Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3657/14.1TBVNG.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERNANDA ALMEIDA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
ATROPELAMENTO
INDEMNIZAÇÃO
PERDA DE RENDIMENTOS
CAPACIDADE DE GANHO
DÉFICE FUNCIONAL PERMANENTE
Nº do Documento: RP201910073657/14.1TBVNG.P2
Data do Acordão: 10/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º703, FLS.115-121)
Área Temática: .
Sumário: I – Pela perda de rendimento laboral e capacidade aquisitiva de 3%, para pessoa com 62 anos de idade à data do sinistro (e tendo em conta uma perspetiva de vida útil até aos 77 anos), considerando um valor correspondente ao salário mínimo nacional à data da fixação da incapacidade, tem-se por adequada indemnização de €5.000,00.
II - Para 3% de incapacidade, pessoa com mais de 60 anos, submissão a cirurgia, com 182 dias de défice funcional (total e parcial), dano estético e dores de grau 3 em 7, considera-se ajustado o valor de €18.000, 00, a título de compensação pelos danos não patrimoniais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 3657/14.1TBVNG.P2

Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:
I – RELATÓRIO
AUTOR: FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, com sede na Avenida …, nº.., em Lisboa,
RÉUS: B… e C…, esta falecida na pendência da acção, tendo sido habilitados como seus sucessores o aqui co-Réu, B…, e D…, seu filho e cônjuge, respectivamente.
Por via da presente ação declarativa, pretende o A. sejam os RR. condenados a reembolsá-lo na quantia de €65.821,79, acrescida dos juros legais, vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento, bem como no pagamento das despesas que o ora Autor vier a suportar com a cobrança do reembolso a liquidar em ampliação do pedido ou em incidente posterior.
Para tanto alegou ter efetuado os seguintes pagamentos: €49.919,53 a E…, €8.661,18 ao Centro Hospitalar F…, E.P.E, €7.241,08 a título de despesas com a instrução do processo.
Tais pagamentos resultam do facto de o aqui R. ter atropelado aquele E…, o que fez com culpa exclusiva, quando conduzia veículo pertencente à Ré que circulava dentro da localidade a mais de 80 kms/hora, tendo invadido a berma onde estava o peão, desprovido de seguro de responsabilidade civil automóvel.

Contestou o primeiro R., pugnando pela improcedência da acção, argumentando circular na sua faixa de rodagem de forma regular quando foi surpreendido pelo súbito aparecimento do peão que, a correr, decidiu atravessar a estrada sem prestar atenção ao trânsito automóvel.

A 7.11.2016 foi proferido despacho saneador e seleccionada a factualidade relevante.

Realizado julgamento, foi proferida sentença, datada de 8.4.2019, a qual decidiu
condenar os Réus B… e D…, na qualidade de sucessores de C…, a solidariamente pagarem ao Autor Fundo de Garantia Automóvel a quantia de €38.902,26, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento; sendo absolvidos do demais.
Foram dados como provados os seguintes factos:
1 – No dia 10 de Janeiro de 2004, pelas 16:00 horas, ocorreu um acidente de viação na Avenida Principal (Estrada Nacional n.º…), em …, em frente ao “Café G…” e “Restaurante H…”;
2 - Nele intervieram o veículo ligeiro de passageiros, marca Fiat, modelo …, de cor … e matrícula XA - .. - .., propriedade de C… e conduzido pelo Réu B…, e o peão E…;
3 - Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas, o peão E… encontrava-se a pé, do lado direito da Avenida …, em frente ao café G… e Restaurante H…, atento o sentido Norte/Sul.
4 - O peão foi colhido pelo veículo XA, que circulava no sentido Norte/Sul;
5 - O atropelamento ocorreu do lado esquerdo do peão, que, após, foi projectado;
6 - No dia e hora referidos, o piso encontrava-se molhado e chovia;
7 - O peão foi socorrido por transeuntes que chamaram uma ambulância, a qual conduziu o peão aos serviços de urgência do Hospital I…, em ….;
8 - À data do acidente, C… era a proprietária do XA e o Réu B…, seu filho, conduzia o XA com o conhecimento e autorização de C…;
9 - À data do acidente, o veículo XA circulava sem beneficiar de seguro válido e eficaz;
10 - Como causa directa e necessária do atropelamento, o E… apresentou as seguintes lesões:
- traumatismo toráxico;
- Enfisema subcutâneo no pescoço até ao hipocôndrio esquerdo;
- fractura de múltiplas costelas, fechada nos 3-4-5 arcos posteriores esquerdos, estando o 3.º arco costal esquerdo partido em 2 locais;
- fractura do tórax com retalho móvel (volet toráxico);
- contusão pulmonar bilateral;
- hemopneumotórax esquerdo;
- GSA- FIO2 – 21% à entrada – PO_- 42,8 Sat 02- 76%;
- AC – sem sopros e AP – MV diminuído em todo o hemitórax esquerdo;
- Após colocação do dreno toráxico no hemitorax esquerdo (extracção de 300 cc de líquido hemático) e com máscara de alta concentração – po2 – 218 sat 02- 99%;
-traumatismo abdominal;
- escoriação no hipocôndrio esquerdo, mole e depressível, sem organomegalias, RHA+;
- escoriação no joelho e tibiotársica direita; - laceração do parênquima do baço com pequena quantidade de liquido livre e intra-abdominal;
- rabdomiolise moderada;
- pupilas isocóricas e isoreactivas e escleróticas anictéricas;
- TAx – 36.º C TA- 149/80 mmHg FC- 110 bpmra FR- 24 ciclos/min. Sat 02 – 100% (máscara de alta concentração);
11 - Para tratamento de tais lesões, o E… foi algaliado, fez RX coluna cervical, apenas sendo visível até à vértebra C5, RX à coluna lombar e sagrada, RX ao tórax e grelhas, TAC toráco-abdomino-pélvico e foi também submetido a uma cirurgia;
12 - Em consequência das lesões sofridas, o E… ficou com cicatrizes frontais em ambas as pernas (uma em cada canela), ficou com cicatrizes nas costas e debaixo do braço esquerdo na zona das costelas, encontrando-se internado no hospital até 19.01.2004;
13 - Em consequência das lesões sofridas, o E… sofreu 10 dias de défice funcional temporário total e 172 dias de défice funcional temporário parcial;
14 - O E… teve a percepção da sua projecção por vários metros, tendo sofrido dores nesses momentos;
15 - Quando ficou caído na estrada, o E… sofreu dores, angústia e terror;
16 - O E…, em consequência das lesões sofridas, teve dores de grau 3, numa escala de 1 a 7;
17 - O E…, em consequência do atropelamento, ficou a padecer de um défice funcional permanente (da integridade físico-psíquica) fixável em 3 pontos, e de um dano estético de grau 3, na mesma escala;
18 - Atento o facto de o XA circular sem seguro, os lesados reclamaram os seus danos junto do ora Autor, através do processo judicial n.º 4782/05.5TBVNG, que correu termos na 2.ª Vara Mista deste tribunal e que terminou com a condenação do ora Autor no pagamento das seguintes verbas:
Ao lesado E…:
a) €18.000,00 a título de lucros cessantes;
b) €390,00, a título de danos emergentes;
c) €25.000,00 a título de danos não patrimoniais; Ao Hospital I…:
d) €6.357,16, pela despesa com a assistência médica prestada ao lesado E…;
19 - O Autor foi condenado no pagamento a E… da quantia de €43.091,42, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde a citação e até integral pagamento sobre a quantia de €18.091,42 e de juros de mora à taxa legal vencidos desde o dia seguinte à decisão sobre a quantia de €25.000,00 até integral pagamento, bem como a pagar ao “Hospital I…” a quantia de € 6.357,16, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde a citação e até integral pagamento;
20 - O Autor, no cumprimento da sentença, efectuou os seguintes pagamentos:
a) €49.919,53 a E…;
b) € 8.661,18 ao “Centro Hospitalar F…, E.P.E”;
c) € 7.241,08 a título de despesas com a instrução do processo;
21 - Ficou provado naquele processo que o titular inscrito no registo de propriedade do XA – B… – vendeu o XA, em 10.09.2002, a J…, o qual, por sua vez, vendeu o XA a C…, mãe de B…, em Novembro do mesmo ano;
22 - Também ficou provado naquele processo que o B…, a conduzia o XA com o conhecimento, autorização, sob as ordens e direcção efectiva de sua mãe, C…, proprietária daquele;
23 – O peão E… bateu com a cabeça no pára-brisas do veículo conduzido pelo Réu B…;
24 – O peão E… pretendia atravessar a Estrada Nacional num local não sinalizado com passadeira;
25 - No âmbito do Processo nº 4782/05.5TBVNG, o Réu B… foi absolvido “porquanto não resultou que o acidente (atropelamento em causa) tenha procedido de culpa sua”;
26 – E… nasceu no dia 1 de Junho de 1941.

Foram dados como não provados os seguintes factos:
a) No momento do embate, o peão E… se encontrasse parado na berma, aguardando a passagem das viaturas que por ali circulavam;
b) No local do atropelamento, a EN n.º… configure uma recta com cerca de 50 metros de extensão, o piso seja de asfalto, existam casas de ambos os lados e uma placa limitadora de velocidade a 50 Km/h;
c) Nas circunstâncias mencionadas em 1. a 4., o XA circulasse a uma velocidade não inferior a 80 Km/h;
d) Nas circunstâncias mencionadas em 1. a 4., o XA tivesse invadido a berma onde se encontrava o peão;
e) Após o embate, o Réu B… tivesse abandonado o local;
f) Na sequência do embate, o E… tivesse partido os óculos;
g) O seu telemóvel tivesse ficado danificado;
h) Tivesse perdido um crucifixo em ouro;
i) Tivesse rasgado as roupas que envergava;
j) O referido em f) a i) tivesse valor superior a €300,00 e o telemóvel tivesse custado €69,90;
k) Na data do embate, o E… havia começado a trabalhar, em período experimental, como recepcionista numa Residencial, auferindo, pelo menos, €450,00, com perspectiva de aumento nos meses subsequentes;
l) Em consequência das lesões sofridas, o E… tivesse perdido aquele emprego e não conseguisse obter outro;
m) O referido em 13. tivesse entristecido o E…, que sempre foi pessoa dinâmica;
n) Em consequência das lesões sofridas, o E… tivesse despendido €22,00 em táxi e €36,60 em transportes públicos;
o) Em análises clínicas, o E… tivesse gasto €23,10;
p) Com certidão da Conservatória do Registo Automóvel relativa ao XA, gastasse €9,00;
q) O E… tivesse tido a percepção do embate; r) Antes do atropelamento, o E… fosse pessoa saudável e forte;
s) Costumasse ir à praia e à piscina, praticando natação com frequência e, agora, não possa fazê-lo;
t) O E… sofresse um grande desgosto com a desfiguração do seu corpo, fechando-se na sua dor, chorando e lamentando o sucedido, recordando, permanentemente, o acidente;
u) Sentindo vergonha e mal-estar pelas cicatrizes que tem o corpo, o que se agrava com a aproximação do Verão;
v) Com o embate, se tivesse partido o espelho lateral direito do veículo XA;
w) À data do acidente, o Réu B… conduzisse o XA sob as ordens de C…;
x) Nas circunstâncias mencionadas em 1. a 4., o XA circulasse a uma velocidade não superior a 40 Km/h;
y) Quando passava junto ao restaurante “H…”, o Réu B… tivesse sido surpreendido com o aparecimento inesperado do peão E…, que atravessava a estrada a correr;
z) O Réu ainda tentasse desviar-se no sentido da faixa contrária, mas não o conseguiu;
aa) O embate se tivesse dado na faixa de rodagem do Réu B…, sensivelmente a meio da mesma;
bb) Após o acidente, o Réu B… tivesse parado a sua viatura, abeirando-se do acidentado E… e chamado o INEM através do seu telemóvel;
cc) O Réu B… tivesse permanecido no local até o INEM chegar, nunca tendo abandonado o sinistrado.

Desta sentença recorre agora o Fundo de Garantia Automóvel (FGA), visando a alteração dos valores indemnizatórios, com base nos argumentos que assim concluiu:
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Os factos que interessam à decisão da causa são os fixados em primeira instância e acima enunciados.
De Direito
A sentença fixou em €5.000, 00, a indemnização pelos 10 dias de défice temporário total, 172 de défice funcional temporário parcial, perda da capacidade aquisitiva correspondente a 3%, pelo período que decorreria entre os 62 anos (idade à data do acidente) e mais 3 a 5 anos. Foi considerado o valor do salário mínimo de €365, 00.
Nesta equação pensamos ser de introduzir algumas alterações de pormenor, seguindo de perto o nosso acórdão do passado dia 9.9 (proc. 376/15.5T8VFR.P1), as quais, como veremos, não alteram o decidido em primeira instância:
A determinação do dano patrimonial futuro, com base na afetação permanente e irreversível da capacidade funcional, com ou sem afetação total ou parcial da capacidade para o exercício da atividade habitual (com valores indemnizatórios reforçados neste último caso) foi objeto de acórdão uniformizador de jurisprudência (AUJ) proferido pelo STJ, a 28.3.2019 (Proc. 1120/12.4TBPLT.G1.S1)[1]. Nesse aresto consignaram-se os seguintes princípios que aqui renovamos:
- A indemnização deste dano passa pela determinação de um capital produtor um rendimento que se venha a extinguir no final do período provável de vida ativa do lesado, suscetível de lhe garantir, durante esta, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho.
- A utilização de fórmulas abstratas ou critérios, como elemento auxiliar, tornam mais justas, atuais e minimamente discrepantes, as indemnizações.
- O recurso aos juízos de equidade é defensável como complemento para ajustar o montante encontrado à solução do caso concreto.
Por nós, sempre aceitámos que valorização deste dano e os critérios de fixação da respetiva indemnização não dispensam um ponto de partida mais ou menos seguro e que consiste no apuramento dos rendimentos que o lesado recebe na sua ocupação normal ou previsível e determinar qual o período futuro de vida (que não apenas ativa) que ainda teria.
Tradicionalmente, os tribunais têm-se socorrido de diversos critérios para o cômputo da indemnização por danos derivados da redução ou extinção da capacidade de ganho[2].
Já se utilizou um critério de capitalização do salário, através da atribuição de um capital cujo rendimento, calculado com base na taxa média e líquida de juros dos depósitos a prazo, fosse equivalente ao rendimento perdido.
Também é vulgar elaborar-se um cálculo baseado em tabelas financeiras, método que assenta em duas condicionantes, uma relativa à esperança de vida do lesado[3] (e não apenas à vida ativa como se acentua neste AUJ) e outra à taxa de juros líquida (que hoje não é superior a 1%, atenta a generalizada baixa das taxas de juro).
Por vezes utilizam-se regras do direito do trabalho usadas no cálculo das pensões por acidente de trabalho ou capital por remição.
Estes critérios não devem ser aplicados mecanicamente mas podem servir como orientação geral ou elemento operativo, no âmbito da tarefa da fixação da indemnização, sujeita à correção imposta pelos circunstancialismos da cada caso mas sempre tendo por pressuposto que a quantia a atribuir ao lesado o há-de ressarcir, durante a sua vida (a laboralmente útil e a posterior), da perda sofrida e mostrar-se esgotada no fim do período considerado.
Destarte, faremos, numa primeira fase, uma abordagem ao problema da fixação da indemnização relativa à perda da capacidade aquisitiva por meio de simples cálculo matemático (refira-se que a tendência em termos de direito comparado é a de fixar tão apriorística e rigorosamente quanto possível os elementos de cálculo deste tipo de indemnização, não só para possibilitar soluções de consenso extra - judicial mas também para evitar casos de injustiça relativa que resultam da diversidade de critérios que se adotam nos diferentes fóruns judiciários, tendência que, quanto a nós, será inteiramente de aplaudir de iure condendo).
Lançaremos mão da equação matemática já utilizada em arestos jurisprudenciais e que é a seguinte:
C = (1+ i)ⁿ – 1 x P
(1+I)ⁿ x i
Nesta equação C representa o capital a depositar logo no primeiro ano, P, a prestação a pagar anualmente e i, a taxa de juro que se fixa em 1% e n, o número de anos de vida que o sinistrado terá.
Consideraremos aqui uma esperança média de vida de 77 anos.
No caso dos atos, o lesado nasceu a 1.6.41.
Ao tempo do sinistro, o valor do salário mínimo nacional era o já enunciado em primeira instância.
Há que fixar, primeiro, o valor diário de indemnização pelos 10 dias de défice funcional temporário total e pelos 172 de défice funcional parcial.
Neste tocante, considerando tratar-se de recuperação de sinistro, fixa-se a indemnização corresponde à perda do s.m.n. tout court, i.é, €121, 60 (10 dias) + €2.091,51 (172 dias) = € 2.213,12.
Já o défice funcional correspondente a 3% apenas será de indemnizar a partir do momento em que o mesmo se fixa, isto é, depois daqueles 10 dias e dos restantes 172, ou seja, desde a data da consolidação das lesões (9.7.04).
À data da consolidação das lesões o A. tinha 63 anos de idade.
Até aos 77 anos faltariam 14 anos.
Apresentava um rendimento anual de, pelo menos, €5.110, e um um deficit funcional de 3%, o que equivale a uma perda anual de €153,30 (é este o valor a considerar).
Assim, utilizando a fórmula que se propõe, teremos uma taxa de juro real líquida de 1% (1 + 0.01).
Logo, C = (1 + 0,1%)14- 1 x €153, 30
(1 + 0.1%)14 x 0.1%
C =2.130, 19
O total de todos os valores achados é, assim, de €4.343, 31.
Aqui chegados já vemos que o valor alcançado em primeira instância se encontra absolutamente dentro dos parâmetros de justiça e, por isso, se mantém neste tocante.
Também a compensação por danos não patrimoniais se acha ajustada.
Mercê do acidente, o lesado viu ainda atingidos outros bens, agora de natureza não patrimonial, uma vez que sofreu ofensas corporais extensas, dores físicas, prejuízos de ordem estética, diminuição da sua capacidade funcional e mesmo perda de capacidade aquisitiva, etc…
Neste tocante, apurou-se que lhe foram produzidas inúmeras lesões, com incidência a nível do lado esquerdo, tendo sofrido dores (grau 3 em 7), sujeição a cirurgia, desvalorização estética (3 em 7) e da capacidade aquisitiva, etc..
Sendo certo que nada apagará já as dores que sentiu (e continua a sentir) ou trará de volta a vitalidade e energia físicas perdidas não é menos verdade que estes danos, quer os que são diretamente biológicos, resultantes das alterações do estado morfológico em geral (as lesões, incapacitação funcional), quer os que respeitam à perturbação do estado de saúde do lesado, traduzida nas dores sentidas e incómodos resultantes dos internamentos, dos sofrimentos psíquicos inerentes, são danos graves merecedores de uma justa e significativa reparação, que se fixa num quantitativo unitário, de acordo com o disposto no art. 496.º, n.º1 e 3 Código Civil.
Considerando a regra geral que resulta dos arts. 496.º e 494.º Código Civil que se reconduzem, genericamente, à avaliação dos critérios de equidade, o que não dispensa a ponderação da orientação jurisprudencial em geral, que não é despicienda, a fim de evitar situações de injustiça relativa (para 6% de incapacidade, pessoa já reformada, em contexto semelhante ao dos autos, foi fixado idêntico valor ao aqui fixado no Ac. RP, de 27.9.2018, Proc. 903/15.8T8GDM.P1[4]), conisderamos ajustado o valor achado em primeira instância que, por isso, se mantém.
O recurso é, pois, improcedente na totalidade.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente e mantém-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.

Porto, 7.10.2019
Fernanda Almeida
António Eleutério
Isabel São Pedro Soeiro
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[1] Decisão que considera exactamente ser o dano biológico um dano abrangente de prejuízos alargados incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expetáveis.
[2] As tabelas de determinam o dano biológico constantes das Portarias 377/08, de 26.5, e 679/09, de 25.6, ficam aquém dos parâmetros jurisprudenciais, como é notado no AUJ.
[3] Que é hoje de 77, 78, para os homens, segundo INE.
[4] Tomando por referência os valores indemnizatórios fixados para casos com alguma similitude com o que nos autos se discute e ponderando a especificidade do caso concreto, designadamente, as lesões sofridas pela Autora, natureza e extensão das mesmas, natureza e duração dos tratamentos médicos, período de internamento a que foi submetida, sequelas permanentes resultantes do acidente, dano estético - 3 graus numa escala de 7 de gravidade crescente -, dores, passadas, actuais e previsivelmente futuras, directamente resultantes das lesões sofridas e também as provocadas pelos tratamentos a que se sujeitou - avaliáveis num grau 4 de uma escala de 7 de gravidade crescente -, repercussão das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes, nomeadamente no seu estado anímico, como detalhadamente vem descrito na sentença recorrida, importando também aqui considerar o facto adicionado aos factos provados sob o ponto n.º 51.º, devendo o quantum indemnizatório para reparação destes danos não patrimoniais ser fixado com recurso a critérios de equidade, tem-se por equilibrada uma indemnização de € 18.000,00 devida a este título. Consequentemente, procedendo a apelação da Autora e improcedendo a da Ré, altera-se para € 18.000,00 a indemnização devida à primeira por danos não patrimoniais, mantendo-se o valor da indemnização fixada na sentença recorrida para reparação dos danos resultantes do défice funcional.