Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3134/21.4T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULO DIAS DA SILVA
Descritores: CONTRATO DE MÚTUO
FORMA LEGAL
Nº do Documento: RP202402083134/21.4T8AVR.P1
Data do Acordão: 02/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Atendendo ao montante emprestado, deveria esse mútuo ter sido titulado por escritura pública, sendo certo que essa forma não foi respeitada sendo, por isso, nulo o mútuo por falta de forma, a qual tem efeito retroativo, pelo que devem os Apelantes restituir o montante peticionado, acrescido dos juros contados desde a citação, nos termos do art.º 805.º n.º 1 do Código Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2024:3134/21.4T8AVR.P1





Acordam no Tribunal da Relação do Porto


1. Relatório
AA, residente habitualmente em 512, ..., Estados Unidos da América instaurou acção declarativa sob a forma de processo comum contra BB e CC, residentes na Travessa ..., ... - ... ..., Águeda, União de Freguesias ..., ... e ..., concelho de Águeda, onde concluiu pedindo que os Réus sejam condenados:
a) a reconhecer que o Autor, através do seu irmão e pai e sogro dos RR, lhes fez entrega em 4/10/2013 da quantia total de €53.363,45, sendo €35.000,00 em euros e $USA dólares 25.000,00, que convertidos em euros naquela data corresponderam a €18.363,45, a título de empréstimo, para os mesmos solverem responsabilidades de ambos perante entidades bancárias e posteriormente lha restituírem;
b) a reconhecer que tal empréstimo é nulo por falta de forma, nos termos do disposto no artigo 1143º do Código Civil, e, por força disso e do disposto no artigo 289º do mesmo Código,
c) a restituírem ao Autor a quantia de € 53.363,45, acrescida de juros moratórios à taxa legal de 4% que sobre ela se vençam desde a data da citação até à data de efectivo e integral restituição da quantia.
Alega, em síntese, que os Réus, sobrinhos do Autor, solicitaram-lhe, através de seu pai e sogro e irmão do Autor, DD, que o Autor lhes emprestasse algo mais do que cinquenta mil euros, o que o Autor fez, em Setembro de 2013.
Acrescenta que, não obstante o Autor tenha solicitado já por diversas vezes aos Réus a restituição da totalidade da quantia emprestada, os mesmos não o fizeram até ao presente.
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Citados, os réus contestaram.
Invocaram que os Réus e, em particular, a Ré são partes ilegítimas e que o mútuo é nulo por falta de forma.
Acrescentaram que foi por necessidade de proteger o seu pai das constantes ameaças e pressões do autor que o réu assinou a declaração de dívida.
Mais alegaram, que os Réus solicitaram a quantia de cerca de € 60.000,00 ao pai e sogro, respectivamente, sendo este que anuiu ao pedido, desconhecendo os Réus a proveniência do referido valor.
Concluem pedindo que seja declarada a ilegitimidade passiva dos réus e, consequentemente, estes sejam absolvidos da instância, ou, caso assim não se entenda, a acção seja julgada improcedente e os Réus absolvidos do pedido.
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Dispensou-se a realização de audiência prévia, elaborando-se despacho saneador que determinou a improcedência da excepção de ilegitimidade, fixando-se o objecto do litígio e os temas de prova.
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Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, com observância de todas as formalidades legais.
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Foi proferida sentença que julgou a acção procedente e, consequentemente:
a) Declarou nulo por falta de forma o mútuo descrito nos pontos 5 a 13 dos factos provados;
b) Condenou os Réus BB e CC a restituírem ao Autor AA a quantia de €53.363,45, acrescida de juros moratórios à taxa legal, desde a data da citação até à data de efectiva e integral restituição de tal quantia.
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Não se conformando com a sentença proferida, os recorrentes BB e CC vieram interpor o presente recurso de apelação, em cujas alegações concluem da seguinte forma:

“I.O presente recurso tem por objeto a matéria dada como provada nos pontos 6, 7, e 13 da sentença recorrida.

II. Foi dado como provado pelo tribunal que: “6 - Os Réus sabiam que o Autor dispunha da quantia de que necessitavam, pelo que lhe solicitaram, através de seu pai e sogro e irmão do Autor, DD, em fins de Setembro de 2013, que o Autor lhes emprestasse algo mais do que cinquenta mil euros (€ 50.000,00).”

III. Foi dado como provado pelo tribunal que: “7 - O Autor acedeu a tal pedido dos Réus fazendo-lhes, por duas vias ou em duas formas de entrega, a entrega do dinheiro que os Réus, seus sobrinhos, lhe pediram.”.

IV. E, por fim, com interesse para o presente recurso que: “13 - Quantias essas (€ 35.000,00 e € 18.363,45) que, por sua vez, o pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, DD, mandou transferir de seguida daquela sua conta no Banco 1... para a conta de ambos os Réus naquele mesmo Banco 1... com o nº ...37....”

V. Quanto ao ponto 6 e ao ponto 7 eles estão interligados, apenas sendo o 7 possível por causa do 6, tendo em conta que o 7 relata a aceitação de um pedido feito em 6, que, portanto, não se dando o 6 como provado, não poderá, por consequência, ser dado como provado o 7.

VI. A prova produzida no julgamento obriga a uma decisão diferente quanto aos pontos enunciados, isto tendo em conta os depoimentos prestados, não só pela Ré, mas como pela testemunha DD.

VII. A história carreada para os autos pelo A. é no sentido de que a certa altura, em Setembro de 2013, o seu irmão, a testemunha DD, lhe pediu, em nome dos RR., o empréstimo do dinheiro que se discute nos autos.

VIII. No entanto essa versão mudou em julgamento, relativamente à contestação dos RR., durante o depoimento do A., que disse ter estado numa reunião com a Ré e o seu irmão, a testemunha DD, onde a Ré (e desta feita já não o seu irmão) lhe pediu o dinheiro emprestado.

IX. Para além desta alteração da versão em relação ao vertido na P.I., que não deveria ser admitida e dada como provada pelo tribunal; não deveria ter sido dada como provada tal reunião, nem tal pedido, isto porquanto as declarações da Ré, assim como do irmão do A., desmentem, também, esta versão.

X. O depoimento da testemunha DD é claro. Não teve nada a ver com o pedido de dinheiro. Não presenciou nem conhece nenhuma reunião onde a Ré tenha pedido dinheiro ao A.. Contraria, cabalmente, a versão carreada para os autos pelo A..

XI. O mesmo se retira das declarações da Ré.

XII. Tal prova implica decisão de facto diferente da que foi tomada.

XIII. Para além dos factos 6 e 7, também o facto 13 foi incorretamente julgado, tendo em conta que há no processo prova dos cheques que a testemunha DD passou aos RR, no valor de 30.000,00€, ao passo que a sentença dispõe que esses valores foram enviados por transferência.

XIV. Tal facto é importante para desconstruir a convicção do tribunal a quo, que sem provas consistentes pretende que o dinheiro teve de passar, primeiro, pela testemunha DD por motivos ligados aos RR. que não podiam ter o dinheiro nas contas, no entanto o dinheiro foi exatamente, direto para as contas dos RR., pelo que poderia, perfeitamente, ter sido movimentado diretamente da conta do A. para as contas dos RR., isto, claro, se na verdade os RR. tivessem pedido alguma vez alguma coisa ao A., que nunca pediram.

XV. No fundo, a versão que deve vingar é a versão dos RR., em como pediram o dinheiro à testemunha DD, pai e sogro, e nunca ao A..
Portanto, foram incorretamente julgados os pontos 6, 7, e 13, da matéria de facto dada como provado, devendo, na sua vez, ter sido dados como provados os b) e c) dos factos não provados. Tudo isto tendo em conta as declarações do A., da Ré, do Réu, da testemunha DD e da testemunha EE, passagens assinaladas com exatidão nos locais próprios, com as transcrições.
Ainda que não se dê como provado os factos b) e c), deverão os 6, 7, e 13, ser dados como não provados o que levará, certamente, à absolvição dos Réus do pedido.
Assim como a sentença viola a norma dispostas no art.º 615/1/c.”.
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Foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
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2. Factos
2.1 Factos provados
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1. O Autor é emigrante nos Estados Unidos da América do Norte (USA), sendo portador do cartão de cidadão nº ....
2. É irmão de DD, residente na Estrada ..., ... - ... ..., União de Freguesia ..., ... e ..., concelho de Águeda,
3. Os Réus são casados entre si e o Réu marido é sobrinho do Autor, sendo filho do seu irmão identificado no artigo anterior, DD,
4. O Autor possuía e possui conta bancária no Banco 2... com o IBAN ...05, de que é exclusivo titular, mas que pode também ser movimentada pelo seu irmão.
5. Em Setembro de 2013 os Réus necessitavam de mais de cinquenta mil euros (€50.000,00) para solverem dívidas de que ambos eram responsáveis perante entidades bancárias.
6. Os Réus sabiam que o Autor dispunha da quantia de que necessitavam, pelo que lhe solicitaram, através de seu pai e sogro e irmão do Autor, DD, em fins de Setembro de 2013, que o Autor lhes emprestasse algo mais do que cinquenta mil euros (€50.000,00).
7. O Autor acedeu a tal pedido dos Réus fazendo-lhes, por duas vias ou em duas formas de entrega, a entrega do dinheiro que os Réus, seus sobrinhos, lhe pediram
8. Para tanto, o Autor acedeu a que o seu irmão DD;
- procedesse previamente à liquidação de uma aplicação de €25.000,00 que o Autor tinha no Banco 2..., afecta à sua conta à ordem identificada no ponto 2 dos factos provados
- E ordenasse igualmente a venda de obrigações afectas àquela mesma conta que renderam € 12.152,50 para que tais quantias passassem a estar na sua conta à ordem,
9. E de seguida e de imediato o mesmo seu irmão sacasse sobre essa mesma sua conta bancária pessoal no Banco 2... um cheque do montante de €35.000,00 (trinta e cinco mil euros), emitido a favor dele próprio para, de seguida, em representação do Autor entregar aos filho e nora, isto é, aos Réus.
10. O que veio a acontecer, após requisição de cheques feita em 30/09/2013 pelo seu irmão DD, através do cheque nº ...56 de €35.0000,00 (trinta e cinco mil euros), datado de 30/9/2013, e que veio a ser depositado por ele, pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, na sua conta do Banco 1... em Águeda com o nº ...52 e que foi debitado na conta do Autor em 4/10/2013.
11. Para além disso, em 3/10/2013 o Autor, como não dispunha do total do montante pretendido pelo seu sobrinho naquela sua conta bancária no Banco 2..., ordenou uma transferência bancária duma sua conta bancária nos Estados Unidos da América do Norte (USA) para a conta bancária com o nº ...52 que o seu irmão DD possuía no Banco 1... em Águeda do montante de €25.000,00 dólares,
12. Os quais, convertidos em euros à cotação daquele dia, deram €18.363,45 (dezoito mil trezentos e sessenta e três euros e quarenta e cinco cêntimos).
13. Quantias essas (€35.000,00 e €18.363,45) que, por sua vez, o pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, DD, mandou transferir de seguida daquela sua conta no Banco 1... para a conta de ambos os Réus naquele mesmo Banco 1... com o nº ...37....
14. Como até fins de 2015, os Réus ainda não haviam restituído ao Autor qualquer quantia por conta da totalidade do dinheiro que o mesmo lhes emprestara e o Autor insistisse perante eles pela sua restituição, o Réu marido, para procurar sossegar o Autor, subscreveu e entregou ao Autor uma declaração impressa, apenas por ele subscrita pessoalmente sob ela, com o seguinte teor “Eu, BB, Portador do Cartão de Cidadão nº ...45, declaro que AA, me concedeu a titulo de empréstimo 25.000,00 USD (vinte e cinco mil dólares), mais €35.000,00 (Trinta e cinco mil euros) com juros de 3% ao ano, com início a 01/01/2016. Sem mais nada a declarar”.
15. O certo é que, não obstante o Autor tenha solicitado já por diversas vezes aos Réus a restituição da totalidade da quantia emprestada, e os Réus terem prometido restituir-lha, até ao momento não o fizeram.

2.1 Factos não provados
O Tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos:
a) O Réu tivesse subscrito a “declaração de confissão de dívida devido a necessidade que sentiu em proteger o sue pai, irmão do aqui Autor das frequentes ameaças de que o mesmo era alvo, com fundamento na movimentação de contas bancárias sem para tal estar autorizado;
b) Os Réus peticionassem ao seu pai e sogro a quantia global de 60.000,00 €;
c) Pedido ao qual o pai e sogro dos réus anuísse;
d) O pai do réu anuísse ao pedido dos réus por ter anteriormente emprestado quantia muito superior ao irmão do Réu.

3. Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar e decidir:
Das conclusões formuladas pelos recorrentes as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que as questões por resolver no âmbito do presente recurso são as seguintes:
- Da nulidade da decisão;
- Da impugnação da matéria de facto;
- Do mérito do decidido.
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4. Conhecendo do mérito do recurso:
4.1. Da nulidade da decisão
Invocam os Apelantes que a decisão recorrida padece do vício de nulidade por os seus fundamentos estarem em oposição com a decisão.
Vejamos, então, se a decisão sob recurso é nula.
É, desde há muito, entendimento pacífico, que as nulidades da decisão não incluem o erro de julgamento seja de facto ou de direito - cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9.4.2019, processo nº 4148/16.1T8BRG.G1.S1, disponível, como os demais, em www.dgsi.pt ou em sumários de acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça -: as nulidades típicas da sentença reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal - cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23.3.2017, proferido no processo nº 7095/10.7TBMTS.P1.S1 -; trata-se de vícios de formação ou actividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afectam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito, enquanto o erro de julgamento (error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei - cf. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 17.10.2017, proferido no processo nº 1204/12.9TVLSB.L1.S1. e de 10.9.2019, proferido no processo nº 800/10.3TBOLH-8.E1.S2 -, consiste num desvio à realidade factual (nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma) ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma.
Como ensinava o Prof. José Alberto Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1981, Vol. V, págs. 124, 125, o magistrado comete erro de juízo ou de julgamento quando decide mal a questão que lhe é submetida, ou porque interpreta e aplica erradamente a lei, ou porque aprecia erradamente os factos; comete um erro de actividade quando, na elaboração da sentença, infringe as regras que disciplinam o exercício do seu poder jurisdicional. Os erros da primeira categoria são de carácter substancial: afectam o fundo ou o efeito da decisão; os segundos são de carácter formal: respeitam à forma ou ao modo como o juiz exerceu a sua actividade.
E, como salienta o Prof. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª edição, 1985, pág. 686, perante norma do Código de Processo Civil de 1961 idêntica à actual, o erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade com o direito aplicável, não se incluiu entre as nulidades da sentença.
As nulidades ditam a anulação da decisão por ser formalmente irregular, as ilegalidades ditam a revogação da decisão por estar desconforme ao caso (decisão injusta ou destituída de mérito jurídico) - cf. neste sentido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2017, proferido no processo nº 1204/12.9TVLSB.L1.S1.
Como é sabido, as causas de nulidade da sentença vêm taxativamente enunciadas no artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, onde se estabelece que é nula a sentença:
- Quando não contenha a assinatura do juiz (al. a)).
- Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (al. b)).
- Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (al. c)).
- Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (al. d)).
- Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido (al. e)).
O Prof. Castro Mendes, in “Direito Processual Civil”, Vol. III, pág. 297, na análise dos vícios da sentença enumera cinco tipos: vícios de essência; vícios de formação; vícios de conteúdo; vícios de forma e vícios de limites.
Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem, assim, a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia).
São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.
No caso vertente, o Apelante invoca que o Tribunal “a quo” violou o disposto no artigo 615º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil, o que é desprovido de sentido e fundamento.
Com efeito, a nulidade da sentença/acórdão prevista no 1º. segmento da alínea c) do nº. 1 do citado artigo 615º - fundamentos em oposição com a decisão - ocorre quando os fundamentos de facto e/ou de direito invocados pelo julgador deveriam conduzir logicamente a um resultado oposto ao expresso na decisão, existindo, pois, uma contradição entre as suas premissas, de facto e/ou de direito, e a conclusão/decisão final.
Ou seja, a contradição a que a lei impõe o efeito inquinatório da sentença como nulidade, é a oposição entre os fundamentos e a decisão - artigo 668º, nº 1, alínea d) do Código de Processo Civil.
Porém, para que tal ocorra, não basta uma qualquer divergência inferida entre os factos provados e a solução jurídica, pois tal divergência pode consubstanciar um mero erro de julgamento (error in judicando) sem a gravidade de uma nulidade da sentença. Como escreve Amâncio Ferreira «a oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento» (A. Ferreira, Manual de Recursos em Processo Civil, 9ª edição, pg. 56).
A contradição entre os fundamentos e a decisão prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 668º, ainda nas palavras do citado autor, verifica-se quando «a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo Juiz conduziriam necessáriamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente»
Reportando-nos ao caso vertente, resulta, de forma insofismável, da leitura da sentença que a decisão recorrida encontra-se em decorrência lógica da fundamentação de facto e de direito, pelo que não se vislumbra a alegada contradição.
Do exposto, resulta não ocorrer a nulidade invocada.
Improcede, pois, a nulidade invocada pelos recorrentes.

4.2. Da impugnação da Matéria de facto
Os apelantes em sede recursiva manifestam-se, ainda, discordantes da decisão que apreciou a matéria de facto, sendo que, segundo o seu entendimento o Tribunal a quo julgou incorrectamente os pontos 6, 7, e 13, da matéria de facto dada como provada, devendo, segundo defendem, serem dados como provados os pontos constantes das alíneas b) e c) dos factos não provados.
Consta dos pontos 6, 7 e 13 dados como provados que:
“6 - Os Réus sabiam que o Autor dispunha da quantia de que necessitavam, pelo que lhe solicitaram, através de seu pai e sogro e irmão do Autor, DD, em fins de Setembro de 2013, que o Autor lhes emprestasse algo mais do que cinquenta mil euros (€ 50.000,00).”
“7 - O Autor acedeu a tal pedido dos Réus fazendo-lhes, por duas vias ou em duas formas de entrega, a entrega do dinheiro que os Réus, seus sobrinhos, lhe pediram.”.
“13 - Quantias essas (€35.000,00 e €18.363,45) que, por sua vez, o pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, DD, mandou transferir de seguida daquela sua conta no Banco 1... para a conta de ambos os Réus naquele mesmo Banco 1... com o nº ...37....”.
Vejamos, então.
No caso vertente, mostram-se minimamente cumpridos os requisitos da impugnação da decisão sobre a matéria de facto previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, nada obstando a que se conheça da mesma.
Entende-se actualmente, de uma forma que se vinha já generalizando nos tribunais superiores, hoje largamente acolhida no artigo 662.º do Código de Processo Civil, que no seu julgamento, a Relação, enquanto tribunal de instância, usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (artigo 655.º do anterior Código de Processo Civil e artigo 607.º, n.º 5, do actual Código de Processo Civil), em ordem ao controlo efectivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efectiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto; porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece.
Como refere A. Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, págs. 224 e 225, “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”.
Importa, pois, por regra, reexaminar as provas indicadas pelos recorrentes e, se necessário, outras provas, maxime as referenciadas na fundamentação da decisão em matéria de facto e que, deste modo, serviram para formar a convicção do Julgador, em ordem a manter ou a alterar a referida materialidade, exercendo-se um controlo efectivo dessa decisão e evitando, na medida do possível, a anulação do julgamento, antes corrigindo, por substituição, a decisão em matéria de facto.
Reportando-nos ao caso vertente constata-se que a Senhora Juiz a quo, após a audiência e em sede de sentença, motivou a sua decisão sobre os factos nos seguintes meios de prova:
“No que se refere aos pontos 1 a 3 dos factos provados nos documentos juntos com a petição inicial e constantes de fls. 8 verso a 11 dos autos.
No que se refere ao ponto 4 dos factos provados nos documentos juntos com a petição inicial e constantes de fls. 12/13 dos autos, bem como no documento junto a fls. 65 dos autos.
No que se refere aos pontos 5 a 7 dos factos provados no depoimento do Autor. Relatou que soube através de um outro sobrinho, a testemunha EE, que os Réus estavam com problemas financeiros. Nessa sequência, fez uma reunião com o irmão e com a Ré (o Réu estava em Angola), ficando combinado que emprestaria aos Réus 35.000,00€. A Ré falou com o marido e, após essa conversa, pediu-lhe mais dinheiro que o Autor não tinha disponível em Portugal, pelo que, só quando regressou aos EUA providenciou pelo seu envio.
O depoimento do autor foi confirmado pela testemunha EE.
Quanto à testemunha DD afirmou que só serviu de intermediário para a recepção do dinheiro, não estando envolvido em qualquer pedido de empréstimo ao irmão.
Face a estes depoimentos, não mereceu qualquer credibilidade o depoimento dos Réus que, embora admitem ter tido necessidade da quantia de dinheiro mencionada, afirmaram nunca ter pedido dinheiro emprestado ao Autor e afirmando que quem lhes emprestou o dinheiro foi o pai do Réu, a testemunha DD, desconhecendo a proveniência desse dinheiro.
De igual modo, não mereceram qualquer credibilidade os seus depoimentos quando afirmam que foram quase obrigados pelo pai do réu a assinar esse documento (explicando depois o Réu que o assinou para o pai lhe continuar a dar os 1000 € mensais que lhe costumava dar).
Aliás, a coerência e objectividade do discurso do réu foi notoriamente prejudicado pelo ressentimento que tem para com o pai a quem acusa de beneficiar o irmão em seu detrimento.
Do que fica dito resulta também a não prova da matéria descrita nos pontos a) a d) dos factos não provados
No que se refere aos pontos 8 a 13 dos factos provados na leitura coordenada dos elementos bancários quer do Banco 2... (conta do autor), que do Banco 1... (conta do irmão do autor) constantes de fls. 12 e 13, 38 a 48, 56, 64, 67 a 68 que documentam todos os movimentos bancários descritos nesses pontos dos factos provados.
Sobre esta matéria depôs ainda o Autor e a testemunha DD, seu irmão, que depuseram quanto à forma como o Autor disponibilizou a quantia referida nesses pontos, para ser entregue ao sobrinho, confirmando os movimentos bancários descritos.
No que se refere ao ponto 14 dos factos provados na declaração constante de fls. 14 verso dos autos.
No que se refere ao ponto 15 dos factos provados, para além do depoimento do Autor, os Réus aceitam não ter pago a quantia mutuada.”.
Tendo presentes estes elementos probatórios e demais motivação, vejamos então se, na parte colocada em crise, a referida análise crítica corresponde à realidade dos factos ou se a matéria em questão merece, e em que medida, a alteração pretendida pelos apelantes.
Conforme atrás referimos, os Apelantes impugnaram a decisão sobre a matéria de facto na parte em que a mesma deu como provados os factos referidos sob os nºs 6 e 7 e 13 dela constantes.
Pretendem que, em sua substituição, sejam dados como provados os pontos b) e c) da matéria de facto dada como não provada.
Não esqueçamos, no entanto, que a formação da convicção do juiz não pode resultar de partículas probatórias, mas tem necessariamente de provir da análise global do conjunto de toda a prova produzida.
De resto, “a actividade dos Juízes, como julgadores, não pode ser a de meros espectadores, receptores de depoimentos. A sua actividade judicatória há-de ter, necessariamente, um sentido crítico. Para se considerarem provados factos não basta que as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre as questões num determinado sentido, para que o Juiz necessariamente aceite esse sentido ou essa versão. Os Juízes têm necessariamente de fazer uma análise crítica e integrada dos depoimentos com os documentos e outros meios de prova que lhes sejam oferecidos (…)”.

- Relativamente ao ponto 6 dos factos provados
Consta do ponto 6 dos factos provados que:
“6 - Os Réus sabiam que o Autor dispunha da quantia de que necessitavam, pelo que lhe solicitaram, através de seu pai e sogro e irmão do Autor, DD, em fins de Setembro de 2013, que o Autor lhes emprestasse algo mais do que cinquenta mil euros (€ 50.000,00).”
Os apelantes pugnam que o referido ponto seja dado como não provado.
Contrapõem às declarações de parte do Autor, nas quais este refere uma reunião que teve com a Ré CC, o depoimento de parte da Ré, que nega ter tido uma qualquer reunião com o Autor, cujo depoimento não merece credibilidade à luz da demais prova produzida.
De resto, os Réus/Apelantes omitem o que relativamente a essa matéria depôs a testemunha EE, irmão do Réu BB e sobrinho do Autor.
Com efeito, EE, irmão do Réu BB e sobrinho do Autor disse que teve uma conversa com o tio AA e que o convenceu a ajudar o irmão BB que então estava em Angola e a emprestar-lhe o dinheiro de que ele precisava, o que foi tratado com a cunhada, por o BB estar ausente em Angola, e que pensa que a cunhada terá assinado uma declaração de divida.
Olvidam, igualmente, os Réus o depoimento da testemunha seu pai e sogro DD, que referiu, sem sombra de dúvidas, que as quantias em causa foram emprestadas aos seus filhos e nora BB e CC, não por ele, mas sim pelo seu irmão AA, o Autor, e que ele se limitou a ser o intermediário na entrega do dinheiro aos Réus, e que o seu irmão – o Autor – com o seu outro filho e restante família resolveram ajudar o BB dado que ele estava enrascado com problemas de dívidas e que a sua interferência foi só guardar o dinheiro até que o BB lhe dissesse.
Da concatenação dos referidos meios de prova resulta, pois, que quem fez o empréstimo das citadas quantias de €35.000,00 e USD25.000,00 (€18.363,45) aos RR./Apelantes foi o Autor, e não o pai e sogro dos RR., e que o empréstimo do Autor foi feito aos RR. através do pai e sogro destes e irmão do Autor.
Ora, como é sabido, nada obsta a que o tribunal, na busca da verdade material, tome em consideração, para fins probatórios, as declarações não confessórias da parte, as quais serão livremente apreciadas, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil.
No entanto, ao valorá-las, não pode o juiz abstrair-se de que se trata de produção de prova em benefício próprio, em que o declarante é, ao mesmo tempo, meio de prova e parte interessada na sua recolha, acabando as declarações por ser como que a versão sonora - viva voz - dos articulados. “A experiência sugere que a fiabilidade das declarações em benefício próprio é reduzida. Por esta razão, compreende-se que se recuse ao depoimento não confessório força para, desacompanhado de qualquer outra prova, permitir a demonstração do facto favorável ao depoente” - cf. acórdão da Relação do Porto, de 23/3/2015, consultável em www. dgsi.pt.
Assim, as declarações de parte prestadas pelos recorrentes, desacompanhadas de quaisquer outros meios de prova credíveis destinados a corroborá-las, mais não foram do que a verbalização da sua pretensão e dos factos que são necessários e favoráveis à sua procedência.
Não merece, por isso, reparo ter-se dado como provado o ponto sob o nº 6 da decisão sobre a matéria de facto, facto esse que tem que ser mantido como provado, ao contrário do que pretendem os RR./Apelados, alterando-se, apenas, a redacção do mesmo, conforme sugerem os Apelados, admitindo-se que a locução “através de seu pai e irmão do Autor DD” deve ser deslocada do local onde se encontra na frase que retrata o facto dado como provado para a localizar imediatamente a seguir à palavra “emprestasse”, passando, assim, a redacção do facto dado como provado sob o nº 6 a ser a seguinte, que corresponde mais exactamente ao que efectivamente se provou:
“Os RR sabiam que o Autor dispunha da quantia de que necessitavam pelo que lhe solicitaram, em fins de Setembro de 2013, que lhes emprestasse, através do seu pai e sogro e irmão do Autor, DD, algo mais do que cinquenta mil (€ 50.000,00).”

- Relativamente ao ponto 7 dos factos provados
Consta do ponto 7 dos factos provados que:
“7 - O Autor acedeu a tal pedido dos Réus fazendo-lhes, por duas vias ou em duas formas de entrega, a entrega do dinheiro que os Réus, seus sobrinhos, lhe pediram.”.
Pugnam os apelantes que o referido facto seja dado como não provado.
Vejamos então.
Adiantamos, desde já, que quanto ao facto dado como provado sob o nº 7 não há qualquer fundamento para alterar a decisão que o deu como provado, com a fundamentação indicada na sentença recorrida.
Na realidade, resulta inequivocamente demonstrado, quer pelas declarações de parte do Autor, quer pelo depoimento prestado pela testemunha DD, irmão do Autor e pai e sogro dos RR., quer por toda a documentação bancária junta aos autos, designadamente da junta aos autos por esta testemunha em 22/1/2022 - que o Autor emprestou aos RR. € 35.000,00, saídos da sua conta bancária em Portugal no Banco 2... identificada no ponto 4 dos factos dados como provados na decisão sobre a matéria de facto e USD $25.000,00 que transferiu duma conta bancária sua nos Estados Unidos de América para a conta bancária do seu irmão e pai e sogro do RR, DD, no Banco 1..., e, portanto, que a entrega do dinheiro do empréstimo do Autor aos RR seria, e, foi feita, por duas vias, por intermédio do seu pai e sogro, DD.
Na verdade, isto foi corroborado pelo depoimento da testemunha DD, que referiu que emitiu em 30/09/2013 um cheque sobre a conta do seu irmão, o Autor, de € 35.000,00, que depositou na sua conta do Banco 1... e que entregou essa quantia aos Réus, seus filho e nora, através de um cheque visado de € 30.000,00 emitido em 27/11/2013 a favor do Réu e sacado sobre a sua conta bancária no Banco 1... onde havia depositado o cheque de € 35.000,00 sacado sobre a conta do Autor, e dois cheques de € 2.500,00 cada um, ambos emitidos em 17/11/2013 a favor da Ré CC, um sacado sobre a sua aludida conta no Banco 1... e outro sobre a sua conta no Banco 3... (cfr. documentos junto aos autos pela testemunha DD em 20 Janeiro de 2022), e que os € 18.363,45, correspondentes aos $ 25.000 dólares transferidos pelo Autor, seu irmão, para a sua conta no Banco 1... em 4/10/2013 e que até 11/06/2014 se mantiveram numa conta em dólares acessória à sua conta no Banco 1..., foram nessa data de 11/6/2014 transferidos, primeiro, para a sua conta normal em euros no Banco 1... e, de seguida, transferidos para a conta do BB – o Réu – no referido Banco 1... em 16/6/2014 (conforme resulta da análise dos documentos por ele juntos aos autos em 20/1/2022).
Afigura-se-nos, assim, demonstrado que o Autor acedeu ao pedido de empréstimo dos RR./Apelantes e lhe fez, por duas vias ou duas formas de entrega, e através de seu irmão e pai e sogro dos RR, DD, a entrega do dinheiro que os Réus, seus sobrinhos, lhe pediram.
Consequentemente, o facto dado como provado sob nº 7 da decisão sobre a matéria de facto deverá manter-se como provado nos exactos termos em que foi dado como provado.

- Relativamente ao ponto 13 dos factos provados
Consta do facto dado como provado sob o ponto 13 que:
“13 - Quantias essas (€35.000,00 e €18.363,45) que, por sua vez, o pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, DD, mandou transferir de seguida daquela sua conta no Banco 1... para a conta de ambos os Réus naquele mesmo Banco 1... com o nº ...37....”
Pugnam os Apelantes que o referido facto seja dado como não provado.
Vejamos então.
Analisada devidamente a prova produzida nos autos, quer a prova testemunhal, designadamente o depoimento da testemunha DD, bem como a prova documental junta aos autos, quer pelos Bancos, quer a junta aos autos por aquela mesma testemunha em 22/1/2022, o facto dado como provado sob nº 13 não corresponde, devidamente, ao que se encontra documentalmente provado conjugado com o depoimento da testemunha DD e ao que resulta dos documentos por ele juntos aos autos em 20/Jan./2022.
Com efeito, conforme, aliás, bem salientam os Apelados, o que resulta da conjugação dos referidos documentos com o aludido depoimento é que:
a) Quanto à quantia de € 35.000,00, que foi movimentada da conta do Autor no Banco 2... pela testemunha DD através de um cheque por ela sacado sobre aquela bancária e por ela depositado no Banco 1... em 4/10/2013 na sua conta com o nº ...52, a mesma foi pela mesma testemunha entregue aos RR através de:
- um cheque visado de € 30.000,00 emitido pela dita testemunha a favor do Réu, seu filho, em 27/10/2013, sacado sobre aquela sua conta nº ...01, no Banco 1..., que entregou ao Réu;
- dois cheques de € 2.500,00 cada um, ambos sacados pela dita testemunha e emitidos em 17/11/2013, a favor da Ré CC, um por ela sacado sobre aquela sua acima referida conta no Banco 1... e outro sacado sob a sua conta no Banco 3... com nº ...93, que a mesma testemunha entregou à Ré;
b) quanto à quantia de € 18.363,45 (resultante da conversão dos $ 25.000 dólares em euros) que o Autor transferira duma sua conta dos Estados Unidos da América para a conta do pai dos RR no Banco 1..., foi com a mesma constituída pelo Banco 1... em 3/10/2013 uma conta em dólares no montante transferido de 25.000 dólares, com o nº ...52 associada à conta bancária da testemunha DD, a qual foi saldada em 11/6/2014 por conversão dos dólares em euros e creditados os € 18.373,45 resultantes da conversão na conta do pai e sogro dos RR, a testemunha DD, o qual, por sua vez, os transferiu em 16/6/2014 para a conta do Réu BB e mulher no mesmo Banco 1....
De resto, corresponde ao que foi referido pela testemunha DD, pai e sogro dos RR. e irmão do Autor, no seu depoimento prestado em audiência de julgamento e que é confirmado pelos documentos por aquela mesma testemunha juntos aos autos em 22 Janeiro de 2022.
Assim, afigura-se-nos que a decisão sobre a matéria de facto seja alterada relativamente ao facto dado como provado sob o nº 13 e que, em vez do que dele consta, que se mantém na essência, seja dado como provado, com fundamento no depoimento da testemunha DD e dos documentos bancários por ela juntos aos autos em 22/Jan/2022, o seguinte:
“13 - Quantias essas (€35.000,00 e €18.363,45) que, por sua vez, o pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, DD, lhes fez entrega da seguinte forma:
a) € 35.000,00 através dos seguintes cheques:
i. Um visado de €30.000,00 com o nº ...04 por ele sacado em 27/11/2013 sobre a sua conta no Banco 1... com o nº ...01 e emitido a favor do Réu, a quem o entregou;
ii. Dois cheques de €2.500,00 cada um, ambos emitidos em 17/11/2013 a favor da Ré CC, a quem os entregou, um com o nº ...06 por ele sacado sobre aquela sua conta no Banco 1..., e o outro com o nº ...06 por ele sacado sobre a sua conta ...93 no Banco 3....
b) € 18.363,45 através de transferência bancária em 11/6/2014 da sua conta com o nº ...01 no Banco 1... para a conta dos Réus BB e mulher naquele mesmo Banco 1... com o nº ...07....”
Assim sendo, decide-se alterar a decisão da matéria de facto quanto ao referido ponto 13, nos seguintes termos:
“13 - Quantias essas (€35.000,00 e € 18.363,45) que, por sua vez, o pai e sogro dos Réus e irmão do Autor, DD, lhes fez entrega da seguinte forma:
a) €35.000,00 através dos seguintes cheques:
i. Um visado de €30.000,00 com o nº ...04 por ele sacado em 27/11/2013 sobre a sua conta no Banco 1... com o nº ...01 e emitido a favor do Réu, a quem o entregou;
ii. Dois cheques de €2.500,00 cada um, ambos emitidos em 17/11/2013 a favor da Ré CC, a quem os entregou, um com o nº ...06 por ele sacado sobre aquela sua conta no Banco 1..., e o outro com o nº ...06 por ele sacado sobre a sua conta ...93 no Banco 3....
b) €18.363,45 através de transferência bancária em 11/6/2014 da sua conta com o nº ...01 no Banco 1... para a conta dos Réus BB e mulher naquele mesmo Banco 1... com o nº ...07....”
Em face do que vem de ser exposto, decide-se alterar a redacção dos pontos 6 e 13 nos termos atrás referidos, improcedendo, no demais, o recurso sobre a decisão da matéria de facto.
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A matéria de facto que fica em definitivo julgada provada é assim a atrás mencionada, excepto quanto aos pontos 6 e 13 nos termos atrás referidos.

4.3. Do mérito da decisão
Os apelantes clamam pela revogação da sentença de que recorrem.
Sustentam tal pretensão na modificação da decisão sobre a matéria de facto que, pela via recursiva, reclamam.
Mantendo-se, todavia, inalterada, na essência, a decisão relativa à matéria de facto, relativamente ao montante efectivamente emprestado pelo Apelado, afigura-se-nos que à luz da mesma se deve manter a decisão proferida pelo Tribunal a quo.
Com efeito, nos termos do artigo 1143º do Código Civil, os mútuos de valor superior a 25.000,00 € só são válidos se forem celebrados por escritura pública.
Assim, atendendo ao montante emprestado, deveria esse mútuo ter sido titulado por escritura pública, sendo certo que essa forma não foi respeitada sendo, por isso, nulo o mútuo por falta de forma, a qual tem efeito retroactivo, pelo que devem os Apelantes restituir o montante peticionado, acrescido dos juros contados desde a citação, nos termos do art. 805º n.º 1 do Código Civil.
Na realidade, as alterações na decisão sobre a matéria de facto não têm qualquer impacto em sede de decisão sobre a matéria de direito, porque apenas fica a retratar mais correctamente o que se provou quanto à forma como o irmão do Autor e pai e sogro dos RR, DD, fez entrega a estes do dinheiro que o Autor lhes emprestou.
Impõe-se, por isso, o não provimento da apelação.
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5. Decisão
Nos termos supra expostos, acordamos neste Tribunal da Relação do Porto, em julgar não provido o recurso, confirmando a decisão recorrida.
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Custas a cargo dos apelantes.
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Notifique.



Porto, 08 de Fevereiro de 2024
Relator: Paulo Dias da Silva
1.º Adjunto: Ana Luísa Loureiro
2.º Adjunto: Francisca Mota Vieira



(a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas e por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)