Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
64274/22.5YIPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FRANCISCA MOTA VIEIRA
Descritores: FUTURA ADOPÇÃO
PAGAMENTO
CONDENAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA
Nº do Documento: RP2024030764274/22.5YIPRT.P1
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A fatura simplificada é um documento emitido quando existe pagamento imediato, ou seja, considera-se liquidada e destina-se ao consumidor final. Portanto terá que ser emitida no mesmo dia de aquisição do produto ou serviço. Não obriga ao preenchimento de NIF ou nome, mas está sujeita a limites de valor para a sua emissão (até 100€ se for prestação de serviços ou até 1000€ se for venda de produtos).
II - Considerando que o réu provou estar na posse da factura simplificada ... com data de emissão de 11.04.2019, a qual, significa que existiu pagamento imediato, considerando que não foi alegado nem está provado qualquer facto que torne irregular a emissão e a posse pelo pelo réu da mencionada factura, o tribunal deve considerar pagos os bens descritos naquela fatura simplificada.
III - Sem prévia emissão da factura devida com os requisitos estabelecidos no art 36º, nº5 do CIVA, não é só o IVA que não exigível, mas sim toda a dívida ainda em discussão, uma vez que sendo o IVA exigível no momento em que os bens são colocados à disposição do adquirente, o preço da compra e venda não pode ser exigido sem ser exigido o IVA, o qual, tem de ter como base um concreto valor apurado.
IV - O tribunal deve condenar no que se liquidar em execução de sentença sempre que se encontrem reunidas duas condições: (i) que o réu tenha efectivamente causado danos ao autor; e (ii) que o montante desses danos não esteja determinado na acção declarativa por não terem sido concretamente apurados (art. 609.º do CPCivil).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo: 64274/22.5YIPRT.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo Local Cível da Póvoa de Varzim - Juiz 1

Relator: Francisca da Mota Vieira

1º Adjunto: António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos

2º Adjunto: Ana Loureiro

Acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto

I.RELATÓRIO

1.“A... Unipessoal, Lda.”, com sede na Rua ..., ... - R/C, Póvoa de Varzim, apresentou requerimento de injunção contra AA e BB, residentes na Rua ..., Nº...- 2º Esquerdo, Póvoa de Varzim, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de € 7.685,04 (sete mil, seiscentos e oitenta e cinco euros e quatro cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos até 07-07-2022, no valor de € 318,00 (trezentos e dezoito euros) e de € 100,00 a título de “outras quantias”.

Para o efeito, a autora alegou, em síntese, que vendeu ao réu bens que identifica, da sua actividade comercial, não tendo este procedido ao pagamento das facturas que indica no articulado inicial na data dos respectivos vencimentos.

 Mais alegou que os bens em questão se encontram na posse dos réus e, na sua habitação, fazendo parte do património comum dos mesmos, sendo que aqueles são casados um com o outro, estando ambos a beneficiar dos bens em questão.

2.Regularmente notificados, com as formalidades da citação, os réus apresentaram oposição, alegando, em resumo, que todos os bens constantes das facturas peticionadas foram pagos no acto da entrega, em 2019, em dinheiro.

Alegam que a fatura ... não corresponde a qualquer fornecimento feito, que todos os bens que os Réus adquiriram à autora foram comprados no ano de 2019, que através daquela factura do ano de 2022 a autora tenta receber duas vezes o preço de alguns bens sendo que na fatura de 2022 cobra valores mais elevados.

E nos artigos 38º e 39º da oposição alegam: “Na verdade, os Requeridos, adquiriram três televisores à Requerente, mas nenhum deles ultrapassou o custo de 600,00€. // 39- Bem como adquiriram um aspirador e uma liquidificadora, aquele por um valor não superior a 150,00€ e esta por um valor não superior a 40,00€.”). 

Também invocaram a prescrição do crédito pela verificação da passagem de mais de 2 anos entre a data do vencimento das facturas, ou seja, 18.06.2019 e a sua citação para a presente injunção, nos termos do artigo 317.º, alínea b), do Código Civil.

E excecionaram a prescrição dos juros, por estarem associados a prestação indevida. Impugnaram ainda parte da factualidade alegada no requerimento de injunção e sustentaram que quantia de 100,00€ exigida nos termos e para os efeitos do artigo 7º do DL 62/2013, de 10 de Maio não se aplica no caso concreto, uma vez que não estamos perante contratos entre empresas ou entidades públicas.

E peticionaram a condenação da autora no pagamento de uma multa, por litigância de má fé.

3.Mediante despacho de 23-11-2022 foi determinada a notificação da autora para querendo, se pronunciar, no prazo de 10 dias, sobre a matéria de excepção invocada pelos réus, prazo esse prorrogado por despacho proferido em 09-12-2022.

4.Por requerimento de 15-12-2022, a autora veio responder, defendendo que os réus não beneficiam da presunção prevista no artigo 317º, al. b) do C.C., por não ser aplicável, uma vez que as facturas em questão não foram pagas, o que confessadamente foi assumido pelo réu várias vezes, sendo que a confissão pelo devedor causa interruptiva do prazo de prescrição, o que também é aplicável às prescrições presuntivas (cfr. artigo 325º do CC). Por isso, considerou-se interrompido o prazo de prescrição em curso, em Maio e em Setembro de 2020, pelo que, a 20-07-2022, aquando da notificação dos réus, ainda não haviam prescrito os créditos da autora, por não ter decorrido o prazo prescricional de 2 anos. Além disso, em Março de 2020 foi declarada a suspensão dos prazos de suspensão e caducidade pela legislação COVID 19, e posteriormente tal legislação voltou a decretar a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade, por período não inferior a 6 meses, pelo que não decorreu o prazo prescricional alegado.

E a factura ... datada de 16-02-2022 não prescreveu por não ter decorrido o prazo prescricional, nem ter sido paga. Por conseguinte, o crédito reclamado nos presentes autos não prescreveu, nem está pago, pelo que devem improceder as excepções invocadas.

A autora também peticionou a condenação do réu como litigante de má fé nos termos do artigo 542º do C.P.C., por deduzir oposição cujo fundamento sabe ser falso, alterando a verdade dos factos conforme a sua conveniência no âmbito de dois processos judiciais distintos, com o objetivo reprovável de impedir a verdade e entorpecer a justiça.

5.Realizou-se a audiência de julgamento com observância de todo o formalismo legal e foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente decidiu:

“- Condenar o réu no pagamento à autora da quantia de € 1.731, 84 (mil, setecentos e trinta e um euros e oitenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 18-06-2019, e da quantia de € 2.719, 86 (dois mil, setecentos e dezanove euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 20-07-2022, ambas até integral pagamento, à taxa de 4%;

- Absolver a ré do pedido.

Mais se decide absolver a autora e os réus dos pedidos de condenação como litigantes de má-fé.

Custas a cargo de ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 40% para a autora e 60% para o réu, nos termos do artigo 527º do C.P.C.

Nos termos dos artigos 297º e 306º, ambos do C.P.C. fixo o valor da causa em € 8.103, 04 (oito mil cento e três euros e quatro cêntimos).”

6.Inconformado o réu apelou e concluiu nos termos que aqui se reproduzem:

a) A Primeira Instância não realizou, convenientemente, o exame crítico das provas, violando a norma presente no artigo 607º n.º 4, do Código de Processo Civil;

b) Alguns factos da fundamentação da sentença foram incorretamente julgados pelo Tribunal a quo, porque não existe compatibilidade e coerência entre o teor das inquirições das testemunhas produzidas nos autos e as respostas dadas, bem como da análise do documento de fls. 27;

c) Face ao exposto, deve o Tribunal ad quem reapreciar a prova gravada e, em conformidade, julgar inequivocamente que o teor do facto provado 1, quanto à data (18.06.2019) não pode fixar uma data concreta, mas sim um período de tempo;

d) Os concretos meios de prova que impõem decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto são: as declarações da Autora do dia 13.06.2023, gravadas das 11:04 a 11:21; a testemunha CC do dia 13.06.2023, gravadas das 12:06ª 12:14; a testemunha DD, do dia 4.07.2023, das 15:54 a 16:13; depoimento de parte do Réu AA do dia 4.07.2023, das 16:14 a 17.05; e depoimento de parte da Ré BB do dia 11.07.2023 das 14:20 a 14.35.

e) Ao dar, erradamente, como provado que os bens referidos na fatura ... foram todos adquiridos em 18.06.2019, acabou por dar como NÃO PROVADO O PONTO 3, concretamente, “os réus pagaram à autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto de entrega, em dinheiro e o réu não solicitou qualquer tipo de recibo no momento.”, FACTO ESTE QUE DEVEREIA TR SIDO DADO COMO PROVADO, NO SENTIDO DE DAR COMO PROVADO QUE: Os réus pagaram à Autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto de entrega, em dinheiro e o Réu não solicitou qualuqer tipo de recibo no momento.

f) Aquilo que decorre da prova produzida é que os bens foram entregues por diversas vezes e foram pagos quando eram entregues, logo, em momento algum o Réu teve de dispor de mais de mil euros de uma só vez, sendo que a testemunha da Autora, EE refere que foi 4 ou 5 vezes levar eletrodomésticos a casa do Réu!

g) Olhando para os valores dos eletrodomésticos isoladamente, o de valor mais alto teve o preço de 390,00€, pelo que é absolutamente normal que tais bens tenham sido pagos em dinheiro, pois foram entregues em 4 ou 5 vezes, no espaço de 3 meses, decorrendo das regras da experiência comum que valores tão reduzidos possam ter sido pagos em numerário.

h) Sendo o pagamento em numerário uma das formas de pagamento atualmente vigentes, deve ser considerado, em relação aos eletrodomésticos vendidos referidos na fatura simplificada de fls. 27 e na fatura ..., (considerando que deve ficar provada a entrega por parte do Réu de 105,66€ e 1731,84€, respetivamente);

i) Fazendo os Réus contraprova sobre tais factos, concretamente aqui, no que respeita aos bens indicados na fatura de fls. 27, documento esse que serviu como base para o Tribunal dar como provados concretos bens e concretos valores, teria também que servir para provar que tais bens tinham sido pagos, pois dúvidas não há que: se trata de uma fatura simplificada; foi emitida pela Autora; estava na posse dos Réus. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou o artigo 346º do CC.

j) Quanto ao FACTO PROVADO Nº 2, o mesmo deveria dar origem a dois factos distintos, uma vez que parte dos eletrodomésticos aí referidos constam de uma fatura simplificada, a fls.27, e outros foram faturados e adquiridos noutro momento.

k) Ou seja, o FACTO PROVADO Nº 2 deverá referir que em 11.04.2019 foram adquiridos e pagos os exatos objetos constantes da referida fatura simplificada ....

l) Quanto ao FACTO NÃO PROVADO Nº 5, DEVE SER DADO COMO PROVADO, nomeadamente porque a fatura de fls. 27 comprova sem margem para qualquer dúvida que os artigos com as referências indicadas foram faturados duas vezes,uma pela fatura simplificada de de fls. 27, a fatura ... e outra na fatura ..., faturas estas que foram usadas pelo Tribunal para dar como comprados os factos.

m) Mas, considerando que o Recorrente fez prova do pagamento de alguns bens, desde logo dos bens constantes de fls.27, o Tribunal a quo nesta parte, deveria ter considerado a obrigação cumprida, pelo que violou o disposto no artigo 762º do CC..

n) Ainda, quanto ao facto provado nº 1, como também se fez prova do referido pagamento, tal facto deveria ser dado como não provado, e, em consequência, não se condenar o Réu no pedido

o) O Tribunal não explica a que propósito condena o Réu no pagamento do IVA, se o mesmo já consta na faturas, sendo que a absoluta falta de fundamentação integra a previsão da nulidade do artigo 615º, n.º 1, al. b), do CPC.

p) O Tribunal a quo violou os artigos 346º e 762º do Código Civil, bem como o artigo 615 nº 1 alínea b) do Código de Processo Civil.

Termina a pedir a revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que outra que determine a absolvição do réu de parte do pedido, devendo este apenas ser condenado no pagamento dos televisores.

7.Foram apresentadas contra-alegações pelas quais a autora pugna pela confirmação da sentença recorrida.

8.Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

II.DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.

As questões colocadas no recurso são as seguintes:

.Da alegada falta de fundamentação da sentença.

.Da impugnação da decisão de facto.

.Do Mérito da sentença recorrida.

III.FUNDAMENTAÇÃO:

3.1. Questão Prévia.

Antes de tudo o mais, impõe-se assinalar que analisada a sentença, resulta no segmento da subsunção jurídica dos factos, que o tribunal a quo incorreu em manifesto lapso no dispositivo da sentença, na parte em que condenou o Réu, relativamente aos bens descritos no item 2º dos factos provados, no valor de € 2.719, 86 (dois mil, setecentos e dezanove euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 20-07-2022, ambas até integral pagamento, à taxa de 4%, porquanto, resulta que a soma desses bens ascende ao valor de  € 2.092,20.

Todavia, como teremos oportunidade de referir a decisão recorrida irá ser alterada, ficando prejudicada uma eventual rectificação do dispositivo suportada nesse apontado lapso de cálculo.

3.2. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:

Para tanto, o réu-apelante conclui nas conclusões O) e P):

“O) O Tribunal não explica a que propósito condena o Réu no pagamento do IVA, se o mesmo já consta nas faturas, sendo que a absoluta falta de fundamentação integra a previsão da nulidade do artigo 615º, n.º 1, al. b), do CPC.

P) O Tribunal a quo violou os artigos 346º e 762º do Código Civil, bem como o artigo 615 nº 1 alínea b) do Código de Processo Civil.”

Em sede de contra-alegações, veio a autora recorrida pugnar, entre o mais, pela improcedência da alegada nulidade por falta de fundamentação, concluindo que o Tribunal aplicou a lei, inclusive a lei fiscal.

Apreciando e decidindo:

As causas de nulidade da sentença encontram-se enumeradas, de forma taxativa, no artigo 615º do Código de Processo Civil, dispondo esse preceito, aplicável aos acórdãos proferidos pela Relação, por força do n.º 1 do artigo 666.º do mesmo Código, que, para além das demais situações contempladas nesse normativo, é nula a sentença quando não especifique ao fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (alínea b).

É, entendimento  pacífico na doutrina e na jurisprudência, que as nulidades da decisão não incluem o erro de julgamento seja de facto ou de direito[1]: as nulidades típicas da sentença reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal[2];  trata-se de vícios de formação ou actividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afectam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito, enquanto o erro de julgamento ( error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei[3],  consiste num desvio à realidade factual [nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma] ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma.

De acordo com o disposto no artigo 615º, nº 1, al. b) do C.P.C. “é nula a sentença quando (…) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (…)”.

A nulidade contemplada no artigo 615º, nº 1, al. b) do C.P.C.,  ocorre quando não se especifiquem os fundamentos de facto e de direito em que se funda da decisão, impondo-se por razões de ordem substancial, cumprindo ao juiz demonstrar que da norma geral e abstracta soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto, e de ordem prática, posto que as partes precisão de conhecer os motivos da decisão, em particular a parte vencida, a fim de, sendo admissível o recurso, poder impugnar o respectivo fundamento.

Esse dever de fundamentação, causa de nulidade da sentença, respeita à falta absoluta de fundamentação, como dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª edição, 1985, p. 687, ao escreverem “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente e incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.

.Feitas estas considerações,  verificamos que o tribunal a quo pronunciou-se nos termos do disposto no artigo 641.º, n.º 1, do CPC, nos seguintes termos:

“(…)Atenta a concreta alegação vertida pelo réu recorrente no seu recurso verifica-se que a omissão que o próprio suscita é, pela sua fundamentação de recurso (auto)respondida.

Isto é, compulsados os autos, verificamos, sem qualquer margem para dúvida, que as facturas onde a autora ancora os seus pedidos de pagamento contêm, a título global, os montantes em dívida integrados pelas rubricas de capital e de IVA devido à taxa legal em vigor.

Contudo, considerando que os pedidos aduzidos pela autora não foram na íntegra julgados procedentes, e que esta também pediu a condenação do réu no pagamento dos juros vencidos e vincendos, importa destrinçar em cada um dos pedidos quais os montantes de capital e de IVA, porquanto, só o capital vence juros nos termos do disposto no artigo 805.º do Código Civil, pois os montantes devidos a título tributário são estanques e liquidados tendo por base o preço base e não o valor adveniente de qualquer outra rubrica variável.

Daí que, na sentença proferida se tenha tido o cuidado de densificar a rubrica do capital em separado da rubrica do IVA para que, no cálculo da rubrica variável referente aos juros não fossem integrados os montantes devidos a título fiscal.

Ademais, verifique-se, a própria autora quando deduz os pedidos de pagamento no requerimento inicial considera-os a título composto, ou seja, integrando o capital e o IVA, mas, a assertividade que se impõe na redacção de uma decisão judicial condenatória impõe ao juiz o dever de escalpelizar cada uma das rubricas por forma a tornar certa a sua ordenação, não se verificando no caso concreto qualquer falta de fundamentação, pois o Tribunal meramente destrinçou o pedido do autor que já incluía IVA à taxa legal em vigor, como o próprio réu recorrente na sua alegação de recurso invoca.

Perante o exposto, entendemos que não se verifica a invocada nulidade por falta de fundamentação, mas vossas excelências decidindo farão inteira e sã justiça.”

Quid iuris ?

Antes de mais, importa assinalar que não logramos perceber o conteúdo da pronúncia do Mmo juiz a quo, proferida ao abrigo do nº1 do art 617º do CPC.

Para tanto, basta analisar o dispositivo da sentença recorrida.

E feita essa análise,  verificamos que a condenação no pagamento de juros abrange não só os montantes de capital (preço dos bens) mas também o valor do IVA, reproduzindo-se aqui esse dispositivo:“- Condenar o réu no pagamento à autora da quantia de € 1.731, 84 (mil, setecentos e trinta e um euros e oitenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 18-06-2019, e da quantia de € 2.719, 86 (dois mil, setecentos e dezanove euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 20-07-2022, ambas até integral pagamento, à taxa de 4%)”.

A revelar que o despacho proferido ao abrigo do nº1 do art 617º do CPC não está em conformidade com o conteúdo do dispositivo da sentença recorrida,  porquanto,  a referida distinção  entre o preço líquido do IVA  e o valor do IVA, com a indicada relevância para efeitos da condenação no pagamento dos juros, não é feita na sentença recorrida, sendo que o réu  foi aí condenado no pagamento dos juros sobre o valor dos bens acrescido de IVA.

Prosseguindo.

Posto isto, importa agora que este Tribunal da Relação aprecie e decida sobre a alegada nulidade da sentença recorrida, por alegada falta de fundamentação com o fundamento invocado pelo recorrente.

Das alegações recursórias que suportam a conclusões O) e P) do recurso, resulta que o recorrente imputa a alegada nulidade da sentença recorrida, por falta de fundamentação, com  relação ao item 1º dos factos provados, a revelar, que nesta parte o que está em causa será o apontado erro de julgamento de facto relativamente a esse item que foi impugnado.

A propósito, alega o recorrente nas alegações, relativamente ao item 1º dos factos provados e à factura ... de 16.02.2016 tão só o seguinte:

 “Ainda quanto ao FACTO PROVADO Nº 1, incorre o Tribunal em erro quando afirma que o preço aí descrito é acrescido de IVA.

Ora, analisando a fatura ..., fatura que serviu de motivação para dar o FACTO 1 como provado, salvo melhor entendimento, foi mal avaliado.

Olhando para o documento, verificamos que o total bruto são 1408,00€ e o IVA são 323,84€, pelo que, os valores indicados na fatura já comtemplaram o IVA, não podendo o Tribunal, no mínimo, condenar nessa parte.”

E mesmo a entender que essa alegação se estende às restantes facturas juntas aos autos, tal alegação não releva, porquanto, o tribunal a quo desconsiderou ( bem ou mal, não interessa), a fatura simplificada ..., emitida e com data de vencimento de 11.04.2019 e a fatura ..., emitida e com vencimento a 16.02.2016.

De resto, relativamente ao facto vertido no item 1 dos factos provados, importa assinalar que não é suporte de qualquer nulidade de sentença por alegada falta de fundamentação sustentar que a sentença proferida seja nula por falta de fundamentação da aplicação de IVA ao valor da fatura, porquanto, resulta provada a aquisição dos bens constantes da fatura referida no item 1 dos  factos provados.

E, como é sabido, o IVA é um imposto aplicado às vendas, cobrado pelo fornecedor e  pago pelo consumidor - neste caso o réu – a ser  posteriormente entregue pela A. à Autoridade Tributária e Aduaneira, e,  em  conformidade com os arts. 29º/ nº 1 - al. b) e 36º/1 do Código do IVA, o IVA é devido e torna-se exigível no momento da realização da venda, a obrigação do pagamento deste imposto nasce com a emissão do documento contabilístico competente - a respetiva fatura.

.Feita esta referência às alegações recursórias,  resulta para nós que a alegada nulidade da sentença, por alegada falta de fundamentação, resulta na perspetiva do recorrente do erro de julgamento de facto que imputa ao item 1º dos factos provados.

Ora, como já tivemos oportunidade de assinalar e repetimos a  nulidade da sentença contemplada na al. b) do nº1 do art 615º do CPC,  pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la, isto é, ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto.[4]

Todavia, da análise da sentença recorrida, incluindo a fundamentação de facto e jurídica e o dispositivo, não resulta que aquela fundamentação seja suscetível de conduzir a resultado distinto, sem prejuízo, naturalmente, da sentença conter lapsos de cálculo e/ou erros a nível de julgamento de facto e de direito, questões distintas da verificação da arguida nulidade por falta de fundamentação.

Em consequência, independentemente do mérito da sentença recorrida, analisada por nós a fundamentação de facto e jurídica vertida na sentença recorrida, não verificamos que esta sentença enferme do imputado vício de falta de fundamentação, sem prejuízo naturalmente de assistir ao recorrente a possibilidade de impugnar a decisão de facto e a fundamentação jurídica vertida naquela

Nos termos expostos, não se verifica a concreta nulidade por falta de fundamentação que o apelante imputou à sentença recorrida.

3.3. Na 1ª instância foram julgados provados e não provados os seguintes factos:

1.Em 18-06-2019, no âmbito da sua actividade, a autora forneceu ao réu os seguintes electrodomésticos, constantes da factura nº ..., com datas de emissão e de vencimento de 18-06-2019, para colocação na casa onde se encontrava a residir aquele, sita na Rua ..., nº ... - 2º esq., ... - Vila do Conde:

- uma máquina de lavar e secar Hoover 11Kg/7Kg, 1500 ROT, pelo preço de € 390, 00, acrescido de IVA;

- um forno Nodor Mult. Ouch Digital, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma placa Nodor 4Z Indução 6.3KW, pelo preço de € 178, 00, acrescido de IVA;

- um combinado Teka N/Frost 185*60 cm Inox, pelo preço de € 265, 00, acrescido de IVA;

- uma máquina de lavar louça Beko Inox 12 Talheres A+, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma chaminé Fagor Box 60 cm Inox, pelo preço de € 95, 00, acrescido de IVA;

- um conjunto Silampos Low Cost 9 peças, pelo preço de € 110, 00, acrescido de IVA.

2.E ainda os seguintes electrodomésticos:

- uma sandwicheira Krea Inox, por preço não inferior a € 8, 90, acrescido de IVA;

- uma varinha Moulinex c/picadora 750w 4 lâminas, por preço não inferior a € 19, 00, acrescido de IVA;

- um ferro Rowenta 2400W DW5112D1, por preço não inferior a € 20, 00, acrescido de IVA;

- um secador de cabelo Braun 2000W Iontec, por preço não inferior a € 15, 20, acrescido de IVA;

- três suportes Led Edm 30’’-60’’ fixo até 60 kg, preço unitário não inferior a € 8, 15, acrescido de IVA;

- um Led Philips 4K smart TV Android Serie 6500, por preço não inferior a € 600, 00, acrescido de IVA;

- um Samsung 4K smart TV, por preço não superior a € 600, 00, acrescido de IVA;

- uma máquina de café Bosch Dolce Gusto Branca, por preço não inferior a € 14, 65, acrescido de IVA;

- um Led JVC HD smart TV, por preço não superior a € 600, 00, acrescido de IVA;

- aspirador Bosch 5/Bolsa Relax Hero Hepa, por preço não superior a € 150, 00, acrescido de IVA;

- uma liquidificadora Krea 700W Inox, por preço não inferior a € 40, 00, acrescido de IVA.

3.Os electrodomésticos referidos em 1 e 2 encontram-se na habitação onde residem os réus, sita na Rua ..., Nº... - 2º esquerdo, Póvoa de Varzim.

4.A autora não forneceu electrodomésticos aos réus no ano de 2022.

5.Os réus foram notificados do requerimento de injunção em 20-07-2022.

6.O réu veio para Portugal e começou a trabalhar por conta da autora em Janeiro de 2019.

7.Em meados de Março de 2019 a ré veio para Portugal e não trabalhava.

1.2-Factos não provados

Nada mais se provou com relevância para a decisão, sendo que não se provou que:

1.A autora e réu acordaram no pagamento dos bens referidos em 2 dos factos provados em 16-02-2022.

2.Os réus são casados um com o outro.

3.Os réus pagaram à autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto da entrega, em dinheiro e o réu não solicitou qualquer tipo de recibo no momento.

4.A factura ..., datada de 16-02-2022, não foi apresentada para pagamento aos réus.

5.A autora facturou em nome do réu duas vezes os artigos com as referências GR36, DD861110, DW5112D1, HD550, 50139 e TAS 1404, uma vez em 2019 e outra em 2022.

6.A autora pagou a quantia de € 100,00 a título de provisão à sua mandatária para entrada do requerimento injuntivo.

7.O réu confessou a falta de pagamento dos bens referidos nos factos provados, em Maio de 2020, perante a autora.

8.O réu confessou a falta de pagamento dos bens referidos nos factos provados, em inícios de Setembro de 2020, perante a autora e os colegas de trabalho.

9.No âmbito do processo nº 3877/21.2T8MTS, que corre termos no Juízo do Trabalho de Matosinhos - Juiz 2, Comarca do Porto, o aqui réu alegou que a aqui autora lhe havia cedido os eletrodomésticos identificados nos factos provados.

3.4 Da Impugnação da decisão de facto:

Porque a impugnação da decisão de facto satisfaz minimamente os requisitos legais do art 640º do CPC, admitimos a impugnação da decisão de facto.

.O Réu -apelante impugna os itens 1º e 2º dos fatos provados e os itens 3 e 5 dos factos julgados não provados.

.Quanto ao item 1º dos factos provados convoca para reapreciação, o  depoimento de parte do legal representante da Autora, bem como os depoimentos das  testemunhas da Autora, DD e CC.

E pretende que aí onde se escreveu “18-06-2019” passe a constar “até Março de 2019”.

.Quanto ao item 2º dos factos provados o apelante entende que este  deveria dar origem a dois factos distintos, uma vez que, alega que   parte dos eletrodomésticos aí referidos constam de uma fatura simplificada, junta com a oposição a fls27 , e outros foram faturados e adquiridos noutro momento.

E  mais alega que o item 2 dos factos provados deve ser dividido, no sentido de excluir as tvs e dois suportes led, e incluir apenas os bens contantes da fatura de fls.27, ou seja, a fatura ... datada de 11.04.2019, requerendo que o facto provado nº 2 passe a ter a seguinte redacção: “em 11.04.2019 foram adquiridos e pagos os exatos objetos constantes da referida fatura simplificada ....”

Convoca para tanto, a reapreciação o depoimento de parte do representante legal da Autora, as declarações de parte dos réus, bem como a fatura simplificada junta a fls.27.

Alega não concordar com a avaliação do Tribunal a quo feita ao referido documento de fls 27, uma vez que, para efeitos de indicação do preço, o Tribunal fez fé no que aí consta, como sendo um documento que comprova os bens e os valores acordados, mas já não aceita como comprovativo de pagamento apesar de se tratar de uma fatura simplificada e estar na posse do Réu!

Pretende ainda que seja aditado aos factos provados o seguinte facto:

.“-em datas não concretamente apuradas, foram adquiridos os três televisores e os dois suportes led.”

.Relativamente ao facto julgado não provado vertido no item 3 cuja redacção se reproduz:

“3. Os réus pagaram à autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto de entrega, em dinheiro e o réu não solicitou qualquer tipo de recibo no momento.”

o recorrente pretende que seja julgado provado que: “Os réus pagaram à Autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto de entrega, em dinheiro e o Réu não solicitou qualquer tipo de recibo no momento”

.E quanto ao facto não provado nº 5, cuja redação se reproduz:

“5.A autora facturou em nome do réu duas vezes os artigos com as referências GR36, DD861110, DW5112D1, HD550, 50139 e TAS 1404, uma vez em 2019 e outra em 2022.

pretende o recorrente que esse facto seja julgado provado.

Para tanto e no essencial convoca o referido documento junto com a oposição como documento nº1, junto a fls. 27 e alega que esse documento, comprova sem margem para qualquer dúvida que os artigos com as referências indicadas foram faturados duas vezes.

Apreciando e decidindo:

Antecipando-nos assinalamos que a requerida reapreciação dos itens 2º e 3º dos factos provados e dos itens 3 e 5 dos factos não provados será feita em conjunto.

No que concerne ao item 1º dos fatos provados, verificamos que em sede de oposição os réus não alegaram factos relativos ao facto que agora pretendem introduzir através da impugnação do facto vertido no item 1º dos factos provados.

Conforme resulta da oposição apresentada, relativamente à factura nº ..., os réus limitaram-se a excecionar em primeira linha o pagamento. (“todos os bens constantes das faturas aqui peticionadas foram pagos no acto da entrega, em 2019”).

A revelar que os réus não alegaram as concretas datas em que procederam aos alegados pagamentos, nem alegaram as concretas datas em que foram celebrados as concretas compras e vendas de bens.

O que os Réus alegaram foi que pagaram o preço dos bens na data da entrega, sem concretizarem as datas em que alegadamente fizeram tais pagamentos e quais os concretos valores pagos, nem as datas das entregas.

Assim, porque a alteração pretendida refere-se a factualidade não alegada na contestação, porque o princípio da concentração da defesa na contestação (cf. artigo 573.º), incluindo na defesa superveniente (como se deduz da conjugação dos artigos 588.º, n.º 1, e 729.º, al. g)), determina a preclusão de toda a defesa que não haja oportunamente feito valer contra a concreta causa de pedir invocada pelo autor, em princípio a requerida alteração, não deveria ser aqui apreciada.

Todavia, noutra perspectiva, abordando a alegação ora feita como sendo enquadrável no artigo 26º da contestação , ( todos os bens adquiridos pelos requeridos foram comprados no ano de 2019 e encontram-se pagos desde essa altura) , iremos proceder à reapreciação dos concretos meios de prova convocados, a saber: depoimento de parte do legal representante da autora e depoimentos das  testemunhas da Autora, DD e CC e declarações de parte dos réus.

Ainda relativamente ao item 1º dos fatos provados o recorrente alegou.

“Ainda quanto ao FACTO PROVADO Nº 1, incorre o Tribunal em erro quando afirma que o preço aí descrito é acrescido de IVA.

Ora, analisando a fatura ..., fatura que serviu de motivação para dar o facto 1 como provado, salvo melhor entendimento, foi mal avaliado.

Olhando para o documento, verificamos que o total bruto são 1408,00€ e o IVA são 323,84€, pelo que, os valores indicados na fatura já comtemplaram o IVA, não podendo o Tribunal, no mínimo, condenar nessa parte.”

. Começando a nossa reapreciação dos meios de prova por este argumento, diremos que não compreendemos a argumentação da recorrente.

Analisada essa factura verificamos que na mesma são descritos os produtos que foram objecto da transação, estando nela indicadas as referências de cada um desses produtos, o número de unidades, o valor do preço sem IVA e a seguir está descrita a taxa do IVA.

E verificamos que a seguir a essa descrição, é feita referência ao valor sobre o qual incide o IVA, concretamente, € 1.408,00, correspondente à soma total dos concretos valores dos bens transacionados, bem como, referência ao valor do IVA liquidado em função daqueles valores.

Tudo a revelar que no item 1º dos fatos o Tribunal a quo limitou-se descrever o conteúdo daquela fatura, sendo que o total do preço, líquido de IVA, corresponde a € 1408,00 e o valor do IVA corresponde a € 323,84€, irrelevando o facto daquela factura conter um lapso de escrita, talvez devido a erro do programa informático, quando na parte final ao indicar o valor total dos preços dos bens, refere o mesmo valor quer para o total líquido quer para o total bruto.

Por outro lado, verificamos que, pese embora a cópia da factura ... junta pelos réus com a oposição enferme do mesmo lapso, isto é, refira o mesmo valor para o valor bruto total e para o valor total líquido, estranhamente o apelante nada refere a propósito, convocando a mesma para sustentar a sua versão dos factos.

Feita esta observação, prosseguimos.

.Procedemos à reprodução dos registos das  gravações do depoimento de parte do legal representante da autora, das declarações de parte dos Réus e analisamos o documento de fls 27, junto pelos réus, o qual, consubstancia cópia de uma fatura simplificada ..., com data de emissão e de vencimento de 11.04.2019, a qual, é omissa na identificação da pessoa singular/colectiva a quem é emitida e que tem aposta a expressão” Pago a pronto” e procedemos à reprodução dos registos das  gravações dos depoimentos das testemunhas da autora DD e CC.

.FF, legal representante da autora, referiu que os  bens em causa foram vendidos no ano de 2019,  que esses bens foram  fornecidos e entregues no  ano de 2019, não ser verdade que os bens das facturas referidas na petição tenham sido pagos pelos Réus. Confrontado com o documento nº1 junto à oposição, e junto a fls 27 dos autos, não confirmou que o mesmo tenha sido emitido e entregue ao réu AA, referindo que este  na altura era funcionário da empresa.

.O Réu, AA, que foi funcionário da autora, referiu que em Setembro de 2018 começou a trabalhar para a autora, que entre Fevereiro e Março de 2019  comprou os bens  que estão indicados nas facturas a que alude o requerimento de injunção e que foram juntas aos autos a 16.12.2022 . Referiu que os três televisores não foram pagos no ato da entrega, mas sim em prestações, sendo que dois tv foram entregues em Março e o terceiro depois. Referiu que fez os pagamentos todos em dinheiro. Também o Réu referiu que em 18.06.2019 já estavam feitas todas as entregas de bens.

E mais referiu, revelando poucas certezas nas suas declarações. “suponho que tenha sido descontado do meu salário”.

Todavia, reconheceu que nunca acordou com o legal representante da autora os concretos termos de tal forma de pagamento, o que igualmente não se mostra verosímil.”

.A Ré BB, referiu ter chegado a Portugal em Março de 2019, data em que a maior parte dos bens adquiridos à autora já estavam instalados na casa dos réus. Referiu que no ano de 2022 não compraram qualquer bem.

Referiu que após estar cá compraram os bens descritos na fatura de fls 27 que lhe foi exibida, que  “a autora deu fatura dois três dias após os réus levantarem  bens, que o esposo foi buscar factura, que o réu lhe disse que fez pagamento no dia seguinte, que a autora “deu “ factura.”

Relativamente a fls 45, fatura de 2022, referiu que não comprou bens no ano de 2022.

Quanto aos bens que estavam instalados na sua casa quando chegou a Portugal referiu que o marido lhe disse que os tinha pago a dinheiro e referiu saber pelo marido que os televisores foram pagos a prestações e que o marido referiu que acordou com a autora esse modo de pagamento, sendo que a ré afirmou que ela própria não acordou nada com a autora.

Assim, relativamente às declarações de parte dos réus mostraram-se contraditórias com a versão apresentada na sua oposição, mormente no que concerne ao modo e datas de pagamento por si enunciadas, uma vez que no seu articulado sustentaram que o pagamento ocorreu aquando da entrega dos bens e em numerário, e nas suas declarações afirmaram que parte do pagamento ocorreu por desconto no vencimento do réu (por ser funcionário da autora) e em prestações.

De resto, como acima foi evidenciado, em relação a tal alegado pagamento a ré revelou ter conhecimento meramente indirecto, através do que lhe foi transmitido pelo réu, nada tendo acordado com a autora a respeito de pagamentos e preços.

Reapreciamos também os depoimentos das testemunhas convocadas pelos Réus, DD e CC, o primeiro, pessoa que fez transporte e montagem de alguns dos bens que foram vendidos ao réu, e o segundo, filho do legal representante da autora, diremos o seguinte.

A testemunha CC, nesta parte parte, referiu que conhece o réu por ter trabalhado numa empresa do pai quase dois anos, referiu ter ajudado a carregar a carrinha que transportou eletrodomésticos e duas tv para casa do réu. De resto, não revelou ter conhecimento do acordo celebrado entre o réu e seu pai relativamente à compra e venda dos bens em apreço. Todavia, referiu que o Réu falou com a testemunha revelando ter dificuldades em pagar os bens que comprou e dizia que estava à espera de ter dinheiro.

A testemunha DD, reformado, referiu conhecer o legal representante da autora, que trabalharam juntos e referiu conhecer os réus por ter montado alguns eletrodomésticos na casa deste em ..., Vila do Conde a pedido do legal representante da autora e com o acordo do Réu, designadamente, um exaustor, transportou dois televisores, pequenos eletrodomésticos, máquina de lavar e secar, placa e um forno. Referiu que ligaram à ficha o frigorífico. Referiu que a montagem ocorreu no Verão-Junho-Julho, antes do Covid.

1.Aqui chegados, reapreciados que foram os meios de prova , relativamente à impugnação dos factos provados nos itens 1º e 2º  cabe referir que no essencial dos meios de prova reapreciados resulta que os bens que foram vendidos pela autora ao Réu foram transportados e colocados na casa deste em vários momentos, não resultando desses meios de prova a ou as datas concretas em que ocorreram o concreto acordo, ou os concretos acordos, celebrados entre autora e o réu, pelo(s) quais, a autora vendeu e o réu comprou cada um dos bens que foram entregues na casa do réu.

Todavia, resultou para nós a convicção que esses concretos acordos ocorreram antes de 18.06.2019, data em que, conforme referido pelo réu, já estavam feitas todas as entregas de bens.

Pelo que, reapreciados os meios de prova convocados  relativamente ao item 1º dos factos provados e relativamente ao item 2º dos factos provados, este na parte em que aí se remetia para a data referida no item 1º,  criamos a segura convicção que em datas não concretamente apurados, localizadas no período que decorre entre início de Janeiro de 2019 até final de Março de 2019 a autora no âmbito da sua actividade, forneceu ao réu, a pedido deste,  os seguintes electrodomésticos, constantes da factura nº ..., com datas de emissão e de vencimento de 18-06-2019, para colocação na casa onde se encontrava a residir aquele, sita na Rua ..., nº ... - 2º esq., ... - Vila do Conde:

- uma máquina de lavar e secar Hoover 11Kg/7Kg, 1500 ROT, pelo preço de € 390, 00, acrescido de IVA;

- um forno Nodor Mult. Ouch Digital, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma placa Nodor 4Z Indução 6.3KW, pelo preço de € 178, 00, acrescido de IVA;

- um combinado Teka N/Frost 185*60 cm Inox, pelo preço de € 265, 00, acrescido de IVA;

- uma máquina de lavar louça Beko Inox 12 Talheres A+, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma chaminé Fagor Box 60 cm Inox, pelo preço de € 95, 00, acrescido de IVA;

- um conjunto Silampos Low Cost 9 peças, pelo preço de € 110, 00, acrescido de IVA.

Em consequência, relativamente ao item 1º dos factos provados, a impugnação deste item procede parcialmente, pelo que, a redação deste item passa a ser a seguinte:

. Entre início de Janeiro de 2019 até final de Março de 2019 a autora no âmbito da sua actividade, forneceu ao réu, a pedido deste,  os seguintes electrodomésticos, constantes da factura nº ..., com datas de emissão e de vencimento de 18-06-2019, para colocação na casa onde se encontrava a residir aquele, sita na Rua ..., nº ... - 2º esq., ... - Vila do Conde:

- uma máquina de lavar e secar Hoover 11Kg/7Kg, 1500 ROT, pelo preço de € 390, 00, acrescido de IVA;

- um forno Nodor Mult. Ouch Digital, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma placa Nodor 4Z Indução 6.3KW, pelo preço de € 178, 00, acrescido de IVA;

- um combinado Teka N/Frost 185*60 cm Inox, pelo preço de € 265, 00, acrescido de IVA;

- uma máquina de lavar louça Beko Inox 12 Talheres A+, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma chaminé Fagor Box 60 cm Inox, pelo preço de € 95, 00, acrescido de IVA;

- um conjunto Silampos Low Cost 9 peças, pelo preço de € 110, 00, acrescido de IVA.

2. Relativamente ao item 2º dos factos provados,  importa apreciar e decidir em primeiro lugar os bens discriminado no item 2 dos factos provados cuja referência consta tanto da factura simplificada ... com data de emissão de 11.04.2019 que foi junta pelo réu-recorrente,  como, também da factura “ ...” emitida a 16.02.2022,  a qual, foi junta pela autora -recorrida juntamente com a factura  nº ..., esta com datas de emissão e de vencimento de 18-06-2019.

E no que concerne à factura simplificada ... com data de emissão e vencimento de 11.04.2019, a qual, estava na posse do réu e que foi por este junta com a oposição, junta  a fls  27 dos autos,  importa assinalar que, contrariamente ao tribunal a quo, entendemos que essa fatura, por se tratar de um fatura simplificada,  revela-se eficaz para alicerçar a tese dos réus no sentido da autora estar a tentar receber duas vezes os valores de alguns bens que constam da factura do ano de 2002.

Para tanto, basta atentar que a 24 de agosto de 2012 foram publicados os decretos-lei n.º 197/2012 e 198/2012, que introduzem alterações em sede de IVA no que respeita à emissão de faturação simplificada, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2013.

E foi introduzido no art. 40.º do CIVA um novo conceito de faturação simplificada que substitui o anterior conceito de “talão de venda” e de dispensa de faturação.

A faturação simplificada substitui a emissão de fatura prevista no art. 29.º como os requisitos previstos no art. 36.º do CIVA.

As faturas simplificadas apenas podem ser emitidas para operações realizadas a particulares não sujeitos passivos, relativos a vendas de bens efectuadas por retalhistas ou vendedores ambulantes, quando o valor da factura não for superior a 1000 euros no caso de produtos  ou relativamente a outras transmissões de bens e prestações de serviços memo a sujeitos passivos de imposto em que o montante da factura não seja superior a 100 euros.

E essa fatura simplificada é um documento emitido quando existe pagamento imediato, ou seja, considera-se liquidada, e destina-se ao consumidor final. Portanto terá que ser emitida no mesmo dia de aquisição do produto ou serviço. Não obriga ao preenchimento de NIF ou nome, mas está sujeita a limites de valor para a sua emissão (até 100€ se for prestação de serviços ou até 1000€ se for venda de produtos).

Assim, a fatura simplificada difere das faturas no sentido de que não é associado à mesma um recibo como comprovativo de pagamento, sendo correspondente a um “fatura-recibo”, e constando da mesma menos dados do que os exigíveis para a fatura.

Posto isto, considerando as normas relativas à emissão das faturas simplificadas que são emitidas quando existe pagamento imediato, considerando que o réu provou estar na posse da factura  simplificada ... com data de emissão de 11.04.2019, a qual, como vimos, significa que existiu pagamento imediato, considerando que não foi alegado nem está provado qualquer facto que torne irregular a mencionada factura, concluem os juízes deste Tribunal da Relação que o item 2º dos factos provados tem de ser alterado no que concerne aos bens que aí são descritos e que também estão descritos naquela fatura emitida a 16.02.2022 , os quais devem ser considerados pagos pelo réu-recorrente.[5]

Mais determinamos que seja aditado a esse item 2º , como item 2º A, um novo item, no qual, seja vertida a convicção que este colectivo de juízes alcançou relativamente à compra e venda celebrada entre a autora e o réu, relativamente aos restantes produtos descritos no item 2º dos factos provados que não estão descritos na factura junta pelo réu, factura ... com data de emissão de 11.04.2019.

Assim, quanto ao item 2º dos factos provados, relativamente aos bens que estão descritos naquela fatura emitida a a 11.04.2019, este colectivo de juízes criou a convicção que esses foram pagos de imediato pelo Réu, merecendo provimento nesta parte a impugnação.

E relativamente aos bens descritos no item 2º dos factos provados que não constam da factura emitida a 11.04.2019 , importa assinalar que o recorrente, no essencial, apenas alegou em sede de oposição que pagou a pronto esses bens, não discutindo sequer  agora em sede de recurso os concretos valores dos bens vertidos no item 2, aceitando até que não conseguiu provar o pagamento desses bens, concluindo nas alegações :

“Efetivamente, apenas relativamente aos televisores, o Réu não conseguiu provar o pagamento, pelo que só poderá ser condenado no pagamento destes objetos.”

Ora reportando-nos agora a estes concretos bens do item 2º dos factos provados que não estão discriminados na fatura simplificada de 11.04.2014, a convicção criada por este colectivo de juízes não difere daquela que foi alcançada pelo tribunal recorrido.

Efectivamente, da reapreciação por nós feita dos meios de prova acima referidos, não resulta para nós a convicção que efetivamente os RR. tivessem pago qualquer valor por conta dos  preços desses bens  em débito, nem tão pouco ficamos convencidos que a autora se tivesse pago através de descontos feitos no salário do Réu.

E  importa assinalar, que impugnada que foi  a factura emitida pela autora no ano de 2022, a qual, como documento particular emitido unilateralmente pela fornecedora de bens para efeitos contabilísticos é impugnável, o tribunal a quo desconsiderou os valores que nela constam como correspondentes aos preços concretos dos bens, porquanto, no essencial, considerou que os valores foram inflacionados e não foram apurados os valores exactos correspondentes aos preços devidos por cada uma dos bens vendidos pela autora ao réu.

De resto, nenhuma das testemunhas cujos depoimentos foram reapreciados revelou ter conhecimento dos concretos preços que foram acordados entre as partes.

A revelar que no essencial relativamente a estes bens, a autora, enquanto vendedora e sujeito passivo de IVA-cfr. art 2º, 1, al. a) CIVA- estava obrigada a provar os factos da constituição da obrigação de pagamento do preço sobre o qual incide o IVA.

E porque não logrou provar os concretos valores correspondentes aos preços dos bens vendidos ao réu não podia o tribunal a quo fazer acrescer IVA aos valores referidos no item 2º dos factos provados.

E, pese embora a questão não tenha sido suscitada pelo recorrente, oficiosamente colocamos, a mesma, a qual, contende com a redacçao a dar ao item 2º, na parte em que o tribunal a quo julgou provados os preços, acrescidos de IVA.

É que o tribunal relativamente ao preço de cada bem vendido pela autora ao Réu julgou provado que: “o preço corresponde a valor não superior ou não inferior ao valor ali referido fixado relativamente a cada bem, acrescido de IVA!”

Ora, afigura-se-nos, em face das disposições do CIVA, que sem estarem fixados os concretos valores correspondentes a cada um desses bens, e sem estar emitida a factura correspondente à compra e venda que veio a ser julgada provada o tribunal a quo não pode fazer acrescer o IVA devido.

É que, como é sabido, sem prévia emissão da factura devida com os requisitos estabelecidos no art 36º, nº5 do CIVA, não é só o IVA que não exigível, mas sim  toda a dívida ainda em discussão, uma vez que sendo o IVA exigível no momento em que os bens são colocados à disposição do adquirente, o preço da compra e venda não pode ser exigido sem ser exigido o IVA, o qual, tem de ter como base um concreto valor apurado.[6]

Em consequência do exposto, porque no caso em apreço, relativamente aos bens descritos no item 2 dos factos provados que não foram objecto de anterior faturação no ano de 2019,  o Tribunal recorrido não logrou fixar os valores exactos correspondentes aos concretos bens vendidos pela autora ao réu impõe-se eliminar a parte em que o tribunal fez acrescer o valor do IVA devido por cada bem vendido e impõe-se fixar  relativamente aos bens cujo preço foi fixado com referência apenas a  um valor não inferior o valor máximo desse concreto preço em função dos meios de prova por nós reapreciados, sendo que, neste aspecto importa atentar nos valores descritos na factura simplificada ... de 11.04.2019 e na factura  ... emitida a 16.02.2022:

Assim, reapreciada a prova convocada, relativamente ao facto provado vertido no item 2º, decidimos conceder parcial provimento à impugnação da decisão de facto e assim, alteramos a redacção do item 2 dos factos provados, o qual, passa a ter a seguinte redacção:

“Em 11.04.2019 foram adquiridos à Autora pelo Réu  e pagos os exatos objetos constantes da referida fatura simplificada ..., concretamente:

- uma sandwicheira Krea Inox, pelo preço de € 8, 90, acrescido de IVA;

- uma varinha Moulinex c/picadora 750w 4 lâminas, pelo preço de € 19, 00, acrescido de IVA;

- um ferro Rowenta 2400W DW5112D1, pelo preço de € 20, 00, acrescido de IVA;

- um secador de cabelo Braun 2000W Iontec, pelo preço de € 15, 20, acrescido de IVA;

- um suporte Led Edm 30’’-60’’ fixo até 60 kg, ao preço unitário de € 8, 15, acrescido de IVA;

- uma máquina de café Bosch Dolce Gusto Branca, ao preço de € 14, 65, acrescido de IVA

E determinamos o aditamento ao factos provados do seguinte item, 2ªA:

“2º A.

.No período que decorreu entre início de Janeiro de 2019 até final de Março de 2019 a autora no âmbito da sua actividade, forneceu ao réu, a pedido deste,  os seguintes electrodomésticos, por preços parcelares não concretamente apurados a seguir discriminados:

- um Led Philips 4K smart TV Android Serie 6500, por preço não concretamente apurado mas não superior a € 600,00,

- um Samsung 4K smart TV, por preço não concretamente apurado mas não superior a € 600,00; - um Led JVC HD smart TV, por preço não concretamente apurado, não superior a € 600,00;

- aspirador Bosch 5/Bolsa Relax Hero Hepa, por preço não concretamente apurado, mas não superior a € 150,00;

- uma liquidificadora Krea 700W Inox, por preço por preço não concretamente apurado, mas não superior a € 40,00.

E ainda

- dois suportes Led Edm 30’’-60’’ fixo até 60 kg, ao preço unitário de € 8,15, acrescido de IVA

. Em consequência do exposto, concedido parcial provimento à impugnação dos itens 1º e 2º dos factos provados, resulta que a factualidade contida no item 5º dos factos julgados não provados deve ser eliminada, o que, se determina, determinando que seja aditado aos factos provados o seguinte item, com a numeração seguinte:

“8º.A autora facturou duas vezes os artigos com as referências GR36, DD861110, DW5112D1, HD550, 50139 e TAS 1404, uma vez em 2019 e outra em 2022, respectivamente , na factura simplificada ... com data de emissão e pagamento em  11.04.2019 que foi junta pelo réu-recorrente e factura “ ...” com data de emissão e pagamento a  16.02.2022.

E relativamente ao item 3º dos factos não provados, porque a reapreciação dos meios de prova convocados não nos convenceu que o réu pagou à autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto da entrega, em dinheiro, não merece qualquer provimento a impugnação nessa parte.

3.5. Matéria de facto julgado provada e não provada após reapreciação por parte deste Tribunal da Relação:

Factos Provados:

1. Entre início de Janeiro de 2019 até final de Março de 2019 a autora no âmbito da sua actividade, forneceu ao réu, a pedido deste,  os seguintes electrodomésticos, constantes da factura nº ..., com datas de emissão e de vencimento de 18-06-2019, para colocação na casa onde se encontrava a residir aquele, sita na Rua ..., nº ... - 2º esq., ... - Vila do Conde:

- uma máquina de lavar e secar Hoover 11Kg/7Kg, 1500 ROT, pelo preço de € 390, 00, acrescido de IVA;

- um forno Nodor Mult. Ouch Digital, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma placa Nodor 4Z Indução 6.3KW, pelo preço de € 178, 00, acrescido de IVA;

- um combinado Teka N/Frost 185*60 cm Inox, pelo preço de € 265, 00, acrescido de IVA;

- uma máquina de lavar louça Beko Inox 12 Talheres A+, pelo preço de € 185, 00, acrescido de IVA;

- uma chaminé Fagor Box 60 cm Inox, pelo preço de € 95, 00, acrescido de IVA;

- um conjunto Silampos Low Cost 9 peças, pelo preço de € 110, 00, acrescido de IVA.

2. Em 11.04.2019 foram adquiridos à Autora pelo Réu e pagos os exatos objetos constantes da referida fatura simplificada ..., concretamente:

- uma sandwicheira Krea Inox, pelo preço de € 8, 90, acrescido de IVA;

- uma varinha Moulinex c/picadora 750w 4 lâminas, pelo preço de € 19, 00, acrescido de IVA;

- um ferro Rowenta 2400W DW5112D1, pelo preço de € 20, 00, acrescido de IVA;

- um secador de cabelo Braun 2000W Iontec, pelo preço de € 15, 20, acrescido de IVA;

- um  suporte Led Edm 30’’-60’’ fixo até 60 kg, ao preço unitário de  € 8, 15, acrescido de IVA;

- uma máquina de café Bosch Dolce Gusto Branca, ao preço de € 14, 65, acrescido de IVA.

2ºA. .No período que decorreu entre início de Janeiro de 2019 até final de Março de 2019 a autora no âmbito da sua actividade, forneceu ao réu, a pedido deste,  os seguintes electrodomésticos, por preços parcelares não concretamente apurados a seguir discriminados:

- um Led Philips 4K smart TV Android Serie 6500, por preço não concretamente apurado mas não superior a € 600,00,

- um Samsung 4K smart TV, por preço não concretamente apurado mas não superior a € 600,00; - um Led JVC HD smart TV, por preço não concretamente apurado, não superior a € 600,00;

- aspirador Bosch 5/Bolsa Relax Hero Hepa, por preço não concretamente apurado, mas não superior a € 150, 00;

- uma liquidificadora Krea 700W Inox, por preço por preço não concretamente apurado, mas não superior a € 40,00.

E ainda

- dois suportes Led Edm 30’’-60’’ fixo até 60 kg, ao preço unitário de € 8,15, acrescido de IVA

3.Os electrodomésticos referidos em 1, 2 e 2º A encontram-se na habitação onde residem os réus, sita na Rua ..., Nº... - 2º esquerdo, Póvoa de Varzim.

4.A autora não forneceu electrodomésticos aos réus no ano de 2022.

5.Os réus foram notificados do requerimento de injunção em 20-07-2022.

6.O réu veio para Portugal e começou a trabalhar por conta da autora em Janeiro de 2019.

7.Em meados de Março de 2019 a ré veio para Portugal e não trabalhava.

8.A autora facturou duas vezes os artigos com as referências GR36, DD861110, DW5112D1, HD550, 50139 e TAS 1404, uma vez em 2019 e outra em 2022, respectivamente , na factura simplificada ... com data de emissão e pagamento em  11.04.2019 que foi junta pelo réu-recorrente e factura  “ ...” com data de emissão e pagamento a  16.02.2022.

Factos não provados

1.A autora e réu acordaram no pagamento dos bens referidos em 2 dos factos provados em 16-02-2022.

2.Os réus são casados um com o outro.

3.Os réus pagaram à autora os valores referidos em 1 dos factos provados no acto da entrega, em dinheiro e o réu não solicitou qualquer tipo de recibo no momento.

4.A fatura ..., datada de 16-02-2022, não foi apresentada para pagamento aos réus.

5.A autora pagou a quantia de € 100,00 a título de provisão à sua mandatária para entrada do requerimento injuntivo.

6.O réu confessou a falta de pagamento dos bens referidos nos factos provados, em Maio de 2020, perante a autora.

7.O réu confessou a falta de pagamento dos bens referidos nos factos provados, em inícios de Setembro de 2020, perante a autora e os colegas de trabalho.

8.No âmbito do processo nº 3877/21.2T8MTS, que corre termos no Juízo do Trabalho de Matosinhos - Juiz 2, Comarca do Porto, o aqui réu alegou que a aqui autora lhe havia cedido os eletrodomésticos identificados nos factos provados.

3.6.Do Mérito da Sentença Recorrida.

3.6.1

Como emerge do regime plasmado nos arts. 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nº 1, da sua natureza lógica de finalização resumida de um discurso, as conclusões têm um papel decisivo, não só no levantamento das questões controversas apresentadas ao tribunal superior como, sobretudo, na fixação do objeto do recurso, logo se compreendendo quão importantes elas são para o tribunal ad quem na definição dos seus poderes de cognição. Em suma: as conclusões têm a importante função de definir e delimitar o objeto do recurso e, desta forma, circunscrever o campo de intervenção do tribunal superior encarregado do julgamento.

No caso, retira-se das conclusões do recurso, que a pretensão do Recorrente encontrava-se totalmente dependente do integral provimento da impugnação da matéria de facto por si apresentada, o que, veio a verificar-se parcialmente.

E o provimento parcial da impugnação da decisão de facto, determina forçosamente a alteração da sentença recorrida. Vejamos.

O facto de se ter apurado que afinal foram feitos vários acordos entre as partes no sentido daquela fornecer, a pedido deste, os concretos bens descritos nos  itens 1º , 2º e sº A,  dos factos provados, e não apenas um, na concreta data de 18.06.2019, data mencionada na factura que veio a ser emitida pela autora, para titular fiscalmente as concretas compras e vendas, não é suscetível de alterar a subsunção jurídica dos factos que foi feita pelo tribunal a quo na parte em que enquadra juridicamente a relação contratual dos autos.

3.6.2.Concretizando.

Da análise dos fatos apurados, resulta estarmos,  perante uma relação contratual de consumo, a que é aplicável o regime que resulta, designadamente, do disposto na Lei n.º 24/96, de 31 de julho [Lei de Defesa do Consumidor (LDC)], em articulação com o que consta do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril (Venda de Bens de Consumo e das Garantias a ela relativas), que transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio[7]

O referido regime, com efeito, é aplicável aos contratos de compra e venda celebrados entre um profissional e um consumidor, ou seja, entre, por um lado, uma pessoa singular ou coletiva que, ao abrigo de um contrato, venda bens de consumo no âmbito da sua atividade profissional e, por outro lado, uma pessoa singular que os adquira para um uso não profissional ou empresarial (artigos 1.º-A e 1.º-B, als. a), b) e c), do referido Decreto-Lei n.º 67/2003)[8]2], e, no caso, tendo em conta as qualidades em que cada uma das partes interveio no citado contrato e o destino que o réu pretendia dar aos bens, é inegável que aquele regime tem aqui inteira aplicação.

Ora, dentro desse regime, o vendedor tem “o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda” (artigo 2.º, n.º 1, do mesmo Decreto-Lei n.º 67/2003). Isto é, bens que tenham as qualidades indicadas pelo vendedor, que sejam adequados ao uso específico e às utilizações habitualmente dadas a outros do mesmo género e que apresentem as qualidades e desempenho habituais do tipo a que pertencem (artigo 2.º-2 da Diretiva 1999/44/CE).

Acresce que a compra e venda de bens de consumo é uma subespécie do contrato de compra e venda e, consequentemente, aplicam-se-lhe as regras gerais do CC, as regras da lDC, as regras especiais do Dl 84/2021, de 18 de outubro, bem como todas as transversais aos contratos de consumo [9]

O artigo 874º do C. Civil define a compra e venda é definida como "o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa ou outro direito, mediante um preço".

Tal contrato tem, como efeitos essenciais, a transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito; a obrigação de entregar a coisa; e a obrigação de pagar o preço (artigo 879º do C. Civil).

Assim, autora e réu celebraram contratos de compra e venda, dos quais, resulta para a autora a obrigação de transmitir a propriedade dos concretos bens em apreço e para o réu resultou a obrigação de pagar os preços acordados.

À autora, na qualidade de vendedora dos bens cabia alegar e provar a concreta relação contratual estabelecida com o réu, os factos constitutivos dessa relação: celebração de um acordo entre as parte pelo qual a autora vendeu ao réu os concretos bens descritos na petição inicial e os factos constitutivos da obrigação de pagamento dos concretos preços parcelares desses bens acordados pelas partes.

Não beneficiando da presunção legal de cumprimento (artigo 344º, n.º 1 do C. Civil), cabia ao réu provar que pagou, tal como alega (artigo 342º, n.º 2 do C. Civil).

 Com efeito, na doutrina e na jurisprudência tem sido entendido que, nas acções por falta de cumprimento da obrigação, o ónus da prova do cumprimento cabe ao réu.

Faz-se apelo à velha teoria da normalidade e afirma-se que “se o autor, alegando e provando a constituição do seu crédito (mediante a alegação e a prova dos factos de onde brotou o direito), vem a juízo exigir a condenação do titular do dever correspondente é porque, normalmente, com extrema probabilidade, o direito se manteve e o demandado não cumpriu” .[10]

Dos factos aprovados resulta que a autora cumpriu a obrigação a que se encontrava adstrita – fornecimento dos bens.

Contudo, a autora, fornecedora dos bens, relativamente aos bens que vendeu ao réu descritos no item 2º A dos factos apurados, não logrou provar, como lhe competia- art 342º- 1 C.Civil, os concretos valores das compras e vendas descritas nos nºs 1 a 5 desse item 2º A.

E o réu, por seu lado, não logrou provar que pagou os preços dos bens a que refere o item 1º dos factos provados, nem tão pouco logrou provar o pagamento dos preços dos bens descritos no item 2º A.

O réu apenas logrou provar o pagamento dos preços dos bens descritos no item 2º dos factos provados.

Em consequência, relativamente aos bens descritos no item 1º e nº6 do item 2ª A dos factos provados, não tendo o réu cumprido a obrigação que sobre si impendia, nos termos do disposto no artigo 798º, do C. Civil, torna-se, em princípio responsável pelo prejuízo que causou ao credor, presumindo-se tal incumprimento culposo, conforme preceitua o nº 1 do artigo 799º, do mesmo diploma.

A obrigação do réu é obviamente pecuniária, e como tal venceria juros a partir da data da sua constituição em mora, por força do preceituado no artigo 806º, nº1, do C. Civil.   

Dispõe o artigo 805º, nº1, do C. Civil, que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. Porém, o n.º 2 do mesmo preceito, na sua alínea a), estabelece que, independentemente de interpelação, há mora do devedor se a obrigação tiver prazo certo.

 Ora, no caso sub judice, provou-se que a obrigação relativa aos bens identificados em 1 dos factos provados (no valor total de € 1.408,00, acrescido de IVA à taxa de 23%, perfazendo o montante global de € 1.731, 84) tinha prazo certo.

Nesta conformidade, sobre a quantia de € 1.731, 84 são devidos juros, à taxa legal anual de 4%, desde a referida data de vencimento (18-06-2019) e sobre o valor de € 16,30, ao qual acresce o  IVA à taxa legal  (dois suportes Led Edm 30’’-60’’  ao preço unitário de € 8,15, acrescido de IVA),  são devidos juros  desde a notificação para os termos da injunção (20-07-2022), até integral pagamento - (artigos 804º, 805º, n.º 1, al. a), 806º e 559º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril).

Todavia, relativamente aos bens indicados no item 2º dos factos provados, no valor total de € 105,668 incluindo IVA, o réu logrou provar o pagamento desses bens, a implicar que a pretensão da autora improcede nessa parte e o recurso procede, a determinar a improcedência da acção com a consequente absolvição do réu-recorrente dessa parte do pedido.

E relativamente aos bens descritos nos nºs 1 a 5 do item 2º A dos factos provados, resulta do exposto que a autora-recorrida não logrou provar os concretos preços das concretas compras e vendas celebradas.

Não obstante, resultou demonstrada a onerosidade do contrato, isto é, que à ré cabe o pagamento dos preços dos concretos bens que comprou à autora.

Ora, no caso dos autos, cabia à autora a prova da existência do contrato e do cumprimento da sua obrigação de entrega dos bens, tendo a autora logrado provar esses factos.

Todavia, a autora não demonstrou que os preços faturados na factura emitida e com vencimento a 16.02.2022 e que aqui veio também peticionar corresponde ao acordado com o réu.

E, inerentemente, não provou também que os valores faturados como sendo os concretos preços das vendas efectuadas.

Tão pouco foram alegados e provados factos suscetíveis de revelarem quais os preços que normalmente a autora-recorrida-vendedora, praticava à data da conclusão do contrato, nem tão pouco resultaram provados que permitam fixar os concretos parcelares dos bens vendidos, convocando juízos de equidade, conforme possibilita o nº1 do art 883º do C.Civil.

Não obstante, daqui não decorre que pura e simplesmente a ação nesta parte deva improceder. Com efeito, muito embora a autora não tenha conseguido demonstrar que os preços alegados  foram os preços fixados e acordados para cada um dos bens descritos no item 2º A dos factos provados,   resulta dos autos que entre as partes foi celebrada entre autora-recorrida e réu-recorrente a compra e venda daqueles bens  e convencionados preços (cujos montantes Não foram apurados) e que esses bens foram entregues ao Réu.

Assim, a situação de facto em análise configura-se como incerteza sobre o quantitativo do direito de crédito do recorrente no confronto do réu-recorrente, enquadrável no artigo 609º, nº 2 do Código de Processo Civil.

Resulta deste normativo que se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condenará no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte em que já seja líquida - artigo 661º, nº 2, do Código de Processo Civil).

Ao referir-se à inexistência de elementos para fixar a quantidade, a lei não distingue entre os casos em que são ou não formulados pedidos genéricos a que se reporta o artigo artº. 556º, nº. 1, al. b) do NCPC.[11]

Ora, onde a lei não distingue, também ao intérprete não é legítimo distinguir, salvo se houver ponderosas razões de sistema que o imponham, ressalva que não ocorre no caso vertente.

É, pois, pressuposto da remessa para o incidente de liquidação a que se fez referência a inexistência de elementos necessários à quantificação em causa, independentemente de ela haver ou não resultado do fracasso da prova.

Por isso, a mera falta de prova na acção declarativa do objecto ou da quantidade não implica decisão de absolvição do pedido, antes justificando a condenação no que se liquidar no incidente acima referido.

Em consequência, relativamente aos bens descritos nos nºs 1 a 5 do item 2ª A dos factos provados, resultando dos factos provados que a autora e o réu celebraram um contrato de compra e venda, que a autora forneceu esses bens ao Réu,  mas não se tendo apurado os concretos preços desses bens deverá relegar-se para momento ulterior, através do incidente de liquidação previsto no artigo 358º, nº 2 do Código de Processo Civil, a determinação desses preços de acordo com os citados critérios legais. (até ao limite máximo considerado no item 2º A dos fatos provados)

A revelar que o recurso interposto procede parcialmente e que a sentença recorrida deve ser alterada.

3.6.3.Da responsabilidade pelas custas.

Como referem António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2018, Almedina, pág. 580), a lei não estabelece uma regra quanto à atribuição da responsabilidade pelas custas nos casos de condenação total ou parcialmente ilíquida. A solução deve ser encontrada através da ponderação dos princípios da causalidade e da proporcionalidade.

Nos casos mais frequentes, em que o autor deduz uma pretensão líquida, consegue convencer o tribunal da existência dos pressupostos gerais de que depende a reconhecimento do direito, mas não reúne os elementos que permitam a sua quantificação na acção declarativa, terminando esta com a prolação de uma sentença de condenação genérica, carecida de posterior liquidação, a responsabilidade das custas relativas à acção declarativa deve ser provisoriamente repartida por igual entre o autor e o réu, sem prejuízo dos acertos necessários resultantes da liquidação posterior.

“O autor é parte vencida porque, apesar de formular um pedido concreto e determinado e de lograr provar factos de onde resulta o reconhecimento do direito a uma prestação (v.g. indemnização extracontratual para compensar os danos) não consegue obter total vencimento, por falta de prova dos factos relativos à quantificação dos prejuízos.

Mas também o réu não pode ficar afastado de parte da responsabilidade pelas custas da acção, pois que, opondo-se ao direito do autor, também deve ser considerado parcialmente vencido na acção declarativa, uma vez que é atingido por uma decisão condenatória, embora não quantificada.»[12]

Em consequência, na condenação ilíquida, porque a condenação em custas assume carater provisório, determinamos que as custas ficam a cargo da autora e do réu, em partes iguais, ficando o acerto final dependente dos resultados emergentes da liquidação posterior.

Sumário.

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IV.DELIBERAÇÃO:

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso interposto e assim, alterando a sentença recorrida na parte em que condenou o réu no  pagamento à autora da quantia de € 2.719, 86 (dois mil, setecentos e dezanove euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 20-07-2022, ambas até integral pagamento, à taxa de 4%, deliberam:

. condenar o réu-recorrente a pagar à autora-recorrida o  valor de € 16,30, ao qual acresce o  IVA à taxa legal (dois suportes Led Edm 30’’-60’’ ao preço unitário de € 8,17, acrescido de IVA) , acrescido dos juros legais desde a notificação para os termos da injunção (20-07-2022), até integral pagamento - (artigos 804º, 805º, n.º 1, al. a), 806º e 559º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril).

. condenar o réu a pagar à Autora a quantia que vier a apurar-se em incidente de liquidação de sentença, correspondente aos preços concretos das compras e vendas dos bens descritos nos nºs 1 a 5 do  item 2º A dos factos provados com os limites superiores aí fixados e em dívida, mais IVA, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, vencidos desde a data da decisão que proceda à liquidação do valor em dívida pela Ré,

confirmando a parte restante da sentença recorrida.

As custas do recurso, serão pagas:

. pelo recorrente no segmento em que foi confirmada a sentença recorrida e na parte da condenação líquida efectuada e

.pelas partes em partes iguais na condenação ilíquida, ficando o acerto final dependente dos resultados emergentes da liquidação posterior.


Porto, 07.03.2024
Francisca da Mota Vieira
António Paulo Vasconcelos
Ana Loureiro
___________________
[1] Cf. acórdão STJ, de 9.4.2019, Procº nº 4148/16.1T8BRG.G1.S1., acórdão STJ, 03.03.2021, Proc nº 157/17.8T8VFX.L1.S1, disponíveis em www.dgsi.pt .
[2] Cf. acórdão STJ, de 23.3.2017, Procº nº 7095/10.7TBMTS.P1.S1.
[3] Cf. acórdãos STJ, de 17.10.2017, Procº nº 1204/12.9TVLSB.L1.S1. e 10.9.2019, Procº nº 800/10.3TBOLH-8.E1.S2.
[4] Entre outros, acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 26.1.2017, Procº nº 8838/12.0T8BVNG.P2.S1:
[5] São estes os bens descritos na factura simplificada emitida a 11.04.2019: - uma sandwicheira Krea Inox,;uma varinha Moulinex c/picadora 750w 4 lâminas; um ferro Rowenta 2400W DW5112D1;um secador de cabelo Braun 2000W Iontec; um suporte Led Edm 30’’-60’’ fixo até 60 kg, preço unitário não inferior a € 8, 15; uma máquina de café Bosch Dolce Gusto Branca, por preço não inferior a € 14, 65, acrescido de IVA.
[6] Neste sentido, escreveu-se no AC deste Tribunal da Relação do Porto de 17.05.2022, no Proc nº 5631/18.0T8PRT.P1: “A emissão e apresentação de uma fatura, respeitante a um serviço prestado, não constitui apenas uma obrigação legal imposta pelos arts. 29º, nº 1, al. b) e 36º, nº 1 do Cód. do IVA, mas funciona também como uma condição de cuja verificação/preenchimento depende a exigibilidade do pagamento em causa.
O IVA recorta-se como um imposto cobrado por uns, mas suportado economicamente por outros. Daí o disposto nos referidos arts. 29º, nº 1, al. b) e 36º/1 do Cód. do IVA, segundo os quais [e sem prejuízo do disposto no art. 7º, nº 1, al. a) do mesmo diploma, de acordo com o qual o IVA é devido e torna-se exigível no momento da realização do serviço] a obrigação do pagamento deste imposto só nasce com a emissão do documento contabilístico competente, ou seja, da respetiva fatura.
A emissão obrigatória de fatura é assim uma condição legal de exigibilidade do IVA pela prestadora do serviço à utilizadora do serviço (que é quem deve efetivamente suportá-lo, sendo a contribuinte de facto).
Deste modo, conforme se sustenta no Ac. Rel. Coimbra de 16.12.2015 (proc. 162/12.4TBMDA.C1, relator Barateiro Martins, disponível in www.dgsi.pt.)[10] [11], “…não é apenas o IVA que não pode ser exigido sem prévia emissão e apresentação de factura (com os requisitos estabelecidos no art. 36.º/5 do CIVA), é antes toda a dívida, ainda em discussão, que não pode ser exigida (uma vez que, sendo o IVA exigível no momento de realização do serviço, a remuneração deste serviço não pode ser exigida sem ser exigido o respectivo IVA).”
A emissão obrigatória de fatura funciona pois como uma implícita condição legal (art. 270º do Cód. Civil), que, enquanto não for preenchida, determina não poder considerar-se vencida e exigível a obrigação[12] – respeitante à remuneração efetiva do serviço e ao correspondente IVA – havendo, por isso, lugar à aplicação do art. 610º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil.[13[
Como já se salientou, no caso “sub judice”, a autora não procedeu à emissão de fatura em nome da ré relativamente à remuneração do seu serviço e ao IVA respetivo, e por essa razão, haverá lugar à já referida aplicação do art. 610º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, devendo assim concretizar-se o pagamento por parte da ré apenas e só contra a apresentação da competente fatura.
[7] Estes dois últimos diplomas foram, entretanto, revogados, respetivamente, pelo artigo 54.º, al. b), do Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de outubro, e artigo 23.º, da Diretiva (UE) 2019/771 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de maio de 2019, mas, como resulta do disposto no artigo 53.º, n.º 1, do referido Decreto-Lei n.º 84/2021, o respetivo regime só se aplica às relações contratuais estabelecidas após a sua entrada em vigor, o que não é o caso, uma vez que, como vimos, a aquisição que qui está em causa é anterior.
[8] Cfr., para maiores desenvolvimentos sobre estas noções, João Sérgio Teles de Menezes Correia Leitão, “Contratos Civis, Comerciais e de Consumo – Uma Inquirição de Taxinomia”, in Estudos de Direito do Consumo, Vol. I, Almedina, págs601 a 626 e Nuno Manuel Pinto Oliveira, O Conceito de Consumidor, Estudos de Direito do Consumo, Vol. I, Almedina, págs. 473 a 514.
[9] Cf. Morais de Carvalho, Jorge Manual de Direito do Consumo, 6.ª ed., almedina, Coimbra,2019, p. 268 e ac. rel. Guimarães de 17/1/2019. Processo 201/15.7T8BAO.G1.
[10] Antunes Varela e Outros, in Manuel de Processo Civil, pág. 453.
[11] Cfr, entre outros, ac TRGuimarães, de 29.10.2020, in proc nº951/19.9YIPRT.G1.
[12] António Abrantes Geraldes (in Temas Judiciários, Vol. I, Almedina, pág. 240),