXXXIII. Tal legitima a sua intervenção nestes autos e na transacção junta aos autos. LXXXIV. A transacção junta aos autos retira o objecto à reclamação apresentada. LXXXV. Esta transacção consubstancia em parte uma cedência de parte do crédito da C... à S.... LXXXVI. Por sua vez a S... e BB renunciam a reclamar quaisquer outros créditos nesta falência. LXXXVII. Vejamos, LXXXVIII. A transação consubstancia um negócio de auto-composição do litígio, sendo este bilateral, uma vez que pressupõe um acordo de vontades entre Autor e Réu, mediante o qual, as partes podem pôr termo ao processo, por sua iniciativa, desde que verificados os pressupostos legais, estando perante uma manifestação do princípio do dispositivo (cfr. artigo 283º, nº 2 do Código de Processo Civil).”, LXXXIX. bem como ainda que XC. “Mais, os sujeitos processuais encontram-se representados por Mandatário com procuração com poderes especiais. XCI. Por se mostrar válida, quer pela disponibilidade do seu objeto, quer pela qualidade das pessoas nela intervenientes, homologo, pela presente sentença, a transação elaborada entre as partes, condenando e absolvendo ambas as partes, no estrito cumprimento do acordado e, em consequência, declaro extinta a instância, nos termos do disposto pelos artigos 277º, al. d), 283º, nº 2, 284º, 289º e 290º, nº 1 e 3, todos do Código Processo Civil.” XCII. Termos em que forçoso será concluir que, paralelamente ao regime da representação sucessória, os antigos sócios das sociedades comerciais entretanto extintas, assumem um papel de direito próprio e autónomo quanto a eventuais e futuros recebimentos que decorram de putativos direitos anteriormente titulados pelas sociedade comercial entretanto extinta, sem que tais recebimentos possam vir, posteriormente, a ser retractivamente considerados para efeitos de responsabilização desses antigos sócios por dívidas da sociedade comercial extinta – como, de resto, sucede com os representantes sucessórios, que são considerados titulares de direito próprio da herança em representação do ascendente pré falecido, sem qualquer responsabilidade de assunção ou dever de pagamento de dívidas imputadas ao representado ascendente pré falecido. XCIII. Por outro lado, no Mapa de Rateio original, datado de 18/02/2019 (junto aos autos na audiência de julgamento que teve lugar em 26/10/2022, mas que ora junta novamente para sua melhor compreensão e análise), constavam como entidades com direito de sub-rogação a sociedade Ré entretanto extinta em 30/01/2018, e BB, por terem essas entidades sido as prestadoras de garantias reais ao credor originário de tais hipotecas (C4 e C8) – Cfr. Créditos Verificados e Graduados para pagamento em 4.º e 7.º lugar. XCIV. Conforme decorre do despacho/sentença de 11/04/2019, a Fls. 6, que ora se transcreve para melhor compreensão: XCV. “Como tal, a sub-rogação verifica-se quando, cumprida a obrigação por terceiro, o crédito respectivo não se extingue, mas antes se transmite por efeito desse cumprimento para o terceiro que realiza a prestação (neste caso, BB e S....). XCVI. Deste modo, o crédito anteriormente pertencente ao credor pago ou indemnizado transmite-se para o sub-rogado (BB e S....) que, assim, ingressa e fica colocado na posição jurídica que o credor satisfeito antes detinha. XCVII. Logo, o crédito reconhecido à Caixa Geral de Depósitos poderá ser objecto de sub-rogação por BB e S... S.A. se o crédito da Caixa Geral de Depósitos for extinto. XCVIII. Assim, BB e S... S.A. vêm substituir-se ao credor (CGD) no exercício do seu direito de crédito. XCIX. O crédito dos sub-rogados (BB e S... S.A.) continua, assim, a ser o mesmo que pertencia ao primitivo credor (CGD). C. Isto porque, BB e S... eram titulares de bens que deram em garantia e que foram vendidos no âmbito do processo de execução fiscal, pelo que ficam sub-rogados nos direitos da CGD na medida em que resulta demonstrado que esta obteve pagamento no âmbito da execução fiscal, por via da adjudicação dos imóveis.” CI. Decorre do exposto que as partes que intervieram no acordo de transação homologado por sentença de 11/04/2019 foram, efetivamente, os antigos sócios da sociedade S... e BB, agindo em nome e interesse próprio nessa transação, e devidamente representados por “mandatária judicial com poderes especiais para esse efeito”, CII. Pelo que foi ordenada a rectificação do mapa de rateio, em conformidade com os termos e alcance da transação homologada, a qual, repete-se, envolveu o reconhecimento do direito ao recebimento da quantia de € 897.836,22 pelos antigos sócios da extinta S... e BB, por conta do crédito verificado e graduado em 4.º lugar no Mapa de Rateio (por referência à hipoteca registada sob a cota C-4), por contrapartida à desistência, por estes, do direito a sub-rogar- se no crédito de € 897.836,21, verificado e graduado em 7.º lugar (por referência à hipoteca registada sob a cota C-8). CIII. A referência à extinta sociedade ré foi efetuada, repita-se, apenas para efeitos de conveniência de exposição judicial (acima já demonstrada), mas que não se pode tomar à letra, uma vez que a dita “sociedade ré” nada recebeu nesse processo, nem participou do acordo de transação homologado pelo tribunal da falência. CIV. Termos em que, por se demonstrar supra que de acordo com a prova produzida em audiência nem a sociedade ré, extinta em 30/01/2018, foi “parte” na transacção judicial homologada por Sentença de 11/04/2019, CV. Nem que foi ordenado qualquer pagamento à sociedade ré pela Sentença de 11/04/2019, CVI. Se deverá alterar a redacção do disposto pelos Facto n.ºs 22. para CVII. “A transacção alcançada entre os antigos sócios da sociedade S..., Lda., extinta em 30/01/2018, BB e C..., S.A. foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso.”, CVIII. Mais cabendo alterar a redacção do disposto pelo Facto n.º 23. Para a seguinte: CIX. “Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que os antigos sócios da sociedade ré e BB receberiam, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento.” CX. Já quanto ao Facto Provado sob o n.º 24., impõe-se uma substancial alteração na sua redacção, atendendo a que não corresponde ao que foi provado em audiência. CXI. Na verdade, o recebimento de quaisquer quantias pelos mandatários judiciais, quando em representação de interesses alheios, não poderão ser imputados ao próprio mandatário como seu “incremento patrimonial”. CXII. O mandato de representação judicial faz projetar para os representados os efeitos decorrentes do exercício do mandato – cfr. arts. 1157.º, 1158.º, 1159.º, 1161.ºa) e e), 1181.º e art. 1184.º, todos do CCivil. CXIII. Tendo ficado provado que um dos réus substitutos nos autos de despejo é a própria mandatária, nestes autos e nos de falência, por ser antiga sócia da sociedade ré extinta em 30/01/2018, CXIV. Mas que o outro réu substituto nestes autos é BB, que interveio na transação homologada em 11/04/2019, como antigo sócio da sociedade ré extinta em 30/01/2019, mas também em nome Pessoal, enquanto detentor de direito de sub-rogação nos créditos que haviam sido reconhecidos, verificados e graduados à então reclamante CGD, CXV. Haveria que esclarecer qual ou quais as entidades – de entre as representadas pela mandatária judicial nesse processo de falência – que beneficiaram, efectivamente, do valor entregue à mandatária judicial em cumprimento do mandato judicial com poderes especiais com que interveio nessa transação homologada em 11/04/2019. CXVI. Com efeito, CXVII. E a entender-se – como parece ser o caso do exposto pelo Tribunal a quo, o qual se aceita agora para efeitos de mero raciocínio jurídico, sem, porém conceder – que o valor recebido pela mandatária judicial no processo de falência, em representação dos interesses dos vários representados nessa outra acção, tivesse correspondido a um activo detido pela sociedade ré em data anterior à da sua extinção, verificada em 30/01/2018, sempre cumpriria aferir, em concreto, dos montantes efetivamente recebidos por cada um dos antigos sócios na partilha desse “património social superveniente”, atendendo a que “Encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.” – Cfr. arts. 164.º e 163.º, n.º 1, ambos do CSC. CXVIII. Em sede de audiência de discussão e julgamento, o Mmo. Sr. Juiz a quo solicitou da ré substituta AA a apresentação da justificação material subjacente ao valor que transaccionou nos autos de falência, designadamente se correspondia a crédito reclamado oportunamente pela sociedade ré contra a falida nesses autos, tendo a ré substituta esclarecido que o valor transacionado por si, enquanto mandatária judicial, nos autos de falência em 10/04/2019, correspondeu ao exercício de direitos de sub-rogação em crédito de terceiro (CGD), por este credor oportunamente reclamados e reconhecidos ao seu, sucessor C..., S.A. na Sentença de Verificação e Graduação de Créditos nesse processo de falência, direitos de sub-rogação que só vieram a ser judicialmente reconhecidos pelo despacho/sentença proferido em 11/04/2019 pelo Tribunal da falência. – Cfr. Ref. ...32, de 07m01s a 18m15s, e 24m15s a 27m01s, do registo de prova gravada. CXIX. Por se tratar de matéria complexa, o Mmo. Sr. Juiz a quo perguntou à ré substituta AA diretamente se, “no final de contas, se entraram na sua conta bancária metade destes oitocentos e tal euros”, tendo a mesma respondido que não recebeu qualquer quantia a título pessoal, mas sim em representação de vários clientes que representava nessa falência – Cfr. Ref. ...32, de 22m18s, do registo de prova gravada. CXX. Tendo o Mmo. Sr. Juiz a quo insistido quanto à identificação específica dos clientes por si representados na referida acção de falência, a ré substituta escusou-se à mesma, invocando os deveres de sigilo profissional - Cfr. Ref. ...32, de 23m45s, do registo de prova gravada, CXXI. O Mmo. Sr. Juiz a quo perguntou à ré substituta AA se a obrigação assumida pela C... SA na referida transacção era conjunta, abrangendo os antigos sócios da S... e BB, bem como qual foi a proporção do valor efetivamente recebido que calhou às partes que a ré substituta representou nesse acordo de transação, tendo a mesma respondido que não recebeu qualquer quantia a título pessoal, mas sim em representação de vários clientes que representava nessa falência e que se escusava quantificar os montantes efetivamente entregues, posteriormente, aos seus representados, por constituir matéria sujeita ao sigilo profissional – Cfr. Ref. ...32, de 33m15s a 35m15s e 40m19s a 50m43s do registo de prova gravada . CXXII. Por outro lado, CXXIII. E na inquirição subsequente, o Mmo. Sr. Juiz a quo perguntou ao réu substituto BB se tinha conhecimento de créditos reclamados pela S... no processo de falência, quais, e se tinha conhecimento de ter havido uma transação nesse processo de falência envolvendo os antigos sócios da sociedade ré e quem foi o mandatário judicial que o representou nos autos de falência, tendo este respondido que a sociedade ré reclamara crédito sobre a falida correspondente ao sinal prestado por conta da aquisição de um apartamento no edifício construído pela falida, bem como pela recuperação do valor correspondente à execução, em 1993, de um imóvel dado em garantia de um empréstimo feito pela CGD à falida, bem como reclamados vários outros créditos por si, em nome próprio, tendo sido representado nesses autos de falência pela co-ré, AA - Cfr. Ref. ...32, de 14m41s a 17m59s, bem como de 18m38s a 23m01s do registo de prova gravada CXXIV. Tendo o Mmo. Sr. Juiz a quo questionado ao réu substituto BB se tinha conhecimento do valor recebido pela sua mandatária nos autos de falência, o mesmo respondeu afirmativamente, mais tendo esclarecido que lhe coubera a totalidade do valor recebido pela sua mandatária nesses autos (no valor de € 808.952,58) – Cfr. Ref. ...32 de 23m41s a 27m50s do registo de prova gravada. CXXV. Tendo o Mmo. Sr. Juiz a quo solicitado a justificação de tal recebimento integral da quantia em causa, de € 808.952,58, o réu substituto declarou que tal se devia ao facto de a expectativa de tal recebimento ter sido condição para conceder na transação que veio a ser homologada por sentença de 11/04/2018, porque atendendo a que a sociedade ré já tinha sido dissolvida em 30/01/2018 sem qualquer activo nem passivo, e que o bem imóvel prestado pela mesma em garantia à CGD já haviam sido vendido em sede executiva em 1993, ele se arrogava com direito a receber integralmente a verba transaccionada, que correspondia, na verdade, a metade do valor total a que ambas os garantes se arrogavam direitos de sub-rogação, no que a sua irmã, aqui ré substituta e mandatária judicial nos autos de falência, acedeu para se concluir a transação nos termos propostos - Cfr. Ref. ...32 de 27m55s a 29m10s do registo de prova gravada . CXXVI. Ora, decorre inquestionavelmente das declarações prestadas pelos réus substitutos em sede de audiência de julgamento que: CXXVII. A ré substituta recebeu a quantia de € 808.952,58, na qualidade de mandatária judicial de diversos representados – não especificados -, mas, pelo menos em representação própria, enquanto antiga sócia da sociedade ré extinta em 30/01/2018 e de BB, que nesse processo de falência interveio como credor, em nome pessoal, e mais tarde também como antigo sócio da sociedade ré extinta em 30/01/2018; CXXVIII. Que a ré substituta AA não reservou ou fez sua qualquer parte do valor de € 808.952,58, que recebeu no processo de falência enquanto mandatária judicial com poderes especiais no processo de falência; e, ainda, CXXIX. - Que o réu substituto declarou ter recebido integralmente o valor de € 808.952,58, recebido pela sua mandatária judicial no processo de falência. CXXX. Ora, aqui chegados, temos de concluir que, independentemente de se considerar que o valor de € 808.952,58, comprovadamente recebido pela ré substituta em maio de 2019, no âmbito do exercício de mandato judicial com poderes especiais no processo de falência em apreço, foi recebido apenas “em representação da sociedade ré, extinta em 30/01/2018” – versão defendida pela autora, CXXXI. Ou, pela “sociedade ré” e BB, em comum e sem determinação de parte ou direito, CXXXII. Ou pelos “antigos sócios da sociedade ré extinta em 30/01/2018” e BB, este em nome e interesse pessoal – conforme expressamente clarificado no despacho/sentença de 11/04/2018 -, CXXXIII. Certo é que nenhuma verba desse valor coube à ora recorrente, CXXXIV. O que se encontra provado pelas declarações que a ré substituta prestou em audiência de julgamento, CXXXV. Pelo que veio a ser declarado pelo réu substituto em audiência de julgamento, CXXXVI. E não se mostra impugnado por qualquer outra prova produzida nos autos. CXXXVII. Nestes termos, o teor do Facto Provado n.º 24. deverá ser alterado, por não corresponder ao que ficou provado em julgamento, devendo a sua redação passar a ser a seguinte: CXXXVIII. “24. A ré substituta AA recebeu a quantia de € 808.952,58 no processo de falência que cursou seus termos sob o n.º 75/14...., pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ..., enquanto advogada e mandatária com poderes especiais de representação para esse efeito no referido processo de falência.” CXXXIX. O restante teor do Facto Provado n.º 24., deverá ser dado como não provado, designadamente que: CXL. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção – por não se ter provado que a quantia recebida pela ré substituta nesses autos de falência, de € 808.952,58, corresponda apenas ao valor transaccionado (e a nenhum outro); CXLI. Os sócios da sociedade dissolvida, e aqui intervenientes, receberam o valor objecto da transacção em substituição da ré dissolvida e liquidada – por se ter logrado provar que na transação homologada intervieram, como partes, a ré substituta AA e o réu substituto, BB, este na dupla qualidade de antigo sócio da sociedade ré extinta em 30/01/2018 e como credor em nome pessoal do direito de sub-rogação em crédito da CGD, e a C..., S.A.; CXLII. Que a ré substituta AA tenha feito sua qualquer parte do valor por si recebido na qualidade de mandatária judicial com poderes especiais para o efeito no âmbito do processo de falência. CXLIII. Por outro lado, CXLIV. Como consequência do conhecimento da ulterior extinção da sociedade ré, verificada em 30/01/2018, o Mmo. Sr. Juiz então titular dos presentes autos veio proferir despacho/sentença em 06/09/2018, declarando a caducidade do contrato de arrendamento, ao abrigo do disposto pelos arts. 1051.º, d), e 1053.º, ambos do CCivil, com procedência do pedido de desocupação imediato do imóvel, CXLV. Mais dispondo que, quanto aos demais pedidos formulados pela autora na sua petição inicial, incumbiria à mesma, “…caso pretenda o prosseguimento da acção para a apreciação respectiva, alegar e provar que a sociedade ré, entretanto extinta, tinha bens que foram partilhados por todos ou por alguns sócios, identificar os visados e, requerer o prosseguimento do processo contra esses, conforme resulta das disposições conjugadas dos artºs 162, nºs 1 e 2 e 163, nºs 1 e 2 do CSC.” (o sublinhado é nosso) – Cfr. Sentença n.º ...16, proferida nestes autos em 06/09/2018. CXLVI. Por requerimento apresentado nos presentes autos em 29/10/2019, a autora veio alegar que a ré substituta recebera numa conta bancária sua a quantia de € 808.952,58, como resultado de um crédito reclamado pela sociedade ré nos autos de falência que correram termos pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ... sob o n.º 75/14..... CXLVII. Os réus substitutos contestaram o alegado pela autora, CXLVIII. Demonstrando que o recebimento de € 808.952,58, imputado à substituta ré nos referidos autos de falência, foi fundado no exercício de mandato judicial com poderes especiais de representação – conforme decorre do despacho/sentença, proferido em 11/04/2019, no âmbito dos autos n.º 75/14...., que correram termos pelo Juízo do Comércio ... – Juiz ..., que juntou aos autos em audiência de julgamento, no dia 26/10/2022, novamente procedendo à junção de uma cópia do referido despacho/sentença em anexo, para melhor facilitar a consulta e análise do mesmo; CXLIX. Demonstrando que foram os réus substitutos quem legitimamente interveio na transacção homologada pelo despacho/sentença de 11/04/2019 – e não a sociedade ré; CL. Demonstrando que o valor transaccionado pelos réus substitutos nessa acção de falência não correspondeu a qualquer crédito anteriormente reclamado, verificado e graduado pela sociedade ré extinta em 30/01/2018, mas sim ao exercício de dois direitos de sub-rogação legal em créditos distintos, reclamados, verificados e graduados à CGD; CLI. Demonstrando que a perspectiva de futuro eventual exercício de sub-rogação legal não constituía bem ou direito susceptível de integrar o activo da sociedade ré extinta em 30/01/2018, por um lado, porque não fora crédito reclamado pela sociedade ré contra a falida, bem como, por outro lado, porque não podia sequer qualificar-se tal putativo direito como “crédito” ou “activo” da sociedade ré antes de ter sido judicialmente reconhecido, como apenas veio a ser, em 11/04/2019. CLII. Para além do recebimento do predito valor de € 808.952,58, em 11/04/2019, a autora não alegou – e, consequentemente, não provou, como exclusivamente lhe competia – ter a sociedade ré extinta em 30/01/2018, detido qualquer outro activo susceptível de ser partilhado pelos antigos sócios, fossem eles bens ou direitos, CLIII. Pelo que não poderão os réus substitutos ser responsabilizados por qualquer passivo superveniente assacado à sociedade ré após a data da sua extinção, em 30/01/2018. CLIV. Mesmo admitindo por mera cautela de raciocínio e sem, porém, conceder que parte do valor transacionado entre os antigos sócios da sociedade ré extinta em 2018 e BB, em nome pessoal, pudesse ser considerado como activo superveniente dessa sociedade ré, o que é facto é que a autora não logrou demonstrar que parte do valor transaccionado competiria aos antigos sócios da sociedade ré extinta em 30/01/2018, CLV. Nem sequer em que medida é que tal “eventual” quantia teria sido partilhada entre os antigos sócios da sociedade ré, CLVI. Sendo, porém, certo que em audiência de julgamento a ré substituta declarou nada ter beneficiado da quantia por si recebida como mandatária judicial, em representação dos interesses de várias entidades, CLVII. E ter o réu substituto declarado o recebimento integral da quantia de € 808.952,58, por ter sido essa a condição que fundou na autorização para transaccionar o direito de sub-rogação que lhe foi reconhecido nos créditos reclamados, verificados e graduados à CGD, em 4.º e 7.º lugares. CLVIII. Assim, mal andou o Mmo. Sr. Juiz a quo ao valorar, em desprimor da posição defendida pelos réus, a falta de produção de prova que competia à autora, por força do disposto pelos arts. 5.º, 341.º e 342.º,1, do CPC2013, designadamente: CLIX. “De referir a este respeito que, sem prejuízo das partes se terem referido à dissolução administrativa da ré sociedade, tal circunstância não ficou cabalmente demonstrada por não ter sido apresentada qualquer prova documental respeitante à liquidação ter sido efectuada ao abrigo do DL n.º 76- A/2006, de 29-03, sendo certo que da leitura do registo comercial parece resultar que chegou a haver uma dissolução administrativa pendente em 2017 mas não ser claro se o cancelamento da matrícula em 2018 foi na sequência desse processo, sendo certo que em todo o caso não foi apresentado documento que ateste a inexistência de activo a partilhar nessa data.” – Cfr. último parágrafo da pág 14 da Sentença sub judice. CLX. Impunha-se outra decisão: CLXI. A um lado, para prova da extinção da sociedade ré – e consequente declaração de caducidade do contrato de arrendamento – bastou a apresentação pela autora, em 09/04/2018, de Informação Não Certificada n.º .../2018, de 22/03/2018, obtida junto da Conservatória do Registo Comercial, relevando as Insc. 2 – AP. 105/... – Dissolução e Encerramento da Liquidação, com anotação de publicação no site oficial, bem como da Insc. 3 – OF. 22 da AP. 105/... – Cancelamento da Matrícula – Cfr. Despacho/Sentença n.º ...16, proferido em 06/09/2018 pelo Mmo. Sr. Juiz então titular dos presentes autos (“Fls. 129 vs a 130 vs: CLXII. Encontrando-se documentalmente atestada a dissolução da ré S..., Ldª, cujo registo do cancelamento da matrícula ocorreu em 30.01.18, porque já decorreu o prazo de seis meses a que alude o artº 1053, declaro que o contrato de arrendamento objecto deste litígio, caducou, por força do disposto no artº 1051, al. d) do C.C.” CLXIII. Em face dos elementos constantes do registo comercial, serão indiciadoras as inscrições AV. ..., ... – Pendente de Dissolução Administrativa, bem como a Av. 3 – OF. 1 da AP. 105/... – Cancelado o AV. 1, que permitem concluir que o procedimento oficioso de dissolução administrativa foi concluído/encerrado pelo registo de dissolução e encerramento da liquidação na referida data de registo (30/01/2018) – cfr. arts. 143.º, 146.º, 6, 150.º, 3 e 160.º, 2, todos do CSC. CLXIV. Em todo o caso, CLXV. O que devia relevar quanto à necessária demonstração de existência de activo societário a partilhar entre os sócios da sociedade extinta à data da sua extinção é que a mesma deve ser alegada e provada pela parte a cuja existência aproveitaria – e não à parte contra quem tal existência é suscitada – cfr arts. 5.º e 342.º, ambos do CPC2013. CLXVI. Acresce que, em sede de audiência de discussão e julgamento, o Mmo. Sr. Juiz a quo perguntou à ré substituta AA as circunstâncias em que ocorrera a dissolução da sociedade ré, designadamente se tinha havido deliberação nesse sentido pelos sócios, tendo a mesma respondido que não houvera deliberação dos sócios nesse sentido, tendo ideia de que a mesma dissolução teria decorrido por via administrativa, por falta de apresentação de contas (Modelo 22), motivada pela ausência de actividade comercial da empresa desde que ficou sem imóveis em carteira para cumprir com o respectivo objecto social, de compra de imóveis para revenda, em 2010 ou 2011 - – Cfr. Ref. ...32, de 05m18s do registo de prova gravada. CLXVII. Ao suscitar dúvidas sobre o processo que conduziu à extinção da sociedade ré originária – que as partes (autora e ré) aceitaram nos autos como decorrente de procedimento de dissolução administrativa e se mostra suficientemente indiciada nos autos pelo documento junto pela autora – e valorar a inexistência de prova quanto à “inexistência de activo da empresa ré à data da sua extinção”, verifica- se nulidade por excesso de pronúncia, p.p. pelo disposto pelo art. 615.º, 1, d), in fine do CPC2013, atendendo a que a parte que invocou o facto da extinção societária em seu proveito, a autora, não alegou que tal extinção houvesse decorrido de procedimento diverso do indiciado pelo documento emitido pela Conservatória do Registo Comercial, CLXVIII. Mais constituindo nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do disposto pelo art. art. 615.º, 1, d), in fine do CPC2013, atendendo a que não só a autora não alegou que a sociedade ré detinha bens para partilhar no seu activo, à data da sua extinção, como se deverá atender a que o ónus da prova sobre a existência desses bens deveria recair sobre a autora – por ser a esta que tal facto aproveitaria – e não sobre a sociedade ré ou os seus antigos sócios, réus substitutos (cfr. arts. 5.º, 341.º e 342.º, 1, todos do CCivil). CLXIX. Das preditas nulidades resultantes do raciocínio judicial exposto na Sentença resulta na subsequente cadência de erros manifestos na Sentença. CLXX. Como acima se disse, não ficou provado que a sociedade ré extinta em 30/01/2018 “…por referência ao processo de falência que correu termos no tribunal do comércio ..., no qual a ré sociedade já era parte e em que, como aqui, foi substituída pelos seus sócios em virtude da sua extinção na pendência do processo, ter aí sido celebrada uma transacção a respeito do mapa de rateio que foi homologada por sentença e levou a que os sócios da ré, em substituição desta, recebessem o mencionado valor, pelo que foi dado como provado que esta era titular de um activo no referido montante” – Cfr. Sentença, Pág 15, CLXXI. Pois o que resultou provado foi que, tendo embora a sociedade ré extinta em 30/01/2018 reclamado créditos no mencionado processo de falência, não obteve qualquer pagamento pelos mesmos, por si ou pelos seus antigos sócios. O que se provou foi que os antigos sócios da ré extinta em 30/01/2018 e BB, em nome pessoal, transaccionaram nesses autos de falência com a credora C..., em 10/04/2019, a fim de lhes ser reconhecido o direito de sub-rogação legal em créditos reclamados, verificados e graduados à CGD, graduados em 4.º e 7.º lugares no Mapa de Rateio de 18/02/2019. CLXXII. De igual forma, CLXXIII. Não ficou provado que os “…réus substitutos terem recebido pessoalmente um valor que correspondia a um crédito da ré sociedade que lhe foi reconhecido no mencionado processo de falência” – cfr. Sentença, pág 15. CLXXIV. O que ficou provado foi, na verdade, que a mandatária judicial nesses autos recebeu, nessa qualidade, o valor de € 808.952,58, em conta bancária por si indicada para o efeito, em maio de 2019. CLXXV. E que entregou a totalidade desse valor a BB, pessoa que representou duplamente na transação judicial homologada por despacho/sentença de 11/04/2019, pelos motivos melhor esclarecidos pelo mesmo no depoimento de parte em audiência de julgamento de 26/10/2022. CLXXVI. De igual forma, não ficou provado que “…que a ré sociedade já era titular de um crédito reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos aí proferida…”, atendendo a que o crédito alvo de transação não fora por si reclamado, nem tão pouco reconhecido, mas antes à CGD, antes estando em causa a invocação do exercício de um direito de sub-rogação legal, que só veio a ser definitivamente reconhecido pelo despacho/sentença de 11/04/2019; CLXXVII. Nem que “…o tribunal ordenou a rectificação do mapa de rateio e o pagamento à ré sociedade, substituída pelos seus sócios, do referido montante de € 897.836,22…”, antes se tendo demonstrado que a manutenção da referência à sociedade ré extinta em 30/01/2019 resultou de opção judicial apenas para efeito de facilitação e apreensão de conteúdo, muito embora tal não resultasse no reconhecimento de direitos à sociedade extinta em 30/01/2018; CLXXVIII. Como também não ficou provado que o valor transaccionado pela mandatária judicial nesses autos de falência “…fosse (exclusivamente) recebido em nome dos sócios…”: na verdade, ficou demonstrado que a mandatária judicial representou diversos interessados nesse autos de falência, sendo que, pelo menos no caso da transação, a referida mandatária representou não só os antigos sócios da sociedade extinta em 30/01/2018, como também, específica e expressamente, outro interessado, BB, em nome pessoal, o qual também gozava do direito de se sub-rogar parcialmente aos créditos reclamados e reconhecidos à CGD, e graduados em 4.º e 7.º lugar para pagamento. CLXXIX. Termos em que mal andou o Tribunal a quo ao concluir que “Tal pagamento, por conseguinte, entendeu o tribunal dever-se a estes substituírem a ré sociedade naquilo que era o seu activo, tudo se passando como se se tratando de uma partilha de um activo societário de elevado valor que entrou na sua titularidade em razão da sua qualidade de sócios…” CLXXX. Não só porque não foi feita prova de que o valor recebido pela mandatária judicial em representação de diversos interessados no processo de falência, no valor de € 808.952,58, tenha resultado de crédito reclamado, reconhecido e verificado à sociedade ré, quer pela Sentença de Verificação e Graduação de Créditos, quer, posteriormente, pelo Mapa de Rateio de 18/02/2019, CLXXXI. Como não ficou provado que o valor transaccionado tivesse beneficiado exclusivamente os antigos sócios da sociedade ré, mostrando-se que as partes intervenientes nessa transacção foram os antigos sócios da sociedade Ré e BB, como titulares de direitos de sub-rogação legal, e C..., S.A. (adquirente dos créditos inicialmente reclamados, verificados e graduados à CGD), tendo, pelo contrário, até, sido feita prova em audiência de julgamento, por declarações do réu substituto, que infirmam a tese desde sempre sustentada pelos réus substitutos no sentido de que o mesmo recebeu a totalidade do valor recebido pela sua mandatária nesse autos de falência, como contrapartida pelo exercício do seu próprio direito de sub-rogação legal nos créditos reclamados e verificados à CGD, ulteriormente cedidos à C..., SA, e graduados em 4.º e 7.º lugar no Mapa de Rateio. CLXXXII. Um último reparo se impõe ao raciocínio expendido pelo MMo. Sr. Juiz a quo, designadamente quanto à referência negativa imputada aos réus substitutos: “…tudo se passando como se se tratando de uma partilha de um activo societário de elevado valor que entrou na sua titularidade em razão da sua qualidade de sócios, sem que, no entanto, e apesar do tribunal ter tentado a conciliação das partes, os mesmos sócios tenham manifestado qualquer vontade de liquidar as alegadas rendas em dívida em valor correspondente a cerca de 1/16 desse montante.” CLXXXIII. O Mmo. Sr. Juiz a quo deveria manter uma posição de equidistância, isenção e imparcialidade em relação às partes do pleito – cfr. art. 4.º do CPC2013. CLXXXIV. A tentativa de conciliação de partes, a que alude o Mmo. Sr. Juiz a quo, decorre de um dever geral de função – cfr. arts. 6.º,1, do CPC – mas não lhe permite, s.m.o., a projecção em Sentença de juízos de valor depreciativos relativamente à parte (ou partes) que não tenham acedido na conciliação tentada. CLXXXV. Mesmo que entenda – como parece ser o caso – que haveria uma certa “obrigação moral” por parte dos réus substitutos em pagar a quantia em que agora condenou a sociedade ré extinta em 30/01/2018, o que se configura apenas para efeito de mero raciocínio académico, sem, porém, conceder, tal afirmação tal não justificará a violação de diversas regras por parte do Tribunal a quo, quer na apreciação dos factos provados em julgamento, quer na aplicação do Direito, e tudo porque ficou demonstrado que em 11/04/2019, a ré substituta representou, como mandatária judicial com poderes especiais para o efeito, os interesses de diversas entidades num processo de falência em que a sociedade ré extinta em 30/01/2018 também havia sido interessada e, com base nesse mandato judicial, terá recebido a quantia de € 808.952,58, sem prejuízo de não se ter provado quer que a referida mandatária judicial tenha beneficiado de qualquer parte desse valor, na referida qualidade de “antiga sócia” da sociedade ré, quer que o referido valor tenha sido recebido pela mandatária judicial exclusivamente em benefício dos “antigos sócios” da sociedade ré. CLXXXVI. Nestes termos, parece que a Sentença sofrerá de nulidade, por violação dos deveres de isenção e equidistância relativamente às partes em conflito, patente no art. 4.º do CPC2013, ou seja, fundando a condenação no pagamento de determinado valor por imputação aos réus substitutos de um certo “dever moral” que não tem cabimento nos presentes autos, o que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto pelo art. 615.º, 1, c) e e), do CPC2013. CLXXXVII. Termos em que, e nos demais de Direito, requerem a Vossas Excelências se dignem admitir o presente Recurso, julgando-o totalmente procedente, por fundado e provado, deferindo a impugnação da matéria de facto dada como provada sob os n.ºs 21. a 24., inclusive, reconhecendo a violação das normas aplicáveis ao caso vertente nos termos supra melhor exposto, conhecendo e declarando as nulidades invocadas, e, consequentemente, anulando a Sentença sub judice, substituindo-a por outra que absolva os réus substitutos do pedido de condenação de pagamento de rendas devidas pela sociedade ré originária, extinta desde 30/01/2018, vencidas entre 10/206 e 30/01/2018, CLXXXVIII. Mais se declarando não ter a autora alegado, nem provado que a sociedade ré, entretanto extinta, tinha bens à data da sua dissolução, CLXXXIX. Que tenham sido partilhados por todos ou por alguns sócios, CXC. Que a sociedade ré tenha recebido bens como activo superveniente, CXCI. Que tal activo superveniente tenha sido partilhado por todos ou por alguns sócios, CXCII. Nem se identificando os visados e a devida medida do respetivo recebimento, na qualidade exclusiva de antigos sócios da sociedade ré, conforme resulta das disposições conjugadas dos artºs 162, nºs 1 e 2 e 163, nºs 1 e 2 do CSC”. Conclui, no sentido de ser dado provimento ao recurso. 17 – A Recorrida Autora apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes CONCLUSÕES: “1- A sentença ora recorrida, é particularmente minuciosa na sua fundamentação, de facto e de direito, pelo que, apesar da A. não ter tido vencimento em toda a amplitude do seu pedido, conforma-se com a mesma sentença, pela profunda análise que faz da prova e suas conclusões. 2- A recorrente volta a revisitar o Venerando Tribunal da Relação ..., quando já o tinha feito na presente ação, em 2018, aí enquanto Advogada de familiares e sua empresa, utilizando uma vez mais uma bafienta e repetida argumentação, fazendo um copy paste de anteriores requerimentos, que nunca foram acolhidos pelo Tribunal, e que em sede de audiência de julgamento, ficaram ainda mais expostos como inverosímeis, 3- A saber, a recorrente repete insistentemente a versão de que a sociedade Ré extinta em 2018, não tinha quaisquer bens ou ativo nessa data, quando é certo, como bem refere a sentença, que a sociedade Ré era credora reclamante no processo de falência, onde foi pago em 2019 o valor superior a 800m€, desde 1993, 4- A A., juntou aos autos vasta documentação nesse sentido, e são os próprios Réus substitutos que confessam, ter a S... reclamado créditos na falência, em valor superior, ao que lhe foi atribuído em sede de rateio em 2019, 5- É falso o vertido nas alegações da Ré substituta, de que a A. não alegou nem provou, que a sociedade extinta, tinha bens, quando toda o foco da A. foi nesse sentido, fazendo prova de que a sociedade extinta, foi contemplada com um valor significativo na falência, pelo facto de nela ser credora. 6- A recorrente fala de que o recebimento da quantia de 808m€ na sua conta bancária, teria sido como “substitutos sucessores” da sociedade ré, introduzindo um duvidoso neologismo jurídico, e que o referido valor, é um crédito/ativo superveniente da sociedade ré, num exercício de criatividade factual, a que já nos habituou. 7- A recorrente tenta com a sua argumentação, retirar a qualidade de credora à Ré S..., no processo de falência, e sem qualquer suporte factual ou legal, criar uma outra figura que não de credora, mas única e exclusivamente beneficiária de uma sub-rogação, que não à própria sociedade, mas ao irmão o Réu BB. 8- No processo de falência o pagamento é realizado ao credor enquanto tal, e a pretensão da Ré S..., com a respetiva reclamação de crédito, relativamente a um imóvel que a CGD, vendeu em execução fiscal, propriedade da mesma S..., remonta a 1993, data do início do processo de falência, situação que cumula com outras reclamações de créditos nessa falência pela S..., de supostos incumprimentos de contratos promessa pela falida, 9- Pelo que, ao contrário do que é alegado pela recorrente, não há um crédito novo da S..., por via do acordo de 11.04.2019, mas sim, para obviar a eternização do processo de falência, que durava há 24 anos, um acordo de pagamento entre as partes credoras, 10- A recorrente tenta misturar a S... e o co-réu BB, quando afirma que “os valores recebidos por força da transação nunca chegaram a integrar o “activo “da sociedade ré, extinta desde 30.01.2018, antes tendo sido recebidos e transacionados por estes por direito próprio- BB (…) e antigos sócios da sociedade ré extinta”, o que não corresponde aos factos, 11- A sentença recorrida, é bastante clara em confirmar, com a prova documental, depoimentos de parte e testemunhas que foi realizada, que a S... recebeu os seus créditos, porque os tinha reclamado nos autos de falência, e conseguiu em sede de transação, que fosse contemplado no rateio, o pagamento do montante de 808m€, que reclamava há 24 anos, 12- Pelo que é totalmente despropositada a afirmação da recorrida, de que a “sociedade Ré nada recebeu por conta dos créditos que houvesse reclamado nos autos” de falência, porquanto desde o início da falência a S..., consta como putativa credora, na lista do mapa de rateio, junta aos autos, como aliás é referido por inúmeras vezes, na douta sentença recorrida, 13- Vem posteriormente a recorrente, fazer uma analogia com a representação sucessória de herdeiros pré-falecidos, descontextualizada, e que nos abstemos de contraditar, insurgindo-nos, porém, contra a afirmação da mesma recorrente, repetida, de que a A. afirmou que “a sociedade havia reclamado créditos nos autos de falência, que lhe foram pagos em 2019, diretamente aos antigos sócios. O que na verdade é falso “, 14- Falso é o que a Recorrente, repete, de que o crédito da S..., foi pago por sub-rogação legal, de um outro credor, alheio à sociedade extinta, quando é certo que o que foi pago à sociedade extinta, foi um valor fixado no rateio, enquanto credora reclamante, e por via de uma transação em sede do processo de falência, e não por via de qualquer ação de sub-rogação, como a recorrente pretende agora fazer crer, e que contradiz os requerimentos e acordo que a recorrente subscreveu em 2019, no processo de falência, 15- É de todo inusitada a pretensão da recorrente, em requerer a alteração do vertido no nº 21º dos Factos Provados, por um texto em que se substituí a S..., como beneficiária no acordo, pelos seus antigos sócios, o que não tem qualquer correspondência com a realidade, bem com os documentos juntos aos autos e restante prova, 16- Porque o que subscreveu no processo de falência, para a recorrente deixou de fazer sentido, agora vem a mesma dizer que “a referência à extinta sociedade ré foi efetuada, repita-se apenas para efeitos de conveniência de exposição judicial (…), mas que não se pode tomar à letra, uma vez que a dita “sociedade ré” nada recebeu nesse processo, nem participou do acordo de transação homologado pelo tribunal de falência” 17- Dir-se-á que a recorrente é pródiga em neologismos jurídicos, a saber o conceito de “conveniência de exposição judicial”, em que, o que o Tribunal escreve, que nos beneficia serve, mas o que nos prejudica, revela alguma dificuldade de expressão, e que não “se pode tomar à letra”, 18- De tanto exercício de criatividade, o que se pode tomar à letra, é que a recorrente tem uma capacidade imaginativa infindável, quando assina um acordo, no processo de falência, em representação da extinta sociedade S..., e agora vem, afirmar que a S..., afinal não é parte no acordo em causa, o que só pode ser motivo de esquecimento seletivo, que a recorrente já nos habituou, 19- E vem a recorrente afirmar, que não teve qualquer incremento patrimonial, quando é certo foi transferido pela massa falida para a sua conta bancária, valor superior a 800m€, e que não fez qualquer prova de ter “distribuído” esse dinheiro por terceiros, 20- Aliás, da forma atabalhoada e inverosímil com que depôs, o irmão da recorrente, afirmou que perante o Tribunal, que a irmã lhe tinha entregue o cheque, recebido da falência, quando nunca houve qualquer cheque, o e irmão da recorrida, não tem conta bancária ativa, por estar a ser demandado noutros processos, e não ter qualquer bens ou rendimentos, sendo mais uma inverdade, que a recorrente lhe teria “entregue” o dinheiro, que recebeu por conta da sociedade extinta, 21- Quer igualmente a Ré AA. fazer crer que o valor superior a 800m€, que recebeu, terá sido por conta de clientes, inexistentes, porque os omite, e que terá distribuído esse valor pelos mesmos, 22- Seguidamente depõe o seu irmão, e também ex-sócio gerente, que afirma que os 808m€ lhe foram entregues por cheque da massa falida, pela irmã, para o compensar dos imoveis, que lhe foram penhorados e vendidos em execução fiscal pela CGD, 23- Mais diz BB que “sociedade ré reclamara créditos sobre a falida” relativos a venda de imóveis dados por empréstimo à CGD, confessando que a reclamação de créditos, da sociedade extinta que está na base do acordo firmado na falência, e que permitiu o recebimento de mais de 800m€, 24- Pelo que é no mínimo provocatório, vir a recorrente afirmar, que. 25- Ao contrário do alegado pela recorrente, aquando do requerimento de prosseguimento da ação contra os Réus substitutos, a A, requereu em 10.2019, “nos termos dos artºs 162, nºs 1 e 2, e 163, nºs 1 e 2 do CSC, o prosseguimento dos presentes autos, porquanto a Ré S..., Lda, entretanto extinta, era titular de um ativo, a saber créditos, no processo de falência da So..., S.A., a correr os seus termos sob o nº 75/15...., no Juízo de Comércio ..., os quais foram pagos e partilhados pela sócios da mesma empresa, supra identificados, a saber AA e BB, em nome pessoal e na qualidade de herdeiros do terceiro sócio da Ré, DD, sócios estes que utilizaram, em benefício próprio o imóvel arrendado, agravando o prejuízo da A. com o arrendamento do mesmo imóvel, sua propriedade, e (…) que o montante de 808.952,58€, atribuído em rateio à Ré S..., foi integralmente recebido pela sócia AA, em sua conta pessoal, no BCP, conforme” documento junto no mesmo requerimento, 26- No que respeita à referência pela recorrente, do Tribunal ter tentado, a conciliação das partes, como é sua obrigação legal, a recorrente mais uma vez tenta distorcer a realidade, afirmando que o mesmo Tribunal, ao tentar, antes da audiência de julgamento, que as partes se conciliassem, e aventando hipóteses de sucesso ou fracasso, para ambas as partes, como é prática corrente na Magistratura Judicial, estaria a violar a sua “isenção, equidistância e imparcialidade”, o que é mais um exercício de maledicência gratuita. 27- Caso a recorrente considerasse que o titular do processo, não estaria em condições de julgar a causa, poderia sempre recorrer ao instituto da suspeição, e não vir em sede de recurso, porque foi condenada, suscitar uma questão que nunca colocou, e que apenas a falta de fundamento para o presente recurso, a faz ir pela via mais nebulosa, de arguir a falta de isenção do Magistrado titular, e por essa circunstância requerer a nulidade da sentença recorrida, o que mais uma vez revela a atitude errática da recorrente em todo este processo, 28- A sentença recorrida, encontra-se bem fundamentada, quer na apreciação da matéria de facto, quer na aplicação do direito, e apesar da A. pretender que fossem igualmente condenados os Réus substitutos, únicos responsáveis pela dilação na entrega do imóvel, porém, dadas as circunstâncias da existência de um meteórico contrato de subarrendamento, que colocou em dúvida quem beneficiou da utilização do imóvel, terá que se conformar com a sentença proferida, de forma a ver ressarcido algum do prejuízo, causado pela atitude premeditada dos Réus, a tudo recorrerem, para se tentar furtar às suas responsabilidades. 29- Os Réus substitutos, nos seus depoimentos, apenas tentaram manipular os factos, tentando dar uma versão de que a S... não teria qualquer ativo ou crédito, à data da sua dissolução, o que é falso, e que o dinheiro transferido para a conta pessoal da Ré AA, afinal por magia, tinha-se transformado num cheque da massa falida, de 808m€, que nunca existiu, mas que nas palavras do Réu BB, lhe foi entregue, tentando ambos, pela distorção da realidade, fazer crer ao Tribunal, que AA não foi a beneficiária única, do pagamento à sociedade extinta pela massa falida, 30- Tão contraditório e atabalhoado foi o depoimento de ambos os Réus, que não vislumbrando ninguém que corroborasse a sua narrativa, dispensaram as testemunhas inicialmente arroladas pelos mesmos Réus, receando que aquilo que dissessem essas testemunhas fosse verdade, e que certamente contrariaria o discurso enviusado, dos mesmos Réus”. Conclui, no sentido da confirmação da sentença recorrida. 18 – Tal recurso foi admitido por despacho datado de 15/05/2023, como apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e, após prestação de caução, com efeito suspensivo. 19 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir. ** II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que: “1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. 2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas ; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”. Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação da recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Assim, no sopesar das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede determina o conhecimento das seguintes questões: 1. Das NULIDADES da SENTENÇA: 1.1 Das nulidades por excesso de pronúncia, previstas no artº. 615º, nº. 1, alín. d), do Cód. de Processo Civil – Conclusões CLXVII a CLXIX ; 1.2 Da nulidade por violação dos deveres de isenção e equidistância relativamente às partes em conflito, com enquadramento nos artigos 4º e 651º, nº. 1, alín. d), in fine, ambos do Cód. de Processo Civil - Conclusões CLXXXII a CLXXXVI e Conclusões contra-alegacionais 26 e 27 ; 2. DA EVENTUAL PERTINÊNCIA DA MODIFICABILIDADE DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO, nos quadros do artº. 662º, do Cód. de Processo Civil, o que determina a aferição: I) Da indicação dos concretos pontos de facto incorrectamente julgados =) Ø Dos factos provados 21. a 23.: a pretensão de alteração da sua redacção ; Ø Do facto provado 24.: a pretensão da alteração parcial da sua redacção, devendo a demais parte passar a figurar como não provada, o que implica a REAPRECIAÇÃO DA PROVA produzida - Conclusões XVIII a CXLII e Conclusões contra-alegacionais 15 a 24, 29 e 30 ; 3. Aferir acerca da SUBSUNÇÃO JURÍDICA EXPOSTA NA DECISÃO RECORRIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS, o que implica apreciação do ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA CAUSA, no âmbito da qual impõe-se conhecer acerca: I) Da impossibilidade de responsabilização dos Réus substitutos por qualquer passivo superveniente assacado à sociedade Ré após a data da sua extinção, em 30/01/2018 - Conclusões CXLIII a CLII ; II) Da não demonstração, por parte da Autora, que parte do valor transacionado competiria aos antigos sócios da sociedade Ré, extinta em 30/01/2018, nem em que medida tal eventual quantia teria sido partilhada entre os antigos sócios da Ré - Conclusões CXLIV a CLVII ; III) Da não prova que o valor recebido pela mandatária judicial, em representação de diversos interessados no processo de falência, no valor de € 808.952,58, tenha resultado de crédito reclamado, reconhecido e verificado à sociedade Ré, quer pela sentença de verificação e graduação de créditos, quer, posteriormente, pelo mapa de rateio de 18/02/2019 - Conclusões CLXX a CLXXXI (em globo, Conclusões contra-alegacionais 3 a 14, 25, 28 e 29. Aprioristicamente, e tendo em atenção o alegado pela Recorrida Autora nas contra-alegações apresentadas, apreciar acerca da tempestividade da junção dos documentos que acompanham as alegações apresentadas pela Apelante. QUESTÃO PRÉVIA: - Da (in)admissibilidade da superveniente junção de documentos Em sede de alegações recursórias, veio a Recorrente Ré substituta, juntar “cópia de dois documentos oportunamente juntos em audiência de julgamento de 26/10/2022, para facilitação de consulta e análise”. Tais documentos traduzem-se em cópia do despacho datado de 11/04/2019, proferido no âmbito dos autos de falência de So..., S.A., nº. 75/14...., do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., cópia do despacho de 18/02/2019, prolatado no apenso de prestação de contas (Liquidatário) nº. 75/14.... dos mesmos autos de falência e plano de rateio, ainda dos mesmos autos de falência, elaborado nos termos do artº. 214º, do CPEREF, datado de 19/02/2019. Em sede contra-alegacional, no final do corpo das alegações, a Recorrida Autora referencia impugnar os documentos apresentados, “por não ser o momento próprio para a sua junção, e por não se saber se correspondem ao documento original”. Decidindo: Prescreve o nº. 1 do artº. 651º, do Cód. de Processo Civil que “as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância”. O artº. 425º dispõe, por seu lado, que “depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”. Relativamente à junção de documentos na presente fase recursória, aduz Rui Pinto – Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, 2018, pág. 312 e 313 – que os documentos enunciados no artº. 425º devem ser objectiva ou subjectivamente supervenientes, devendo “acompanhar as alegações ou contra-alegações do apresentante”. Exigível é, todavia, que “a parte consiga demonstrar a referida superveniência, objectiva ou subjectiva. De outro modo, está liminarmente excluída a apresentação de documento que a parte já tinha ou podia ter em sua posse e que, como tal, deveria ter junto nos termos (amplos) do artigo 423º”. Ora, in casu, tal como referencia expressamente a Recorrente, tais documentos já haviam sido oportunamente juntos em sede de audiência de julgamento, reiterando a sua junção para facilitação de consulta e análise. E, compulsados os autos, constata-se que a junção de tal prova documental já havia sido ordenada pelo Tribunal a quo, o que ocorreu durante o depoimento de parte de AA, que os exibiu – cf., o teor da acta de julgamento de 26/10/2022 -, constituindo aqueles uma mera réplica destes. Pelo exposto, inexistindo qualquer novidade na sua junção em sede alegacional, e perante a aduzida pretensão de facilitação do presente Tribunal, inexiste qualquer fundamento legal para censurar a sua junção. Que, desta forma, se sanciona, nada mais urgindo determinar. ** III – FUNDAMENTAÇÃO A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Na sentença recorrida/apelada, foi considerado como PROVADO o seguinte (corrigem-se os lapsos de redacção ; figuram com um * os factos objecto de impugnação e a negrito os factos alterados, após apreciação da impugnação, constando em nota de rodapé as redacções originais de tais factos): 1. A autora G..., S.A. é proprietária do imóvel, sito na Av. ..., em ..., Lugar ..., com o actual artigo matricial ...78, da União das Freguesias ..., composto por edifício com cave, ... e ... andar, com 11 divisões, garagem e logradouro, descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...05, da freguesia .... 2. A autora adquiriu o imóvel à Caixa Geral de Depósitos, S.A., por compra, tendo registado a aquisição na Conservatória do Registo Predial pela Ap.22 de 06-06-2008. 3. Com referência ao imóvel foi celebrado um contrato denominado “Contrato Promessa de Arrendamento”, sem data, mas com efeitos reportados a 01-01-1991, em que são outorgantes BB e a ré S..., Lda., mediante o qual o primeiro, na qualidade de proprietário do imóvel, declarou prometer arrendar à segunda o referido imóvel, destinado à sua sede e à residência dos seus sócios ou de outrem, pelo período de 5 anos, renovável, pela renda mensal de 10.000$00, a pagar no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeita, ficando o contrato prometido de ser celebrado logo que o proprietário obtenha o necessário licenciamento, nos termos do doc. n.º 2 junto com a p.i.. 4. O referido contrato foi apresentado na 2.ª Repartição de Finanças e aí carimbado com a data de 30-04-1992. 5. A autora, anteriormente à presente acção, intentou um procedimento especial de despejo junto do Balcão Nacional de Arrendamento contra a ré, com fundamento na falta de pagamento de rendas e na resolução do contrato de arrendamento referido em 3., o qual veio a ser distribuído na então Instância Local ... - J..., sob o n.º 3553/14..... 6. Nessa acção, a ré veio deduzir oposição ao procedimento especial de despejo alegando não ser a autora parte legítima por não estar definida a situação referente à propriedade do imóvel, e ter sido impugnada a venda à Caixa Geral de Depósitos no âmbito de um processo de execução fiscal no Tribunal Tributário ..., sob o n.º 1322/08...., pelo que tinha continuado a pagar a renda ao anterior proprietário. 7. Foi proferida sentença nessa acção, datada de 27-11-2015, a julgar ineficaz a resolução do contrato de arrendamento efectuada pela ora autora e improcedente o pedido de entrega do imóvel, absolvendo a ora ré do pedido, nos termos do doc. n.º 3 junto com a p.i.. 8. Consta da fundamentação da referida sentença que a autora tem o imóvel registado em seu favor mas não provou ter comunicado à ré essa aquisição e que de futuro as rendas lhe deveriam ser pagas, pelo que não estaria obrigada a pagar as rendas que a autora havia notificado ter actualizado. 9. A autora, por carta registada com aviso de recepção datada de 06-07-2016, recepcionada pela ré em 15-07-2016, sob o assunto “comunicação de alteração de proprietário”, veio comunicar à ré ter adquirido o imóvel e ser a proprietária, juntando cópia da caderneta predial urbana e da certidão do registo predial, notificando a ré para proceder ao pagamento da renda ao senhorio ou o seu representante legal, no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeita a renda, nos termos do doc n.º 4 junto com a p.i.. 10. A ré respondeu a essa carta, mediante carta datada de 19-07-2016 na qual declara que, encontrando-se em discussão judicial a questão da validade do negócio de transmissão do prédio arrendado, celebrado entre o Serviço de Finanças e a Caixa Geral de Depósitos e subsequentemente entre a Caixa Geral de Depósitos e a autora, considerava intempestiva a pretensão apresentada na carta da autora ao peticionar o pagamento das rendas em causa, nos termos do doc. não numerado junto com a contestação. 11. A autora, por carta registada com aviso de recepção datada de 28-07-2016, recepcionada pela ré em 04-08-2016, sob o assunto “comunicação de actualização de renda”, veio reiterar o direito de peticionar o pagamento de rendas por ser a proprietária do imóvel, bem como “comunicar a iniciativa de actualização da renda, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 30º da Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 31/2012 de 14 de Agosto”, nos termos do doc. n.º 6 junto com a p.i. 12. Consta da referida carta, nomeadamente, o seguinte: “É do seu conhecimento, que entrou em vigor a Lei 31/2012 de 4 de Agosto que prevê a transição para o NRAU e actualização da renda relativamente ao seu contrato de arrendamento. Como pode V. Exª pode comprovar, pela cópia da caderneta predial urbana que lhe anexamos, o valor do locado, já avaliado nos termos dos arts 38º e ss do CIMI é de 315.160,00€. Nestes termos vimos propor a V. Exa, que o contrato de arrendamento da sociedade de que é legal representante, passe a ter o prazo certo de cinco anos, sendo a nova renda de 1.750,89€”. 13. A ré respondeu a essa carta, mediante carta datada de 29-08-2016, na qual, para além da questão da pendência da acção e da alusão à existência de subarrendamento em favor de CC, nos termos do doc. não numerado junto com a contestação, consta o seguinte: “Acresce, por outro lado, que para que a situação de arrendamento em causa transite do âmbito da legislação atualmente aplicável para o NRAU, é necessária a verificação cumulativa de várias circunstâncias, designadamente: 1. Existência de comunicação expressa da iniciativa exclusiva do Senhorio – art. 30.º, 1, da Lei 6/2006; 2. Acompanhada de proposta de novo valor de renda, tipo e duração de contrato; 3. Que se comunique o valor do locado, precedido de avaliação nos termos dos arts. 38.º e segs. do CIMI, 4. Que se anexe cópia da caderneta predial urbana, e 5. Que o arrendatário não invoque qualquer das circunstâncias previstas nos arts. 31.º, 4, e art. 51.º, 4, da mesma Lei, ou, invocando tais circunstâncias, dê o seu acordo à aplicação do NRAU. Ora, e desde logo, existe séria e fundada dúvida sobre a oportunidade dessa empresa para agir na qualidade de senhorio, atendendo ao supra exposto. Mais acresce que também se considera incumprido o requisito correspondente ao valor do locado. Com efeito, decorre da análise da Caderneta Predial Urbana junta à carta em apreço que a área do locado em causa corresponde a 254,91 m2 de área bruta privativa. Tal referência é absolutamente errada, evidenciando discrepância real, por defeito, em relação ao imóvel em causa. Fica, desde logo, claro e evidente, que a inscrição matricial em que se fundou a reavaliação do correspondente valor patrimonial tributário se encontra deficientemente efetuada, porque em manifesto desacordo com a realidade física do locado, pelo que não revela aptidão para os efeitos pretendidos. Mais acresce que a Ficha de Avaliação n.º ... resultou da apresentação do Mod 1 do IMI n.º ..., entregue por essa empresa em 03.08.2007, na sequência da 1.ª transmissão do imóvel após a entrada em vigor do CIMI – cfr. art. 15.º do DL 287/2003, de 12.11. Ora, resulta do disposto pelo art. 37.º, 2, do CIMI, que tratando-se de avaliação de prédio urbano cuja data de construção seja posterior a 7 de Agosto de 1951, a instrução do referido processo de avaliação compreende a entrega de plantas do edifício. O procedimento em causa – obrigatório por Lei – não deve ter sido realizado, não só atenta a confrontação das áreas supra descritas (absolutamente desfasadas da realidade física do locado e do imóvel), como também atenta a aplicação dos coeficientes de qualidade e conforto, que não teve em consideração diversos fatores enunciados por lei como minorativos. Acresce, ainda, que o imóvel não se encontra licenciado pela respectiva entidade camarária competente para o efeito. Resulta do supra exposto que a determinação do novo valor patrimonial tributário do imóvel é errada, por manifestamente desadequada da realidade física do locado, quer no tocante à sua dimensão, quer no tocante ao seu estado de conservação, pelo que o referido documento não se mostra apto à produção dos efeitos pretendidos, Designadamente porque não se mostra apto à determinação do novo valor de renda anual, que será discutido e determinado por referência ao limite máximo de 1/15 do valor patrimonial tributário atualizado do prédio arrendado – cfr. arts. 54.º, 2 e 35.º, 2, a) e b) ambos do NRAU. Quanto à V. proposta de duração do contrato, bem como novo valor de renda, impõem-se os seguintes esclarecimentos: De acordo com a carta ora recebida, propõem V. Exas. um aumento de renda, para Eur. 1.750,89, bem como que o contrato passe a termo certo, pelo período de cinco anos. Sem prejuízo do acima exposto, e mesmo considerando, sem, porém, conceder, na questão da legitimidade dessa empresa como futura senhoria (o que, sublinha-se, só acontecerá após trânsito em julgado da sentença que viesse a validar a vossa aquisição da propriedade do imóvel em causa), nem quanto à oportunidade do pretendido exercício de tais direitos, impõe-se recordar a V. Exas. que, atento o facto de a arrendatária ser uma micro entidade e a subarrendatária ter idade superior a 65 anos de idade, e discordarem ambas da V. proposta, o presente contrato só ficaria submetido ao NRAU no caso de acordo entre as partes ou decorridos 5 anos sobre a data de receção da resposta do arrendatário, nos termos dos arts. 31.º, 35.º, 36.º e 51.º, todos da mesma Lei – cfr. art. 54.º do NRAU. Ora, a arrendatária em causa é uma microentidade, que não tem, há mais de 20 anos, quaisquer empregados ao seu serviço e cujo volume de negócios líquido é inferior a Eur. 500.000,00, o que se comprova pelo documento anexo, mais se comunicando que se pretende manter a renda nos valores actuais, por não se concordar com quaisquer elementos da V. proposta.”. 14. A autora, por carta registada com aviso de recepção datada de 30-09-2016, recepcionada pela ré em 04-10-2016, respondeu à carta da ré, nos termos do doc. n.º 7 junto com a p.i., do qual consta o seguinte: “(…) Veio a S... propor a manutenção do valor actual da renda, bem como das actuais condições de duração do contrato, o que a G... S.A., expressamente não aceita, reiterando o valor da renda proposto na sua comunicação de 28/07/2016. (…) É inequívoca a condição de proprietária do imóvel, da G..., bem como a direito que lhe assiste a peticionar as rendas, reiterando-se, que se estão a ser pagos rendas a anteriores proprietários, tais supostos pagamentos são ineficazes perante a actual proprietária. No que respeita à agora referida sublocação do imóvel, a G..., nunca teve conhecimento da mesma, sendo a mesma informação desprovida de qualquer suporte legal. Relativamente à avaliação matricial, como bem refere, estando em conformidade com os elementos identificativos, na posse das Finanças na data da avaliação, é a única legalmente admissível. Aliás, o valor da renda actualizado, nos termos do CIMI, é menos de metade do valor da renda praticado num imóvel com 3 pisos, 11 divisões, jardim, piscina e garagem, em plena Av. ..., em frente à praia da .... Nestes termos a nova renda que se vence no dia 01 de Novembro de 2016, será fixada com base em 1/15 do VT, calculado nos termos do CIMI, no montante de 1.750,89€ mensais. Ainda com a renda que se vence no dia 01 de Novembro de 2016, deverá a sociedade de que Vª Exª é gerente, proceder ao pagamento do diferencial que se venceu no dia 01 de Outubro de 2016 (…)” 15. Consta da cópia da caderneta predial do imóvel, obtida via internet em 06-07-2016, junta com a carta referida em 9., que o valor patrimonial do imóvel para efeitos de IMI correspondia a € 336.681,49, determinado no ano de 2013, e que o Vt (valor patrimonial tributário) era de € 315.160,00 (correspondendo 1/15 desse valor ao valor da renda anual que, dividida por 12 meses, perfaz a renda mensal de € 1.750,89. 16. Consta da nota de liquidação de emitida pela Autoridade Tributária em nome da autora, com referência ao valor do IMI devido em Julho de 2016 (2.ª prestação), com referência a vários prédios, que o imóvel em causa nos autos, no ano de 2015, tinha um valor patrimonial tributário de € 336.681,49, correspondente à colecta de € 1.313,06, nos termos do doc. n.º 5 junto com a p.i.. 17. A ré não procedeu, perante a autora, ao pagamento de qualquer das rendas à autora, nem procedeu ao seu depósito liberatório. 18. Na pendência dos autos, o imóvel foi entregue à autora pelos sócios da ré em 03-05-2019, livre e desocupado de pessoas e bens. 19. A acção que correu termos no Tribunal Tributário ... sob o n.º 1322/08...., tendo em vista a declaração da nulidade da venda do imóvel à Caixa Geral de Depósitos, S.A, veio a ser julgada improcedente 24-01-2022, sem que tenha sido interposto recurso. 20. Na pendência dos autos, a sociedade ré foi declarada dissolvida e encerrada a liquidação, bem como cancelada a respectiva matrícula pelas Inscrições 2 e 3 referentes à Ap. 105 de 30-01-2018. 21. No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o eventual direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, por extinção da sociedade ré em 30/01/2018, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu aos antigos sócios da extinta sociedade ré e a BB o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22, inscrita como C-4. *[2]. 22. Tal transacção foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso. * 23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio nos termos feitos constar do infra facto provado 27., ordenando-se o respectivo pagamento aos credores de acordo com o mapa de rateio rectificado * [3]. 24. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes, bem como BB em nome pessoal, receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB (seu irmão), quer enquanto sócio da sociedade dissolvida, quer em nome pessoal, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos também em substituição da ré dissolvida e liquidada * [4]. *** Na mesma sentença recorrida/apelada, foi considerado como NÃO PROVADO o seguinte (corrigem-se os lapsos de redacção): A. A manutenção da ocupação do imóvel foi realizada no interesse exclusivo dos sócios da ré que tudo fizerem para permanecer no mesmo, por mais de dois anos, sem pagarem qualquer renda, utilizando o imóvel em seu exclusivo proveito. B. A ré continua a pagar a renda ao senhorio conhecido e a subarrendatária a pagar a renda devida à ré, estando as rendas pagas. C. A autora tem conhecimento da situação de subarrendamento a CC desde 2009. D. A referida subarrendatária tem no local arrendado a sua única habitação, existindo razões sociais, nomeadamente devido à sua situação económica, estado de saúde e idade, que impedem a desocupação imediata do imóvel. **** Nos termos do artº. 607º, nºs. 3 e 4, ex vi do artº. 663º, nº. 2, ambos do Cód. de Processo Civil, tendo por base a análise da prova documental junta aos autos -, adita-se, ainda, a seguinte factualidade consideranda: 25. No âmbito dos autos de falência de So..., S.A., com o nº. 75/14...., do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., BB e S..., Lda., apresentaram reclamação, da qual consta, para além do mais, o seguinte: “BB e S..., Lda. (representada pelos sócios), credores nos autos de falência acima melhor identificados, notificados do Mapa de Rateio em 25.02.2019, vêm, m.r., apresentar Reclamação, o que fazem nos termos e com os fundamentos seguintes: 1. Por requerimento junto ao apenso B dos presentes autos de falência em 22.01.2018, os ora reclamantes responderam aos despachos proferidos por esse douto Tribunal, no sentido do cabal esclarecimento dos montantes que lhes devem ser pagos. 2. Para tanto, juntaram cópia de: a) Certidão do Registo Predial de ..., sobre a Descrição n.°... da freguesia ..., relativo ao imóvel que era pertença da falida e que foi vendido nestes autos em 2001, onde se mostram inscritas as hipotecas C4. em beneficio de Caixa Geral de Depósitos, por "...abertura de crédito (em favor da So..., S.A.)...", no montante máximo de Eur. 5.177.522,17 (cinco milhões, cento e setenta e sete mil, quinhentos e vinte e dois euros e dezassete cêntimos), e que abrange igualmente três prédios entregues como garantia ao bom cumprimento deste empréstimo por terceiros (os ora requerentes) "...situados na área das ..., ... e ...." e C8, em beneficio de Caixa Geral de Depósitos, por "...abertura de crédito (em favor da So..., S.A.)...", no montante máximo de Eur. 3.569.647,15 (três milhões, quinhentos e sessenta e nove mil, seiscentos e quarenta e sete euros e quinze cêntimos), e que abrange igualmente três prédios entregues como garantia ao bom cumprimento deste empréstimo por 33. Tais quantias não deverão, consequentemente, ficar retidas, conforme se propõe no Mapa de Rateio ora em apreço, antes devendo ser pagas de imediato, em igualdade de circunstância com aos demais credores verificados e graduados, nos exatos termos e montantes acima (e já anterior e oportunamente) bem identificados e descriminados, considerando que a sua retenção infundada e sem determinação de condição a cumprir ou prazo de verificação para o seu desbloqueio, constitui um intolerável ónus imposto sobre os ora reclamantes, injusto e injustificado em face dos elementos documentais e decisões judiciais supra melhor identificados. 34. Acresce que os credores originários são legalmente obrigados a participar nos presentes autos todas as quantias que já hajam recebido de condevedores solidários da falida, sob pena de serem condenados a restituir em dobro o que indevidamente receberem, mais respondendo, em todo o caso, pelos danos que causarem aos aqui reclamantes — cfr. Art. 1257.° do CPC na versão vigente em 15.03.1993. 35. Por fim, resta referir que a mandatária subscritora da presente reclamação juntou aos presentes autos de falência, ainda cursante sob o n.° 106/93 Geral pelo Tribunal Judicial ..., em 08.03.2013, diversas procurações com poderes especiais de representação, entre as quais constando a dos Herdeiros de DD, de BB e de GG, podendo, nos termos aí previstos, "...confessar, desistir e transacionar, no todo ou em parte, tanto no pedido como na instância, bem como para em nome e interesse dos mandantes que representa, participar e deliberar em assembleia de credores, receber e dar quitação de quaisquer valores, nos termos e condições que entender por mais convenientes, tudo no âmbito do Processo n.° ...93 e Apensos, a correr termos pela Secção Única do Tribunal Judicial ...." 36. Acrescendo que se representa a si mesma, AA, NIF ...61, enquanto sócia que foi da sociedade comercial entretanto dissolvida S..., Lda., 37. Requerendo, assim, e em consequência, se digne ordenar o pagamento das quantias verificadas e graduadas no Rateio a favor de S..., Lda, representada pelos sócios AA, BB e Herdeiros de DD, bem como os demais créditos igualmente verificados e graduados a BB, Herdeiros de DD e GG por transferência bancária para a conta com o iban ...05, titulada por Dra AA, junto do MillenniumBcp” ; 26. No âmbito dos mesmos autos de falência, com a data de 19/02/2019, foi apresentado PLANO DE RATEIO, (ARTº. 214º do CPEREF), Prestação de contas (Liquidatário), do qual consta, na parte que ora releva, o seguinte: “MAPA DE RATEIO (Art.° 214.° do CPEREF) (Em obediéricia ao acórdão do Tribunal ...) Em referancia ao produto da venda quanto ao imóvel (…..) Credor em 4.º Lugar (Crédito Garantido pela Hipoteca C4) C..., S.A. , Crédito reclamado e verificado ----------- 5.177.522.17 € Recebem por rateio : C..., S.A ------------------------------------------ 4.279.885.95 € Valor retido --------------------------------------------------- 897.836,22 € a) Total por rateio ------------------------------------------------- 5.177.522,17 € Fica em dívida ------------------------------------------------- 0 € a) (BB e S...?) O valor no montante de 897.836.22 € fica retido tendo em consideração o que vem referido na sentença de verificação e graduação de créditos, nos termos da qual o crédito da CGD extinguir-se-á por via da satisfação que obteve no âmbito do processo de execução fiscal, com a venda dos terrenos dados em garantia por BB e S... e, por sua vez extinguir-se-á o crédito da C... uma vez que a CGD se comprometeu a entregar o produto da venda à C..., podendo estes credores substituir-se na posição dos credores iniciais. (…..) Credor em 7.° Lugar (Crédito Garantido pela Hipoteca C-8) C..., S.A., Crédito reclamado e verificado ------------------------- 3.569.647,15 € Recebem por rateio: C..., S.A. ----------------------------------------------- 202.518,76 € Valor retido ------------------------------------------------------ 897.836,21 € c) Total por rateio ------------------------------------------------- 1.100.354,97 € Fica em dívida -------------------------------------------------- 2.469.292,18 € c) (BB e S...?) O valor no montante de 897.836.21 € fica retido tendo em consideração o que vem referido na sentença de verificação e graduação de créditos, nos termos da qual o crédito da CGD extinguir-so-à por via da satisfação que obteve no âmbito do processo de execução fiscal, com a venda dos terrenos dados em garantia por BB e S... e, por sua vez extinguir-se-á o crédito da C... uma vez que a CGD se comprometeu a entregar o produto da venda à C..., podendo estes credores substituir-se na posição dos credores iniciais” 27. Ainda nos mesmos autos de falência, em 11/04/2019, foi proferida a seguinte decisão: “I - Requerimentos datados de 09.04.2019 com as referências ...67 e ...69 e datados de 10.04.2019 com as referências ...22, ...49 e ...66 Por requerimento datado de 09.04.2019 C..., BB e os sócios da extinta S... juntaram transação aos autos. Esta transacção tem por objecto a reclamação apresentada no requerimento datado de 07.03.2019 com a referência ...79. Este requerimento implica uma apreciação dos créditos relativos às inscrições das hipotecas C4 e C8, tendo em consideração todos os elementos juntos aos autos, o que vem referido na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, que prevê a possibilidade da S... e BB se sub-rogarem na posição da Caixa Geral de Depósitos na divisão pelos credores do produto que advenha da liquidação dos bens integrantes da massa falida, na medida em que prestaram garantias e nessa medida acabaram por pagar créditos da falida, desde que demonstrem que a Caixa Geral de Depósitos já obteve pagamento no âmbito da execução fiscal com a venda dos imóveis dados em garantia (hipotecas) porquanto a CGD deixará de ser credora nesta falência. Ora, na reclamação apresentada considera a credora C... que os titulares dos prédios hipotecados vendidos no âmbito da execução fiscal, não deverão ser contemplados no rateio por via da sub‑rogação legal, como referido na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, mas antes deverão exercer os seus direitos através de uma acção de regresso instaurada contra a massa falida. Contra esta posição vieram manifestar-se BB e S..., Lda., alegando para o efeito "(...) o que compete aos ora reclamantes é provar "...que a Caixa Geral de Depósitos obteve pagamento no processo de execução.", o que foi feito através da junção dos documentos supra mencionados em 2., 23. Acrescendo a confissão da venda dos preditos imóveis em sede de execução e sua aquisição pela própria CGD, no requerimento por si junto aos autos em 16.01.2014. 24. Aliás, todos os bens adquiridos pela referida via de adjudicação com dispensa de depósito do preço foram imediata e subsequentemente revendidos a terceiros, pelo que assim se vê que a CGD não só nada despendeu em processo executivo tributário, como imediatamente realizou o produto desses investimentos, continuando - alegadamente até à presente data - sem pagar qualquer parte do preço dos bens que adquiriu aos credores que pudessem, em sede de execução fiscal, ter ficado graduados à sua frente. 25. Porém, a demonstração de que não se locupletou com a totalidade dos valores que recebeu em sede de execução fiscal, resultante da aquisição para si dos imóveis dados em garantia pelos ora reclamantes com dispensa de depósito do respectivo preço, no valor total de Eur. 1.795.672,43 pelos três imóveis executados, não cabe aos ora reclamantes mas antes à própria CGD - que reclama ter pago algo que nunca demonstrou nos presentes autos -, não lhes podendo ser exigida tal prova como condição de recebimento dos valores a que têm direito, sob pena de subversão das regras de ónus da prova. 26. Mais acrescendo, outrossim, que o cumprimento do estabelecido entre a CGD e a C... SA no contrato de cessão de créditos é totalmente alheio aos ora reclamantes, não podendo igualmente constituir qualquer obstáculo ao pagamento direto e imediato dos valores dos imóveis executados aos ora reclamantes em sede de rateio. 27. Na verdade, não só os ora reclamantes não intervieram no referido negócio, como acresce que mesmo havendo incumprimento por parte da CGD - designadamente por esta não ter, eventualmente, entregue à C... SA o produto da venda dos referido imóveis em sede de execução fiscal -, o que se desconhece, caberá apenas e só à C... SA o direito de reclamar, querendo, tal cumprimento em sede própria e autónoma da presente falência. 28. Em suma, resulta do supra exposto que os créditos reclamados pela CGD nos presentes autos foram parcialmente cedidos à C..., S.A., tendo sido a mesma habilitada à parte cedida pelo Apenso 75/14.... 29. O imóvel sito na freguesia ..., concelho ..., serviu de garantia ao cumprimento das obrigações assumidas pela So..., S.A. à CGD, conforme resulta do Contrato de Crédito que serve de base à reclamação de créditos da CGD nos presentes autos, tendo sido excluído da cessão de créditos efetuada pela CGD à C..., S.A. (cfr. 75/14...). 30. Demonstrado e provado que se mostra o pagamento parcial dos créditos garantidos pelas hipotecas registadas como C4 e C8, efetuado pela S.... Lda. à custa da venda do imóvel que deu como garantia do cumprimento da obrigação da falida, fica a ora reclamante sub-rogada nos direitos da credora originária CGD, adquirindo os poderes que a esta competiam, no caso, a receber diretamente da Massa Falida o valor de Eur. 897.836,21 (oitocentos e noventa e sete mil, oitocentos e trinta e seis euros e vinte e um cêntimos). verificado e graduado em 4.° (quarto) lugar, sob a designação hipoteca C-4. 31. De igual forma, demonstrado e provado que se mostra o pagamento parcial dos créditos garantidos pelas hipotecas registadas como C4 e C8, efetuado por BB, à custa da venda dos imóveis que deu como garantia do cumprimento da obrigação da falida, fica também o ora reclamante directa e imediatamente sub-rogado nos direitos da credora originária CGD, verificados e graduados em 4.° (quarto) lugar, sob a designação hipoteca C-4, adquirindo os poderes que a esta competiam, no caso, a receber diretamente da Massa Falida os valores de Eur. 498.797,90 (quatrocentos e noventa e oito mil, setecentos e noventa e sete euros e noventa cêntimos). pela venda do imóvel sito na freguesia ..., concelho ..., e de Eur. 399.038,32 (trezentos e noventa e nove mil, trinta e oito euros e trinta e dois cêntimos), pela venda do imóvel sito na freguesia ..., concelho .... 32. O que ora requerem, nos termos e para os efeitos do disposto pelos arts. 592.° e 593.°, ambos do CCivil. 33. Tais quantias não deverão, consequentemente, ficar retidas, conforme se propõe no Mapa de Rateio ora em apreço, antes devendo ser pagas de imediato, em igualdade de circunstância com aos demais credores verificados e graduados, nos exatos termos e montantes acima (e já anterior e oportunamente) bem identificados e descriminados, considerando que a sua retenção infundada e sem determinação de condição a cumprir ou prazo de verificação para o seu desbloqueio, constitui um intolerável ónus imposto sobre os ora reclamantes, injusto e injustificado em face dos elementos documentais e decisões judiciais supra melhor identificados. 34. Acresce que os credores originários são legalmente obrigados a participar nos presentes autos todas as quantias que já hajam recebido de condevedores solidários da falida, sob pena de serem condenados a restituir em dobro o que indevidamente receberem, mais respondendo, em todo o caso, pelos danos que causarem aos aqui reclamantes - cfr. Art. 1257.° do CPC na versão vigente em 15.03.1993. A Caixa Geral de Depósitos, no requerimento datado de 12.03.2019, com a referência ...29, vem alegar que "( ...) Por for a da falência da mutuária, foram penhorados no âmbito da execução os imóveis titulados pelos garantes, os quais se encontram devidamente identificados no requerimento executivo e de seguida se discriminam. - Prédio urbano da freguesia ..., concelho ..., descrito da Conservatória do Registo Predial ... saba o n.? 3026, fls. 113v, L." B-9 e inscrito na matriz sob o artigo ...19; - Prédio urbano da freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n." ...87 e inscrito na matriz sob o artigo n." ...30; - Prédio urbano da freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n." ...90 e inscrito na matriz sob o artigo n." ...51. 3. Para a venda dos citados imóveis foram expedidas carta precatórias, para os Serviços de Finanças ..., ...-2 (...) e .... 4. Nas vendas efectuadas nos referidos Serviços de Finanças, todos os imóveis foram adjudicados à CGD, S.A., pelos valores de 180.000.000$00 (cento e oitenta milhões de escudos) a que corresponde o actual contravalor de € 897.836,21, 80.000.000$00 (oitenta milhões de escudos) a que corresponde o contravalor de € 399.038,32 e € 498.797,90, respectivamente. 5. A CGD, S.A. ficou dispensada do depósito do preço, conforme plasmado nos respectivos Titulas de Adjudicação, dos quais se juntam cópias, como Docs. n.ºs 2, 3 e 4. 6. No entanto, no âmbito dos referidos autos de execução foram já pagas custas em Maio de 2008, na Carta Precatória ao Serviço de Finanças ... 2 - ... - ...56, pelo montante de € 9.481,78 (Doc. n." 5) e posteriormente, em 05.08.2016, no valor de € 28.565,61, respeitante ao valor total da quantia exequenda, resultando tal pagamento da Liquidação elaborada na Carta Precatória ao Servi o de Finanças ... ...71, em 02.02.2015, após reclamação apresentada para o Tribunal Tributário ... no Proc." 163/08.... (Verificação e Graduação de Créditos), à conta de custas de 05.11.2014 e como melhor resulta dos esclarecimentos prestados pelo Oficio n.? 439, de 21.01.2016 do SF da ... 2 (Docs. n.os. 6 a 10). 7. Assim sendo a Caixa Geral de Depósitos, S.A,. não recebeu qualquer valor da venda dos imóveis no âmbito do processo de execução fiscal, uma vez que ficou dispensada do depósito do preço, todavia, foram suportadas as despesas supra identificadas que terão necessariamente de ser levadas em conta, na imputação aos créditos reclamados nos presentes autos, apesar de aqui representarem tais créditos natureza comum, uma vez que a garantia real de que beneficiavam pertencia aos garantes, executados no processo fiscal (…)" Cumpre apreciar e decidir Como se refere na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado "( ... ) os créditos da CGD derivavam de quatro empréstimos (aberturas de crédito), referidos nas al. a), b), c) e d) de K5.1 dos factos assentes.( ... ) Os créditos derivados dos contratos referidos em c) e d) (e respectivas garantias), foram cedidos à C..., juntamente com as garantias associadas 804 - C... que se habilitou como adquirente no processo (apenso BE). Nestes créditos importa porém atender às garantias hipotecárias prestadas por terceiros [dois prédios de BB e um prédio de S... Lda, cada um destes prédios afectado aos dois empréstimos referidos nas alo c) e d) mas através de hipotecas autónomas e sucessivas], pois, tendo esses prédios sido vendidos, o valor da venda que seja afectado ao pagamento do crédito da CGD deverá ser atendido como causa de extinção parcial do crédito reclamado [a situação foi atendida na cessão de créditos, com a CGD a excluir da cessão as hipotecas sobre o prédio da S... Lda, e a reservar para si o pagamento que lhe venha a caber no produto da venda desse prédio: e a comprometer-se a entregar ao cessionário o valor que lhe venha a caber no produto da venda dos outros dois prédios]. As vendas dos três prédios hipotecados estão reveladas no processo, mas não os pagamentos devidos ao credor por força dessas vendas. Assim, os créditos derivados daqueles empréstimos devem valer como reconhecidos mas sem prejuízo de, antes dos pagamentos, se apurar a existência de efectivos pagamentos nas execuções onde ocorreram as aludidas vendas. ( ... ). Associado aos créditos da CGD vem questão atinente aos credores BB e S... SA, por referência às hipotecas por si constituídas para garantir créditos daquela CGD [como os prédios hipotecados foram vendidos808 em execuções movidas para cobrar os créditos da CGD, estes credores reclamaram para si, por sub-rogação, parte do crédito da CGD (correspondente ao valor das vendas), e requereram ainda o abatimento dos valores das vendas ao crédito da CGD e, depois, da C...]. As vendas estão documentadas nos autos 809 Aliás, será também apenas quanto a este valor que os titulares dos prédios hipotecados podem invocar a sub-rogação legal. Assim, estes credores começaram por reclamar os seus créditos derivados das vendas (fls. 512 777) 111 s tais reclamações foram julgadas ineptas (fls. 5940), por decisão que transitou em julgado. Pese embora tenham, posteriormente, voltado a referir esses créditos [quer para solicitarem a sua dedução ao crédito da CGD, quer para que sejam considerados como créditos próprios (no âmbito de pedido de reforma do despacho de fls. 12.046), quer para oferecerem prova documental, no âmbito da instrução], a verdade é que aquela decisão excluiu as suas reclamações, pelo que, como créditos próprios, não podem ser considerados neste apenso por falta de válida reclamação (sem prejuízo, claro, de outro meio processual disponível). No que toca ao pedido de abatimento do valor das vendas aos créditos da CGD (ou C...), a pretensão assenta num equívoco pois, como os credores visados referiram no apenso BE, o preço da venda judicial, no âmbito do processo executivo, constitui coisa diferente do valor entregue ao credor para pagamento do seu crédito. Aquele preço não se imputa no crédito do exequente porque constitui apenas o produto da venda executiva, do qual se dará pagamento aos credores que eventualmente concorram na execução (havendo sempre que respeitar a regra da precipuidade das custas). Assim, o que interessa neste sede não é o valor da venda mas a parte do valor da venda que foi entregue ao credor exequente809. Realidade esta que, como se disse supra, se desconhece (nunca foi alegada nem demonstrada) e, por isso, não será considerada nesta decisão - mas deverá ser avaliada antes dos pagamentos [aliás, por assim ser, as reclamação não seriam ainda admissíveis: como a sub-rogação só funciona com o pagamento ao credor (e não com a venda do bem que funciona como garantia), nos termos do já referido art. 592° n.°1 do CC, e esse pagamento não está ainda demonstrado (não se sabe sequer se já ocorreu), estes interessados não têm ainda demonstrado um crédito que possam reclamar]." Salienta-se desde já, Resulta dos autos que a sociedade S..., Lda. foi liquidada. Assim, esta passará a ser representada pelos seus sócios, pois nos termos do artigo 160°, n.° 1, do Código das Sociedades Comerciais, a sociedade considera-se extinta pelo registo de encerramento da liquidação. Mais, determina o artigo 162° do mesmo diploma legal que as acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, não havendo lugar à suspensão da instância nem a habilitação. Assim, relativamente a esta sociedade credora será representada pelos seus sócios. No entanto, continuaremos a fazer referência à sociedade S.... Conclui-se pois, que a sentença de verificação e graduação de créditos reconhece o direito de BB e S... S.A. se substituirem na posição da credora Caixa Geral de Depósitos, por referência às hipotecas por estes prestadas para garantir créditos daquela CGD, na medida em que esta obteve/foi ressarcida no âmbito do processo de execução fiscal uma vez os bens lhe foram adjudicados com a dispensa do pagamento do preço, tendo a Caixa Geral de Depósitos transmitido os bens, com a consequente extinção dos créditos reclamados nesta falência. Todos estes factos se encontram demonstrados nos autos - cfr. documentos juntos. De facto, a transmissão pela Caixa Geral de Depósitos dos imóveis adjudicados no âmbito do processo de execução fiscal equivale ao pagamento. Consideramos que o direito de BB e S... S.A. não deverá ser exercido contra a falida numa acção de direito de regresso. Isto porque, o direito de regresso é próprio do regime das obrigações solidárias (artigos 497° e 524° do Código Civil), e não estamos, neste caso, perante um direito de regresso, mas sim perante uma sub-rogação. E, uma vez que este direito resulta da lei, estamos no âmbito da sub-rogação legal. A sub-rogação traduz-se numa forma de transferência de cré ditos, correspondentemente regulada no Código Civil no capitulo relativo à "transmissão de créditos e dívidas". Pressuposto necessário e essencial da sub-rogação ou seu fundamento jurídico base é o cumprimento duma obrigação por terceiro - art. 592°, n" l , do Código Civil. Como tal, a sub-rogação verifica-se quando, cumprida a obrigação por terceiro, o crédito respectivo não se extingue, mas antes se transmite por efeito desse cumprimento para o terceiro que realiza a prestação (neste caso, BB e S... S.A.). Deste modo, o crédito anteriormente pertencente ao credor pago ou indemnizado transmite-se para o sub-rogado (BB e S... S.A.) que, assim, ingressa e fica colocado na posição jurídica que o credor satisfeito antes detinha. Logo, o crédito reconhecido à Caixa Geral de Depósitos poderá ser objecto de sub-rogação por BB e S... S.A. se o crédito da Caixa Geral de Depósitos for extinto. Assim, BB e S... S.A. vêm substituir-se ao credor (CGD) no exercício do seu direito de crédito. O crédito dos sub-rogados (BB e S... S.A.) continua, assim, a ser o mesmo que pertencia ao primitivo credor (CGD). Isto porque, BB e S... S.A. eram titulares de bens que deram em garantia e que foram vendidos no âmbito do processo de execução fiscal, pelo que ficam sub-rogados nos direitos da CGD na medida em que resulta demonstrado que esta obteve pagamento no âmbito da execução fiscal, por via da adjudicação dos imóveis. Saliente-se que os terceiros, S... e BB, não têm direito aos imóveis, mas apenas direito sobre a falida porquanto pagaram créditos desta, tendo para tal contribuído com o seu património. Todavia, na sentença de verificação e graduação de créditos refere-se que os titulares dos prédios hipotecados apenas poderão invocar a sub-rogação legal quanto ao valor das vendas, o que significa que apenas deverão ser pagos por conta do valor da venda. Atenta a transacção junta aos autos, nos termos da qual, em suma, e tendo em consideração a parte que interessa aos presentes autos: - A C... cede à S... o valor que lhe coube no rateio por conta da inscrição da hipoteca C4 (4° lugar) no montante de 897.836,22 euros (oitocentos e noventa e sete mil, oitocentos e trinta e seis euros e vinte e dois cêntimos), desistindo desta parte do pedido a favor dos sócios da extinta S..., requerendo que no rateio este valor seja entregue aos mesmos. - Por sua vez os sócios da extinta S... e BB declaram, em suma, que com a entrega desta quantia nada mais têm a reclamar ou a requerer no âmbito deste processo de falência por conta das garantias que prestaram à Caixa Geral de Depósitos a respeito das quais lhes foi reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos o direito de se sub-rogarem na posição da referida Caixa Geral de Depósitos, na medida em que viessem demonstrar que esta foi paga no âmbito da execução fiscal e porquanto nesse caso deixaria de deter a qualidade de credora nestes autos. - Requerem a homologação do acordo. Como se disse os sócios da extinta S... e BB têm direito a sub-rogar-se nos direitos da Caixa Geral de Depósitos como determinado na sentença de verificação e graduação de créditos. Tal legitima a sua intervenção nestes autos e na transacção junta aos autos. A transacção junta aos autos retira o objecto à reclamação apresentada. Esta transacção consubstancia em parte uma cedência de parte do crédito da C... à S.... Por sua vez a S... e BB renunciam a reclamar quaisquer outros créditos nesta falência. Vejamos, A transação consubstancia um negócio de auto-composição do litígio, sendo este bilateral, uma vez que pressupõe um acordo de vontades entre Autor e Réu, mediante o qual, as partes podem pôr termo ao processo, por sua iniciativa, desde que verificados os pressupostos legais, estando perante uma manifestação do princípio do dispositivo (cfr. artigo 283°, n° 2 do Código de Processo Civil). Como se sabe, a transação pode ter como efeito a modificação do pedido ou fazer cessar a causa nos precisos termos acordados (artigos 284° do Código de Processo Civil. Compulsada a transacção elaborada entre as partes, conclui-se que a vontade das partes vai no sentido de pôr termo ao presente processo, visando assim a sua extinção. Convém salientar que esta transacção em nada interfere com a distribuição aos restantes credores porquanto apenas se cinge à distribuição dos valores por conta da das inscrições das hipotecas C4 e C8, sendo que: - Na inscrição da hipoteca C4 a C... reclamou um crédito o montante de 5.177.522,17 euros que foi verificado e ao ceder o valor de 897.836,22 euros à S... apenas vai receber o valor de 4.279.685,95 euros. - Na inscrição da hipoteca C8 a C... reclamou um crédito no montante de 3.569.647,15 euros que foi verificado e a S... e BB ao renunciarem a quaisquer outros direitos significa que a C... vai receber o valor de 1.100.354,97 euros, acrescido do valor sobrante que ficou retido para despesas processuais. Daqui decorre que a transacção apresentada pela S... e C... não carece do consentimento dos credores. Atendendo aos elementos juntos aos autos e ao supra explanado, conclui-se que esta transação é válida. Mais, os sujeitos processuais encontram-se representados por Mandatário com procuração com poderes especiais. Por se mostrar válida, quer pela disponibilidade do seu objeto, quer pela qualidade das pessoas nela intervenientes, homologo, pela presente sentença, a transação elaborada entre, as partes, condenando e absolvendo ambas as partes, no estrito cumprimento do acordado e, em consequência, declaro extinta a instância, nos termos do disposto pelos artigos 277°, al. d), 283°, n° 2, 284°, 289° e 290°, n° 1 e 3, todos do Código Processo Civil. Registe e notifique. Uma vez que as partes renunciaram ao prazo de recurso (requerimento datado de 10.04.2019), a presente sentença transita de imediato em julgado. Notifique. Perante o exposto, deverá ser rectificado o mapa de rateio relativamente às inscricões das hipotecas C4, C6 e C8. Para o efeito, tendo em consideração as reclamações apresentadas e o já decidido a propósito no despacho datado de 08.04.2019 a propósito da inscrição da hipoteca C6 - com a concordância do Turismo de Portugal e C... (requerimento datado de 10.04.2019) – a desistência da reclamação da C... a respeito do direito de retenção (requerimento datado de 10.04.2019) e na presente sentença, proceda à rectificação no local próprio, lavrando cota no processo, introduzindo as seguintes alterações: - Inscrição da hipoteca C4 C... » 4.279.685,95 euros S... » 897.836,22 euros - Inscrição da hipoteca C6 Turismo de Portugal, IP » 274.587,74 euros C... » 1.117.840,13 euros - Inscrição da hipoteca C8 C... » 1.100.354,97 euros, acrescido do valor sobrante que ficou retido para despesas processuais. Notifique os sujeitos visados - C..., Turismo de Portugal, Caixa Geral de Depósitos, sócios da extinta S... na pessoa da sua Mandatária Dra. AA e BB. * II - Tendo em consideração o mapa de rateio apresentado pela secção, não havendo controvérsia ou dúvida quanto ao rateio efectuado, uma vez efectuadas as alterações agora determinadas, com notificação aos credores visados, decorrido o prazo legal da primeira notificação sem mais reclamações, determino o pagamento quanto ao plano efetuado. D.N. * III - Verificado o determinado no ponto II, notifique de imediato o liquidatário para que proceda de imediato ao pagamento aos credores de acordo com o mapa de rateio, devendo juntar o respectivo comprovativo. Para o efeito, deverá proceder à transferência bancária para o IBAN/NIB indicados e, nos casos em que tal informação não tenha sido junta deverá proceder ao pagamento por cheque. No pagamento aos credores deve reter-se o valor que couber no rateio aos herdeiros ainda não habilitados. Notifique o liquidatário e d.n. * IV - Comunique ao Conselho Superior da Magistratura. D.N.”. ** B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO I) Da NULIDADE da SENTENÇA, por preenchimento da causa enunciada na 2ª parte, da alínea d), do nº. 1, do artº. 615º, do Cód. de Processo Civil Invoca a Apelante que o Tribunal a quo, ao “suscitar dúvidas sobre o processo que conduziu à extinção da sociedade ré originária – que as partes (autora e ré) aceitaram nos autos como decorrente de procedimento de dissolução administrativa e se mostra suficientemente indiciada nos autos pelo documento junto pela autora – e valorar a inexistência de prova quanto à “inexistência de activo da empresa ré à data da sua extinção”” incorre em nulidade por excesso de pronúncia, com legal enquadramento no disposto no artº. 615.º, 1, d), in fine do Cód. de Processo Civil, “atendendo a que a parte que invocou o facto da extinção societária em seu proveito, a autora, não alegou que tal extinção houvesse decorrido de procedimento diverso do indiciado pelo documento emitido pela Conservatória do Registo Comercial”. Acrescentou, ainda, constituir igualmente nulidade por excesso de pronúncia, com idêntico enquadramento jurídico, “atendendo a que não só a autora não alegou que a sociedade ré detinha bens para partilhar no seu activo, à data da sua extinção, como se deverá atender a que o ónus da prova sobre a existência desses bens deveria recair sobre a autora – por ser a esta que tal facto aproveitaria – e não sobre a sociedade ré ou os seus antigos sócios, réus substitutos (cfr. arts. 5.º, 341.º e 342.º, 1, todos do CCivil)”. Conclui, referenciando que de tais nulidades resultantes do raciocínio judicial exposto na sentença apelada, resultam, por subsequente cadência, manifestos erros na sentença recorrida. Apreciemos: Enunciando as causas de nulidade da sentença, prescreve a alínea d), do nº. 1, do artº. 615º, ser “nula a sentença quando: d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” (sublinhado nosso). Por sua vez, o nº. 2, do artº. 608º, prevendo acerca das questões a resolver e sua ordem, referencia que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras ; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”. No regime jurídico das nulidades dos actos decisórios releva “a divergência entre o que é objectivamente praticado ou declarado pelo juiz, e o que a lei determina ou o que resultou demonstrado da produção de prova”. Estamos no campo do error in procedendo, que se traduz “na violação de uma disposição reguladora da forma (em sentido amplo) do ato processual: o ato executado é formalmente diferente do legalmente previsto. Aqui não se discute se a questão foi bem julgada, refletindo a decisão este julgamento acertado – por exemplo, é irrelevante que a sentença (à qual falte a fundamentação) reconheça a cada parte o que lhe pertence (suum cuique tribuere)” [5] [6]. Assim, nas situações ou manifestações mais graves, o error in procedendo fere o acto de nulidade, estando-se perante vícios do acto processual formais, pois os “vícios substanciais, como por ex., os cometidos na apreciação da matéria de fundo, ou na tramitação do processo, são objecto de recurso, não se inserindo na previsão normativa das nulidades” [7]. A diferenciação ocorre, assim, por referência ao error in judicando, que “é um vício de julgamento do thema decidendum (seja este de direito, processual ou material ou de facto). O juiz falha na escolha da norma pertinente ou na sua interpretação, não aplicando apropriadamente o direito – dito de outro modo, não subsume correctamente os factos fundamento da decisão à realidade normativa vigente (questão de direito) -; ou falha na afirmação ou na negação dos factos ocorridos (positivos ou negativos), tal como a realidade histórica resultou demonstrada da prova produzida, havendo uma divergência entre esta demonstração e o conteúdo da decisão de facto (questão de facto). Não está aqui em causa a regularidade formal do ato decisório, isto é, se este satisfaz ou não as disposições da lei processual que regulam a forma dos atos. A questão não foi bem julgada, embora a decisão – isto é, o ato processual decisório – possa ter sido formalmente bem elaborada. A decisão (ato decisório) que exteriorize um error in judicando não é, com este fundamento, inválida. O meio adequado à sua impugnação é o recurso, sendo o objecto deste o julgamento em que assenta a pronúncia. Confirmando-se o julgamento, a decisão é mantida; no caso oposto, é, por consequência, cassada, ou revogada e substituída – dependendo do sistema de recursos vigente” [8]. As nulidades de sentença – cf., artigos 615º e 666º -, integrando, juntamente com as nulidades de processo – artigos 186º a 202º -, “o género das nulidades judiciais ou adjectivas”, distinguem-se, entre si, “porquanto, às primeiras, subjazem desvios ao formalismo processual prescrito na lei, quer por se praticar um ato proibido, quer por se omitir uma ato prescrito na lei, quer por se realizar um acto imposto ou permitido por lei mas sem o formalismo requerido, enquanto que as segundas se traduzem na violação da lei processual por parte do juiz (ou do tribunal) prolator de alguma decisão”. Como vício de limite, a nulidade de sentença enunciada na transcrita alínea d) divide-se em dois segmentos, sendo o segundo atinente ao excesso de pronúncia. Neste, em correspondência com o citado 2º segmento, do nº. 2 do artº. 608º, “encontra-se vedado ao juiz conhecer de causas de pedir não invocadas ou de excepções que não sejam do seu conhecimento oficioso” [9]. No excesso de pronúncia, e a nulidade daí resultante de excesso de pronúncia de facto, nas palavras de Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro [10], “não é de conhecimento oficioso, só podendo o tribunal que proferiu a decisão anular (parcialmente) a sentença com esse fundamento, sobre requerimento da parte (art. 196º). Embora este vício seja impressivo, por representar uma ostensiva violação do matricial princípio dispositivo, é por esta mesma razão que não se justifica o seu conhecimento oficioso. Se o vencido renuncia a invocar a inadmissibilidade da pronúncia sobre o facto essencial – o que está na sua disponibilidade (art. 264º) -, sujeita-se á sua consideração pelo tribunal ad quem na base factual do julgamento de direito”. Analisada a decisão apelada, e de forma liminar, não se constata, minimamente, que a mesma tenha incorrido no aludido excesso de pronúncia. Com efeito, não vislumbramos que a decisão sob apelo tenho violado o nuclear princípio do dispositivo, ou seja, que esta tenha conhecido de qualquer causa de pedir não invocada pela parte competente, ou de excepções não invocadas, para além das que permitem o oficioso conhecimento. Conhecimento, aliás, que não é sequer invocado pela Recorrente, pois a razão da sua discórdia, já supra exposta, não é atinente a qualquer excesso de conhecimento, mas antes ao alegado incumprimento de regras do ónus probatório, o que é atinente a eventual erro de julgamento, quanto ao mérito do decidido, e não a qualquer violação de regras procedimentais, capaz de macularem a decisão com o imputado vício. O que determina, necessariamente, e sem outras delongas, improcedência das invocadas nulidades da sentença, com legal inscrição na 2ª parte, da alínea d), do nº. 1, do artº. 615º, do Cód. de Processo Civil e, consequentemente, juízo de improcedência, nesta parte, da apelação em apreciação. II) Da NULIDADE da SENTENÇA, por violação dos deveres de isenção e equidistância relativamente às partes em conflito (artigos 4º e 651º, nº. 1, alí. c), in fine, e e), ambos do Cód. de Processo Civil) Referencia, igualmente, a Apelante que a sentença sob apelo imputa uma referência negativa aos Réus substitutos quando referencia que “…tudo se passando como se se tratando de uma partilha de um activo societário de elevado valor que entrou na sua titularidade em razão da sua qualidade de sócios, sem que, no entanto, e apesar do tribunal ter tentado a conciliação das partes, os mesmos sócios tenham manifestado qualquer vontade de liquidar as alegadas rendas em dívida em valor correspondente a cerca de 1/16 desse montante.”. Aduz que o julgador “a quo deveria manter uma posição de equidistância, isenção e imparcialidade em relação às partes do pleito”, conforme imposto pelo artº. 4º, do Cód. de Processo Civil, e que a tentativa de conciliação das partes “decorre de um dever geral de função – cfr. arts. 6.º,1, do CPC – mas não lhe permite, s.m.o., a projecção em Sentença de juízos de valor depreciativos relativamente à parte (ou partes) que não tenham acedido na conciliação tentada”. Acrescenta, ainda, que mesmo que se entenda, conforme parece ser o caso, “que haveria uma certa “obrigação moral” por parte dos réus substitutos em pagar a quantia em que agora condenou a sociedade ré extinta em 30/01/2018, o que se configura apenas para efeito de mero raciocínio académico, sem, porém, conceder”, tal não justificará que o Tribunal viole várias regras, “quer na apreciação dos factos provados em julgamento, quer na aplicação do Direito”. Adita, ainda, ter fixado “demonstrado que em 11/04/2019, a ré substituta representou, como mandatária judicial com poderes especiais para o efeito, os interesses de diversas entidades num processo de falência em que a sociedade ré extinta em 30/01/2018 também havia sido interessada e, com base nesse mandato judicial, terá recebido a quantia de € 808.952,58, sem prejuízo de não se ter provado quer que a referida mandatária judicial tenha beneficiado de qualquer parte desse valor, na referida qualidade de “antiga sócia” da sociedade ré, quer que o referido valor tenha sido recebido pela mandatária judicial exclusivamente em benefício dos “antigos sócios” da sociedade ré”. Donde, conclui, a sentença sofrerá de nulidade, “por violação dos deveres de isenção e equidistância relativamente às partes em conflito, patente no art. 4.º do CPC2013, ou seja, fundando a condenação no pagamento de determinado valor por imputação aos réus substitutos de um certo “dever moral” que não tem cabimento nos presentes autos, o que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto pelo art. 615.º, 1, c) e e), do CPC2013”. Na resposta apresentada, referencia a Recorrida Autora que aquela pretende distorcer a realidade, num puro “exercício de maledicência gratuita”, pois, caso a mesma Recorrente entendesse que a titular do processo não “estaria em condições de julgar a causa, poderia sempre recorrer ao instituto da suspeição, e não vir em sede de recurso, porque foi condenada, suscitar uma questão que nunca colocou, e que apenas a falta de fundamento para o presente recurso, a faz ir pela via mais nebulosa, de arguir a falta de isenção do Magistrado titular, e por essa circunstância requerer a nulidade da sentença recorrida, o que mais uma vez revela a atitude errática da recorrente em todo este processo”. Decidindo: Enunciando as causas de nulidade da sentença, prescrevem as alíneas c) e e), do nº. 1, do artº. 615º, ser “nula a sentença quando: c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível ; e) o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido” (sublinhado nosso). Por sua vez, estipulando acerca dos limites da condenação, referencia o nº. 1, do artº. 609º, igualmente do Cód. de Processo Civil, que “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”. No que concerne à causa de nulidade equacionada pela transcrita alínea c), refere Ferreira de Almeida [11] tratar-se na presente causa de nulidade de “uma «construção viciosa», ou seja, de um vício lógico da sentença: o juiz elegeu deliberadamente determinada fundamentação e seguiu um determinado raciocínio para extrair uma dada conclusão ; só que esses fundamentos conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a um resultado oposto a esse, isto é, existe contradição entre os fundamentos e a decisão (por ex., toda a lógica fundamentadora da sentença apontaria para a condenação do réu no pagamento da dívida reclamada pelo autor, mas o juiz, na sentença, decreta, de modo contraditório, a absolvição do réu do pedido). Não se trata de um qualquer simples erro material (em que o juiz escreveu coisa diversa da pretendida – contradição ou oposição aparente) mas de um erro lógico-discursivo em termos da obtenção de um determinado resultado – contradição ou oposição real. O que não se confunde, também, com o chamado erro de julgamento, isto é, com a errada subsunção da hipótese concreta na correspondente fattispecie ou previsão normativa abstracta, vício este só sindicável em sede de recurso jurisdicional”. Por outro lado, acrescenta, a sentença padece de ambiguidade “quando alguma das suas passagens se presta a diferentes interpretações ou pode comportar mais do que um sentido, quer na fundamentação, quer na decisão”, sendo que este fundamento de nulidade da 2ª parte da alínea c) apenas ocorre “se tais vícios tornarem a «decisão ininteligível» ou incompreensível”. Na presente causa de nulidade da sentença não está em equação “um problema de viciação da pronúncia de facto”, mas antes “uma contradição entre o segmento decisório final e a fundamentação – podendo esta ser, incluindo a decisão de facto, intrinsecamente coerente. A fonte do vício (obscuridade ou ambiguidade) situa-se na fundamentação, na sua ambiguidade ou na sua obscuridade, vindo depois a contaminar a decisão, tornando-a ininteligível. A fundamentação assume aqui o papel de elemento de interpretação extrínseco (hoc sensu), auxiliando o destinatário na interpretação da decisão, dela se extraindo que não é seguro que a decisão tenha o sentido unívoco que aparentava ter, sendo, sim, ininteligível”. Pelo que “o elemento viciador em causa tanto pode situar-se nos fundamentos, como no segmento decisório da sentença”, sendo que o “vício oriundo da fundamentação só é relevante quando comprometa inquestionavelmente a decisão: a ambiguidade ou obscuridade pontual da fundamentação são irrelevantes, neste contexto, quando não provoquem a ininteligibilidade da decisão” [12]. Na pronúncia ultra petitum enunciada na transcrita alínea e), do nº. 1, do artº. 615º, ocorre violação do “princípio do dispositivo na vertente relativa à conformação objectiva da instância”, ao não serem observados “os limites impostos pelo art. 609-1, condenando ou absolvendo em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido” [13]. Não pode, deste modo, o juiz, “ultrapassar na sentença os limites do pedido (ou dos pedidos deduzidos), em violação do princípio dispositivo. É que lhe impõe o nº. 1 do artº. 609º ; a condenação em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido, ex-vi da al. e) do nº. 1 do artº 615º”. Assim, não pode o juiz, “sob pena de nulidade, condenar ultra-petitum, ou seja, em quantidade superior ou em objecto (qualidade) diversos dos constantes do pedido”, sendo exemplo de condenação em objecto diverso o caso do “autor pedir a restituição da coisa comodatada e a sentença condenar o réu a entregar-lhe uma outra coisa em substituição daquela ou a prestar um outro facto que não o da entrega da coisa”. Bem como o exemplo de que “tendo o autor pedido o reconhecimento do seu direito de propriedade por ter adquirido, por compra, certo prédio, não pode o juiz, na sentença, reconhecer esse direito com fundamento em que o ter adquirido por sucessão, ainda que os factos em que se baseie tenham sido alegados, a outro título, no processo” [14]. Ora, este “balizamento cognitivo (…) é operado pelo objeto do processo (pedido e causa de pedir) tal como definido (a título principal) pelo autor na petição inicial”. O mesmo autor, sustentado no entendimento de Miguel Mesquita [15], advoga, no que á presente causa de nulidade concerne, o que apelida de “flexibilização do princípio do pedido”, tendo por base a necessidade de ponderação “do princípio da efectividade (eficiência/eficácia)”, bem como tendo “sempre presente o princípio da proporcionalidade, nas suas vertentes da justa medida e da proibição do excesso”. Tal adopção determina que “seja de reconhecer ao juiz a faculdade de «sugerir (ex-officio) uma modificação do pedido» e em que, por tal, «o princípio do pedido deva ser suavizado ou mitigado» quando o autor requeira unicamente certa providência que os factos alegados e provados demonstrem revestir-se de um carácter demasiado drástico ou oneroso”. Ora, um dos campos de intervenção do julgador situa-se ao nível dos “poderes/deveres do juiz com vista ao aperfeiçoamento dos articulados (artº 591º, nº. 1, al. c)) ou mesmo os seus poderes instrutórios dimanados do princípio do inquisitório (artº 411º)”. Todavia, conclui-se, “«qualquer desvio, na sentença, relativamente ao pedido exigirá sempre o prévio respeito pelos princípios da cooperação, do contraditório e do dispositivo e da igualdade das partes»”, devendo sempre o tribunal “«trabalhar com base nos factos alegados, não abrindo a porta a novos factos sob pena de violação do princípio do dispositivo»” [16] [17]. Deste modo, “o juiz não pode conhecer, em regra, senão das questões suscitadas pelas partes ; na decisão que proferir sobre essas questões, não pode ultrapassar, nem em quantidade, nem em qualidade, os limites constantes do pedido formulado pelas partes”. Pelo que “não pode condenar em objecto diverso do que se pediu, isto é, não pode modificar a qualidade do pedido. Se o autor pediu que o réu fosse condenado a pagar determinada quantia, não pode o juiz condená-lo a entregar coisa certa ; se o autor pediu a entrega de coisa certa, não pode a sentença condenar o réu a prestar um facto ; se o pedido respeita á entrega duma casa, não pode o juiz condenar o réu a entregar um prédio rústico, ou a entregar casa diferente daquela que o autor pediu ; se o autor pediu a prestação de determinado facto (a construção dum muro, por hipótese), não pode a sentença condenar na prestação doutro facto (na abertura duma mina, por exemplo)” [18]. Analisada a decisão apelada, e de forma liminar, não se constata, minimamente, que a mesma seja contraditória entre os fundamentos e a decisão, ou seja, que exista uma construção viciosa ou um vício lógico de raciocínio, capaz de a inquinar. Efectivamente, ponderada a fundamentação apresentada, não é legítimo concluir que a mesma contradiga ou esteja em distonia com a decisão proferida, isto é, que da mera e imediata análise da fundamentação aduzida fosse expectável ou legítimo concluir por diferenciada decisão. Inexiste, efectivamente, qualquer erro lógico-discursivo, no sentido de que a decisão proferida não encontre qualquer lastro ou conforto no juízo seguido na fundamentação exarada, ou seja, que a decisão, no iter de interpretação da fundamentação exarada, e mediante uma análise de lógica dedução, tivesse surgido de forma surpreendente ou inesperada. Por outro lado, também não se pode afirmar que a decisão recorrida seja ambígua, de forma a torná-la ininteligível ou incompreensível. Efectivamente, não é possível afirmar, de forma pertinente, que da fundamentação da mesma resulte, ainda que parcialmente, diferenciadas interpretações, com multiplicidade de sentidos, susceptível de a inquinar nos termos descritos. Ou seja, que da interpretação feita constar seja possível extrair uma multiplicidade de sentidos, afastando-a de um sentido unívoco, susceptível de afectar a decisão ao ponto de a inquinar de ininteligibilidade ou incompreensibilidade. Ademais, nada do aduzido pela Recorrente permite configurar o presente vício, concluindo-se, assim, por uma total impertinência na imputação efectuada, que, deste modo, não pode deixar de soçobrar. Por outro lado, no que respeita ao aludido enquadramento no vício inscrito na alínea e), resulta evidente e apodítico inexistir qualquer condenação (que nem sequer se equaciona) que extravase o quantum do pedido deduzido, ou que tenha incidido sobre objecto diferenciado do contido no mesmo pedido. Pelo que, não se pode aludir, com razão, que a decisão apelada tenha conhecido de questão de que não podia tomar conhecimento ou que o Tribunal a quo, na decisão sob sindicância, tenha conhecido de questão ou objecto diferenciado do pedido. Efectivamente, também no que concerne à presente imputação, é totalmente impertinente o apelo à equacionada causa de nulidade de sentença, pois, a aduzida violação dos deveres de isenção e equidistância, nada tem a ver com tal fundamente de mácula da decisão. O que determina, sem ulteriores delongas, concluir-se no sentido da decisão recorrida não estar maculada pelas apontadas causas de nulidade, com legal inscrição nas alíneas c) e e), do nº. 1, do artº. 615º, do Cód. de Processo Civil, assim improcedendo a sua invocação e, consequentemente, a inviabilidade das conclusões recursórias apresentadas. III) REAPRECIAÇÃO da PROVA decorrente da impugnação da matéria de facto Os factos provados objecto de impugnação são os seguintes: - facto 21, com a seguinte redacção: “21. No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de na sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu à extinta sociedade ré o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22”. Pretendendo-se que tal facto passe a figurar com a seguinte redacção: “No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o eventual direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, por extinção da sociedade ré em 30/01/2018, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu aos antigos sócios da extinta sociedade ré e a BB o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22, inscrita como C-4”. - factos 22 e 23, possuidores da seguinte redacção: “22. Tal transacção foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso. 23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que a sociedade ré receberia, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento”. Pretendendo-se que os mesmos passem a figurar com a seguinte redacção: “22. A transacção alcançada entre os antigos sócios da sociedade S..., Lda., extinta em 30/01/2018, BB e C..., S.A. foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso.”, “23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que os antigos sócios da sociedade ré e BB receberiam, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento”. - facto 24, com a seguinte redacção: “24. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB, seu irmão, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos em substituição da ré dissolvida e liquidada”. Relativamente ao presente facto, a pretensão é a de alteração da sua redacção, bem como que parte do mesmo passe a figurar como factualidade não provada. Assim, tal facto deverá passar a ter a seguinte redacção: “24. A ré substituta AA recebeu a quantia de € 808.952,58 no processo de falência que cursou seus termos sob o n.º 75/14...., pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ..., enquanto advogada e mandatária com poderes especiais de representação para esse efeito no referido processo de falência”. Devendo considerar-se como não provado que: “Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção em substituição da ré dissolvida e liquidada” ; “a ré substituta AA tenha feito sua qualquer parte do valor por si recebido na qualidade de mandatária judicial com poderes especiais para o efeito no âmbito do processo de falência”. Prevendo acerca da modificabilidade da decisão de facto, consagra o artigo 662º do Cód. de Processo Civil os poderes vinculados da Relação, estatuindo que: “ 1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. 2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento; b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova; c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta; d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados”. Para que tal conhecimento se consuma, deve previamente o recorrente/apelante, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o ónus a seu cargo, plasmado no artigo 640º do mesmo diploma, o qual dispõe que: “1 -Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”. No caso sub judice, a prova produzida em audiência foi gravada, tendo a Apelante dado cumprimento ao preceituado no supra referido artigo 640º, nº. 2, alín. a), do Cód. de Processo Civil, indicando com exactidão as passagens da gravação em que funda o recurso interposto. Pelo que, tendo, adrede, a Apelante indicado os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, bem como a decisão que sobre tais pontos factuais deveria passar a constar, mostram-se preenchidos todos os requisitos ou pressupostos conducentes ao conhecimento da apresentada impugnação da matéria de facto. Deste modo, procedeu-se à devida consideração dos depoimentos enunciados, fundamentalmente no que concerne às passagens da gravação indicadas. Invoca, ainda, a Recorrente como concreto meio probatório a ponderar o resultante de prova documental, pelo que o Tribunal ponderará a sua potencialidade probatória, e adequação à matéria de facto considerada provada, nomeadamente na aferição se o mesmo impunha, por referência aos concretos pontos de facto impugnados, diferenciada decisão. Não se desconhece que “para negar a admissibilidade da modificação da decisão da matéria de facto, designadamente quando esta seja sustentada em meios de prova gravados, não pode servir de justificação o mero facto de existirem elementos não verbalizados (gestos, hesitações, posturas no depoimento, etc.) insusceptíveis de serem recolhidos pela gravação áudio ou vídeo. Também não encontra justificação a invocação, como factor impeditivo da reapreciação da prova oralmente produzida e da eventual modificação da decisão da matéria de facto, da necessidade de respeitar o princípio da livre apreciação pelo qual o tribunal de 1ª instância se guiou ou sequer as dificuldades de reapreciação de provas gravadas em face da falta de imediação”. Pelo que, poderá e deverá a Relação “modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a livre apreciação da prova, um resultado diferente que seja racionalmente sustentado” [19]. Reconhece-se que o registo dos depoimentos, seja áudio ou vídeo, “nem sempre consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no tribunal a quo. Como a experiência o demonstra frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, sendo que a mera gravação dos depoimentos não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que porventura influenciaram o juiz da 1ª instância. Na verdade, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador”. Efectivamente, e esta é uma fragilidade que urge assumir e reconhecer, “o sistema não garante de forma tão perfeita quanto a que é possível na 1ª instância a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e de onde é legítimo aos tribunais retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”. Todavia, tais dificuldades não devem justificar, por si só, a recusa da actividade judicativa conducente à reapreciação dos meios de prova, ainda que tais circunstâncias ou fragilidades devam ser necessariamente “ponderadas na ocasião em que a Relação procede à reapreciação dos meios de prova, evitando a introdução de alterações quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados” [20] (sublinhado nosso). ------ DA INDICAÇÃO DOS CONCRETOS PONTOS DE FACTO INCORRECTAMENTE JULGADOS - do facto provado 21: Referencia a Impugnante não ter a Autora alegado, nem provado, quer a sociedade Ré, entretanto extinta, tinha bens à data da sua extinção, mas antes que em 29/10/2019, os antigos sócios daquela mesma sociedade, extinta em 30/01/2018, haviam recebido em Maio de 2019 a quantia de 808.952,58 €, no “âmbito de processo judicial alheio a este, “na qualidade de substitutos sucessores” da sociedade ré, configurando o predito direito (e recebimento) como de um crédito/activo superveniente da sociedade ré nos presentes autos”. Assim, o que esteve em causa nos presentes autos não foi um crédito oportunamente reclamado nos autos de falência nº. 75/14...., pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ..., mas antes “uma verdadeira sub-rogação em créditos anteriormente reconhecidos pelo Tribunal da falência, na Sentença de Verificação e Graduação de Créditos, a favor de entidade terceira – CGD, substituída por C..., SA, por cedência de créditos –, que os prestadores de garantias imóveis acessórias desde há muito se vinham arrogando o direito de receber”, conforme decisão proferida por aquele juízo, datada de 11/04/2019. Ou seja, não estava em equação uma qualquer expectativa de um crédito /activo que a sociedade Ré “pudesse aspirar por efeito de anterior reconhecimento em sentença de verificação e graduação de créditos”, mas antes a “invocação de exercício de dois direitos de sub-rogação, pela sociedade ré e por BB, na medida em que prestaram garantias e nessa medida acabaram por pagar créditos da falida, desde que demonstrem que a Caixa Geral de Depósitos já obteve pagamento no âmbito da execução fiscal com a venda dos imóveis dados em garantia (hipotecas) porquanto a CGD deixará de ser credora nesta falência”. Citando o demais despacho/sentença de 11/04/2019, considera que o valor por si recebido, em representação dos antigos sócios da sociedade Ré e de BB, reporta-se a “dois créditos transacionados com outro credor no âmbito desse mesmo processo, por exercício de direito de sub-rogação legal em crédito reconhecido a terceiro (CGD) e concorrente com o da entidade interveniente na transação (C..., S.A.), o que, de resto, se conclui pelas expressões “…desistindo desta parte do pedido a favor dos sócios da extinta S...” e “os sócios da extinta S... e BB declaram, em suma, que com a entrega desta quantia nada mais têm a reclamar ou a requerer no âmbito deste processo de falência por conta das garantias que prestaram à Caixa Geral de Depósitos”, não resultando do referido acordo que os antigos sócios da sociedade ré ou BB estivessem inibidos de reaver quaisquer outros créditos que houvessem de receber por conta de reclamações próprias que houvessem sido reclamadas, verificadas e reconhecidas no âmbito dos referidos autos”. Em sede contra-alegacional (o que valerá para a totalidade da matéria factual impugnada), referencia a Recorrida ser inusitada a pretensão da Recorrente na requerida alteração textual “em que se substituí a S..., como beneficiária no acordo, pelos seus antigos sócios, o que não tem qualquer correspondência com a realidade, bem com os documentos juntos aos autos e restante prova”, de forma a fazer crer que o que subscreveu nos autos de falência tivesse deixado de fazer sentido. Assim, só por esquecimento selectivo pode afirmar ter assinado um acordo, em processo de falência, em representação da extinta sociedade Ré, e agora afirmar que afinal esta não é parte no acordo em causa. Sendo, ainda, completamente inverosímil afirmar que não teve qualquer incremento patrimonial, quando resulta ter sido transferido para a sua conta bancária, pela massa falida, valor superior a 800.000,00 €, não tendo feito “qualquer prova de ter «distribuído» esse dinheiro por terceiros”. Questiona, ainda, a falta de credibilidade do afirmado pelo irmão da Recorrente, no que concerne à alegada entrega de um cheque daquele valor que nunca existiu, considerando no mínimo provocatória a alegação da recorrente de que “o valor recebido foi atribuído a BB, quando no acordo figura a Sociedade S... como credora beneficiária, e que “nenhuma verba desse valor coube à recorrente”, quando o que ficou provado, é que apenas a mesma AA, recebeu 808m€ na sua conta pessoal do BCP”. Por fim, aduz que os Réus substitutos, nos seus depoimentos, “apenas tentaram manipular os factos, tentando dar uma versão de que a S... não teria qualquer ativo ou crédito, à data da sua dissolução, o que é falso, e que o dinheiro transferido para a conta pessoal da Ré AA, afinal por magia, tinha-se transformado num cheque da massa falida, de 808m€, que nunca existiu, mas que nas palavras do Réu BB, lhe foi entregue, tentando ambos, pela distorção da realidade, fazer crer ao Tribunal, que AA não foi a beneficiária única, do pagamento à sociedade extinta pela massa falida”. Acrescentam que tão contraditórios e atabalhoados foram tais depoimentos, “que não vislumbrando ninguém que corroborasse a sua narrativa, dispensaram as testemunhas inicialmente arroladas pelos mesmos Réus, receando que aquilo que dissessem essas testemunhas fosse verdade, e que certamente contrariaria o discurso enviusado, dos mesmos Réus”. Na sentença sob apelo, na motivação da decisão da matéria de facto (igualmente a considerar na apreciação dos demais pontos factuais impugnados), consta o seguinte: “A convicção do tribunal quanto à factualidade provada e não provada assentou, essencialmente, na confissão pela ré e, subsequentemente, pelos réus sócios substitutos, dos factos alegados pela autora na petição inicial e no requerimento de prosseguimento da acção de 29-10-2019, no seguimento da extinção da sociedade na pendência dos autos, bem como nos diversos documentos juntos aos autos e, em menor medida, na prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento. (….) Finalmente, no que respeita à extinção da ré sociedade e ao recebimento pelos sócios seus substitutos de activos de que esta fosse titular (temas da prova n.º 3 e 4), teve o tribunal em consideração a certidão do registo comercial da ré junta em 29-10-2019 da qual resulta ter esta sido dissolvida e, de imediato, decretada a sua dissolução e cancelamento da matrícula, com efeitos a 30- 01-2018, bem como os elementos relativos ao processo de falência em que a ré era credora que foram trazidos aos autos pelas partes através do 2.º requerimento de 29-10-2019, do requerimento de 26-10- 2022 e dos documentos juntos na audiência de julgamento na mesma data, tendo ainda sido valorado o que resultou da confissão objecto do depoimento de parte prestado pelos réus substitutos em que admitiram ter sido aí reconhecido e pago um crédito no valor de € 897.836,22 (cfr. assentada). De referir a este respeito que, sem prejuízo das partes se terem referido à dissolução administrativa da ré sociedade, tal circunstância não ficou cabalmente demonstrada por não ter sido apresentada qualquer prova documental respeitante à liquidação ter sido efectuada ao abrigo do DL n.º 76-A/2006, de 29-03, sendo certo que da leitura do registo comercial parece resultar que chegou a haver uma dissolução administrativa pendente em 2017 mas não ser claro se o cancelamento da matrícula em 2018 foi na sequência desse processo, sendo certo que em todo o caso não foi apresentado documento que ateste a inexistência de activo a partilhar nessa data. Em qualquer caso, decorre dos elementos juntos aos autos por referência ao processo de falência que correu termos no tribunal do comércio ..., no qual a ré sociedade já era parte e em que, como aqui, foi substituída pelos seus sócios em virtude da sua extinção na pendência do processo, ter aí sido celebrada uma transacção a respeito do mapa de rateio que foi homologada por sentença e levou a que os sócios da ré, em substituição desta, recebessem o mencionado valor, pelo que foi dado como provado que esta era titular de um activo no referido montante. No mais, resulta do requerimento apresentado nesses autos de falência pelos sócios (cfr. documento junto com o requerimento de 29-10-2019), e foi admitido em declarações de parte pelos próprios, que esse valor foi pago e deu entrada na conta bancária da mandatária nesses autos, correspondente à aqui ré substituta e igualmente mandatária, Dra. AA, que fez os pagamentos conforme combinado entre os sócios, não subsistindo, assim, dúvidas dos aqui réus substitutos terem recebido pessoalmente um valor que correspondia a um crédito da ré sociedade que lhe foi reconhecido no mencionado processo de falência. Neste sentido, decorre da leitura da decisão proferida em 11-04-2019 no processo de falência e que terminou com a sentença homologatória da transacção parcial relativa ao mapa de rateio, os contornos em que esse acordo foi celebrado, sendo certo que resulta demonstrado, por um lado, que a ré sociedade já era titular de um crédito reconhecido na sentença de verificação e graduação de créditos aí proferida, e, por outro, que foi substituída pelos respectivos sócios no seguimento do cancelamento da sua matrícula, e que o tribunal ordenou a rectificação do mapa de rateio e o pagamento à ré sociedade, substituída pelos seus sócios, do referido montante de € 897.836,22, o qual foi pedido que fosse liquidado através de transferência para uma conta da aí ré substituta e mandatária, que o recebeu em nome dos sócios. Tal pagamento, por conseguinte, entendeu o tribunal dever-se a estes substituírem a ré sociedade naquilo que era o seu activo, tudo se passando como se se tratando de uma partilha de um activo societário de elevado valor que entrou na sua titularidade em razão da sua qualidade de sócios, sem que, no entanto, e apesar do tribunal ter tentado a conciliação das partes, os mesmos sócios tenham manifestado qualquer vontade de liquidar as alegadas rendas em dívida em valor correspondente a cerca de 1/16 desse montante”. O Tribunal procedeu à total audição dos depoimentos de parte dos Réus substitutos. Assim, e em súmula, referenciou a Ré substituta AA, de 52 anos, advogada ter sido sócia da S..., atribuindo as funções de gerência ao seu irmão, e não sabendo explicitar o motivo pelo qual também figurava na matrícula comercial da mesma como gerente. Identificou a natureza familiar de tal sociedade, o seu objecto social (compra de imóveis para revenda) e o facto de ter exercido actividade até 2010/2011, sendo que o pai havia falecido em 1994. A liquidação de tal sociedade foi administrativa, não tendo existido fecho de contas nem balanço final. Referiu que o progenitor era administrador da empresa So..., na qual tinha interesse, e que entregou vários imóveis em garantia de um mútuo efectuado junto da CGD. Tal empresa foi à falência, tendo a C... adquirido o crédito da CGD, mas que esta excluiu de tal venda as garantias do negócio. Aludiu, assim, ao direito de sub-rogação existente, havendo que demonstrar por parte dos representados da extinta S... que os imóveis haviam sido vendidos (o imóvel pertencente à S..., constituído por um terreno em ..., havia sido vendido por 188 mil contos em 1993), que a CGD estava ressarcida e em que montante. Assim, nega ter sido reconhecido à S... qualquer crédito na falência da So..., estando apenas em causa o direito daquela e do seu irmão em sub-rogarem-se nos créditos da CGD, tendo existido efectivamente créditos da S... e do seu irmão reclamados naquela falência, mas que não foram reconhecidos. Esclareceu que a S... e o seu irmão apresentaram reclamação ao mapa de rateio, tendo existido posteriormente transacção com a C..., tendo recebido o montante acordado, em representação dos seus clientes, por parte do Liquidatário da So..., numa conta sua do BCP. Afirmou não o ter recebido pessoalmente, mas antes em representação dos seus clientes e, inquirida expressamente, escudou-.se no sigilo profissional para não identificar quem recebeu tal valor. Mencionou, expressamente, ter ocorrido um duplo reconhecimento na transacção, e que a concessão não foi apenas da S..., mas também do seu irmão BB, pois tratavam-se de dois créditos distintos: um deles era do irmão a título pessoal, e o outro da S..., cada um deles no valor de “890 e tal mil euros”. Foi-lhe expressamente perguntado qual era a percentagem da S..., e do irmão, no capital reconhecido na transacção, mas voltou a escudar-se no dever de sigilo profissional para não responder, o que reiterou, igualmente, no que respeita ao destino do dinheiro. Por fim, referenciou que a transacção com os sócios da S... nunca teria existido sem o acordo do irmão, atento o facto de estarmos perante dois créditos distintos. Por sua vez, o Réu substituto BB, de 57 anos, identificou-se como comerciante, antecedente gerente da S..., mencionando a natureza familiar desta, bem como o facto de se destinar à gestão de imóveis. Esclareceu que o pai fez investimentos no ..., nomeadamente num hotel, através da So... (pertença do pai e do arquitecto KK), e que a casa foi dada de garantia, o que fez formalmente, mas a mando do pai, pois a mesma havia-lhe sido anteriormente doada pelos progenitores, em virtude de outros problemas que levaram a que o progenitor não pudesse/devesse ter bens em seu nome. Mencionou ter sido igualmente vendido um terreno da S..., sito em ..., que havia sido dado de garantia de empréstimo. Referenciou que a S... foi dissolvida e liquidada por falta de entrega das contas, afirmando que a mesma não tinha qualquer património, nomeadamente não possuía créditos directos sobre a So..., ainda que os possuísse indirectamente, em virtude do aludido imóvel sito em ..., dado em garantia, ter sido alienado nas finanças por 180.000 contos. Assim, o valor do crédito da S... era de 800 e tal mil euros, fruto daquela alienação. A título pessoal, acrescentou, era possuidor de outros créditos sobre a So..., para além dos 900.000,00 € relativos aos imóveis dados em garantia, mas que quer os seus, quer os directamente reclamados pela S..., não foram reconhecidos, com excepção dos referenciados indirectos, decorrentes da alienação dos imóveis dados em garantia. Adrede, referenciou ter feito um acordo com a irmã, no sentido de receberem 50% do valor devido, mas que o dinheiro ficaria todo para si, pois o depoente é que tinha perdido os bens. Assim, mencionou que a irmã entregou-lhe o dinheiro, não ficando com nada, pois prescindiu da parte dela, aludindo, deste modo, a dois diferenciados acordos: um relativo à transacção e o demais efectuado particularmente com a irmã. Desta forma, acrescentou ter recebido aproximadamente “800 e dez mil euros”, pois existiam umas dívidas do falecido pai à CCAM, com execução pendente, tendo a C... também adquirido tais créditos, cujo valor foi abatido ao montante que lhe foi entregue. Inquirido acerca da forma de pagamento, referiu que o valor foi pago em cheque à irmã e que esta entregou-lhe o cheque. Posteriormente, confrontado com a falsidade de tal relato, afirmou, em sentido contrário, que a irmã entregou-lhe tal quantia através de um cheque emitido pela mesma. Os presentes depoimentos procuraram explicitar a forma como à sociedade arrendatária dissolvida, ou aos sócios substitutos desta, foi reconhecido o direito ao recebimento da quantia de aproximadamente 800 mil euros, no âmbito do rateio efectuado no processo de falência da sociedade So..., S.A. – processo nº. 75/14...., do Juízo de Comércio ... (Juiz ...), bem como acerca de quem recebeu tal montante, nomeadamente se foram os sócios da sociedade Ré, dissolvida na pendência dos autos, correspondentes aos intervenientes ou substitutos passivos. Em primeiro lugar, resultou evidente o interesse pessoal e directo dos depoentes nos depoimentos prestados, pelo que a ponderação do declarado deverá ter como critério aferidor a sua concatenação com a vária prova documental junta extraída dos identificados autos de falência, na maior parte replicada nos factos provados supra aditados. Em segundo lugar, relativamente ao declarado, caso exista antinomia com o expresso naquela prova documental não pode deixar de conceder maior relevância a esta, atenta a sua evidente maior fiabilidade. Por fim, exarar, de forma indubitável, que nas declarações prestadas pelos irmãos (Réus substitutos) existiu a preocupação de, em evidente articulação, negarem que a ora Recorrente tenha recebido qualquer valor daquele que foi entregue, por sub-rogação, escudando-se a mesma no invocado dever de sigilo profissional, enquanto que o irmão assume o recebimento da totalidade da quantia. E isto, apesar do teor claro e evidente da transacção subjacente àquele recebimento, donde não resulta qualquer exclusividade no recebimento daquela quantia, nem que o destinatário tivesse sido apenas o Réu substituto. Com efeito, o teor do aduzido por ambos, nessa parte, revelou-se inconsistente, pouco fundado e mesmo inverosímil, pois, conforme melhor fundamentaremos infra, não é minimamente credível que, atenta a forma como foi redigida a transacção, não tenha a Ré substituta recebido qualquer quantia quando, para além dos imóveis dados de garantia pelo irmão, também estava em causa a sub-rogação no crédito da CGD (entretanto cedido à C...) que havia sido igualmente satisfeito pela venda de um imóvel que pertencia à S... (sito em ...). E, ainda que assim não fosse, a própria justificação dada pelo depoente, de que acordou com a irmã que o dinheiro iria todo para si, pois o depoente é que tinha perdido os bens, para além de inverídica, atento o consignado, nenhum sustento consistente revela, pois, desde logo, o próprio imóvel arrendado apenas pertencia formalmente ao Réu substituto, atenta a confessada doação efectuada pelos progenitores, em virtude de não ser conveniente que o pai, por outros problemas existentes, o mantivesse em seu nome. O que afasta a exclusividade na perda enunciada. Apreciando: As alterações de redacção pretendidas introduzir no facto provado 21., traduzem-se: 1) no esclarecimento que a Ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, por extinção da sociedade Ré em 30/01/2018 ; 2) que a cedência da C... foi efectuada aos antigos sócios da extinta sociedade Ré ; 3) que tal cedência foi igualmente efectuada a BB ; 4) que a hipoteca em equação encontrava-se inscrita como C-4. O facto 27. provado (e aditado) reproduz, integralmente, o teor da decisão prolatada nos autos de falência da So..., S.A., datada de 11/04/2019, na qual se ajuizou acerca do enquadramento em que surgiu a transacção efectuada entre a C..., os sócios da extinta S... e BB, procedeu-se à sua homologação e determinou-se as rectificações a efectivar no mapa de rateio relativamente (no que ora releva) às inscrições das hipotecas C4 e C8. Das quatro alterações enunciadas, apenas relativamente à identificada em 3) se poderia afirmar não possuir correspondência na literalidade da transacção junta, atenta a forma como é reportada naquela decisão feita constar no facto provado 27.. Todavia, atenta a referência, que igualmente consta nessa decisão, que na transacção apresentada os sócios da extinta S... e BB declaram, em suma, “que com a entrega desta quantia nada mais têm a reclamar ou a requerer no âmbito deste processo de falência por conta das garantias que prestaram à Caixa geral de Depósitos (…)”, resulta evidente que tal cedência não pôde deixar de ser igualmente efectuada a BB, em termos pessoais, para além da sua qualidade de sócio da extinta S.... Donde, no acolhimento das requeridas alterações, determina-se que o facto provado 21. passe a figurar com a seguinte redacção: “21. No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o eventual direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, por extinção da sociedade ré em 30/01/2018, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu aos antigos sócios da extinta sociedade ré e a BB o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22, inscrita como C-4”. - dos factos provados 22 e 23: Referencia a Impugnante que, paralelamente ao regime da representação sucessória, “os antigos sócios das sociedades comerciais entretanto extintas, assumem um papel de direito próprio e autónomo quanto a eventuais e futuros recebimentos que decorram de putativos direitos anteriormente titulados pelas sociedade comercial entretanto extinta, sem que tais recebimentos possam vir, posteriormente, a ser retractivamente considerados para efeitos de responsabilização desses antigos sócios por dívidas da sociedade comercial extinta – como, de resto, sucede com os representantes sucessórios, que são considerados titulares de direito próprio da herança em representação do ascendente pré falecido, sem qualquer responsabilidade de assunção ou dever de pagamento de dívidas imputadas ao representado ascendente pré falecido”. Assim, as partes que intervieram na transacção homologada, foram, efectivamente, os antigos sócios da sociedade S... e BB, “agindo em nome e interesse próprio nessa transação (…)”, pelo que a referência à extinta sociedade Ré foi apenas para efeitos de “conveniência de exposição judicial”, que não se pode ler literalmente, pois a aludida sociedade Ré “nada recebeu nesse processo, nem participou do acordo de transação homologado pelo tribunal da falência”, nem, por outro lado, “foi ordenado qualquer pagamento à sociedade ré pela Sentença de 11/04/2019”. Apreciando: Os factos 22. e 23. possuem a seguinte redacção: “22. Tal transacção foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso. 23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que a sociedade ré receberia, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento”. Pretende-se, com a exposta argumentação, que os mesmos passem a figurar com a seguinte redacção: “22. A transacção alcançada entre os antigos sócios da sociedade S..., Lda., extinta em 30/01/2018, BB e C..., S.A. foi homologada por sentença proferida nesse processo em 11-04-2019, transitada de imediato em julgado por as partes terem renunciado ao prazo de recurso.”, “23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que os antigos sócios da sociedade ré e BB receberiam, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento”. Ora, tendo-se procedido, no aditado facto provado 27., à total transcrição do teor da decisão de 11/04/2019, deve ser o teor desta a prevalecer, efectuando-se a devida interpretação do clausulado na transacção homologada, o que constitui já matéria de direito. Por outro lado, o facto 22., ao reportar-se à transação efectuada, já remete para a nova redacção do facto provado 21., da qual já consta a identidade dos outorgantes na transacção homologada. Donde, decide-se no sentido de: - o facto provado 22. manter a sua redacção ; - o facto provado 23. passar a ter a seguinte redacção: “23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio nos termos feitos constar do infra facto provado 27., ordenando-se o respectivo pagamento aos credores de acordo com o mapa de rateio rectificado”. - do facto provado 24.: Relativamente ao presente ponto factual, referencia a Impugnante impor-se uma substancial alteração da sua redacção, em virtude de não corresponder ao que foi provado em audiência. Referencia que “o recebimento de quaisquer quantias pelos mandatários judiciais, quando em representação de interesses alheios, não poderão ser imputados ao próprio mandatário como seu “incremento patrimonial””, sendo que, se resultou provado que um dos Réus substitutos da sociedade Ré extinta é a própria mandatária, quer nos presentes autos, quer nos de falência, também resulta que o outro Réu substituto é BB, que interveio na transacção homologada não só como antigo sócio da sociedade Ré, como ainda em nome pessoal, enquanto detentor do direito de sub-rogação nos créditos que haviam sido reconhecidos, verificados e graduados à então reclamante CGD. Assim, urgia “esclarecer qual ou quais as entidades – de entre as representadas pela mandatária judicial nesse processo de falência – que beneficiaram, efectivamente, do valor entregue à mandatária judicial em cumprimento do mandato judicial com poderes especiais com que interveio nessa transação homologada em 11/04/2019”. E, caso se entendesse que o valor recebido pela mandatária correspondia “a um activo detido pela sociedade ré em data anterior à da sua extinção (…), sempre cumpriria aferir, em concreto, dos montantes efectivamente recebidos por cada um dos antigos sócios na partilha desse «património social superveniente»”. Seguidamente, fazendo referência ao teor das declarações por si prestadas e pelo seu irmão BB, em sede de depoimentos de parte, conclui que “nenhuma verba desse valor coube à ora recorrente”. Pelo que, pugna pela alteração da redacção do facto provado 24., bem como pela consideração como não provada de parte da matéria factual no mesmo contida. Apreciando: Precisando, o facto provado 24. possui a seguinte redacção: “24. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB, seu irmão, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos em substituição da ré dissolvida e liquidada”. Pretende-se que o mesmo passe a figurar com a seguinte redacção: “24. A ré substituta AA recebeu a quantia de € 808.952,58 no processo de falência que cursou seus termos sob o n.º 75/14...., pelo Juízo de Comércio ... – Juiz ..., enquanto advogada e mandatária com poderes especiais de representação para esse efeito no referido processo de falência”. Devendo considerar-se como não provado que: “Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção em substituição da ré dissolvida e liquidada” ; “a ré substituta AA tenha feito sua qualquer parte do valor por si recebido na qualidade de mandatária judicial com poderes especiais para o efeito no âmbito do processo de falência”. Conforme já supra justificámos, a alteração da redacção do presente ponto factual não pode merecer a procedência reclamada. Com efeito, aquela prova não possui a credibilidade suficiente e bastante para se concluir pela não prova de que os sócios da sociedade dissolvida – os ora substitutos Réus – tenham recebido o valor objecto de transacção em substituição da mesma Ré dissolvida e liquidada, nem que a Ré substituta, ora Recorrente, tenha feito como sua qualquer parte daquele valor recebido. Efectivamente, e ao invés, o que resulta, desde logo dos termos da transacção, sua homologação e rectificação ordenada no mapa de rateio, é que o recebimento daquela quantia teve necessariamente por destinatários os Réus intervenientes, em substituição da Ré dissolvida e liquidada. Aliás, caso assim não se pretendesse, nunca os termos da transacção, e sua subsequente homologação, seriam outorgados nos termos expostos, pois bastaria fazer constar que aquele valor destinar-se-ia, apenas, ao exercício do direito de sub-rogação por parte de BB, em nome pessoal, e não aos sócios da extinta S.... Todavia, não foi isto que foi convencionado, antes se consignando expressamente a cedência do valor à extinta S..., ora representada pelos sócios BB e AA. Acresce, porém, conforme já realçado, que tal entrega a BB não foi efectivada apenas na qualidade de sócio da S..., mas também em nome pessoal, atento o direito de sub-rogação de que também era pessoalmente titular, decorrente da venda de terrenos próprios, dados em garantia. Pelo que, nesta parte, a conjugação da prova produzida, primordialmente a documental, impõe a introdução desta precisão no ponto factual questionado. Donde, num juízo de parcial procedência da impugnação apresentada (e ainda que com diferenciada redacção), decide-se no sentido de que o ponto factual 24. passe a figurar com a seguinte redacção: “24. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes, bem como BB em nome pessoal, receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB (seu irmão), quer enquanto sócio da sociedade dissolvida, quer em nome pessoal, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos também em substituição da ré dissolvida e liquidada”, improcedendo, no demais, a requerida alteração factual. Em conclusão, num juízo de parcial procedência da impugnação apresentada, as alterações a introduzir na matéria factícia traduzem-se no seguinte: - alteração da redacção dos factos provados 21., 23. e 24., que passam a figurar com o seguinte teor: “21. No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o eventual direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, por extinção da sociedade ré em 30/01/2018, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu aos antigos sócios da extinta sociedade ré e a BB o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22, inscrita como C-4” ; “23. Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio nos termos feitos constar do infra facto provado 27., ordenando-se o respectivo pagamento aos credores de acordo com o mapa de rateio rectificado” ; “24. Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes, bem como BB em nome pessoal, receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB (seu irmão), quer enquanto sócio da sociedade dissolvida, quer em nome pessoal, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos também em substituição da ré dissolvida e liquidada”. IV) DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA EXPOSTA NA DECISÃO RECORRIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS Ø Da impossibilidade de responsabilização dos Réus substitutos por qualquer passivo superveniente assacado à sociedade Ré após a data da sua extinção, em 30/01/2018 ; Ø Da não demonstração, por parte da Autora, que parte do valor transacionado competiria aos antigos sócios da sociedade Ré, extinta em 30/01/2018, nem em que medida tal eventual quantia teria sido partilhada entre os antigos sócios da sociedade Ré ; Ø Da não prova que o valor recebido pela mandatária judicial, em representação de diversos interessados no processo de falência, no valor de € 808.952,58, tenha resultado de crédito reclamado, reconhecido e verificado à sociedade Ré, quer pela sentença de verificação e graduação de créditos, quer, posteriormente, pelo mapa de rateio de 18/02/2019. Tendo por pressuposto o delimitado objecto da apelação, a sentença apelada ajuizou, em súmula e no que ora releva, relativamente à responsabilidade dos Réus substitutos pelas rendas em dívida, nos seguintes termos: - a intervenção dos Réus substitutos da sociedade ocorre por força do disposto no artº. 162º, do Cód. das Sociedades Comerciais, sendo a sua responsabilização efectivada de acordo com o estatuído no artº. 163º, do mesmo diploma ; - extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social, mas só até ao montante que receberam na partilha ; - apenas se apurando a existência de activo societário susceptível de partilha pelos sócios se mostrava justificado o prosseguimento dos autos e a eventual responsabilização dos sócios pelo referido passivo ; - a Ré sociedade, antes da sua extinção, era titular de créditos, nomeadamente o que reclamou em processo de falência, sendo que, em termos contabilísticos, tal pretensão não pode deixar de corresponder a um valor do activo inscrito na sua contabilidade, constituindo, pois, uma activo susceptível de partilha ; - provando-se terem os Réus substitutos recebido, em representação e em virtude da extinção da Ré sociedade, um montante muito superior ao valor da dívida aqui apurada, e que remonta a um período anterior à sua extinção, devem os mesmos ser condenados no seu pagamento nas forças do que resulta partilhado, o que é muito superior ao necessário para assegurar o pagamento do valor em dívida apurado. A Recorrente referencia que demonstrado: § Terem sido os Réus substitutos quem legitimamente interveio na transacção homologada, e não a sociedade Ré ; § Que o valor objecto da transacção não corresponde a qualquer crédito anteriormente reclamado, verificado e graduado pela sociedade Ré extinta, mas antes ao exercitar de dois direitos de sub-rogação legal em distintos créditos, reclamados, verificados e graduados à CGD ; § Que a perspectiva do eventual futuro “exercício de sub-rogação legal não constituía bem ou direito susceptível de integrar o activo da sociedade ré extinta em 30/01/2018, por um lado, porque não fora crédito reclamado pela sociedade ré contra a falida, bem como, por outro lado, porque não podia sequer qualificar-se tal putativo direito como “crédito” ou “activo” da sociedade ré antes de ter sido judicialmente reconhecido, como apenas veio a ser, em 11/04/2019” ; § Que, para além do alegado recebimento daquela quantia de 808.952,58 €, a Autora não alegou, nem consequentemente provou, ter a sociedade Ré qualquer outro activo susceptível de ser partilhado pelos antigos sócios, não poderão os réus substitutos “ser responsabilizados por qualquer passivo superveniente assacado à sociedade ré após a data da sua extinção, em 30/01/2018”. Por outro lado, acrescenta, ainda que se aceitasse que parte do valor transacionado pudesse ser considerado como activo superveniente da dissolvida sociedade Ré, “o que é facto é que a autora não logrou demonstrar que parte do valor transaccionado competiria aos antigos sócios da sociedade ré extinta em 30/01/2018, nem sequer em que medida é que tal “eventual” quantia teria sido partilhada entre os antigos sócios da sociedade ré”. Acrescenta, ainda, ter ficado provado que a extinta sociedade Ré, apesar de ter reclamado créditos no processo de falência, não obteve qualquer pagamento, por si ou pelos seus antigos sócios, sendo que foram estes antigos sócios da Ré extinta, juntamente com BB, em nome pessoal, que “transaccionaram nesses autos de falência com a credora C..., em 10/04/2019, a fim de lhes ser reconhecido o direito de sub-rogação legal em créditos reclamados, verificados e graduados à CGD, graduados em 4.º e 7.º lugares no Mapa de Rateio de 18/02/2019”. Referencia, ainda, factualidade alegadamente como provada, fruto da impugnação apresentada (mas que não obteve procedência), concluindo não ter ficado provado que “o valor transaccionado tivesse beneficiado exclusivamente os antigos sócios da sociedade ré, mostrando-se que as partes intervenientes nessa transacção foram os antigos sócios da sociedade Ré e BB, como titulares de direitos de sub-rogação legal, e C..., S.A. (adquirente dos créditos inicialmente reclamados, verificados e graduados à CGD), tendo, pelo contrário, até, sido feita prova em audiência de julgamento, por declarações do réu substituto, que infirmam a tese desde sempre sustentada pelos réus substitutos no sentido de que o mesmo recebeu a totalidade do valor recebido pela sua mandatária nesse autos de falência, como contrapartida pelo exercício do seu próprio direito de sub-rogação legal nos créditos reclamados e verificados à CGD, ulteriormente cedidos à C..., SA, e graduados em 4.º e 7.º lugar no Mapa de Rateio”. Na resposta apresentada, referencia a Recorrida que a sociedade era credora reclamante no processo de falência, onde foi pago, em 2019, valor superior a 800 mil euros, tendo junto vasta documentação comprovativa, para além de terem sido os próprios Réus substitutos a confessar ter a S... reclamado créditos na falência, em montante superior ao atribuído em sede de rateio. Acrescenta que com a sua argumentação, pretende a Recorrente retirar a qualidade de credora à Ré S..., pretendendo criar uma outra figura, que não a de credora, “mas única e exclusivamente beneficiária de uma sub-rogação, que não à própria sociedade, mas antes ao irmão e Réu substituto. Assim, “no processo de falência o pagamento é realizado ao credor enquanto tal, e a pretensão da Ré S..., com a respetiva reclamação de crédito, relativamente a um imóvel que a CGD, vendeu em execução fiscal, propriedade da mesma S..., remonta a 1993, data do início do processo de falência, situação que cumula com outras reclamações de créditos nessa falência pela S..., de supostos incumprimentos de contratos promessa pela falida”. Pelo que inexiste um crédito novo da S..., por via do acordo concretizado em 11/04/2019, mas antes, por forma a obviar a eternização dos autos de falência, um acordo de pagamento entre as partes credoras, tentando a Recorrente misturar a S... e o co-Réu BB. Expostos os argumentos nucleares, as questões controversas em equação reconduzem-se, no essencial: - a apurar se o valor feito constar na transacção efectuada, e entregue à ora Recorrente, ainda se pode considerar como um activo da sociedade anteriormente dissolvida, de forma a responder pelos débitos apurados nos presentes autos a onerarem aquela sociedade então arrendatária ; - e, em caso afirmativo, aferir se tal montante, ou pelo menos parte dele, pode considerar-se como tendo ingressado na esfera patrimonial da ora Recorrente, de forma a responsabilizá-la pelo pagamento de tais débitos. Equacionemos, num primeiro momento, o quadro legal. Como norma de natureza geral aplicável aos contratos de sociedade, ajuizando acerca da responsabilidade dos sócios após a liquidação [21], refere o artº. 1020º, do Cód. Civil, que “encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios continuam responsáveis perante terceiros pelo pagamento dos débitos que não tenham sido saldados, como se não tivesse havido liquidação”. Prevendo acerca da liquidação das sociedades comerciais, prescreve o artº. 162º, do Cód. das Sociedades Comerciais, no que concerne às acções pendentes, que “1 - As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.os 2, 4 e 5, e 164.º, n.os 2 e 5. 2 - A instância não se suspende nem é necessária habilitação”. Acrescenta o normativo seguinte – 163º -, a propósito do passivo superveniente, nos seus nºs. 1 e 3, que: “1 - Encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada. (…) 3 - O antigo sócio que satisfizer alguma dívida, por força do disposto no n.º 1, tem direito de regresso contra os outros, de maneira a ser respeitada a proporção de cada um nos lucros e nas perdas”. Regulando acerca do activo superveniente, aduz o nº. 1, do artº. 164º, do mesmo diploma, que “verificando-se, depois de encerrada a liquidação e extinta a sociedade, a existência de bens não partilhados, compete aos liquidatários propor a partilha adicional pelos antigos sócios, reduzindo os bens a dinheiro, se não for acordada unanimemente a partilha em espécie”. Por fim, no âmbito das sociedades por quotas, estatuindo acerca das características da sociedade, prescreve o nº. 3, do artº. 197º, ainda do Cód. das Sociedades Comerciais, que “só o património social responde para com os credores pelas dívidas da sociedade, salvo o disposto no artigo seguinte”, o qual dispõe acerca das situações em que é convencionada a responsabilidade directa dos sócios para com os credores sociais. Nas palavras de Raul Ventura - Dissolução e Liquidação de Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Almedina, 1993, pág. 296, 305, 306, 323 e 324, “dissolvida a sociedade, não se altera radicalmente a sua organização, mas produzem-se algumas modificações na sua estrutura orgânica e bem assim na competência de alguns órgãos subsistentes”. Deste modo, o “sistema de continuidade de pessoas” legalmente previsto no artº. 151º, do C.S.C., “recomenda-se por dois motivos: o conhecimento que os administradores ou gerentes já têm da sociedade que administraram ; a possibilidade de imediato começo das tarefas de liquidação”, decorrendo que “os administradores ou gerentes, mudam de qualidade (…), passando a exercer funções de liquidatários ; o órgão é outro, mas os novos cargos são, por força da lei, providos nas pessoas que exerciam os cargos anteriores”. Como regra ou princípio geral, as funções dos liquidatários cessam com a extinção da sociedade, caso não tenha ocorrido qualquer anterior hipótese excepcional, nomeadamente “pela expiração do prazo de nomeação, pela morte, incapacidade ou inabilidade superveniente do liquidatário, por renúncia e por destituição”. Todavia, tal intervenção dos liquidatários nem sempre cessa com a extinção da sociedade. É o que sucede “nas hipóteses de existirem acções pendentes, passivo ou activo superveniente (arts. 162º a 164º)”, relativamente às quais o liquidatário prolonga as suas funções. Extinta a sociedade, subsistem, assim, relações jurídicas que se prolongam para além do termo da sua personalidade. Assim, os transcritos artigos 162º a 164º, do CSC, reportam-se a matérias derivadas da “subsistência de relações jurídicas, depois de extinta a sociedade”, tendo-se em atenção a latente existência “de conflitos de interesses de sócios, de credores sociais e de devedores da sociedade”. Pelo que, “se as dívidas não se extinguirem, mas o devedor inicial desaparecer, os credores deverão encontrar quem o substitua e não podem encontrar tal entidade fora dos sócios ou dos liquidatários”. A problemática do “passivo e activo superveniente foi resolvido no sentido de a responsabilidade e a titularidade passarem, em certos termos, para os sócios”, sendo que, ocorrendo a extinção da sociedade, inexiste extinção da instância nas acções em que a sociedade extinta seja parte, considerando-se esta “substituída pela generalidade dos sócios” – Idem, pág. 461 a 463 e 467. Procurando explicitar a legal solução do como e porquê dos débitos, bens e créditos que tinham como sujeito a sociedade passarem a ser encabeçados nos sócios, aduz o mesmo Ilustre Autor – Ibidem, pág. 480, 481, 483, 484 a 490 - que “o como não pode deixar de ser uma sucessão”, enquanto que “o porquê é, em primeiro lugar, intuitivo ; desaparecida a sociedade-sujeito, e mantidos vivos os direitos da sociedade ou contra esta, só os sócios podem ser os novos titulares desse activo e passivo. A explicação jurídica dessa intuição reside na extensão do direito de cada sócio relativamente ao património ex-social. Os sócios têm direito ao saldo da liquidação, distribuído pela partilha. Se tiverem recebido mais do que era seu direito, porque há débitos sociais insatisfeitos, terão se os satisfazer ; se tiverem recebido menos, porque não foram partilhados bens sociais, terão direito a estes” [22]. Desta forma, a legal solução consagrada no transcrito artº. 1020º, do Cód. Civil, “consiste em os antigos sócios continuarem responsáveis perante terceiros pelo pagamento dos débitos que não tenham sido saldados, como se não tivesse havido liquidação. Por outras palavras, a responsabilidade dos sócios para com terceiros, relativos aos débitos sociais não satisfeitos durante a liquidação, não é afectada pelo facto de a liquidação ter terminado e a sociedade ter sido extinta”. Com efeito, a responsabilidade “recai sobre os «antigos sócios», corroborando o adjectivo que a sociedade está terminada e afastando a ideia de que, para esse efeito limitado, se considere constituída alguma nova sociedade. São de tomar como «antigos sócios» aqueles que tinham essa qualidade no momento da extinção da sociedade ; no caso de posteriormente falecer algum antigo sócio, respondem os seus sucessores nos termos legais”. Todavia, esta responsabilidade “é limitada ao montante que receberam na partilha”, o que se apura “relativamente a cada sócio, i.e., cada sócio é responsável até ao montante por ele recebido na partilha e não por aquilo que outros sócios também tenham recebido, o que atingiria potencialmente a totalidade do activo partilhado”. E, “fixada a responsabilidade até esse momento, tem ela natureza solidária. O credor não necessita de ratear a dívida entre os antigos sócios, segundo algum critério ; necessita apenas de, em cada demanda individual, não ultrapassar o montante percebido da partilha pelo sócio demandado, podendo, portanto, suceder que apenas um ou alguns sócios venham a ser demandados, assim como poderá suceder que algum sócio esteja isento desta responsabilidade por nada ter recebido na partilha”. Desta forma, “o antigo sócio pode ter sido demandado, até ao mencionado limite, por uma dívida cujo montante exceda a sua responsabilidade proporcionalmente à dos restantes antigos sócios e, como vimos, não pode escusar-se a pagar, com tal fundamento. As proporções são restabelecidas por meio de direito de regresso, garantido no art. 163º, nº. 3”. Por sua vez, o mecanismo legal inscrito no transcrito nº. 2, do artº. 162º, visa facilitar a actuação dos credores sociais, sem prejudicar os sócios. Com efeito, depois de extinta a sociedade, os credores sociais ver-se-iam confrontados com “uma pluralidade de devedores, desprovidos, em princípio, de uma representação unitária e embora os pudessem demandar conjuntamente, nos termos do art. 30º, nº. 1, CPC, estariam sujeitos a incómodas contingências para a identificação dos actuais réus (por exemplo, dificuldades de determinação dos sucessores, no caso de falecimento de algum antigo sócio ; desconhecimento dos antigos titulares de acções não registadas) e a complicações processuais, como as citações de numerosos réus e a eventual separação das defesas destes” (sublinhado nosso). Desta forma, a consagrada solução alternativa, “consiste em «despersonalizar» os sócios, para efeitos processuais, admitindo a propositura das acções contra a «generalidade» deles e ao mesmo tempo atribuir aos liquidatários (ou outras pessoas, na falta deles) a representação processual dessa «generalidade»”. Pelo que bastará, aquando da propositura da acção pelo reclamado credor social, identificar na petição inicial os representantes, ou seja, os liquidatários da extinta sociedade, “o que o credor não tem dificuldade em fazer, bastando-lhe consultar o registo comercial”. Este sistema de representação legal não tem coincidência com nenhum outro previsto no Cód. de Processo Civil, ainda que se aproxime do estatuído no vigente artº. 26º, previsto “quanto a patrimónios autónomos e sociedades ou associações que careçam de personalidade jurídica”. Todavia, não seria directamente aplicável, pois, na situação em apreciação “não há um património autónomo – os bens pertencem individualmente a cada sócio e também cada um destes é individualmente responsável pela dívida, até certo limite – e muito menos uma associação ou sociedade, mesmo desprovidas de personalidade. No entanto, a ideia básica é idêntica ; há neste caso uma sobrevivência de um interesse, que foi comum a todos os antigos sócios sob a égide da sociedade, e que ainda é em substância idêntico, pois todos eles estão sujeitos a responder pela dívida, sofrendo eventualmente um prejuízo igual ao que sofreriam se tal dívida tivesse feito reduzir o activo partilhável”. Adrede, considera, avançando um enquadramento dogmático, que a enunciada “generalidade dos (antigos) sócios” tem personalidade judiciária, actuando os liquidatários “judicialmente como representantes da generalidade dos sócios ; recebem da lei o encargo de defender interesses alheios, em continuação de uma função que, relativamente à sociedade, aceitaram exercer” (sublinhado nosso). Por fim, no que concerne ao activo superveniente, regulamentado no transcrito artº. 164º, aduz o mesmo Autor – Ibidem, pág. 192 e 193 – que este normativo “nem sequer se pronuncia sobre a pertença aos sócios do activo superveniente, tão clara ela é ; pressupõe-na, contudo, ao regulamentar a respectiva partilha”. E, nesta, já não poderá existir “uma deliberação de sócios, pois já não há sociedade ; terá de haver um acordo de partilha e tal acordo deve ser unânime, visto que, fora da sociedade, a regra da maioria não funciona”. Sabe-se que a extinção de uma sociedade é fundamentalmente composta por duas etapas nucleares: a sua dissolução e a sua liquidação. Assim, enquanto a dissolução, que marca o início do processo, tende-se “a esgotar-se num acto (v.g., deliberação dos sócios, declaração do conservador do registo comercial, sentença judicial!), consistindo o seu efeito principal “a modificação da situação ou do estatuto da sociedade dotada de personalidade jurídica, determinado (em regra) a sua imediata entrada em liquidação (art. 146.°, 1 CSC)”, a liquidação “designa a situação jurídica da sociedade no período (mais ou menos longo) compreendido entre a respectiva dissolução e o momento em que o encerramento da liquidação é registado, facto que verdadeiramente determina extinção do ente societário (cfr. art. 160.°, 2 CSC)”, utilizando-se, ainda, este termo para “referir um processo, isto é, ao conjunto ordenado de actos a realizar ao longo daquela fase terminal da vida societária”. Neste processo de liquidação operam várias tensões, nomeadamente entre dois núcleos de interesses. Por um lado, “o interesse dos sócios, o qual aponta no sentido de virem a reaver o valor das suas entradas e a receber os lucros que hajam sido produzidos e não periodicamente distribuídos (lucros finais ou de liquidação). Aos sócios interessará igualmente a extinção da generalidade das relações jurídicas com epicentro na sociedade, por forma a evitar que as suas próprias esferas jurídicas com elas fiquem oneradas”. Todavia, ressalva-se, estes legítimos interesses dos sócios não podem realizar-se “à custa ou com atropelo dos não menos legítimos interesses dos credores sociais, que obviamente reclamam a satisfação dos seus direitos com as forças do património societário. A tensão entre ambos os interesses é patente ao longo da regulamentação legal do processo de liquidação, marcado pela tutela primacial dispensada aos interesses dos credores: a prioridade reside no pagamento das dívidas sociais; só depois terá lugar a partilha do activo remanescente e a extinção definitiva da sociedade”. No que concerne à responsabilidade dos ex-sócios pelo passivo superveniente, legalmente inscrita no citado nº. 1, do artº. 163º, o fundamento desta solução legal, acrescenta-se radicar “numa ideia de sucessão na titularidade daquela relação jurídica, embora de âmbito limitado pela extensão do direito de cada sócio relativamente ao antigo património social. Os sócios têm direito ao saldo de liquidação distribuído pela partilha; mas, se houverem recebido mais do que o que era seu direito porque havia débitos sociais insatisfeitos, terão de ser eles a satisfazê-los, agora, à custa dos bens que receberam. Assim se compreende que a responsabilidade de cada sócio pelo passivo superveniente tenha como limite o montante que recebeu em partilha. Depois, segundo o n.° 3 do art. 163.°, o(s) antigo(s) sócio(s) que satisfizerem os credores - credores que podem demandar aquele ou aqueles sócios que entenderem e que podem proceder judicial ou extrajudicialmente - gozam de direito de regresso contra os restantes, de maneira a restabelecer a proporção de cada um nos lucros e nas perdas (cfr. Em particular, o art. 156.°, 3). O fundamento desta espécie de sucessão restrita no débito societário assenta portanto numa ideia de devolução: se os sócios houverem recebido mais do que lhes pertencia porque havia débitos sociais insatisfeitos, terão de ser eles a satisfazê-los, mais tarde, à custa dos bens que lhes haviam sido entregues”. Assim, acrescenta-se, “caso o credor consiga fazer prova de que na realidade havia bens no activo à data da extinção da sociedade (e independentemente de conseguir demonstrar qual o destino que tiveram ou qual o sócio que deles ou do seu valor eventualmente se apropriou) deverá poder demandar os ex-sócios até ao valor que fosse de atribuir a esses bens, por aplicação do art. 163.° (e demandar qualquer dos sócios - veja-se que o art. 163.°, n.° 3 consagra um direito de regresso entre eles, indiciando que se trata de responsabilidade solidária)” – cf., Carolina Cunha, Responsabilidade dos sócios pelo passivo superveniente após a extinção da sociedade nos casos de ausência de liquidação, III Congresso do Direito das Sociedades Em Revista, Almedina, Outubro/2014, pág. 171 a 175 e 182 . Doutrinariamente, apreciando o problema das eventuais falsas declarações aquando da dissolução das sociedades, sem que tenha ocorrido liquidação, atenta a existência de uma pura declaração, efectuada pelos sócios, de que a sociedade não possui activo nem passivo, operado o procedimento conducente à extinção do ente societária, indaga-se junto de quem podem os credores societários reclamar a satisfação das suas pretensões. Em diferenciada obra, referencia Carolina Cunha – Código das Sociedades Comerciais em Comentário, IDET Coord. de Coutinho de Abreu, Tomo II, pág. 633 e 634 -, apreciando o regime decorrente do nº. 1, do artº. 163º, do CSC, que “a utilidade deste regime para a satisfação dos credores é, na hipótese de que curamos, marginal: segundo o disposto no art. 163°, 1, a responsabilidade dos sócios pelo passivo social superveniente tem como limite o montante que receberam na partilha. Ora, justamente, a declaração que fundou o procedimento acelerado de extinção do ente societário atestava, igualmente, a inexistência de activo, pelo que é frequente os antigos sócios alegarem que nada foi partilhado e que nada receberam, assim logrando esvaziar totalmente a sua responsabilidade”. Todavia, ressalva não parecer curial “que os sócios se possam valer apenas de uma declaração feita por eles próprios e desprovida de fiscalização para demonstrar que nada receberam em partilha — tanto mais que a declaração se veio revelar falsa no que ao passivo concerne, o que confere um golpe decisivo na sua (já escassa) credibilidade quanto à inexistência de activo. Em termos processuais, portanto, demandados pelos credores ao abrigo do art. 163 2 para pagamento do passivo superveniente, cabe aos sócios o ónus de provar, através de outros meios que não a referida declaração, que nada receberam na partilha (aliás, o art. 342°, 2, CCiv)”. Posição que a mesma Autora reafirma - Responsabilidade dos sócios pelo passivo superveniente….., ob. cit., pág. 192 a 194 -, ao apreciar acerca do valor probatório da declaração de património zero e aferição do ónus probatório da existência, e partilha, de bens sociais. Assim, e desde logo, “o facto de haverem declarado - seja no procedimento de extinção imediata, seja (com maior frequência, parece) na escritura pública por intermédio da qual procedem à dissolução da sociedade - a inexistência quer de activo, quer de passivo não impede a sua responsabilização subsequente (…)”. Por outro lado, no que concerne á “vexata quaestio de saber a quem incumbe o ónus de provar a (in)existência de bens partilhados: se são os credores que devem alegar e provar a existência de bens sociais como facto constitutivo do seu direito (art. 342.°, 1 CCiv.), se são os sócios que, instados a responder pela dívida societária terão de alegar e provar a inexistência de bens partilhados como facto impeditivo do direito dos credores (342.°, 2)”, enuncia duas diferenciadas teses. Assim, a “tese do facto constitutivo, que assaca o ónus da prova da existência e partilha de bens societários aos credores como pressuposto do exercício judicial do seu direito, parece ainda dominar a jurisprudência, embora tenha vindo perder terreno para a posição contrária. A tese do facto impeditivo, para a qual já me havia inclinado anteriormente tem vindo a ganhar o favor de alguma jurisprudência”, citando o Acórdão desta Relação de 15/03/2011. Analisando este aresto, aduz que o tribunal “começa por estabelecer que a relação jurídica que o credor social traz à lide, nos termos do art. 163.° do CSC, é aquela que o liga à sociedade, posto que nenhuma outra, diversa e autónoma, se constituiu com os respectivos sócios. Daqui retira que ao credor social apenas cabe a prova dos factos constitutivos desse seu direito sobre a sociedade (nos termos, obviamente, do art. 342.°, 1 CCiv.), cabendo correspectivamente aos sócios invocar e provar que o credor está impedido de obter, naquele momento, o ressarcimento total ou parcial do seu crédito sobre a sociedade, uma vez que da liquidação da mesma não resultou qualquer saldo ou não resultou saldo suficiente. Nas palavras do tribunal, esta posição é «a única que assegura ao credor insatisfeito uma situação idêntica à que se verificaria caso a sociedade não estivesse extinta»; ; ora, «tendo a sociedade sido dissolvida por deliberação dos sócios, como é o caso, e igualmente por estes liquidado o respectivo património (circunstâncias a que o credor social é alheio)»;, não se compreende «por que razão deve ser o credor insatisfeito a suportar os custos acrescidos dessa situação no que respeita aos ónus que processualmente lhe incumbem (sendo, aliás, certo que já sofre as consequências derivadas da cessação do giro comercial da empresa)”. Acrescenta, ainda, que tal aresto censura a posição contrária, referenciando que “o facto de exigir do credor uma prova que “necessariamente pressupõe um conhecimento sobre a situação económico-financeira da sociedade que ele, naturalmente, não terá, em muito dificultando ou, mesmo, inviabilizando a satisfação de um crédito que ele, efectivamente, tem”; - isto quando, correlativamente, os sócios se encontram numa “posição ideal para alegar e provar aquilo que receberam ou não receberam na partilha””. Jurisprudencialmente, vejamos qual tem sido o entendimento relativamente aos normativos em equação, nomeadamente, e para além de outros considerandos, no que respeita ao ónus probatório da (in)existência de bens ou activo partilhados na decorrência da liquidação da sociedade. Isto é, se compete aos credores o ónus de alegação e prova da existência de bens sociais capazes de responder pela dívida societária, como facto constitutivo do seu direito, ou se, ao invés, sendo chamados os sócios a responder pela dívida societária, terão estes de alegar e provar a inexistência de bens partilhados como facto impeditivo do direito dos credores. Num segundo momento, provada a existência de bens societários que integraram o património dos sócios (suficientes para liquidar o passivo superveniente reclamado), ainda que sem prova concreta do quantum que recebeu cada um dos sócios, urge ainda determinar a quem compete a prova de que o valor reclamado pelo credor ultrapassa o valor concretamente partilhado relativamente a cada um dos sócios demandados, nomeadamente se é o credor que tem de provar o montante concretamente recebido por cada sócio na partilha efectuada, ou se, em contraponto, sendo cada um dos sócios responsáveis até ao montante concretamente recebido na partilha, é a estes que incumbe a prova de que o valor reclamado ultrapassa tal limite. O que efectuaremos por referência cronológica a vários arestos (todos in www.dgsi.pt ). No douto Acórdão do STJ de 26/06/2008 – Processo nº. 08B1184, Relator: Santos Bernardino – sumariou-se que “os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha. 6. A declaração, feita na escritura de dissolução e liquidação de uma sociedade por quotas, pelos seus dois únicos sócios, de que a sociedade não tem activo nem passivo e de que não há bens a partilhar, não vincula os credores sociais, porque não coberta pela força probatória material que, no art. 371º do CC, é reconhecida aos documentos autênticos. 7. Em acção pendente contra a sociedade, uma vez operada, em consequência da sua extinção, devidamente registada, a substituição desta pelos dois sócios, impende sobre a autora – para lograr a responsabilidade destes, nos termos aludidos nos n.os 4 e 5 – o ónus de alegar e provar que a sociedade tinha bens e que esses bens foram partilhados entre os sócios, em detrimento da satisfação do seu crédito” (sublinhado nosso). Por sua vez, no douto Acórdão desta RL de 12/06/2014 – Processo nº. 20802/07.6YYLSB,L1-2, Relatora: Teresa Albuquerque -, referenciou-se que “como mecanismo de protecção dos credores, o legislador consagrou a responsabilidade dos sócios pelo passivo não satisfeito ou acautelado nos termos do art 163º, de acordo com o qual os sócios sucedem na titularidade da relação jurídica, embora num âmbito limitado. O que é natural, pois os sócios da sociedade accionada não poderiam desconhecer a existência da divida litigiosa aquando da dissolução da sociedade, pelo que se justifica que sejam responsáveis pela mesma enquanto sucessores da extinta sociedade, embora apenas até ao montante do que tenham recebido em partilha, nos termos do referido art 163º/1 CSCom. Além de que seria descabido que com a extinção da sociedade os credores deixassem de ter direito aos seus créditos, visto que se assim fosse os sócios poderiam utilizar a liquidação como meio de escape às dívidas da sociedade”. Acrescenta que estando em causa a utilização do mecanismo conducente à dissolução administrativa oficiosa, determinada pelo conservador, que “«veio substituir por principio a dissolução voluntaria determinada pelo tribunal – a anteriormente denominada dissolução judicial (diferida), prevista na red anterior dos arts 142º/1 e 144º: esta “desjudicialização” (e correspondente substituição da competência do juiz por um conjunto de poderes atribuídos ao conservador) foi justamente a principal novidade da reforma societária de 2006 (DL 76-A/2006)»”, um dos pressupostos para a utilização deste procedimento é o da inexistência, quer de activo, quer de passivo a liquidar. E resulta deste mecanismo, a supressão «de modo radical de toda e qualquer operação de liquidação», representando, portanto, «a consagração legal de uma dissolução sem fase de liquidação»”. Apreciando acerca do ónus probatório em equação, e citando Carolina Cunha, acrescenta que entendimento “de fazer impender sobre os credores o ónus da prova de que a sociedade tinha bens e que esses bens foram partilhados entre os sócios, em detrimento da satisfação do seu crédito, implica que lhes resulte exigida uma prova que supõe o conhecimento da situação económica da sociedade a que eles, muito dificilmente, terão acesso. Por isso se prefere abertamente o entendimento de que o credor apenas está obrigado a provar o seu direito sobre a sociedade, cabendo aos sócios provar, nos termos do art. 342º/2 do CC, que da liquidação da sociedade não resultou qualquer saldo ou não resultou saldo suficiente para satisfazer o crédito peticionado” (sublinhado nosso). Desta mesma RL, referencie-se o douto aresto de 24/06/2014 – Processo nº. 6804/10.9TBALM.L1-1, Relator: Manuel Ribeiro Marques -, no qual se fixou como questão de fundo a conhecer saber se, “face ao disposto neste normativo, compete à autora (credora) alegar e provar que a partilha dos bens da sociedade extinta teve lugar entre os sócios, ou se compete a estes (réus) alegar e provar que a mesma partilha não teve lugar”. Acrescenta não poder olvidar-se “que os antigos sócios (ora réus) não são devedores pessoais da autora, mas sim substitutos da devedora inicial, e que se durante a existência jurídica da sociedade só o património desta (e não dos sócios) responde pela dívida social, após a sua extinção a posição dos antigos sócios não pode sofrer qualquer agravamento relativamente àquelas dívidas. Não há aqui uma situação idêntica à que ocorre com os herdeiros, no âmbito do fenómeno sucessório. Enquanto estes, aceitam a herança por vontade própria, sucedendo dessa forma nas relações activas e passivas de que era titular o de cujus, os antigos sócios das sociedades extintas sucedem nas relações passivas de que era titular a sociedade extinta por força da lei, mas apenas se tiverem recebido bens sociais por partilha”. Pelo que, inexistindo esta sucessão, as relações em que a sociedade era sujeito, extinguem-se. Donde, consigna caber ao credor “o ónus de alegação e prova de que, liquidada a sociedade, os antigos sócios (no caso os réus) procederam à partilha de bens sociais, enquanto factos constitutivos do seu direito (art. 342º nº 1 do C. Civil) - cfr. Acs. STJ de 12 de Março de 2013 (relator, Cons. Garcia Calejo) e de 7 de Fevereiro de 2013 (relator, Cons. Bettencourt de Faria), in www.dgsi.pt. É que no art. 163º do CSC não é apenas o montante, mas a própria existência da responsabilidade que está em causa. Assim, os sócios só podem suceder nas dívidas da sociedade se para eles tiverem sido transmitidos certos bens antes pertença do património social” (sublinhado nosso). Ainda da RL, referenciemos o douto Acórdão datado de 08/03/2017 – Processo nº. 449/08.0TTCSC.1.L1-4, Relatora: Maria João Romba -, no qual se começou por referenciar que “a extinção da sociedade devedora, após a propositura da acção executiva, por dissolução administrativa, tem como consequência, por força do disposto pelo art. 162º do CSC, a substituição da sociedade dissolvida pela generalidade dos respectivos sócios, sem necessidade de habilitação”. E, no concernente ao ónus probatório, aduz que embora, “nos termos do art. 163º nº 1 do mesmo código, os antigos sócios só respondam pelo passivo social não satisfeito até ao montante que receberam na partilha do património da sociedade, não pode recair sobre a exequente o ónus de prova desse facto (que não é, de forma alguma, constitutivo do seu direito, uma vez que esse estava já reconhecido, tendo a obrigação correspectiva sido automaticamente transmitida, ope legis para os ex-sócios). Caberá apenas a cada um dos ex-sócios, se for caso disso, provar que não recebeu em partilha bens suficientes para satisfazer a dívida exequenda, ou seja, essa eventualidade é matéria de excepção peremptória, tratando-se de factos impeditivos do direito da exequente ao prosseguimento da execução contra os ex-sócios da devedora, sua ex-empregadora, como disposto pelo art. 162º” (sublinhado nosso). No douto Acórdão do STJ de 30/05/2017 – Processo nº. 593/14.5TBTNV-E1.S1 – sumariou-se que, relativamente ao activo superveniente, a “situação prevista e regulada no art. 164.º do CSC reporta-se à constatação (verificação), posterior ao encerramento da liquidação e após extinção da sociedade, da existência de bens não partilhados, não se exigindo que tais bens sejam supervenientes, no sentido estrito da sua ocorrência histórica, mas apenas que não hajam sido partilhados”. Igualmente desta RL de 12/07/2018 – Processo nº. 9097/14.5YIPRT.L1-6, Relator: Eduardo Petersen Silva -, após se citar dois arestos em sentido divergente, referenciou-se que “no Ac. TRL citado estamos em que o ónus de alegação e prova sempre compete ao demandado antigo sócio, e no Ac. TRP citado, que o ónus de alegação e prova competirá ao demandante, a menos que a extinção da sociedade ocorra na pendência da acção, caso em que operará uma mera substituição legal. Ora, esta posição que claramente distingue as situações, permite repor, e não é despiciendo, o equilíbrio ou paralelismo entre a situação dum credor que judicialmente acciona uma sociedade que se mantém existente durante toda a pendência da acção e o credor que, sendo-lhe a extinção da sociedade na pendência da acção alheia, se vê confrontado, segundo a tese maioritária, com a necessidade de ampliar a causa de pedir na pendência da acção com os factos respeitantes à extinção da sociedade e à liquidação dela e ao recebimento pelos sócios, e em que medida, dos bens da extinta sociedade. Noutro plano (isto é, tanto valendo para a situação de pendência como para a anterioridade do conhecimento da extinção) se situa a questão da dificuldade da prova, e quanto a ela, o mais das vezes, não poderá afirmar-se inelutavelmente tal dificuldade: - é que a liquidação deverá ser depositada no registo, e através dela o credor pode aceder rapidamente ao conhecimento de quem recebeu e quanto recebeu. Exceptuam-se os casos de dissolução em que, por inexistência de activo o encerramento da liquidação é meramente formal ou de simples constatação. Terá sido esse o caso dos autos, em que a dissolução foi administrativa e a sentença se baseia, como do respectivo relatório consta, na inexistência de liquidação, sendo certo que da certidão do registo comercial nas menções respeitantes a depósito, nada consta sobre o depósito da liquidação”. Conclui, então, que “sem prejuízo do respeito e interesse dos argumentos minoritários, continuamos a defender a tese maioritária: - não pode sempre afirmar-se uma prova impossível ou excessivamente onerosa e a questão da equiparação processual tem valor no âmbito do direito adjectivo, mas acima dele está o direito substantivo e a regra básica e fundamental da repartição do ónus de prova que comete a prova dos factos constitutivos do direito ao autor, conferindo estabilidade, certeza e segurança ao sistema jurídico”. Em douto Acórdão do STJ de 25/10/2018 – Processo nº. 3275/15.7T8MAI-A.P1.S2, Relatora: Maria da Graça Trigo –, após transcrever-se vária jurisprudência de tal Tribunal superior, concluiu-se competir “à credora, a aqui exequente/embargada, o ónus da prova de que os sócios receberam bens na partilha da sociedade executada para efeitos de prosseguimento da acção contra os sócios”. No douto aresto do STJ de 01/10/2019 – Processo nº. 4022/06.0TCLRS.L2.S1, Relatora: Fátima Gomes -, sumariou-se que “sendo extinta uma sociedade no decurso de acção judicial contra ela interposta, esta poderá prosseguir contra os antigos sócios, desde que estes tenham recebido bens na partilha, ficando a responsabilidade desses sócios pelo passivo social limitada pelo montante que receberam na partilha; 2. Não tendo ficado provado que qualquer dos sócios da R. tenha recebido em partilha algum bem da sociedade, não existe fundamento à luz dos arts. 162º e 163º nº1 do C.S.C. para que a acção prossiga contra esses sócios liquidatários; 3. Na situação indicada deve julgar-se extinta a instância por inutilidade superveniente da lide (art. 277º, al. e) do C.P.C.), já que a responsabilidade dos sócios pelas dívidas sociais está limitada ao valor do património social de que beneficiaram (indevidamente), quando o mesmo devia ter sido destinado a solver dívidas da sociedade”. Referencie-se, ainda, o douto Acórdão desta RL de 12/02/2020 – Processo nº. 3/05.9TTALM-B.L1.4, Relator: José Eduardo Sapateiro (tem 1 voto de vencido) -, o qual, após uma longa análise da doutrina e das duas diferenciadas posições jurisprudenciais quanto ao ónus probatório, conclui nos seguintes termos: “salvo o devido respeito pela opinião contrária, afigura-se-nos que nem o legislador visava tal resultado, jurídica, económica e socialmente perverso, nem os tribunais - pelo menos quando se deparam com situações comprovadas de falsas declarações como a dos autos, em que o ativo da sociedade existente e «ocultado» não é destinado a liquidar o passivo societário, também existente e ignorado, mas antes «desencaminhado» (no fundo, partilhado), de formas desconhecidas, informais, não declaradas, sub-reptícias, de licitude duvidosa, pelos sócios do ente societário de responsabilidade limitada extinto por mero ato privado dos mesmos – podem, de ânimo leve, exigir aos credores prejudicados com tais condutas e práticas fraudulentas ou levadas a cabo numa situação de abuso de direito, que façam ainda assim e à imagem do que acontece em situações de regular e são comércio jurídico, quando as empresas se encontram a funcionar e a desenvolver normalmente a sua atividade económica, a alegação e prova – já de si difícil, mesmo quando as sociedades comerciais se extinguem de boa-fé, de forma mais ou menos pública e transparente e de acordo com os parâmetros e exigências legais – de qual o património que sobrou e foi partilhado entre aqueles, assim como do seu valor, de maneira a poderem responsabilizar pelas dívidas sociais os ditos sócios prevaricadores. A posição maioritária da nossa jurisprudência não apenas peca por uma leitura excessivamente formal e literal dos preceitos normativos envolvidos nesta controvérsia relativa à repartição do ónus da prova, como acaba por premiar o «infrator», ao não valorar devidamente as falsas declarações de inexistência de ativo e passivo prestadas pelos sócios e ao isentá-los da prova de que, não obstante a inveracidade de tais declarações, os bens da sociedade que existiam foram destinados a pagar na sua totalidade dívidas daquela ou, quando «divididos» entre eles, possuem um valor pecuniário diminuto ou inferior ao da quantia exequenda, só respondendo pela satisfação desta última até esse limite. Nesta medida, estamos com a jurisprudência minoritária e com a doutrina antes transcrita que entende que, em casos de fraude ou abuso de direito derivados da dissolução e liquidação imediatas da sociedade suportadas em falsas declarações, ao credor apenas cabe alegar e provar o seu crédito (que, no caso dos autos, derivou de transação entre as partes na ação declarativa laboral e passou pelo crivo do tribunal do trabalho), recaindo sobre os sócios da sociedade extinta, nos moldes antes referidos, a prova dos factos impeditivos ou extintivos de tal direito”. Sumaria-se, ainda, neste aresto, que “a Oponente deveria não somente ter alegado de forma circunstanciada, em termos de modo, tempo e lugar, como depois demonstrado em termos objetivos, fidedignos e fiáveis, conforme lhe exigia o correspondente ónus de alegação e prova que a referida verba de € 118.174,53 havia efetivamente sido consumida na liquidação de dívidas do ente societário e que, nessa medida, não tinha sobrado nada do referido montante, que pudesse ter sido partilhado pelos dois sócios-gerentes. III - Não foi isso que aconteceu nesta Oposição à Execução, tendo ficado por saber o que aconteceu efetivamente ao valor de € 118.174,53, dúvida essa quanto à realidade desses factos que, nos termos do art.º 414.º do NCPC, se resolve contra quem aproveitaria ou beneficiária com os mesmos, ou seja, a Apelada (sublinhado nosso). No douto Acórdão do STJ de 28/04/2021 – Processo nº. 3/05.9TTALM-B.L1.S1, Relatora: Leonor Cruz Rodrigues -, após se enunciar o entendimento jurisprudencial divergente sobre a questão de saber a quem cabe o ónus de alegar e provar o recebimento pelos sócios de bens ou direitos em partilha na sequência da dissolução da sociedade, sumariou-se que “prosseguindo a execução, nos termos dos artº.s 162.º e 163.º, n.º 1, do CSC, para pagamento do passivo, estando provado que à data da deliberação de dissolução existia passivo e ativo social, com este tendo sido posteriormente liquidadas dívidas da sociedade, e a existência de saldo remanescente do ativo social cujo destino não foi apurado, cabe aos sócios provar, através de outros meios que não a declaração mencionada em II, que se veio a revelar ser falsa, que nada receberam na partilha (art.º 414.º do CPC)” (sublinhado nosso), traduzindo-se aquela declaração à efectuada em acta da Assembleia Geral de sociedade por quotas, na qual foi declarado, pelos seus dois únicos sócios, de que a sociedade não tem activo nem passivo e de que inexistem bens a partilhar. Em douto aresto, igualmente do STJ de 17/06/2021 – Processo nº. 18901/16.2T8PRT-A.P1.S1, Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza -, defendeu-se que “tratando-se de acções nas quais as sociedades vieram cobrar créditos sobre terceiros, que continuaram apesar da extinção das sociedades, a procedência da pretensão de cobrança pode conduzir, como sucedeu no caso presente, ao reconhecimento judicial de activos que não foram objecto de liquidação, e que, não sendo voluntariamente satisfeitos, podem vir a justificar a propositura de acções executivas, baseadas nas sentenças condenatórias. Certo é que, em tal eventualidade – como aqui aconteceu –, embora a acção executiva seja instaurada pelos ex-sócios, o crédito cuja satisfação efectiva assim se pretende é o que foi reconhecido pela sentença condenatória e não um crédito exigido pelos sócios per se nos termos que lhes permitiria o artigo 164.º do Código das Sociedades Comerciais, por se dever considerar abrangido por este preceito o passivo não liquidado, embora não superveniente em sentido próprio” (sublinhado nosso). Ou seja, conforme se sumaria, nesse caso, “embora a acção executiva seja instaurada pelos ex-sócios, o crédito cuja satisfação efectiva assim se pretende é o que foi reconhecido pela sentença condenatória, que é o título executivo, e não um crédito exigido pelos sócios per se, nos termos que lhes permitiria o art. 164.º do CSC”. Por fim, atentemos ao mais recente Acórdão desta Relação e Secção de 27/01/2022 – Processo nº. 12382/17.0T8LSB.L1-2, Relator: Carlos Castelo Branco (ora 1º Adjunto) -, no qual, após vasta citação doutrinária e jurisprudencial, enuncia as duas posições em confronto relativamente ao ónus probatório da existência de património social susceptível de responder pelo passivo societário. Consigna-se que “e acordo com a mencionada “tese do facto constitutivo”, compete aos credores alegar e provar a existência de bens na esfera patrimonial da sociedade e que esses bens foram partilhados pelos sócios, sob pena de estes não serem responsabilizados pelo passivo superveniente, considerando-se que o ónus da prova em questão traduz um facto constitutivo do direito dos credores, nos termos do artigo 342º nº 1 do Código Civil”. Por outro lado, “em sentido contrário situa-se a denominada “tese do facto impeditivo”, segundo a qual se considera que o ónus da prova traduz um facto impeditivo dos direitos dos credores, nos termos do artigo 342.º, n.º 2, do CC, invocável mediante exceção perentória, pelo que incumbirá aos antigos sócios o ónus de provar que a sociedade extinta não era detentora de bens ou valores e que, como tal, nada receberam na partilha do património social ou que receberam valores inferiores ao do crédito peticionado; aos credores sociais caberá apenas a alegação e a prova de que têm um direito sobre a sociedade”. Seguidamente, após ponderação do argumentário expedido, referencia que “afigura-se-nos que a correta interpretação dos normativos em apreço e a adequada consideração dos interesses em presença, determinam que se mostre mais ajustada a consideração da aludida “tese do facto impeditivo”, que ora se perfilha”. Com efeito, e concretizando, “a relação jurídica que o credor social traz à lide liga-o à sociedade, pelo que àquele cabe apenas a prova dos factos constitutivos desse seu direito sobre a sociedade, cabendo correspectivamente aos antigos sócios da sociedade invocar e provar que o credor está impedido de obter, naquele momento, o ressarcimento total ou parcial do seu crédito sobre a sociedade, uma vez que da liquidação da sociedade não resultou para os sócios qualquer saldo ou não resultou saldo suficiente”. Assim, “caso não sejam demonstrados os factos impeditivos invocados pelos antigos sócios e seja demonstrada a existência do direito do credor, o cumprimento da obrigação em que sucederam, poderá ser assacado aos antigos sócios”, sendo que, todavia, “segundo o n.° 3 do art. 163.° do CSC, os antigos sócios que satisfizerem os credores - credores que podem demandar aquele ou aqueles sócios que entenderem e que podem proceder judicial ou extrajudicialmente - gozam de direito de regresso contra os restantes” (sublinhado nosso). Aqui chegados, urge delimitar as directrizes ponderáveis: - extinta uma sociedade, após o percurso das etapas de dissolução e subsequente liquidação, existem relações jurídicas que subsistem e que se prolongam para além do termo da sua personalidade ; - o que sucede dentro de uma tensão latente entre os interesses dos sócios, dos credores sociais e dos devedores societários ; - tal problemática do activo e passivo superveniente, regulada nos artigos 162º a 164º, do Cód. das Sociedades Comerciais, determinou que a responsabilidade e titularidade passem, em determinados termos para os sócios da sociedade extinta e, existindo acções pendentes, a instância perdura, sendo a sociedade substituída pela generalidade dos sócios ; - assim, extinta a sociedade, mas mantidos os direitos ou obrigações desta, são os sócios os novos titulares deste activo e passivo, com direito ao saldo da liquidação, distribuído mediante partilha ; - pelo que, nessa partilha, caso tenham recebido mais do que era o seu direito, pois tais activos deveriam ter sido destinados a solver dívidas da sociedade, terão de ulteriormente satisfazer o passivo reclamado e, caso tenham recebido menos, em virtude de não ter sido partilhado todo o activo social, têm direito a reclamá-lo ; - porém, a responsabilidade de cada sócio no cumprimento do passivo da extinta sociedade é limitado ao montante que recebeu da partilha, ou seja, cada sócio é responsável pelo montante que pessoalmente recebeu na partilha, e não por aquilo que os demais sócios tenham recebido ; - tal responsabilidade é solidária, pelo que, podendo cada um dos sócios ser demandado até àquele limite recepcionado, caso a sua responsabilidade proporcional relativamente aos demais sócios seja ultrapassada, não pode, com tal fundamento, escudar-se ao pagamento, antes operando posteriormente as proporções mediante o direito de regresso inscrito no nº. 3, do artº. 163º, do CSC ; - ou seja, todos os sócios estão vinculados a responder pelas dívidas supervenientes, devendo responder em idêntica medida (com consequente perda) à que responderiam casos tais dívidas tivessem feito reduzir, ab initio, o activo partilhável ; - o que tem fundamento numa ideia de devolução, ou seja, caso os sócios, na liquidação efectuada, tenham recebido mais do que deveriam caso todos os débitos societários fossem pagos, estão vinculados à sua posterior satisfação, à custa dos bens ou direitos societários que lhe tenham sido anteriormente entregues ; - relativamente ao ónus probatório da (in)existência de bens ou activo partilhados na decorrência da liquidação da sociedade, ou seja, se compete aos credores o ónus de alegação e prova da existência de bens sociais capazes de responder pela dívida societária, como facto constitutivo do seu direito, ou se, ao invés, sendo chamados os sócios a responder pela dívida societária, terão estes de alegar e provar a inexistência de bens partilhados como facto impeditivo do direito dos credores, tem existido controvérsia, nomeadamente jurisprudencial, conforme resulta exemplificativamente dos arestos supra enunciados ; - entendemos, na ponderação dos argumentos em equação e tutela da posição dos credores sociais, que demandando estes os sócios, nos quadros do nº. 2, do artº 163º, do CSC, de forma a ser-lhes pago passivo superveniente, incumbe aos sócios demandados o ónus probatório de alegação e prova de que nada receberam na partilha, como facto impeditivo do direito dos credores (o nº. 2, do artº. 342º, do Cód. Civil) – tese do facto impeditivo ; - ou seja, aos credores sociais incumbe apenas o ónus probatório dos factos constitutivos do seu direito creditório sobre a sociedade extinta, incumbindo aos ex-sócios alegar e provar, como excepção peremptória de que se trata, que da liquidação da sociedade não resultou qualquer saldo positivo ; - ou que não resultou saldo suficiente ou bastante para fazer face ao crédito reclamado, isto é, que naquele momento os credores estão impedidos de obter o ressarcimento, total ou parcial, do seu crédito sob a sociedade, em virtude de que da liquidação desta não resultou qualquer saldo, ou não resultou saldo suficiente capaz de solver o crédito reclamado ; - e não aos credores sociais o ónus de alegação e prova da existência de bens ou direitos sociais, recebidos ou partilhados pelos ex-sócios, em detrimento da satisfação do seu crédito, como eventual facto constitutivo do seu direito (o nº. 1, do artº. 342º, do Cód. Civil) – tese do facto constitutivo ; - tendo-se apurado a existência de um activo societário, e não tendo os ex-sócios alegado e provado que este foi consumido na liquidação de dívidas do ente societário, nada sobrando para partilha entre os sócios, não se logrando determinar o que aconteceu a tal activo, tal situação de dúvida quanto à realidade factual é resolvida, nos termos do artº. 414º, do Cód. de Processo Civil, contra quem aproveitaria ou beneficiaria com os mesmos, ou seja, contra os ex-sócios, a quem incumbiria provar que nada receberam na partilha. Revertendo tais directrizes ou princípios ao caso sub judice, consigna-se o seguinte: - a Autora instaurou a acção contra S..., Lda., peticionando, para além do maís, e no que ora releva, a sua condenação no pagamento de quantias correspondentes às rendas em dívida, atenta a sua posição de arrendatária em imóvel àquela pertencente ; - na pendência dos autos, veio a sociedade Ré a ser declarada dissolvida, e encerrada a sua liquidação, bem como cancelada a respectiva matrícula pelas Inscrições 2 e 3 referentes à Ap. 105 de 30-01-2018 – facto provado 20. ; - mediante decisão datada de 06/09/2018, conheceu-se parcialmente acerca da pretensão acional e, no que respeitava ao petitório de condenação no pagamento das rendas vencidas e vincendas (pedido subsistente), consignou-se que caberia à Autora, caso pretendesse o prosseguimento da acção para o efeito, alegar e provar que a sociedade Ré, entretanto extinta, tinha bens que foram partilhados pelos sócios, e, identificando os visados, requerer o prosseguimento da acção contra esses ; - relativamente ao demais pedido subsistente, veio a Autora, em 29/10/2019, requerer o prosseguimento da acção, deduzindo-o contra os ex-sócios da sociedade Ré dissolvida, nomeadamente AA e BB ; - desde logo alegando que estes, na qualidade de sócios da Ré declarada extinta, haviam recebido, no âmbito de um processo de falência, créditos no valor de € 808.952,58, de que era titular a mesma Ré ; - nomeadamente que a sociedade dissolvida era titular de créditos no processo de falência da So..., S.A., a correr os seus termos sob o n° 75/ A...., no Juízo de Comércio ..., os quais foram pagos e partilhados pelos sócios da mesma empresa, supra identificados, a saber AA e BB, em nome pessoal e na qualidade de herdeiros do terceiro sócio da Ré, DD ; - a sentença sob sindicância reconheceu ser a sociedade Autora titular de um crédito sob a sociedade Ré, entretanto extinta, no valor de capital de 26.412,99 €, acrescido de juros moratórios comercais, contados desde a data de vencimento de cada uma das rendas em dívida, até integral e efectivo pagamento ; - e, consequentemente, condenou os Réus substitutos a pagar à Autora tal quantia ; - reportando-se tal valor a rendas devidas e não pagas, relativas ao período compreendido entre Julho de 2016 e Janeiro de 2018, sendo que nesta parte, não fazendo parte do objecto recursório, aquela decisão, datada de 13/02/2023, transitou em julgado ; - assim, tendo ocorrido o cancelamento da matrícula comercial da Ré sociedade, após a sua dissolução e liquidação, em 30/01/2018, estamos perante passivo superveniente, pelo qual devem responder, prima facie, os ex-sócios, e ora intervenientes Réus substitutos ; - conforme enunciámos, a Autora logrou provar os factos constitutivos do seu direito creditório sobre a sociedade extinta ; - pelo que, segundo a posição adoptada, incumbiria aos Réus substitutos, enquanto ex-sócios demandados, provarem que nada receberam na partilha societária, como facto impeditivo do direito creditício da Autora ; - e, não o tendo feito, nomeadamente a Ré substituta recorrente, tal bastaria para a formulação de um juízo de improcedência da pretensão recursória apresentada ; - todavia, para além da prova do seu activo creditício, logrou ainda a Autora provar a existência de um activo superveniente que, pelo menos em parte, é necessariamente da titularidade da extinta sociedade ; - com efeito, a transacção enunciada nos factos provados 21. a 24., lavrada nos autos de falência da So..., S.A., reporta-se ao exercício, por sub-rogação, relativamente ao reconhecimento do direito da extinta Ré sociedade, e de BB, em nome pessoal, de se sub-rogarem na posição da CGD, tendo transaccionado com a C... que, por sua vez, havia adquirido os créditos da CGD ; - mediante tal transacção foi cedido aos antigos sócios da extinta sociedade Ré, e a BB, o valor que havia cabido à referenciada C..., por rateio, por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22, inscrita como C-4, o que sucedeu em virtude do crédito que anteriormente havia sido pertença da CGD ter sido parcialmente satisfeito mediante a alienação de imóveis (sendo, pelo menos um deles, pertença da extinta Ré S...) – cf., facto provado 27. ; - desta forma, os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes, bem como BB em nome pessoal, receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência ; - a qual entregou ao restante sócio BB (seu irmão), quer enquanto sócio da sociedade dissolvida, quer em nome pessoal, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos também em substituição da ré dissolvida e liquidada ; - ou seja, parte do valor objecto de transacção constitui, com clareza, um activo patrimonial pertença da Ré dissolvida, que apenas se veio a definir mediante a sentença homologatória da transacção, datada e transitada em julgado em 11/04/2019 ; - efectivamente, resultando aquele direito de sub-rogação da extinção do crédito da CGD, por via da satisfação que obteve no processo de execução fiscal, com a venda dos terrenos, um dos quais pertencentes à S..., deve necessariamente concluir-se que, efectivada aquela venda (foram adjudicados pela credora CGD), formou-se embrionariamente a aludida posição creditícia, que acabou por concretizar-se e balizar-se na sentença de verificação e graduação de créditos da falência da So..., S.A. e, posteriormente, delimitar-se na transacção outorgada ; - sendo certo, conforme supra referenciámos, que para a existência ou reconhecimento de um activo superveniente, não é necessário que os bens ou direitos sejam historicamente supervenientes, bastando apenas que ainda não tenham sido partilhados ; - ora, se é certo que tal activo superveniente não resultou, stricto sensu, de um crédito reclamado, reconhecido e verificado à sociedade Ré, nos termos em que os demais créditos em concurso foram reclamados e reconhecidos, o mesmo tem igualmente por fonte a sentença de verificação e graduação de créditos, atenta a substituição, aí consignada, por sub-rogação, na posição dos credores iniciais, fruto de requerimento de reclamação anteriormente apresentado – cf., facto provado 25. ; - desta forma, não é legítimo concluir-se pela impossibilidade de responsabilização dos Réus substitutos por qualquer passivo superveniente assacado à sociedade Ré após a data da sua extinção, em 30/01/2018, para tanto bastando que os Réus substitutos, enquanto ex-sócios demandados, decaiam na prova de que nada receberam na partilha societária ou seja, que faleçam na prova deste facto impeditivo do direito reclamado pela Autora ; - sendo que, ademais, in casu, logrou inclusive a credora Autora provar a concreta existência de um activo recebido, nomeadamente uma quantia monetária, fruto da transacção homologada, sendo que tal valor, num primeiro momento entregue à Ré substituta (e ora Apelante) AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, foi posteriormente, em parte, entregue ao restante sócio (e irmão) BB, quer enquanto sócio da sociedade dissolvida, quer em nome pessoal, sendo que tal valor global foi recebido, também, em substituição da Ré dissolvida e liquidada ; - donde, não é pertinente a afirmação da Recorrente de que a Autora não demonstrou que parte do valor transacionado competiria aos antigos sócios da sociedade Ré ; - sendo que, relativamente à alegação de que a Autora não demonstrou em que medida tal quantia teria sido partilhada entre os antigos sócios da sociedade Ré, o que efectivamente não se logrou provar, tal situação de dúvida quanto à realidade factual é resolvida, nos quadros do artº. 414º, do Cód. de Processo Civil, contra quem aproveitaria ou beneficiaria com o mesmo, ou seja, contra a ex-sócia (ora Recorrente), a quem incumbiria provar que o montante que lhe coube na partilha não seria suficiente para fazer face ao pagamento do passivo social superveniente ora reclamado. Donde, não poderá deixar de concluir-se, nos termos consignados na sentença apelada, no sentido dos Réus substitutos (entre os quais figura a Ré substituta apelante) terem recebido, em representação e em virtude da extinção da Ré sociedade, um montante assaz superior ao valor da dívida apurada nos autos (crédito da Autora), que remonta a período anterior à data da sua extinção. Pelo que, devem os mesmos ser condenados no seu pagamento, nas forças do que resulta partilhado, manifestamente superior ao necessário para assegurar a solvabilidade do valor em dívida. Determinando, consequentemente, juízo de total improcedência das conclusões recursórias, conducente à confirmação da sentença recorrida/apelada. ------ Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, as custas do presente recurso ficam a cargo da Apelante/Ré substituta. *** IV. DECISÃO Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em: Julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela Ré substitua/Apelante/Recorrente AA, em que figura como Autora/Apelada/Recorrida G..., S.A. e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida/apelada. Custas do presente recurso a cargo da Recorrente/Apelante/Ré substituta - cf., artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil. Lisboa, 04 de Abril de 2024 Arlindo Crua Carlos Castelo Branco Inês Moura _______________________________________________________ [1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original. [2] O presente facto possuía a seguinte redacção original: “No processo de falência que correu termos sob o n.º 75/14.... do Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no seguimento de na sentença de verificação e graduação de créditos ter sido reconhecido o direito da ré e de BB a se substituírem na posição da CGD, após a elaboração de um mapa de rateio e de ter sido considerado que a ré liquidada seria representada pelos respectivos sócios, foi apresentado em 10-04-2019 um requerimento de transação mediante o qual a sociedade C... cedeu à extinta sociedade ré o valor que lhe coube no rateio por conta de uma hipoteca no montante de € 897.836,22”. [3] Originalmente, o presente facto tinha a seguinte redacção: “Foi, então, ordenada a rectificação do mapa de rateio por forma a constar que a sociedade ré receberia, com referência à inscrição da denominada hipoteca C4, o valor de € 897.836,22, ordenando-se o respectivo pagamento”. [4] Era a seguinte a sua redacção original: “Os sócios da sociedade dissolvida e aqui intervenientes receberam o valor objecto da transacção, tendo o mesmo sido entregue à ré substituta AA, enquanto advogada e mandatária nos autos de falência, tendo esta entregue ao restante sócio BB, seu irmão, a parte que acordaram, tendo esses valores sido recebidos em substituição da ré dissolvida e liquidada”. [5] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2014, 2ª Edição, Almedina, pág. 599. [6] Traduzem estas nulidades da sentença a “violação da lei processual por parte do juiz (ou do tribunal) prolator de alguma decisão”, pertencendo ao género das nulidades judiciais ou adjectivas – cf., Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, pág. 368. [7] Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, 1982, pág. 102. [8] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. cit, pág. 600 e 601. [9] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 372. [10] Ob. cit., pág. 606. [11] Ob. cit., pág. 370 e 371. [12] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. cit., pág. 604 e 605. [13] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª Edição, Almedina, pág. 737. [14] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 372. [15] RLJ, Ano 143º, Novembro-Dezembro de 2013, nº. 3983, pág. 129 a 151. [16] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 372 a 375. [17] Acerca da disponibilidade da tutela jurisdicional a operar pelo princípio do dispositivo, através das modificações objectivas da instância, por alteração do pedido e da causa de pedir, nos termos dos artigos 264º e 265º, ambos do Cód. de Processo Civil, cf., José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., Vol. 1º, 4ª Edição, pág. 40. [18] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, pág. 67 e 68. [19] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 285. [20] Idem, pág. 285 a 287. [21] Refere António Pereira de Almeida - Sociedades Comerciais, 3ª Edição, Coimbra Editora, 2003, pág. 525 – que “liquidação é a situação em que se encontra a sociedade em consequência da dissolução e tem por finalidade a partilha do activo remanescente após liquidação do passivo”. [22] Nas palavras de António Pereira de Almeida - ob. cit., pág. 528 -, “após o encerramento da liquidação e extinção da sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha (art. 163º, nº. 1)”. |