Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
117/18.5T9VLG.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA GUERREIRO
Descritores: CRIME DE FALSAS DECLARAÇÕES
DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE COMERCIAL
AUSÊNCIA DE PASSIVO
Nº do Documento: RP20240207117/18.5T9VLG.P2
Data do Acordão: 02/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL/CONFERÊNCIA
Decisão: PROVIMENTO PARCIAL
Indicações Eventuais: 1. ª SECÇÃO CRIMINAL
Área Temática: .
Sumário: I - Para o preenchimento dos elementos típicos do crime de falsas declarações p.p. pelo art. 348-A do CP basta que da declaração dissonante da realidade feita pelo agente se extraia um efeito jurídico.
II - No caso dos autos em que os arguidos conhecedores da proibição legal e da falsidade da sua declaração, afirmam perante funcionário em exercício de funções, que a sociedade comercial, de que eram os únicos sócios e que pretendiam dissolver, não tinha passivo, o que permitiu a passagem à partilha imediata, sem fase de liquidação nos termos do art. 147 do C. das Sociedades Comerciais, estão preenchidos os elementos típicos do crime de falsas declarações.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 117/18.5T9VLG.P2




1. Relatório

Nos autos de processo comum com julgamento perante Tribunal Singular que com o nº 117/18.5T9VLG correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal de Valongo, Juiz 2, foi em 25/09/2023, depositada sentença com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, e atentos os fundamentos de facto e de Direito invocados, julgo:
A. Procedente a acusação pública deduzida contra os arguidos AA e BB, em consequência do que decido condená-los, pela prática, em autoria material, de um crime de falsas declarações, previsto e punido pelo art. 348.º-A, n.º s 1 e 2 do Código Penal, nas seguintes penas:
a. O arguido AA, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), assim perfazendo um total de € 1.200,00 (mil e duzentos euros);
b. O arguido BB, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), assim perfazendo um total de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros).
B. Procedente o pedido de indemnização civil formulado por “A..., Lda.”, enquanto demandante cível, contra AA e BB, enquanto demandados cíveis, em consequência do que os condeno, ao abrigo do disposto no art. 82.º, n.º 1 do Código do Processo Penal, em montante a liquidar em execução de sentença.
Custas – criminais e cíveis – pelos arguidos, fixando-se a taxa de justiça em 6 (seis) UC – arts. 513.º e 514.º do Código de Processo Penal e art. 8.º do Regulamento das Custas Processuais, bem como art. 527.º do Código do Processo Civil ex vi art. 523.º do Código do Processo Penal.»
Inconformados vieram os arguidos recorrer desta decisão condenatória.
É o seguinte o teor das conclusões elaboradas no recurso conjunto dos arguidos:
« I - O tribunal “ a quo” não interpretou correctamente a norma do art.º 348.º-A, do CP e, a qual tem que ser vista e analisada à luz do preceituado art.97.º do Código do notariado, que em advertência refere: que “Os outorgantes são advertidos de que incorrem nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações perante oficial público se, dolosamente e em prejuízo de outrem, prestarem ou confirmarem declarações falsas, devendo a advertência constar da escritura.”
II - Desde logo, como o refere a matéria de facto dado como provada, no âmbito do processo de natureza cível que seus termos correu sob o processo nr.º 1527/18.T8VLG no Juízo Local cível de Valongo Juíz 1, que consta do teor recursório proferido pela 2.ª secção do Tribunal ad Relação do Porto, sob o processo nr.º 572/18.9T8VLG.P2 e ainda, dos presentes Autos recorridos, não só o teor decisório tece qualquer cumprimento sobre a obrigação do preceituado no art.97,º do Código do Notariado, como ainda, toda a fundamentação de facto, desde a prova testemunhal, aos Relatórios decisórios, ao processo injuntivo que deu origem ao título e à subsequente divida, enferma por um lado de contradições, designadamente quando se pretende imputar aos Arguidos os factos, como são omissos no que toca ao dolo e à intenção daqueles, como ainda, tem por pressuposto um titulo que é obtido à margem da lei.
III - De tal forma que um dos fundamentos do legal representante da Assistente para se eximir às responsabilidades pela imputação dos factos do arguido e recorrente AA, foi de que “ participou criminalmente contra os sócios da mesma, pelo crime de falsas declarações, pois não tinha conhecimento, nem tinha de o ter, que a gerência da sociedade era efetuada à revelia dos seus sócios.”
IV - O que tem implícito a falta de intenção que advém da falta de nexo de causalidade entre o denunciado e a imputação que àquele era pretenso a legal representante da assistente formular.
V - Inquiridos os Arguidos, das declarações prestadas pelo arguido AA, sócio da empresa, prestadas na sessão de 06.09.2023, acessíveis a partir do minuto 00.43.54, no ficheiro 20230906141541_15329189_2871601, resulta que não só desconhecia por completo ou sequer até tinha consciência do que declarou, apenas lhe tendo sido dado a conhecer que precisavam de ter declarado o que declarou para o encerramento da empresa. Sendo que os responsáveis pelas contas da sociedade, o gerente e o contabilista daquela, informaram aquele naquela data que poderia declarar o encerramento da sociedade, pois que não existiam activos e nem passivos.
VI - E, das declarações do Arguido BB, Das declarações prestadas pelo arguido BB, sócio da empresa, prestadas na sessão de 06.09.2023, acessíveis a partir do minuto 00.43.54, no ficheiro 20230906141541_15329189_2871601, resulta que não só desconhecia por completo ou sequer até tinha consciência do que declarou, apenas lhe tendo sido dado a conhecer que precisavam de ter declarado o que declarou para o encerramento da empresa. Sendo que os responsáveis pelas contas da sociedade, o gerente e o contabilista daquela, informaram aquele naquela data que poderia declarar o encerramento da sociedade, pois que não existiam activos e nem passivos.
VII - E, a legal representante da Assistente apenas veio sedimentar a prova sobre a ausência de conhecimento da intenção dos factos porque foram acusados, designadamente a pretensão dos arguidos em dolosamente e com as declarações prejudicarem ou mesmo até terem conhecimento que estavam a prejudicar terceiros.
“Dr. CC Agora outra coisa, a senhora... está recordada, portanto, também já disse aqui neste Tribunal que nem conhecia os filhos, nem conhecia... portanto, os arguidos que estão ali, nunca negociou nada com eles... DD Não, não. Dr. CC Os seus filhos também nunca negociaram nada com eles? DD Não, não. Dr. CC Foi sempre tudo com o pai? DD Com o senhor EE, tudo. Fiquei surpresa... Dr. CC Entre os gerentes... atuais da empresa, e os sócios... e os conhecimentos que eles têm contabilísticos. A senhora, da contabilidade, se eu lhe perguntar, o que é... o modelo 22, do IRC, a diferença entre o ativo e o passivo... a senhora tem esses conhecimentos? 0:06:10.3 DD Tenho, não tenho conhecimentos como funcionam. Não é? Dr. CC Não sabe como funcionam? DD Não é como..., sei o que... o que fazem, o que faz perante a lei, mas não sou capaz de pôr as coisas certas nas... nos sítios certos, é isso que eu quero dizer. As coisas certas, quer-se dizer, lá os valores, e as coisas que são adicionadas a isso. Dr. CC Isso não sabe, não é? DD Não... eu não sou contabilista.”
VIII - Salvo melhor opinião, o tribunal a quo não interpretou correctamente a norma do art.º 348.º-A, do CP, porquanto, por força desta norma, comete crime quem declara falsamente a autoridade pública ou a funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei atribua efeitos jurídicos, próprios ou alheios. B- As palavras “identidade”, “estado” e “qualidade” têm, na norma do art.º 348º-A do Código Penal, os seguintes sentidos - Identidade: “Conjunto de características, de dados próprios e exclusivos de uma pessoa, que permitem o seu reconhecimento como tal, sem confusão com outra, nome, idade, naturalidade, estado civil, filiação…”, “Circunstância de um indivíduo ser aquele que diz ser ou aquele que outrem presume que ele seja” ou “Circunstância de que um indivíduo é o mesmo que se pretende ou que se presume ser”; - Estado: “Modo de ser de uma pessoa, considerado na sua duração”, “Modo atual de ser (de pessoa)” ou “Situação, modo de ser, de uma pessoa”; - Qualidade: “Função exercida, título a que correspondem direitos e obrigações; condição social”, “Condição social, civil, jurídica, título…sob o qual as partes figuram num acto jurídico ou num processo”, “Aptidão”, “título, categoria”, “Condição social, civil, jurídica” ou “Modo de ser”. (v. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia de Ciências de Lisboa, Verbo, 2001, Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam. pt/dlpo/estado, consultado em 28-06-2016, e Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Cândido de Figueiredo, 1913, disponível em http://www.dicionario-aberto.net/dict.pdf).
IX - Os Arguidos não estavam pois imbuídos de nenhum daqueles sentidos atribuídos pelo artigo 348-A do C.Penal e, muito menos o tribunal recorrido deu como provado terem sido advertidos os arguidos, nos termos do que dispõe o art.97.º do Código do Notariado, de que incorrem nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações perante oficial público se, dolosamente e em prejuízo de outrem, prestarem ou confirmarem declarações falsas, devendo a advertência constar da escritura.
X - Não só não praticaram o facto como ainda, nem sequer tinham consciência de que estavam a prejudicar terceiros, faltando assim o elemento volitivo, por ausência do elemento subjectivo. Algo que é corroborado pela legal representante da Assistente que alega não conhecer o suficiente de contabilidade para sequer poder ajuizar sobre as contas ou as rúbricas onde aquelas se inserem.
XI - No caso em apreço, a qualidade indicada pelos os arguidos foi a sua identificação como sócios da sociedade B..., Lda e tal qualidade é real, verdadeira e não foi colocada em questão pela sentença recorrida. A conduta incriminadora imputada é o conteúdo das declarações prestadas pelos arguidos constantes da escritura de dissolução da sociedade B..., e estas não se referem a qualquer qualidade respeitantes aos sócios a que a lei atribua efeitos jurídicos, mas sim ao facto de a sociedade da qual faziam parte se encontrava saldada, isto é, sem qualquer activo ou passivo. A qualidade a que alude o art.º 348.º-A, do CP, reporta-se a uma função, condição, título ou categoria duradouros.
XII - E, as declarações contidas na escritura de dissolução da sociedade B..., Lda, encontram-se subtraídas à norma incriminadora daquele preceito penal, pois, como afirma António Latas, in As alterações ao Código Penal introduzidas pela Lei 19/2013 de 21 de Fevereiro, Revista do CEJ nº 1, 2014, deve entender-se como qualidade a que a lei atribui efeitos jurídicos quando: “está em causa o estado ou outra qualidade em que o próprio ou outra pessoa é tomada pela lei para determinado efeito jurídico (v.g. estado civil, nacionalidade, residência, maioridade, ser proprietário), o que não se confunde com afirmações do agente sobre factos concretos que não correspondam necessariamente àquelas qualidades típicas, ainda que deles, juntamente com outros, possam retirar-se conclusões sobre as mesmas.”
XIII - A sentença a quo ao condenar os Recorrentes como autores de um crime de falsas declarações, p.p. no art.º348-A, do CP, violou o disposto no art.º 1.º, n.1, do CP, na asserção de que “só pode ser punido criminalmente o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática”, bem como o princípio da legalidade, na asserção de que não há crime sem lei. O exame directo e livre efectuado pelo julgador aos documentos contabilísticos que acompanham a escritura de dissolução da sociedade B..., Lda, encontra-se subtraído à actividade do tribunal recorrido. O processo judicial é uma forma que se pretende equilibrada de chegar a uma decisão, e o exame realizado pelo tribunal recorrido, que sem conhecimentos científicos comprovados, ateste que nos documentos contabilísticos entregues para a realização de escritura de dissolução e encerramento da empresa dos Recorrente, existem dívidas aos sócios, não pode ter, salvo o devido respeito, valor pericial, pois para comprovar tal facto exigem-se conhecimentos muito específicos, conhecimentos técnicos e científicos específicos, subtraídos à livre apreciação da prova.
XIV - Para além de que os Recorrentes deveriam ter tido acesso a tais documentos para sobre aqueles se pronunciarem, por terem sido os mesmos apenas e só apresentados em julgamento e, meramente sujeitos a um “crivo” de opinião do Tribunal.
XV - A perícia como meio de prova, deve ou tem que ser produzido quando o processo e a futura decisão se defrontam com conhecimentos especializados que estão para além das possibilidades de constatação e/ou percepção, efectivas ou presumidas, do tribunal em três campos do saber, os técnicos, os científicos e os artísticos, como o caso dos autos em que se necessita de obter um juízo técnico e cientifico respeitante à contabilidade da sociedade junta na escritura de dissolução, conhecimentos que, ressalvado o devido respeito, o tribunal recorrido não dispõe. Pois, a ante complexidade característica de tais conhecimentos, é suposto que o tribunal seja adjuvado por quem reúna os conhecimentos e a credibilidade necessárias para verter, com conhecimento e neutralidade, em linguagem comum essa complexidade.
XVI - E, não pode o tribunal recorrido dar como provado, como o faz no ponto 9., dos factos dados como provados, que a sociedade B... devia, na data da sua dissolução, o valor de € 23.358,33, aos aqui Recorrentes, porque esse montante corresponde ao valor do capital próprio daquela e, o que se deve ao crivo e falta de conhecimentos técnicos do Tribunal e, a impossibilidade de sobre aqueles os Arguidos terem sequer tido hipótese de os contradizer (através de perícia naturalmente). E, essa afirmação e asserção de facto provado, entra em confronto directo até com os conhecimentos do homem médio, pois como é de conhecimento público e, que se afere de uma simples pesquisa, o capital próprio corresponde ao património líquido da empresa e subdivide- se em várias rúbricas, como o capital social, reservas, prestações suplementares e resultados transitados.
XVII - Não significa, por si só, tal como declarou e afirmou o a decisão recorrida, que o valor inscrito como capital próprio naqueles documentos contabilísticos são, nada mais nada menos, dívidas da sociedade B..., Lda, aos aqui Recorrentes. Sem expressar sequer o Tribunal se o capital próprio se refere até a meros “resultados transitados”. O exame realizado pelo tribunal recorrido aos documentos contabilísticos e as conclusões dele retiradas, estava-lhe vedado, por exigir a avaliação daqueles factos relevantes por quem possui especiais conhecimentos técnicos e científicos e sobre eles possa emitir um especial juízo técnico e científico. Ao não o ter feito e, ao valorar os meios de prova respeitantes ao exame directo efectuado pelo julgador para fundamentar positivamente aquela conclusão, ou os factos dados como provados, e se substituindo ao exame pericial, não podem as conclusões do exame directo efectuado pelo juiz a quo proceder, porquanto se encontram despidas de qualquer valor enquanto juízo técnico ou científico, por forma a atribuir a autoria dos factos aos ora Recorrentes.
XVIII - Nem pode o Tribunal a quo recorrer ao princípio da livre apreciação da prova, pelo simples exame directo daqueles documentos e contabilidade, pois ao fazê-lo está a violar o principio da verdade material e do in dúbio pro reo, bem como o próprio princípio da livre apreciação da prova, ao presumir tal conclusão ou factualidade e, ainda, ao dar essa factualidade como provada. Tanto mais que o juízo técnico e científico necessário nestes autos, para apurar da existência ou não de passivo na contabilidade da empresa detida pelos Recorrentes, presume- se subtraído à livre apreciação do julgador, nos termos do art.º 163º nº 1 do CPP, pois só a perícia visa a percepção e interpretação de factos importantes para a decisão da causa, em si mesmos considerados, e só ela goza da especial força probatória estabelecida no art.º 163º do CPP.
XIX - Uma vez que a prova pericial para comprovação de determinados factos que apenas podem ser observados ou compreendidos e valorados cabalmente, em virtude de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, que não é suposto encontrarem-se nos juízes e outros profissionais do foro, conforme decorre entre nós nos termos do citado art.º 151º do CPP, não foi realizada, resulta daí que o tribunal não possa julgar provado os factos em causa, mesmo que afirme a convicção de que o facto em causa se encontra suficientemente provado com base noutros elementos probatórios que, por definição, não assegurarão aqueles conhecimentos com o formalismo que a lei de processo exige no art.º 151 º e seguintes do CPP. E, ao inexistir prova pericial, não tem suporte probatório a consideração, pelo tribunal recorrido, de que existia qualquer dívida da sociedade B... a qualquer um dos seus sócios ou a qualquer terceiro.
XX - Até porque, opinando sobre elementos contabilísticos da sociedade, para os quais não tem qualquer conhecimento técnico, por outro lado, já o mesmo Tribunal e, de forma ostensiva, não opinou sobre os conhecimentos técnicos que possuiu, designadamente a não existência de convenção de preenchimento para obtenção do titulo injuntivo ou a não prossecução da execução contra os gerentes societários no âmbito do que dispõe o Código das Sociedades Comercias e ou, a fundamentação para sustar a execução, assim impedindo os Recorrentes de poderem ser citados e a execução prosseguir para aferir da substancia do que foi peticionado. E, embora tendo conhecimentos técnicos, também o Tribunal não opinou sobre a falta dos diversos títulos que a Assistente fundamentou o seu pedido por prática de alegado ilicito, a saber; a falta de factura que suporta o pedido de pagamento de honorários de mandatário (avença ou prestação de serviços…), a falta de titulo que fundamenta o pedido de pagamento de taxas de Justiça e de honorários de agente de execução e, em especial, a falta de titulo para a presente demanda criminal em sede de responsabilidade contratual e, com que estribou a demanda crime.
XXI - Assim, a falta da realização da perícia configura um vício que é de conhecimento oficioso e contido no art.º 410º, n. 2, al. a), do CPP, e que consubstancia a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. E, a valoração do que não pode valor por falta de conhecimentos técnicos e a omissão na valoração dos fatos jurídicos em apreciação, a violação do prIncípio Constitucional da Igualdade dos Cidadãos perante a lei e a violação do princípio Constitucional da Imparcialidade. Violações que ocorrem in casu, pois a matéria de facto provada, revela-se dessa forma, insuficiente para fundamentar a decisão de direito, pois o tribunal não investigou toda a matéria de facto com interesse para a decisão, para além de depreciar outra e, que tinha como valorar, o que se requer.
XXII - Os Recorrentes consideram, salvo melhor entendimento, que o Tribunal recorrido errou na apreciação da prova, ao dar como provados os factos vertidos nos pontos 8, 9, 10, 11, 12,13 e 14. No que respeita ao ponto 8 e 9, carecendo a apreciação da existência de passivo na sociedade B..., à data da realização da escritura, de especiais conhecimentos técnicos e científicos e, não tendo sido realizada a prova pericial nos termos do art.º 151º do C.P Penal, não poderia o tribunal a quo ter concluído pela existência de qualquer passivo naquela sociedade.
XXIII - Também errou o Tribunal ao dar como provados os pontos 10, 11, 12, 13 e 14 por os factos neles vertidos não resultarem de qualquer prova produzida, bem pelo contrário. No que se reporta à admissão dos factos vertidos nos pontos 8 e 9, tal não pode resultar da simples apreciação e livre convicção do julgador, pois que esta apreciação se lhe encontra vedada, dado que para análise da documentação anexa à escritura de dissolução da empresa B... especiais conhecimentos técnicos e científicos são exigidos, nos termos do art.º 151.º, do CPP e estes não foram realizados.
XXIV - E, mesmo que o tribunal afirme a convicção de que o facto em causa se encontra suficientemente provado com base noutros elementos probatórios, com base na livre apreciação da prova, este não pode julgar provados os factos em causa, pois aqueles conhecimentos não assegurarão, com o formalismo que a lei exige, o disposto no art.º 151.º, do CPP. Daí que, por inerência, tenha, sempre, de considerar-se que os factos vertidos nos pontos 10, 11, 12, 13 e 14, tenham de considerar-se como não provados.
XXV - Ainda, quanto ao ponto vertido no n.º 8, e atenta a consideração da factualidade vertida nos pontos 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26, não podem os Recorrentes deixar de os impugnar directamente, atento que a Assistente interpôs requerimento de injunção contra a sociedade B..., solicitando o pagamento de várias facturas, no qual indicou a existência de “domicílio convencionado”, que não existia entre as partes. E, fê- lo de plena má-fé, e, assim, criou naquele procedimento, uma formalidade de segurança de notificação inferior, pois a notificação do requerimento de injunção é efectuada mediante o envio de carta simples, remetida para o domicílio convencionado, considerando- se a notificação feita na pessoa do requerido, com o depósito da carta na caixa do correio deste, nos termos do art.º 12.º-A, do DL 269/98 e, não através de carta registada com aviso de recepção, sendo aplicável as disposições relativas à citação, nos termos do art.º 12.º, n.ºs 1 e 2, do mesmo regime jurídico
XXVI - Dessa forma, impediu o exercício de uma defesa ampla, plena e cabal dos Recorrentes naquele procedimento de injunção e muniu-se de um título executivo que padece de nulidade de notificação, por inobservância das formalidades legais prescritas na lei, nos termos do art.º 191.º, n.1, do CPC e que implica a falta do próprio título que se formou no procedimento de injunção, nos termos do art.º 726.º, n.2, al. a), 1ª parte e art.º 734, n.1, do CPC, tal como se afere do Ac. Do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 10.05.2016, no âmbito do processo 580/14.3T8GRD-A.C1, disponível no sítio www.dgsi.pt .
XXVII - Ao interpor acção executiva com base num título que padece de nulidade e, por tal não revestido de força executiva e na qual solicitou, no decorrer do mesmo, a suspensão da execução, impediu que, dessa forma, fossem citados os ora Recorrentes nos termos do art.º 1020.º, do Código Civil e das disposições constantes do art.º 162 e 163.º, do Código das Sociedades Comerciais, e dessa forma se pudessem opor e contraditar tanto à existência de formação de título executivo válido, como a não existência da dívida reclamada pela Assistente. Direito que foi vedado aos Recorrentes pela Assistente e que, agora, serve para os incriminar, sem que para isso tenha existido um processo justo e equitativo com a possibilidade plena de defesa no processo cível, bem como não foi discutido no âmbito do enxerto cível nos presentes autos. E, sem que exista uma sentença que se pronuncie sobre a existência ou não de tal dívida e a existência de título executivo válido para interpor a acção executiva, o que impede a formação de caso julgado material, pois não houve qualquer exercício do princípio do contraditório, no âmbito cível, pela dedução de embargos de executado e sua apreciação pelo julgador e, que impede o douto tribunal recorrido de formar a sua convicção sobre esse facto e, ao apreciar matérias que lhe estavam vedadas por carecer de conhecimentos técnicos, não apreciando aquelas que deveria, num manifesto “venire contra factum próprio da Assistente” como demonstrado, violou o Tribunal recorrido, entre outros os princípios Constitucionais da Igualdade, da Imparcialidade e, do Direito a uma Decisão Justa.
XXVIII - Do confronto das declarações prestadas pela testemunha FF e DD, resulta manifesta contradição, tal como descrito nas motivação, porquanto enquanto o primeiro refere que o material que foi entregue pela sociedade B... e avaliado por este e, já a sua mãe e gerente da Assistente indica que quando as peças lhe foram entregues esta já sabia que a empresa já não laborava há 3 meses, ou seja desde Junho de 2017 e que o material foi avaliado foi, afinal, avaliado pelo Sr. EE e não pelo SR. FF, sócio da Assistente. Da mesma forma se retira, pela figura e experiência do homem médio, que a Assistente negociou a entrega das mercadorias com o gerente da B..., sabia bem que aquele era o único património de que dispunham, pelo que não crível a qualquer cidadão colocado na posição do legal representante da empresa B..., a saber que conseguiria vender a mercadoria que tinha em stock por valor bem superior a qualquer outra entidade, o entregasse à Assistente, por apenas € 1.722,00, e esta análise não foi apreciada pelo tribunal a quo, nem sequer foi tida em conta, tendo até servido, no sentido oposto para dar como provado o facto vertido no ponto n.º 8.
XXIV - RR- Das declarações prestadas pela agente de execução GG, na sessão de 29.01.2019, a partir do minuto T_00.33.17, resulta que esta, alegadamente, não podia citar os sócios, aqui Recorrentes, porquanto, como o processo seguia a forma sumária e tinha de haver penhora prévia à citação, e só depois de concretizada a penhora é que podia encetar as diligência tendentes à citação, o que não é verdade, pois após a verificação da dissolução da sociedade por parte da agente de execução e da sua comunicação ao mandatário da Assistente, poderia, a Assistente ter requerido, nos termos do art.º1020, do CC, a habilitação dos sócios, na alegada dívida reclamada bem como poderia a agente de execução, ter dado cumprimento aos termos do disposto no art.º 750.º, do CPC. Da produção do depoimento da gerente da Assistente, DD resultou, ainda, tal como transcrito na motivação, que esta não sabia que havia interposto um processo crime aos Recorrentes, porquanto as ordens eram para a sociedade B..., na pessoa do Sr. EE, pois que era este que a Assistente conhecia e com quem mantinha relações comerciais, e foi efectuada com uma procuração datada de 2015.
XXX - O que leva a concluir que a Assistente não pretendia agir criminalmente contra os ora Recorrentes mas sim contra o seu pai, e fê-lo nos presentes autos como forma de pressionar o pagamento de uma dívida que bem sabe não existir. Assim, e salvo melhor entendimento, consideram os recorrentes que os factos vertidos nos pontos 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, bem como os pontos n.º 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26, devem ser declarados como não provados.
XXXI - No que respeita ao pedido de indemnização cível os Recorrentes consideram que o tribunal recorrido não dispunha de matéria de facto suficiente que lhe permitisse concluir pela sua condenação pela prática de facto ilícito e pela sua condenação genérica no pedido de indemnização. A acção civil enxertada nos presentes autos não tem por objecto a indemnização por perdas e danos emergentes do facto do crime imputado, mas sim um alegado incumprimento contratual resultante, segundo a Assistente, do não pagamento das facturas juntas aos autos. Crédito este que que a Assistente, apesar de fraudulentamente obter título executivo e, impedir os Recorrentes e a sociedade B... de contraditar tanto título como o alegado crédito, optou sempre por não cobrar, por não dar andamento aos autos tal como lhe competia.
XXXII - Embora a Assistente refira que teve danos com os comportamentos que imputou, o que é certo é que no discorrer da sua alegação configura o seu pedido de indemnização na base do incumprimento contratual que refere ter existido pela sociedade B..., bem como até faz referência aos juros de mora, frutos civis, resultantes daquele alegado incumprimento, “pelo atraso no pagamento”, e solicita o pagamento dos juros de mora, não desde a data da prática do ilícito penal que imputa, mas sim do vencimento da obrigação que indica nas facturas que juntou aos autos. O título executivo reporta-se aos danos indemnizáveis, de acordo com as normas referentes à responsabilidade contratual, ou seja, ao valor das facturas que Recorrida alega não terem sido pagas, acrescido dos juros de mora desde o vencimento da obrigação e dos juros vincendos até integral pagamento e, bem como nas despesas com as taxas de justiças e honorários de agente de execução e do seu mandatário, e a natureza da obrigação e das prestações cuja falta se alega, e a natureza da obrigação e das prestações cuja falta se alega não se altera pela interposição de um processo crime.
XXXIII - O dever de pagamento alegado pela Assistente não radica na prática do crime mas na relação contratual estabelecida anteriormente, até anterior à prática do alegado ilícito imputado aos Recorrentes, que lhe é anterior e subsiste, e só paralelamente lhe é atribuída dignidade penal. BBB- A determinação indemnizatória cível em processo penal deverá ter sempre a sua fonte num acto ilícito, pois que não é legalmente admissível que em sede de processo penal o tribunal criminal se pronuncie sobre uma responsabilidade fundada numa outra genética que não a da responsabilidade civil extracontratual, ou seja, a da responsabilidade civil do agente pelos danos que, com a prática do crime causou, pois que a acção cível que adere ao processo penal é a que tem por objecto a «indemnização por perdas e danos emergentes do crime», e só essa, nos termos dos art.º 128º e art.º 129, ambos do CP.
XXXIV - Face ao disposto no art.º 129.º, do CP importa salientar que a indemnização de perdas e danos, ainda que emergente de crime, deixou de constituir um efeito penal para passar a ser regulada pela lei civil, assumindo, pois, a natureza de uma obrigação civil em sentido técnico, nos termos do art.º 397.º, do CC, com o seu regime específico. Pois, a fonte o dever de indemnizar de que se conhece em processo penal é o facto ilícito, nos termos do art.º 483.º, do CC, e não a relação contratual ou outra similar. Sendo como é, de natureza contratual a indemnização solicitada pela demandante Recorrida, esta é completamente alheia ao processo penal e à competência dos tribunais criminais. Pelo que, deve ser declarada a incompetência do tribunal recorrido, em razão da matéria, para apreciar o pedido de indemnização civil formulado, o que constitui uma
excepção, de conhecimento oficioso pelo tribunal e que deve conduzir à absolvição da instância dos ora Recorrentes. Devendo ainda ser a Assistente condenada por conduta processual imprópria, como se constata no denominado “venire contra factum próprio”
Concluem pedindo que na procedência do presente recurso seja proferido Acórdão que revogue a decisão recorrida.
O presente recurso foi admitido por despacho proferido em 30/10/2023.
O MP em primeira instância respondeu ao recurso expressando o seu entendimento no sentido de que a decisão proferida se encontra devidamente fundamentada e optou pela solução mais plausível segundo as regras da experiência comum e a própria lógica, em obediência ao princípio plasmado no artº 127 do Código de Processo Penal. Considera que os factos provados suportam completamente a decisão de direito e não se deteta qualquer contradição entre os factos julgados provados e não provados, na fundamentação ou entre esta e a decisão.
Conclui que não merece qualquer reparo a apreciação que o tribunal ad quo fez dos elementos de prova carreados para os autos, analisando-os de forma conjunta, como um todo persuasivo que acabou por fundamentar a sua convicção, não se detetando na sentença recorrida quaisquer dos vícios enumerados no art. 410 nº 2, do CPP.
Pugna pela improcedência do recurso e total confirmação do decidido quer no que respeita à parte crime como cível.
Nesta Relação o Sr. Procurador-geral-adjunto manifesta a sua concordância com os argumentos da sentença recorrida alegando que pela fundamentação da matéria de facto constante da sentença recorrida, também ficou convencido que nenhuma dúvida se suscitou ao Tribunal de que ambos os recorridos tinham praticado os factos pelos quais tinham sido acusados.
Entende que uma realidade é a que resulta da decisão recorrida quanto à matéria de facto que indiscutivelmente integra o ilícito em questão e outra é a visão dos arguidos do que deveria constar da matéria de facto.
A final subscreve a resposta do MP em primeira instância e emite parecer no sentido do não provimento do presente recurso.
Cumprido o disposto no art. 417 nº2 do CPP vieram os recorrentes responder ao parecer alegando em síntese que impugnam a matéria de facto e, as erróneas, insuficientes ou contraditórias conclusões sobre uma não realizada peritagem da contabilidade da sociedade “B...”, bem como uma não participação dos arguidos na elaboração das contas e ainda, nas contas apresentadas pelo contabilista e aprovadas pelo gerente e, entidades que previamente às declarações que os arguidos produziram, os informaram que as contas da sociedade estavam saldadas.
Impugnam também a condenação no pedido de indemnização cível, por não caber ao Tribunal concluir sobre o que não era objeto da causa e muito menos sobre a subjetividade na apreciação das contas que foram apresentadas para o encerramento da empresa e, da valoração ou apreciação daquelas das rúbricas e, por quem não tem competência, o Tribunal.
Nada tendo recebido os arguidos e recorrente na liquidação da “B..., lda” qualquer benesse e, tendo existido um acordo entre o gerente da “B...” e os agora representantes da sociedade lesada, a “A..., lda” (pelos filhos da legal representante daquela à data), face ao disposto no art.º 129.º, do CP, importa salientar que a indemnização de perdas e danos, ainda que emergente de crime, não só deixou de constituir um efeito penal para passar a ser regulada pela lei civil, assumindo, pois, a natureza de uma obrigação civil em sentido técnico, nos termos do art.º 397, do CC, com o seu regime específico.


2. Fundamentação

A - Circunstâncias com interesse para a decisão:
Pelo seu interesse para a decisão a proferir passamos de seguida a transcrever a sentença recorrida no que respeita à decisão sobre a matéria de facto e respetiva motivação:

«2. Dos factos
2.1 Matéria de facto provada
Da discussão resultaram provados os seguintes factos, que doravante se elencam por referência às peças processuais de referência nos autos, expurgadas de factualidade irrelevante para a descoberta da verdade material, tal qual delimitada pelo libelo acusatório, bem como de juízos conclusivos ou de Direito:
1. Os arguidos eram os sócios da sociedade comercial “B..., Lda.”, sedeada na Rua ..., ..., em Valongo, cujo objecto social se prendia com o comércio por grosso e a retalho de peças e acessórios para veículos automóveis.
2. Ambos, à data da constituição daquela, igualmente residindo naquela morada, assim como o respectivo gerente nomeado, EE, progenitor de ambos.
3. Tendo intervindo no contrato de sociedade como sócios, em função da impossibilidade de EE o ser, mercê da sua declaração de insolvência.
4. Em 27/10/17, os arguidos dirigiram-se ao Cartório Notarial de Valongo, onde compareceram como outorgantes em escritura pública, nesta declarando “sob a sua inteira e exclusiva responsabilidade [serem] os únicos sócios [daquela] sociedade comercial”(sic) e deliberando “dissolver a referida sociedade” (sic).
5. Relativamente à qual declararam “não [ter] qualquer activo ou passivo a partilhar, pelo que a [consideravam] completamente liquidada a partir [desse dia], data em que foram encerradas e aprovadas as respectivas contas” (sic).
6. Assim como que designavam o arguido AA como “fiel depositário de todos os livros, documentos e haveres da sociedade, bem como representante para efeitos tributários” (sic), mais tendo “manifestado a sua vontade que [o registo comercial obrigatório] fosse promovido na sequência [desse] acto” (sic).
7. Nessa esteira, havendo sido lavrado registo da dissolução e encerramento da liquidação, assim como averbado o cancelamento da sua matrícula.
8. Àquela data, a sociedade “B..., Lda.” devia à assistente a quantia de € 9.379,08 (nove mil, trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), o que originou a instauração do processo de execução que, com o n.º 25336/17.8T8PRT, correu termos pelo Juízo (J9) de Execução do Porto.
9. Assim como devia aos arguidos, enquanto seus únicos sócios, a quantia de € 23.358,33 (vinte e três mil, trezentos e cinquenta e oito euros e trinta e três cêntimos).
10. Podiam os arguidos prever que, ao declararem que a sociedade comercial de que eram os únicos sócios não tinha qualquer activo ou passivo a partilhar, assim a considerando liquidada, relatavam facto dissonante da realidade, possibilitador do registo da dissolução e encerramento da liquidação daquela e do cancelamento da sua matrícula, em documento exarado por autoridade pública.
11. Com o que eximiriam a mencionada sociedade do pagamento da quantia devida à assistente, beneficiando a primeira e prejudicando a segunda.
12. Como previram e com o que se conformaram, agindo de comum acordo e em comunhão de esforços.
13. Sabiam ser tal conduta proibida e punida por lei.
14. Não obstante o que não deixaram de actuar como na realidade actuaram, agindo livre e conscientemente.
15. O arguido AA é solteiro; reside com os seus progenitores em casa destes; estuda e trabalha a tempo parcial como nutricionista, com o que aufere um rendimento mensal de € 30,00 (trinta euros); completou a licenciatura em ciências da nutrição.
16. O arguido BB é casado; reside com a sua mulher e um filho com quinze meses de idade em casa própria, para cuja aquisição contraiu empréstimo, que amortiza mensalmente no montante de € 277,00 (duzentos e setenta e sete euros); trabalha como supervisor de limpeza, com o que aufere um rendimento mensal de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros); a sua mulher labora como enfermeira, em razão do que percebe um vencimento de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) por mês; amortiza igualmente empréstimo contraído para a aquisição de veículo automóvel, no que despende a quantia de € 199,00 (cento e noventa e nove euros) por mês; completou o 12.º ano de escolaridade.
17. Não lhes são conhecidos antecedentes criminais.
Mais se apurou, com relevo para a descoberta da verdade e boa decisão da causa:
18. Em 14/09/17, pela assistente, enquanto requerente, foi apresentado requerimento de injunção no Balcão Nacional de Injunções contra a sociedade “B..., Lda.”, enquanto requerida, solicitando o pagamento de uma quantia global de € 12.181,30 (doze mil, cento e oitenta e um euros e trinta cêntimos).
19. Fundamentando essa sua pretensão no fornecimento de mercadorias no âmbito das respectivas actividades comerciais, titulado por facturas emitidas no período de 07/02/17 a 14/09/17, sem que as mesmas houvessem sido liquidadas.
20. No que a assistente despendeu, a título de taxa de justiça, o montante de € 102,00 (cento e dois euros).
21. Do que a requerida foi notificada por via postal simples, com prova de depósito em receptáculo datada de 25/09/17.
22. Em 27/10/17, foi conferida força executiva a esse requerimento de injunção, na sequência do que, em 28/11/17, foi apresentado requerimento executivo, visando a cobrança coerciva da discriminada quantia.
23. No que a assistente despendeu, a título de taxa de justiça, o montante de € 25,50 (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos).
24. Em 11/12/17, a Sra. AE nomeada naqueles autos de execução, notificou a assistente, na pessoa do seu Ilustre Advogado, quanto ao “resultado das buscas da fase 1” (sic), na mesma “[alertando] para o facto de a sociedade [se encontrar] extinta com a matrícula cancelada” (sic).
25. Em 06/12/17, aquela Sra. AE emitiu em nome da assistente a factura-recibo n.º ...16, respeitante a “honorários fase 1” (sic), no total de € 74,97 (setenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos).
26. Em 29/01/19, o Ilustre Advogado da assistente emitiu em nome desta a factura-recibo n.º ...51, respeitante a “adiantamento por conta de despesas e honorários processo B..., Lda.” (sic), no total de € 700,01 (setecentos euros e um cêntimo).
27. Em 08/01/18, “A..., Lda.” Participou criminalmente contra AA, BB e EE, imputando-lhes a prática de factos que, em seu entender, integram o cometimento, em co-autoria material, de um crime de falsas declarações, previsto e punido pelo art. 348.º-A, n.º s 1 e 2, do Código Penal.
28. Em 20/08/18, o arguido AA intentou contra DD e “A..., Lda.” acção de processo comum, peticionando a declaração de violação dos seus direitos de personalidade com indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, a qual, sob o n.º 1527/18.9T8VLG, correu termos no Juízo (J1) Local Cível de Valongo do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, a qual, por sentença proferida em 15/08/22 e transitada em 30/03/23, foi julgada improcedente.
Não resultaram provados ou não provados, com interesse para a discussão da causa, quaisquer outros factos, e, assim, nomeadamente, por referência à contestação apresentada nos autos, na medida em que não resultam necessariamente prejudicados pelos factos provados, que os arguidos solicitassem a dissolução da sociedade estribados nos documentos que lhes foram fornecidos por contabilistas, da sociedade “B..., Lda.” ou da assistente e nas informações que lhes foram prestadas pelo gerente daquela, assim como que desconhecessem a existência de qualquer dívida da sociedade de que eram sócios para com a assistente.

2.2. Fundamentação da matéria de facto
2.2.1. Considerações preliminares
O Tribunal formou a sua convicção com base na análise crítica do conjunto da prova produzida, cotejada com as regras da experiência comum e da normalidade social, tendo sopesado as declarações prestadas pelos arguidos – que, tendo optado pelo silêncio aquando da primeira audiência de julgamento, se decidiram a prestar declarações na segunda das mesmas –, os depoimentos produzidos pelas testemunhas inquiridas em Juízo – apenas tendo sido reinquirida à factualidade repetidamente em dilucidação a testemunha arrolada em sede de contestação, DD – e os documentos juntos aos autos com pertinência para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, nos moldes que doravante se expõem. Na precisa medida em que a referida testemunha não relatou factos directos de que tivesse conhecimento susceptível de relevar para a conformação do elemento subjectivo do ilícito em causa – tão-só se permitindo dar conta da sua experiência pessoal enquanto gerente de uma sociedade e, nessa medida, “[assinar] mediante explicação” (sic) os documentos apresentados pela contabilidade, de entre os quais as actas anuais de aprovação de contas – permitir-nos-emos reproduzir o essencial dos depoimentos oportunamente perfilhados em Juízo, anteriormente ao que nos determos, mercê da sua novidade, nas declarações desta feita prestadas pelos arguidos.

2.2.2. Da prova produzida em audiência de julgamento
O arguido AA afirmou documento algum referente à sociedade “B..., Lda.” haver assinado, excepção feita à escritura de dissolução e liquidação daquela; confrontado com a cópia do respectivo pacto social, reconheceu a sua assinatura no mesmo aposta e recordou-se de assim ter procedido na sua própria casa – justificou a sua falta de memória com o facto de, à data, contar com dezoito anos e nada se lhe ofereceu replicar, quando esclarecido acerca da circunstância de necessariamente a ter manuscrito em local diverso. Igualmente convocou uma tal idade em ordem a fundamentar o seu então desconhecimento do que seria uma sociedade, reputando que apenas quando perfez vinte e quatro ou vinte e cinco anos se inteirou do respectivo significado. Aduziu não ter lido a escritura pública em questão – constituindo facto notório que lhe foi lida –, cujo “título” (sic) inclusive, ignorava, sabendo, porém, que “estava lá escrito” (sic) que “não havia qualquer implicação negativa” (sic) de pôr termo à sociedade. Revelou sequer conhecer o contabilista da “B..., Lda.” e jamais ter assinado uma acta societária. Instado, respondeu que, embora residindo com os seus progenitores, e, assim, com o gerente EE, jamais ouviu comentários acerca de problemas financeiras que a empresa atravessasse.
O arguido BB argumentou ter-lhe sido dito que “o sócio-gerente tem o ónus e o bónus” (sic), razão pela qual se desinteressou da sociedade. Referiu que o seu contabilista tinha o respectivo local de trabalho no mesmo edifício onde funciona a Conservatória onde assinou a escritura pública de encerramento e liquidação, já que “[lhe disseram] que não havia dívidas” (sic). Recusou alguma vez ter assinado uma qualquer acta da “B..., Lda.” e admitiu saber que o seu progenitor EE, gerente daquela, se encontrava insolvente, tendo sido essa a razão em homenagem à qual figurou no pacto social como sócio. Instado sobre a sua nomeação como fiel depositário, entre o mais, dos elementos da contabilidade, respondeu ignorar o seu paradeiro.
Em sede de acusação pública, foram arrolados como testemunhas FF e HH, respectivamente, sócio e contabilista da assistente, cujos depoimentos se nos afiguraram como sérios e consequentes, assim como coerentes entre si e no confronto com a prova documental carreada para os autos (cfr. infra), em razão do que mereceram credibilidade por parte deste Tribunal. Com efeito, a testemunha FF assumiu-se como o responsável pelo departamento comercial da assistente, afirmando ter esta deixado de manter o relacionamento comercial existente com a sociedade “B..., Lda.”, mercê do incumprimento, por parte da mesma e a partir de meados de 2017, dos prazos de pagamento das facturas emitidas; acrescentou ter a assistente chegado a vender àquela sociedade alguns bens do seu comércio a pronto pagamento. Reputou EE como sendo o gerente da sociedade “B..., Lda.”, o mesmo tendo sido contactado, por via electrónica e pessoalmente, a propósito da dívida paulatinamente contraída, no valor aproximado de € 10.000,00 (dez mil euros); referiu que aquele se predispôs a abater parte da mesma – que não a sua totalidade – através da entrega de stock – explicando reportar-se-lhe a factura junta a fls. 368, no montante de € 1.722,00 (mil, setecentos e vinte e dois euros) –, quanto ao remanescente, pretendendo a sua liquidação faseada em prestações no valor de € 50,00 (cinquenta euros) – esclarecendo que essa proposta não vingou, porquanto EE se negou a subscrever um documento que garantisse o pagamento em falta na íntegra. Instado acerca da discriminada factura, asseverou que viu o descrito “material diverso” (sic) – que exemplificou como filtros, correias e tensores – ter sido entregue por EE nas instalações da assistente. A testemunha HH corroborou a deterioração do relacionamento comercial entre a assistente e a sociedade “B..., Lda.” relacionado com falhas nos pagamentos; a intervenção de EE nos destinos desta como seu gerente; a solicitação, por parte do mesmo, no sentido de dar stock para abater parte da dívida contraída; a frustração do acordo respeitante à sua liquidação faseada; a notícia da dissolução daquela sociedade após o encaminhamento do incumprimento ao contencioso.
Em sede de contestação, foram inquiridas DD, sócia e gerente da assistente, GG, AE nomeada nos autos de execução movidos pela assistente à sociedade “B..., Lda.”, e II, mãe dos arguidos. Apenas a última logrou auxiliar na descoberta da verdade, pois que a testemunha DD relatou o quanto havia já sido noticiado pelas testemunhas FF e HH, ao passo que a testemunha GG se limitou a enunciar a sua intervenção enquanto AE nomeada no âmbito do processo executivo movido pela assistente contra a sociedade “B..., Lda.”, conforme decorrente de documentos juntos aos autos – a saber, as cópias de requerimento executivo de fls. 376 e seguintes, de notificação de fls. 383 e de consultas de bases de dados de fls. 384 e seguintes –, na certeza de a inexistência de citação da requerida se ancorar em disposições legais, quais sejam o art. 855.º, n.º 3 do Código do Processo Civil e o art. 160.º, n.º 2 do CSC.
Diferentemente, a testemunha II deu a conhecer o circunstancialismo fáctico caracterizador da sociedade “B..., Lda.”, com o que possibilitou um melhor enquadramento da narração do libelo acusatório. Na verdade, afirmou que essa sociedade era gerida por EE, seu marido e progenitor dos seus filhos, estes tendo “dado o seu nome” enquanto sócios por virtude da impossibilidade daqueloutro em trabalhar à conta da sua insolvência; precisou que a sociedade deixou de laborar em Maio de 2017, dada a falta de clientes. Assumiu ter sido EE quem lhe transmitiu que a entrega do stock se reportava à amortização integral da dívida, que esse stock representava a totalidade do activo e que inexistiam dívidas que obstaculizassem ao encerramento da sociedade. Disse ter sido a própria quem procedeu à descarga daquele nas instalações da assistente – pormenor em que não incutiu convencimento, uma vez que garantiu sequer ter chegado à fala com alguém da assistente nessa ocasião, o que, convocados os ditames da normalidade do acontecer, se nos revelou destituído de plausibilidade; retenha-se que não exercia qualquer função na sociedade e que era necessária a avaliação do dito stock. Aventou que os arguidos ignoravam a vida societária, tendo-se apresentado na Conservatória para efeitos de dissolução da sociedade com fulcro no que lhes foi transmitido pelo contabilista – cuja identificação não providenciou, cingindo-se à sua localização na rotunda onde se situa o Serviço de Finanças de Valongo, onde abundam prestadores de serviços –, a própria admitindo não ter observado a documentação que aquele, para esse fim, preparou, assim como não terem os arguidos colocado qualquer questão aquando da leitura da escritura pública. Instada, respondeu que os arguidos eram maiores de idade aquando da constituição da sociedade, sendo sabedores da insolvência do seu progenitor; não ter memória de uma qualquer acta respeitante à actividade societária; ignorar a consideração contabilística de um empréstimo, por parte de um daqueles, no balancete junto pelos próprios e reportado a Dezembro de 2016.
Entendeu este Tribunal revestir-se de inutilidade o recurso ao disposto no art. 340.º do Código do Processo Penal por forma a inquirir o predito EE, na precisa medida em que o mesmo havia sido arrolado como testemunha em sede de contestação e o seu depoimento, na ocasião, prescindido, inculcando a convicção que, não pretendendo discorrer acerca dos factos com que fosse confrontado, se recusaria legalmente a depor, enquanto progenitor dos arguidos.
Documentalmente, retiveram-se:
a. O print de certidão permanente de matrícula da assistente de fls. 95 a 97 – comprovativo do seu objecto social, assente no comércio de acessórios para a indústria auto; da qualidade de sócios de JJ, DD, KK e FF; da qualidade de gerentes de JJ e DD;
b. O print de certidão permanente de matrícula da sociedade “B..., Lda.” de fls. 98 a 100 e de fls. 483 a 486– comprovativo da localização da sua sede social na Rua ..., ..., Valongo; das qualidades de sócios dos arguidos e de gerente de EE; da residência de todos estes, à data da respectiva constituição, na referida Rua ..., ..., Valongo; da respectiva dissolução e encerramento da liquidação, assim como da aprovação das contas, em 27/10/17, tendo sido nomeado como depositário o arguido AA, entretanto residente na Rua ..., Valongo; do cancelamento oficioso da correspondente matrícula;
c. As cópias de facturas de fls. 101 a 343, emitidas pela assistente à sociedade “B..., Lda.”, a primeira apresentando, como datas de emissão e vencimento, respectivamente, 07/02/17 e 05/04/17, e a última, como datas de emissão e vencimento, respectivamente, 31/05/17 e 05/07/17 – cujo teor não foi impugnado, donde, comprovativas da venda, pela assistente à sociedade “B..., Lda.”, de bens inscritos nos correspectivos objectos sociais;
d. As cópias de notas de crédito de fls. 344 a 367, emitidas pela assistente à sociedade “B..., Lda.”, a primeira apresentando, como data de emissão e vencimento, 07/02/17, e a última apresentando, como data de emissão e vencimento, 31/08/17 – cujo teor não foi impugnado, donde, comprovativas do abatimento, pela assistente à sociedade “B..., Lda.”, de quantias respeitantes a facturas anteriormente emitidas;
e. A cópia de factura de fls. 368, emitida pela sociedade “B..., Lda.” à assistente, apresentando como data de emissão e disponibilização dos bens a que se reporta, 15/09/17, do seu descritivo constando a indicação de “material diverso”, este no valor de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros) sem IVA – cujo teor não foi impugnado, donde, comprovativa da disponibilização de bens inscritos nos correspectivos objectos sociais por parte da sociedade “B..., Lda.” à assistente, para abatimento ao valor da dívida da primeira para com a segunda; sendo certo ter apenas sido questionado o alcance desse abatimento, reputando-o a assistente como parcial e os arguidos como integral, convenceu-se este Tribunal, perante a prova testemunhal produzida, quanto ao mérito da alegação da assistente;
f. A cópia de peças processuais atinentes ao requerimento de injunção e sua instrução apresentado pela assistente contra a sociedade “B..., Lda.” de fls. 369 a 375 – comprovativa do recurso por parte da assistente a esse procedimento judicial em 14/09/17; do englobamento das facturas juntas aos presentes autos no correspectivo pedido; do pagamento de taxa de justiça no valor de € 102,00 (cento e dois euros); da notificação daquela sociedade na sua sede social, por via postal simples, com prova de depósito em receptáculo datada de 25/09/17; da aposição de força executiva em 27/10/17;
g. A cópia de peças processuais atinentes à execução judicial movida pela assistente contra a sociedade “B..., Lda.” na sequência da aposição da força executiva ao referido requerimento de injunção e falta de pagamento por parte da requerida de fls. 376 a 393 – comprovativa do recurso por parte da assistente à acção executiva para cobrança coerciva daquele seu crédito; do pagamento de taxa de justiça no valor de € 25,50 (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos); das pesquisas efectuadas pela Sra. AE nomeada para efeitos de penhora de bens; da informação pela mesma prestada à assistente no sentido de não a haver logrado e de aquela sociedade se encontrar extinta e a sua matrícula cancelada; dos honorários cobrados à assistente no valor de € 74,97 (setenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos); da legitimidade do Ilustre Advogado da assistente para a sua representação em Juízo, o que expressamente consignamos face a questões suscitadas pela defesa, nomeadamente acerca da sua datação, apenas se nos oferecendo afirmar tratar-se de uma procuração forense absolutamente regular e válida, destinando-se o seu conteúdo genérico a habilitar aquele a intervir, como na mesma se exara, “em qualquer pleito em que [a assistente] seja parte” (sic), enquanto não seja objecto de revogação;
h. A cópia da escritura pública de dissolução de sociedade de fls. 418 e seguinte – comprovativa da comparência dos arguidos no Cartório Notarial de Valongo em 27/10/17, da sua qualidade como outorgantes e do teor das declarações que prestaram para efeitos de dissolução, liquidação e cancelamento da matrícula da sociedade “B..., Lda.”;
i. A factura-recibo de fls. 549 – comprovativa do recebimento, por parte do Ilustre Mandatário da assistente de um adiantamento desta por conta das despesas e honorários no âmbito dos presentes autos, no valor de € 700,01 (setecentos euros e um cêntimo); expressamente consigamos, face a questões suscitadas pela defesa, termos como prática habitual por parte dos Senhores Advogados a não exigência do pagamento integral dos seus serviços anteriormente a estes serem prestados na sua totalidade, conforme sucede no caso vertente;
j. O print do balancete geral da sociedade “B..., Lda.” referente a Dezembro de 2016 de fls. 550 a 552 – comprovativo dos valores do activo e do passivo a uma tal data;
k. Os prints da prestação de contas da sociedade “B..., Lda.” objecto de depósito na Conservatória do Registo Comercial de fls. 582 a 610 e da IES referente ao exercício de 2017 apresentada a título de declaração do período de cessação de fls. 620 a 676 – comprovativos, no cotejo com os demais elementos contabilísticos carreados para os autos, da existência de activo e passivo aquando da outorga da escritura de dissolução e liquidação daquela;
l. A certidão da acção de processo comum n.º 1527/18.9T8VLG, intentada pelo arguido AA contra DD e “A..., Lda.”, cujos termos correram termos no Juízo (J1) Local Cível de Valongo do Tribunal Judicial da Comarca do Porto de fls. 1035 – comprovativa da sua improcedência;
m. A cópia do contrato de sociedade por quotas de fls. 1073 e seguintes – comprovativa, entre o mais, da constituição da sociedade “B..., Lda.” em 13/06/21, na Conservatória do Registo Comercial do Porto / CFE e com o reconhecimento presencial das assinaturas dos arguidos.
Ainda do ponto de vista documental, não foram considerados:
i. Os prints da folha de rosto da IES referente ao exercício de 2016 de fls. 553 e da declaração de IRC da referente ao exercício de 2016 de fls. 554 a 559 – inidóneas à comprovação da existência ou não de passivo à data da outorga da escritura de dissolução e liquidação daquela, em 27/10/17;
ii. A cópia de articulado de arguição de nulidade apresentado por EE no âmbito dos autos de execução n.º 25336/17.8T8PRT, cujos termos correm Juízo (J9) de Execução do Porto de fls. 568 a 570 – consubstanciando questão cível a ser decidida no âmbito dos mesmos e cujo conhecimento não contende com o objecto dos presentes autos;
iii. A cópia da sentença de extinção da lide executiva proferida no âmbito dos autos de execução n.º 25336/17.8T8PRT, cujos termos correm Juízo (J9) de Execução do Porto de fls. 680 e seguinte – consubstanciando questão cível decidida no âmbito dos mesmos e cujo conhecimento não contende com o objecto dos presentes autos;
iv. A cópia de articulado de contestação oferecido pela assistente e DD e de petição inicial apresentada pelo arguido AA no âmbito dos autos declarativos n.º 1572/18.9T8VLG, cujos termos correm no Juízo (J1) Local de Valongo do Tribunal Judicial da Comarca do Porto de fls. 681 verso a 731 e de fls. fls. 732 a 743 – consubstanciando questão cível a ser decidida no âmbito dos mesmos e cujo conhecimento não contende com o objecto dos presentes autos; expressamente consignamos ter a junção da referida petição inicial sido requerida por este Tribunal por forma a apurar da existência de uma eventual litispendência, concluindo-se negativamente.
2.2.3. Da convicção acerca da prova assim produzida
Neste conspecto, e uma vez que a apreciação concertada da prova produzida se desdobrou em dois momentos, a saber, a análise propriamente dita dos meios de prova e as ilações retiradas da sua concatenação, permitir-nos-emos adoptar a mesma linha de raciocínio, desta feita atendendo ao teor das declarações prestadas pelos arguidos e à melhor concretização do tipo subjectivo de ilícito. No que directamente contende com o desfecho da lide cível que o arguido AA intentou contra a assistente e DD, salvo melhor opinião, não vislumbramos que o teor da respectiva sentença – ademais de improcedência – seja idóneo a questionar a incursão dos arguidos na comissão do ilícito por que vêm acusados.
Com efeito, e tendo sido suscitado por parte do Ilustre Advogado dos arguidos – entre o mais na argumentação que esgrimiu em sede de alegações finais, assim, como no exercício de direito de defesa subsequente à comunicação da alteração não substancial dos factos descritos na acusação – impor-se nestes autos, entre o mais, a consideração de um dos factos na mesma dados como provados – qual seja, o de que os arguidos produziram a declaração cuja falsidade ora se discute a pedido do seu progenitor e gerente da sociedade –, oferece-se-nos dizer que, ainda que os arguidos assim o houvessem peremptoriamente asseverado nas declarações que prestaram na segunda das audiências de julgamento – o que se não verificou –, uma tal realidade, por si só, não os eximiria de incorrerem na prática do crime em questão, havendo que indagar – como o fizemos na sentença anteriormente proferida e o faremos na presente – da sua ciência acerca da falsidade da declaração que prestaram. Observe-se que o facto inscrito no elenco da alteração não substancial dos factos descreve de forma objectiva e fidedigna os contornos da lide cível, sendo os arguidos, que não este Tribunal, quem preconiza “resultar [daquele facto] uma imagem que põe em causa a defesa” (sic, cfr. o art. 30.º da exposição de fls. 1079 e seguintes). Igualmente se diga que “o reenvio parcial dos autos para novo julgamento relativamente aos factos constantes dos números 8 (oito) a 14 (catorze) da matéria de facto provada, a ter lugar após o trânsito da decisão que [viesse] a ser obtida nos autos de natureza cível (…) (sic, cfr. o acórdão prolatado pelo Venerando TRP de fls. 832 e seguintes, a fls. 852), se bem interpretámos a decisão superior, visou o “apuramento de tais factos e para obstar a decisões judiciais contraditórias” (sic, cfr. o acórdão prolatado pelo Venerando TRP de fls. 832 e seguintes, a fls. 851), realidade diversa da pretendida inculcar pelos arguidos, na precisa medida em que, salvo melhor opinião, não pode o julgador em processo crime importar acriticamente a convicção do julgador em processo cível para efeitos da sentença que irá proferir, pois que formada de forma necessariamente diversa e em obediência a ritualismo processual diferenciado, do que constitui exemplo paradigmático a distribuição do ónus da prova. Deste modo, e ainda que este Tribunal pretendesse integrar o facto em causa na presente decisão, nos precisos moldes em que consta da sentença cível, quedaria por deslindar os contornos em que se deu o “(…) pedido do seu pai (…)” (sic, cfr. a sentença cível de fls. 1035 e seguintes, a fls. 1038) susceptíveis de relevarem em contexto criminal. Na realidade, e sabendo-se as diversas formas de que se pode revestir a autoria, a alegada circunstância de os arguidos terem prestado as declarações insertas na escritura pública de encerramento e liquidação a solicitação da testemunha EE, por si só, não os exime de responsabilidade criminal, sob pena de imediata desconsideração por parte das instâncias penais quanto ao julgamento da prática de crimes a pedido de outrem. Por fim, acrescentaremos termos inscrito no elenco da alteração não substancial dos factos os contornos da pendência dos presentes autos por motivos de contextualização no que respeitou à pendência da lide cível, entre o mais, por haver sido entendido no acórdão prolatado pelo Venerando TRP impor-se o trânsito em julgado da sentença proferida naquela última anteriormente ao início do novo julgamento.
Sequer se evidenciando controvertidos os factos de os arguidos serem os únicos sócios da sociedade “B..., Lda.” e de a gerência desta ser assumida por EE, seu progenitor, importa, antes do mais, operar a destrinça entre tais qualidades. Por sócio, deve entender-se a pessoa que detém uma parte ou a totalidade da participação social de uma organização, afinal, e de forma que se pretende simplista, o proprietário ou dono da sociedade; já o gerente é a pessoa nomeada pelo sócio para desenvolver a actividade da sociedade, mormente no sentido de, por via da mesma, ser obtido lucro, conspecto em que explicita o art. 259.º do CSC dever o gerente praticar os actos que forem necessários ou convenientes para a realização do objecto social, com respeito pelas deliberações dos sócios. Exemplificativas desta distinção são, de resto, as previsões do seu art. 246.º – em cujos termos, entre o mais, depende de deliberação dos sócios a destituição de gerentes e a responsabilização destes, designadamente por via da propositura de acções, pela sociedade, contra os mesmos – e do art. 252.º do CSC – em consonância com a qual a sociedade é administrada por um ou mais gerentes, designados ou eleitos pelos sócios. Realce-se não alcançarmos o sentido da argumentação esgrimida pelos arguidos em sede de exercício do seu direito de defesa na sequência da comunicação da alteração não substancial dos factos operada no sentido de os arguidos sequer serem gerentes de Direito (cfr. o art. 11.º da exposição de fls. 1079 e seguintes), assim como – desde já o consignaremos – não alcançamos a razão de ser da convocação da suposta intenção por parte da legal representante da assistente no sentido de que “que quem deveria estar como arguido era o gerente e não os filhos daquele (…)” (sic, cfr. o art. 12.º da exposição de fls. 1079).
Neste seguimento, e repristinando o referido art. 246.º do CSC, [depende] de deliberação dos sócios, para além de outros actos, a dissolução da sociedade, em razão do que, no caso dos autos, necessariamente incumbiria aos arguidos, que não ao gerente EE, acordarem na dissolução da sociedade “B..., Lda.” e comparecerem como outorgantes na respectiva escritura pública, assumindo aquela sua qualidade de sócios e dando conta daquela sua deliberação. Havendo os arguidos, nesse âmbito, declarado, “sob a sua inteira e exclusiva responsabilidade”(sic), não ter a referida sociedade “qualquer activo ou passivo a partilhar, (…) [considerando-a] completamente liquidada a partir [desse dia]” (sic), considerou o Ministério Público, enquanto titular da acção penal, tratar-se da narração de um facto falso, pois que, à data dessa declaração, existia uma dívida daquela sociedade para com a assistente, donde, passivo. Nesta imputação se surpreendendo delimitado o objecto dos presentes autos, competia a este Tribunal pronunciar-se, posteriormente à prova tida por pertinente, em sentido afirmativo ou negativo, fundamentando a sua convicção; o mesmo é dizer, jamais constituiu – ou constitui – incumbência nossa, pronunciarmo-nos quanto aos contornos dessa alegada dívida, e, assim, com relação a muitas das questões suscitadas pela defesa, porquanto idóneas a serem apreciadas em sede diversa, a saber, no âmbito dos processos de jurisdição cível que se divisam convocados neste, casos dos autos de execução n.º 25336/17.8T8PRT e dos autos declarativos n.º 1572/18.9T8VLG. Questão diversa – e que, com aqueloutras, salvo melhor opinião, se não confunde – prende-se com a consideração, enquanto meio de prova, da actividade processual desenvolvida em torno da alegada dívida, por forma a deslindar da falsidade ou não da declaração, prestada pelos arguidos, relativa à inexistência de activo e de passivo, por parte da sua sociedade, à data da escritura pública em questão.
Vejamos.
Demonstram a existência de uma dívida da sociedade “B..., Lda.” para com a assistente, não apenas as facturas juntas aos autos, como as decisões jurisdicionais a seu respeito tomadas. Com efeito, intentou aquela, fundando a sua pretensão na falta de pagamento dessas facturas, um requerimento de injunção, no qual foi aposta força executiva; do mesmo passo, e com fulcro nessa realidade processual, cuidou a assistente de apresentar requerimento executivo, visando a cobrança coerciva do montante devido pela sociedade “B..., Lda.”, desiderato que se frustrou ante a constatação da sua dissolução e liquidação, já que, após o cancelamento da correspondente matrícula que se lhe seguiu, aquela deixou de ter existência jurídica. Ora, o facto de este Tribunal ter convocado depreender dos prints da prestação de contas e da IES apresentada a título de declaração do período de cessação depositados na Conservatória do Registo Comercial a inscrição de um crédito por parte dos sócios no valor de € 23.358,33 (vinte e três mil, trezentos e cinquenta e oito euros e trinta e três cêntimos), do teor daquelas não resultando ter sido atempadamente regularizado, e, nessa esteira, ter ajuizado poder conceder-se que, sendo esses sócios os arguidos, se tivessem considerado ressarcidos pela sociedade – ressarcimento esse que, todavia, não encontra repercussão em documento algum apresentado aquando do encerramento daquela, sequer consta da escritura pública que outorgaram em ordem à sua dissolução e liquidação, mais se entendendo, salvo o devido respeito, que os arguidos não poderiam emitir a correspondente quitação a todo o tempo, pois que a sociedade “B..., Lda.” se extinguiu com o cancelamento da matrícula subsequente à referida escritura pública –, mais do que um qualquer exercício probabilístico, afigurou-se-nos como facto revelador de uma outra irregularidade ao nível das contas da sociedade à qual os arguidos não poderiam ser alheios, precisamente por constar expressamente da documentação de que se fizeram acompanhar na sua deslocação à Conservatória.
O mesmo é dizer, dúvidas inexistindo quanto à dívida contraída para com a assistente – tanto bastando para a produção de uma declaração falsa como infra cuidaremos de explicitar com acrescido rigor –, socorremo-nos de semelhante realidade por forma a concluirmos pelo tipo subjectivo de ilícito, perspectivando-se-nos inverosímil que o comum dos cidadãos se aventurasse a afirmar a inexistência de activo e de passivo de uma sociedade de que é gerente, ainda que de mero Direito, para efeitos de escritura pública com o escopo do seu encerramento e liquidação, quando – por observação directa e independente do mais elementar conhecimento contabilístico – o impresso da prestação de contas que apresentaram no Cartório Notarial salta à vista o valor de 23.358,33, inscrito na coluna subordinada ao “total do passivo” (sic). Por outras palavras, o comum dos cidadãos, dotado de senso comum e sentido de responsabilidade pelos seus actos, constataria não se tratar de um documento zerado, como seria expectável – repetimo-lo, aos olhos do homem médio, conhecedor elementar de matemática e ignorante de contabilidade –, não podendo ignorar a ostensividade de uma inscrição de uma quantia no campo destinando ao passivo. Observe-se que idêntico raciocínio faríamos se uma qualquer quantia se encontrasse aposta na coluna relativa ao activo, na precisa medida em que o ora discutido se prende com uma declaração de inexistência de activo e de passivo.
Não foi, de facto e conforme sustentado pelos arguidos, “realizada qualquer prova pericial aos documentos contabilísticos da sociedade “B..., Lda.” (cfr. o art. 4.º da exposição de fls. 1079 e seguintes), ante a sua manifesta desnecessidade para concluirmos da forma predita, pois que o que releva, quanto a nós, é a percepção do homem médio e avisado por referência a um documento não zerado que apresenta numa Conservatória e com fulcro no qual produz a declaração de inexistência de activo e de passivo, que não a do conhecedor das normas contabilísticas – não podendo deixar de notar-se serem os arguidos quem escalpeliza a razão de ser do valor inserto como dívida aos sócios (cfr. os arts. 5.º a 7.º da exposição de fls. 1079 e seguintes). Deste modo, bastando a comprovada dívida para com a assistente para concluir pela existência de passivo aquando da outorga da escritura pública de dissolução e liquidação da sociedade “B..., Lda.”, mais se conclui que os arguidos, perante Sra. Notária e em ordem a ser exarado em escritura pública, declararam facto juridicamente relevante desconforme à realidade. Esclareça-se que a falsidade desse facto assenta na peremptoriedade da afirmação em que se consubstancia, qual seja, a de que a sociedade não tem – de todo em todo, permitimo-nos acrescentar – passivo, o que se não compadece, por a excluir, com a discussão de uma dívida, controvertendo-a, conforme esgrimido pela defesa relativamente à verba reclamada pela assistente.
Resta, pois, apurar da ciência dos arguidos quanto à atestada falsidade.
Tendo os mesmos alegado, em sede de contestação, que se apresentaram no Cartório Notarial de Valongo para dissolverem a sociedade “(…) estribados nos documentos que lhes foram fornecidos pelo contabilista (…)” (sic, cfr. o seu art. 10.º) e nas “(…) informações que lhe foram prestadas pelo gerente da sociedade (…)” (sic, cfr. o seu art. 13.º), a verdade é a de que, em Juízo, apenas o arguido BB aduziu que lhe “disseram que não havia dívidas” (sic). Não concretizando quem assim lho houvesse veiculado, mas intuindo-se, dado ter feito uso do plural, que se reportasse ao contabilista da sociedade “B..., Lda.” e ao gerente EE, seu progenitor, tivemos como estranhamente lacónicas as referências ao primeiro, apenas se logrando apurar ter o seu local de trabalho numa das rotundas principais de Valongo, na qual se concentram dezenas de prestadores de serviços; por outro lado, foram os arguidos quem prescindiu do depoimento da testemunha EE, que arrolaram na mencionada peça processual, o qual – atrevemo-nos a dizer – seria a pessoa indicada para auxiliar na descoberta da verdade, mormente dando conta do que teria ou não transmitido aos arguidos quanto à saúde financeira da sociedade. Retenha-se ainda que a testemunha II, sua mãe e mulher de EE, revelou um conhecimento tão só indirecto desse facto – e, como tal, desconsiderado –, referindo ter sido aquele último quem transmitiu à própria – que não, necessariamente, aos arguidos –, a inexistência de dívidas que obstaculizassem ao encerramento da sociedade, assim como a afectação do stock a que se reconduz a factura pela mesma emitida ao abatimento integral da dívida existente para com esta. Detendo-nos nestoutro particular, sublinhe-se que a sua emissão em 15/09/17 e o seu enquadramento preconizado pela defesa – precisamente no sentido de a assistente se ter dado como integralmente ressarcida com a entrega daquele stock –, pressupõe, desde logo, o reconhecimento da existência de uma dívida para com aquela, já que, a assim não suceder, não faria sentido a configuração daquela entrega como uma forma de a ressarcir. Acresce que a versão da defesa não encontra arrimo documental, como seria exigível e expectável, inexistindo nos autos uma qualquer nota de crédito ou um documento de quitação que permitam concluir pelo apregoado acerto de contas, do mesmo modo que esbarra nos ditames da lógica e na demais prova produzida, pois que, a conceder-se o suposto abatimento integral, a assistente ter-se-ia quedado, numa dívida que ultrapassa os € 9.000,00 (nove mil euros), com pertences avaliados em € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros), ou seja, com menos de um quinto do montante de que era credora. Repita-se, por constituir argumentação sistemática dos arguidos, terem sido instruídos pelo contabilista e pelo gerente da sociedade “B..., Lda.”, afinal, o seu próprio progenitor (cfr. os arts. 15.º e 16.º da exposição de fls. 1079 e seguintes): quanto ao primeiro, apenas referências estranhamente vagas foram disponibilizadas pelos arguidos, sequer lhe apontando um nome, deste modo sequer permitindo equacionar a sua convocação para comparecer em Juízo por forma a contribuir para a descoberta da verdade material; quanto ao segundo, optou por não depor, direito que, à luz da sua relação de filiação lhe assistia, mas que precludiu a este Tribunal a possibilidade de indagar das sustentadas instruções, e, até, vir a conhecer a identificação daqueloutro profissional.
Ora, reconduzida a defesa dos arguidos ao seu processo volitivo, é consabido que “a prova do dolo e da consciência da ilicitude dificilmente se alcança de forma directa, a não ser por confissão, e, por isso, há que proceder à conjugação da demais factualidade julgada provada com as regras da experiência comum e do conhecimento da vida para se poder concluir pela prova daqueles”, razão pela qual “além da confissão do arguido, o único meio de prova que realmente satisfaz a necessidade de provar o dolo é a prova indiciária (ou prova indirecta)” (cfr. o Ac. do TRP de 10/11/21, in www.dgsi.pt). O mesmo é dizer, legitima-se o recurso às regras da experiência a que se reconduz o art. 127.º do Código do Processo Penal para alcançar a verdade material, no pressuposto de que “livre apreciação (…) não significa (…) apreciação arbitrária, mas apreciação pautada pelas regras da experiência e a estas conforme”, dispondo o saber humano “de certezas emergentes do id quod plerumque accidit” (cfr. o Ac. do TRP de 20/12/11, in www.dgsi.pt) e sendo consabido que “entre os meios de prova admissíveis em processo penal, o tribunal pode socorrer-se de presunções judiciais ou máximas da experiência inspiradas nos juízos correntes de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana” (cfr. o Ac. do TRL de 14/05/15, in www.dgsi.pt).
Assente esta premissa, o primeiro facto a trazer à colação prende-se com a qualidade em que os arguidos intervinham na sociedade “B..., Lda.”, sabendo serem os seus únicos sócios. É do conhecimento do homem médio que ser, afinal, dono de uma sociedade acarreta direitos e deveres que lhe são indissociáveis, ainda que a sua gestão no quotidiano esteja a cargo de outrem, cuja esfera de actuação se cinge a essa actuação no dia-a-dia; é do conhecimento do homem médio serem os sócios quem se há-de manifestar nos momentos de maior importância da vida societária, e, deste modo, na sua criação e extinção; é do conhecimento do homem médio que as sociedades têm como escopo o lucro, para obtenção do qual se relacionam comercial e financeiramente com terceiros; é do conhecimento do homem médio que a decisão de encerrar uma sociedade se reveste de particular relevância, pois que importa que estejam reunidas as condições que o permitam, de entre estas avultando a inexistência de dívidas; é do conhecimento do homem médio que declarações produzidas em Conservatórias se revestem de especial solenidade, inculcando um tal local a respectiva seriedade e o escrito a que são reduzidas dotado de importante significado, desde logo porque merecedor da sua leitura em voz alta.
Tudo, o que os arguidos, maiores de idade à data da constituição da “B..., Lda.” e instruídos em termos de escolaridade, não podiam desconhecer, no caso concreto sendo ainda comprovadamente sabedores de duas outras realidades relevantes, quais sejam, a de que o endereço da sede social coincidia com o da casa de morada de família e a de que EE – progenitor de ambos, donde, pessoa necessariamente próxima, a dada altura todos residindo no mesmo local – não podia figurar como sócio em razão da sua insolvência, esta sua particular condição, e independentemente dos laços de filiação, lhes impondo acrescida atenção, já que indiciadora de que se debatera com problemas de ordem financeira expressivos – mais sendo conhecimento do homem médio, e, assim, dos arguidos, que apenas dívidas com uma significativa dimensão acarretam um estado de insolvência. Por outras palavras, talqualmente acima notado, o comum dos cidadãos, que não o conhecedor profundo de contabilidade, cuidaria de se assegurar da correspondência de declaração de inexistência de activo e passivo que produzisse, por referência a sociedade de que fosse sócio, em plena Conservatória e com o fito de a encerrar e liquidar, deste modo lhe pondo termo definitivo.
Não colhe, por conseguinte, o absoluto desconhecimento dos arguidos quanto à existência de passivo; ademais, uma simples passagem de olhos pelas duas primeiras folhas do impresso da prestação de contas, do qual se muniram para apresentação no Cartório Notarial, configuraria o bastante para se questionarem acerca dos valores inscritos nos quadros identificados como activo e passivo – no primeiro se exarando o valor de 0,00, mas, no segundo, o valor de 23.358,33, inscrito na coluna subordinada ao “total do passivo” – estando em causa documento não zerado – idóneo a inculcar no homem médio, destituído de conhecimentos de contabilidade, que poderia existir um passivo naquele montante. Não obstante tal percepção, prosseguiram os arguidos com a dissolução e liquidação da sociedade, conformando-se com a possibilidade de declararem um facto inverídico destinado a constar de um documento como uma escritura pública, cientes que, esse facto assim declarado não era inócuo, antes se traduzindo numa petição de princípio que, permitindo a extinção da sociedade como ente jurídico, se traduziria – ainda que o tipo dispense a efectiva ocorrência de um dano – em prejuízo para os seus credores, ao não mais a poderem demandar ou prosseguir com a sua demanda tendo em vista a liquidação do quanto lhes era devido. Realce-se que a escritura pública nestes moldes outorgada lhes foi “lida em voz alta e explicado o seu conteúdo” (sic), na mesma expressamente se exarando que a declaração produzida o era “sob a sua inteira e exclusiva responsabilidade”(sic). Donde, a ilação de que representaram a realização de um facto que preenche o tipo como consequência possível da sua conduta e, não obstante, actuaram, conformando-se com aquela realização, no que se divisa o seu dolo, conquanto que eventual.»
B- Fundamentação de direito
É pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
No caso concreto as questões suscitadas pelos recorrentes são as seguintes:
1ª) Impugnação da matéria de facto e violação do princípio da livre apreciação da prova.
2ª) Subsunção dos factos provados ao tipo legal de falsas declarações.
3ª) Aferir sobre a responsabilidade civil emergente dos factos.
Cumpre apreciar!
1ª) questão
Os tribunais da Relação conhecem de facto e de direito nos termos do disposto no art. 428 do CPP.
Porém, o modelo de recurso em processo penal português, não é o da repetição do julgamento, mas da sindicância do juízo decisório da matéria de facto efetuado pela primeira instância, no sentido de verificar se houve ou não erro de julgamento na apreciação/valoração das provas.
Os recorrentes impugnam os factos provados sob os pontos 8, 9, 10, 11, 12,13 e 14 porquanto entendem que a apreciação da existência de passivo na sociedade B..., à data da realização da escritura carecia de especiais conhecimentos técnicos e científicos e não tendo sido realizada qualquer perícia, face ao disposto no art. 151 do CPP não poderia o Tribunal ter concluído que a sociedade em causa tinha passivo.
Dispõe o citado art. 151 do CPP que : «A prova pericial tem lugar quando a percepção ou a apreciação dos factos exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos.», estando o juízo técnico emergente da prova pericial subtraído à livre apreciação do julgador, exceto quando seja devidamente fundamentada a divergência quanto ao mesmo. - art. 163 nºs 1 e 2 do CPP.
Porém, e no caso concreto, a apreciação e apreensão de que a sociedade de que os arguidos eram os únicos sócios, tinha um passivo de € 23.358,33. à data de 27/10/2017, resulta evidente da ultima Informação Empresarial simplificada, referente ao período anterior à escritura de dissolução da Sociedade e que se encontra junta aos autos, - não requerendo quaisquer conhecimentos especiais, de qualquer ciência ou arte -, mas antes os básicos de leitura e compreensão de escrita. Nessa quantia de € 23.358,33 inclui-se a divida à assistente constante do ponto 8 da matéria de facto provada, pelo que, para rigor deve ser corrigido o teor do ponto 9 da matéria de facto assente no sentido de fazer aí constar que o total do passivo existente em 27/10/2017 era de 23.358,33 (vinte e três mil, trezentos e cinquenta e oito euros e trinta e três cêntimos).
Aqui chegados podemos concluir que face aos documentos juntos aos autos, para afirmar a existência de passivo à data da dissolução da sociedade, não são necessários especiais conhecimentos profissionais e científicos, mas apenas cultura geral que deve presumir-se no Juiz de julgamento, como na generalidade das pessoas instruídas e com experiência de vida, e nos próprios arguidos cuja escolaridade é elevada, sendo um deles licenciado.
Em rigor a prova pericial não deve ser levada a efeito em casos em que é evidente a sua não essencialidade para a descoberta da verdade material, - sendo por isso desnecessária -, ou tenha finalidades meramente dilatórias da marcha processual.
Sobre este ponto veja-se a anotação ao art. 151 do Código de Processo Penal, Comentários e notas práticas dos Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, Ed. Coimbra Editora, 2009.
Pelo exposto conclui-se que a prova pericial a que aludem os recorrentes não se mostra necessária no caso em apreciação, pelo que, a impugnação da matéria de facto com base em que tal prova não existiu nos autos, não procede.
Nesta medida também não se vislumbra o invocado vício de insuficiência da matéria de facto para a decisão, já que o texto da sentença recorrida contém todos os elementos necessários para proferir decisão.
Na verdade, nos termos do disposto no art. 127 do CPP a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente só podendo ser sindicada e alterada quando essa convicção seja desrazoável ou contrária a outros meios de prova que os recorrentes concretamente não indicaram.
Os recorrentes impugnam os factos constantes dos pontos 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26 invocando vícios e irregularidades internas do processo de injunção que não fazem parte do objeto deste recurso, não competindo a este tribunal conhecer de vícios que tenham ocorrido noutras lides, pelo que, tal impugnação também não pode proceder.
Aqui chegados e face à inexistência de prova que impusesse decisão diversa da tomada em primeira instância improcede a impugnação da matéria de facto, porém e face ao regime legal quanto à dissolução e extinção de sociedades impõe-se retirar da matéria de facto provada o constante do ponto 11, por se tratar de uma ilação contrária ao disposto nas normas legais sobre tal matéria como adiante melhor se explicará.
2ª questão:
Consideram os recorrentes que o tribunal a quo não interpretou corretamente a norma do art. 348-A, do CP, a qual tem que ser vista e analisada à luz do preceituado art.97 do Código do notariado.
Sobre o enquadramento penal da conduta dos arguidos passamos a transcrever o que consta da decisão recorrida:
«Dispõe o art. 348.º-A, n.º 1 do Código Penal que quem declarar ou atestar falsamente à autoridade pública ou a funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei atribua efeitos jurídicos, próprios ou alheios, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal. Acrescenta o seu n.º 2 que se as declarações se destinarem a ser exaradas em documento autêntico o agente é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa.
Percorrendo a Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 75/XII (acessível em www.app.parlamento.pt), que conduziu ao aditamento da incriminação em apreço ao Código Penal, constatamos ter sido intenção do legislador “clarificar o tipo do crime de falsa declarações, que deixa de se confinar às declarações recebidas como meio de prova em processo judiciário, ou equivalente, passando a constituir ilícito criminal igualmente as falsas declarações que sejam prestadas perante autoridade pública ou funcionário público no exercício das suas funções e se destinem a produzir efeitos jurídicos”, mas, igualmente, a de dar “conteúdo normativo às múltiplas remissões feitas na legislação avulsa para este tipo de crime”. O bem jurídico assim visado salvaguardar contende, pois, com “a tutela da integridade da função administrativa nas suas diversas manifestações e da capacidade funcional da administração, exercida em conformidade com as exigências de legalidade e objectividade que num Estado de Direito devem presidir às funções públicas”, já que “ao declarar ou atestar falsamente identidade, estado ou outra qualidade própria ou de terceiro, o agente induz a autoridade ou funcionário a quem se dirige a praticar acto objectivamente viciado nos seus pressupostos, pondo em causa a própria administração e a sua imprescindibilidade para a realização ou satisfação de finalidades fundamentais, indispensáveis em qualquer sociedade organizada” (António Latas, “As Alterações ao Código Penal introduzidas pela Lei 19/2013 de 21 de Fevereiro”, in www.tre.mj.pt/docs). Como característica mais relevante deste tipo de ilícito, cumpre reter a sua configuração como crime de perigo abstracto, na medida em que a consumação prescinde de um resultado decorrente da conduta, antes se bastando com a mera actividade; em causa estão, pois, comportamentos cuja tipificação assenta na sua perigosidade típica para o bem jurídico em homenagem ao qual se erige a incriminação.
Integram o respectivo tipo objectivo o acto de declarar ou atestar com falsidade, a qualidade do quanto se declara ou atesta – a identidade, o estado ou qualquer outra a que a lei atribua efeitos jurídicos – e a entidade perante a qual se declara ou atesta – autoridade pública ou funcionário no exercício das suas funções; no caso concreto do n.º 2, mais se exige um especial destino da declaração ou atestado – a sua exaração em documento autêntico. Numa sua concretização, podemos afirmar que declarar significa manifestar, verbalmente ou por escrito, um facto, ao passo que atestar corresponde ao acto de alguém confirmar um determinado acto cuja demonstração se pretende; em ambas as hipóteses, importa que haja falsidade, não no sentido de adulterar o suporte físico da declaração ou atestado (falsidade material), mas de fazer inscrever no mesmo um facto dissonante da verdade. Por outro lado, importa que essa narração inverídica se atenha a determinadas qualidades, discriminadas no tipo, sendo de associar a qualidade a que lei atribua efeitos jurídicos a um facto juridicamente relevante, a avaliar segundo critérios objectivos e sendo suficiente a sua “aptidão para formar uma convicção de factores co determinantes”(Miguez Garcia e Castela Rio, Comentário Penal, Parte Geral e Especial, Almedina, 2014, 1178). Finalmente, urge que o destinatário da declaração ou atestado se integre nos conceitos de autoridade pública ou de funcionário no exercício das suas funções, a densificar de acordo com o disposto no art. 386.º do Código Penal. Debruçando-nos sobre a previsão do n.º 2 da incriminação, o documento autêntico por excelência é aquele que, conforme ensina o art. 363.º, n.º 2 do Código Civil, se mostra exarado com as formalidades legais pelas autoridades públicas, nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividades que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública, sendo certo que, de acordo com o art. 35.º, n.º 2 do Código do Notariado, são autênticos os documentos exarados pelo notário nos respectivos livros, ou em instrumentos avulsos, e os certificados, certidões e outros documentos análogos por ele expedidos.
Subjectivamente, encontramo-nos na presença de um crime doloso, em qualquer uma das suas modalidades: impõe-se que agente saiba que está a declarar ou atestar uma qualidade – a identidade, o estado ou outra a que a lei atribua efeitos jurídicos – falsa, o mesmo é dizer, que o conteúdo da sua declaração ou atestado não corresponde à verdade; que o faz perante uma autoridade pública ou funcionário no exercício das suas funções – não sendo de exigir uma qualquer advertência no sentido de, ao assim proceder, poder incorrer na prática de um crime; e, na hipótese do n.º 2, que a falsidade se destina a ser inscrita em documento autêntico. Deste modo, pode o agente representar e querer a produção do facto típico (dolo directo), representar como efeito necessário da conduta a produção de um dado evento e, não obstante, actuar (dolo necessário) ou prever a possibilidade da produção de um dado evento, agindo em conformação com a concretização do mesmo (dolo eventual).
Logrou a adesão da prova que, em 27/10/17, os arguidos se dirigiram ao Cartório Notarial de Valongo, onde compareceram como outorgantes em escritura pública, nesta declarando “sob a sua inteira e exclusiva responsabilidade [serem] os únicos sócios [daquela] sociedade comercial” (sic) e deliberando “dissolver a referida sociedade” (sic), relativamente à qual declararam “não [ter] qualquer activo ou passivo a partilhar, pelo que a [consideravam] completamente liquidada a partir [desse dia], data em que foram encerradas e aprovadas as respectivas contas” (sic), nessa esteira, havendo sido lavrado registo da dissolução e encerramento da liquidação, assim como averbado o cancelamento da sua matrícula. Apurou-se, porém, que, àquela data, a sociedade “B..., Lda.” devia à assistente a quantia de € 9.379,08 (nove mil, trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), assim como devia aos arguidos, enquanto seus únicos sócios, a quantia de € 23.358,33 (vinte e três mil, trezentos e cinquenta e oito euros e trinta e três cêntimos). Descortinou-se que os arguidos podiam prever – como previram, não obstante o que, conformando-se com essa possibilidade, agiram – que, ao declararem que a sociedade não tinha qualquer activo ou passivo a partilhar, assim a considerando liquidada, relatavam facto com implicações jurídicas dissonante da realidade, perante autoridade pública e em ordem a ser exarado em escritura pública; socorrendo-nos da doutrina mais avalizada, representando o resultado e não tomando posição perante este, deverá a punição fazer-se a título de dolo eventual (neste sentido, Eduardo Correia, Direito Criminal, I, Coimbra, 1971, 385). Por fim, e embora prescindindo o tipo do resultado, mais se deslindou que, à conta da sua descrita conduta, os arguidos eximiram a sociedade do pagamento da quantia devida à assistente, beneficiando a primeira e prejudicando a segunda.
Não ocorrem quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou de desculpação.
Preenchidos que se encontram os elementos objectivo e subjectivo do ilícito em apreciação, legítima se torna a ilação de que os arguidos incorreram na prática do crime por que vêm acusados.»
Vejamos!
Neste tipo legal tutela-se a autonomia intencional do Estado no nº1 e no nº2 as competências funcionais do órgão ou funcionário competente.
É autor deste crime quem declarar ou atestar falsamente à autoridade pública ou a funcionário em exercício de funções, identidade, estado ou outra qualidade, a que a lei atribua efeitos jurídicos próprios ou alheios.
O crime é cometido por um particular num ato público.
A falsidade refere-se a uma característica pessoal a que a lei atribua efeitos jurídicos próprios ou alheios, trata-se, pois, de facto juridicamente relevante.
O tipo é doloso não se exigindo a presença de um dolo específico de enganar, bastando o dolo eventual.
O tipo legal também não exige a advertência prévia ao sujeito ativo prevista no art. 97 do Código de Notariado, o qual entendemos não se aplicar ao caso concreto como pretendem os recorrentes, dado tratar-se de lei anterior à do preceito do Código Penal que foi aplicado nos autos, e também por tal norma ter sido declarada inconstitucional com força obrigatória geral pelo Ac. do Tribunal Constitucional nº96/2015 relatado pelo Conselheiro Fernando Ventura.
Analisando a matéria de facto assente sob os pontos 1 a 7 dos autos e 8 e 9 dos autos verifica-se que efetivamente os arguidos únicos sócios da sociedade comercial por quotas com a firma “B..., Lda, com sede em Valongo, na data da realização da escritura de dissolução da referida sociedade declararam no Cartório Notarial de Valongo os factos que ficaram assentes sob os pontos 4 e 5 da matéria de facto provada, tendo vindo a verificar-se que não obstante a declaração de que a sociedade em causa não era detentora de qualquer passivo, essa declaração era dissonante da realidade da sociedade comercial que pretendiam dissolver, o que não podiam ignorar.
Cumpre agora aferir se, a tal declaração não conforme à realidade, atribui a lei os efeitos jurídicos que constam do ponto 11 da matéria de facto, ou seja, que com tal declaração eximiriam a mencionada sociedade do pagamento da quantia devida à assistente, beneficiando a primeira e prejudicando a segunda.
Atento o constante do ponto 7 da matéria de facto provada foi lavrado registo da dissolução e encerramento da liquidação, assim como averbado o cancelamento da sua matrícula da mencionada sociedade, pelo que, a mesma termina a sua vida como pessoa coletiva considerando-se extinta.
Com a extinção nos termos previstos no art. 160 nº2 do Código das Sociedades Comerciais, a sociedade perde a sua personalidade jurídica, mas as relações jurídicas de que a sociedade era titular não se extinguem, como flui do disposto nos arts. 162, 163 e 164 do Código das Sociedades Comerciais.
Porém, os interesses dos credores e do tráfico jurídico em geral opõem-se fortemente a que a extinção da sociedade acarrete a extinção das dívidas sociais.
Na verdade, os sócios substituem a sociedade passando a ser partes nas lides e a responder pelo passivo social até ao montante recebido em partilha.
A declaração de que a sociedade não tinha passivo foi feita sob inteira e exclusiva responsabilidade dos arguidos seus sócios e a escritura de dissolução não faz prova plena quanto a essa matéria, atento o disposto no art. 1020 do C.Civil, aplicável por força do art. 2º do C. das Soc. Comerciais, onde se estabelece que as dívidas não saldadas da sociedade continuam a ser responsabilidade dos antigos sócios.
No entanto, verifica-se um efeito jurídico que emerge da declaração dissonante da realidade de que a sociedade não era detentora de passivo, que é a passagem à partilha imediata sem fase de liquidação nos termos do art. 147 do C. das Sociedades Comerciais.
Este efeito jurídico obtido por via da declaração da não existência de passivo permite preencher os elementos típicos do crime imputado aos arguidos.
Os factos assentes sob os pontos 12, 13 e 14 da matéria de facto provada preenchem os elementos subjetivos do tipo legal nada havendo a censurar à decisão recorrida no que respeita à condenação pelo tipo legal previsto no art. 348-A nºs 1 e 2 do CP.
Improcede, pelo exposto, este argumento do recurso.
3ª questão:
Alegam os recorrentes que a ação civil enxertada nos presentes autos não tem por objeto a indemnização por perdas e danos emergentes do crime imputado, mas sim um alegado incumprimento contratual resultante, segundo a assistente, do não pagamento das faturas juntas aos autos.
Sobre este ponto passamos a citar a decisão recorrida:
«4. Do Direito, no seu segmento jurídico-civil
Em conformidade com o disposto no art. 129.º do Código Penal, a indemnização por perdas e danos emergentes de um crime é disciplinada pela lei civil, mostrando-se assim necessário, para o apuramento da responsabilidade civil do arguido, o recurso ao Código Civil, e, em concreto, aos seus arts. 483.º e seguintes e 562.º e seguintes. Estabelece o art. 483.º, n.º 1 do Código Civil que aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. Desta forma, são pressupostos da responsabilidade civil pela prática de factos ilícitos: a) o facto do agente – o facto humano dominável ou controlável pela vontade; b) a ilicitude – a antijuridicidade do facto, podendo revestir uma de duas modalidades: a violação de um direito alheio ou a violação de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios; c) o nexo de imputação do facto ao agente – a culpa em sentido amplo, de molde a permitir afirmar que o facto do agente merece a censura do Direito, podendo revestir uma de duas modalidades: o dolo ou a negligência; d) o dano – o prejuízo sofrido em bens jurídicos alheios em virtude do facto; e) o nexo de causalidade entre o facto e o dano – a afirmação, à luz do Direito, de que o dano é uma consequência directa e necessária do facto. O critério a atender, no tocante à culpa do agente, é o plasmado no art. 487.º, n.º 2 do citado Código, em razão do que a culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso, sendo certo que, em obediência ao respectivo n.º 1, é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.
Revertendo ao segmento legal que cuida do direito à indemnização, prevêem os arts. 562.º a 564.º do Código Civil que quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, posto que restrita aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, compreendendo o dever de indemnizar não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, neste caso, e ante a possibilidade de danos futuros, podendo o Tribunal desde logo considerá-los desde que sejam previsíveis, na impossibilidade da sua determinação remetendo a fixação da indemnização para decisão ulterior. Ainda que a reconstituição natural seja a forma prioritária de indemnização, as mais das vezes não se evidenciando viável, recorrer-se-á, em conformidade com o preceituado no art. 566.º do mesmo Código, à sua fixação em dinheiro, esta tendo, por via de regra, como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos, obedecendo o seu cálculo a juízos de equidade se não puder ser averiguado o valor exacto destes. Por fim, e na hipótese concreta de obrigações pecuniárias, estatui o art. 806.º, n.º 1 do referido diploma legal que a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora, neste conspecto estabelecendo o seu art. 805.º, n.º 3, a regra, quanto à responsabilidade por facto ilícito, do momento da citação.
No caso vertente, pretende a assistente, enquanto demandante cível, ser ressarcida pelos arguidos, enquanto demandados cíveis, no valor global de € 13.327,31 (treze mil, trezentos e vinte e sete euros e trinta e um cêntimos), acrescido de juros moratórios a calcular por referência ao capital peticionado, à taxa legal de 4% e até efectivo e integral pagamento, para o que convoca danos de natureza exclusivamente patrimonial. Compreende aquele valor as seguintes parcelas: a quantia de € 9.379,08 (nove mil, trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), referente ao valor das facturas que se viu impossibilitada de cobrar face à extinção da sociedade devedora; a quantia de € 1.098,81 (mil, noventa e oito euros e oitenta e um cêntimos), referente aos juros moratórios vencidos reportados a tais facturas, enquanto consubstanciadoras de obrigações de pagamento com prazo certo; as quantias de € 102,00 (cento e dois euros) e de € 25,50 (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos), referentes à liquidação de taxas de justiça na apresentação dos requerimentos injuntivo e executivo; a quantia de € 1.350,00 (mil, trezentos e cinquenta euros), referente a honorários do Ilustre Mandatário; as quantias de € 74,97 (setenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos) e de € 1.296,95 (mil, duzentos e noventa e seis euros e noventa e cinco cêntimos), referentes a provisão e honorários finais da Sra. AE. Sendo certo dispor o art. 72.º, n.º 2 do Código do Processo Penal que, no caso de o procedimento depender de queixa ou de acusação particular, a prévia dedução do pedido perante o tribunal civil pelas pessoas com direito de queixa ou de acusação vale como renúncia a este direito, deste modo abrangendo os crimes semipúblicos e particulares, atesta-se que o ilícito imputado aos arguidos consubstancia um crime público, cujo procedimento criminal não se encontra, portanto, na dependência de uma queixa ou de uma acusação particular, razão pela qual se não pode entender que uma anterior dedução de pedido de indemnização em sede civil equivalha a uma renúncia quanto ao exercício de um tal direito.
Atentemos na factualidade que mereceu a adesão da prova.
Demonstrou-se que, à data da escritura de dissolução e liquidação da sociedade “B..., Lda.” – de que os arguidos eram sócios e na qual declararam facto falso –, a mesma era devedora à demandante da quantia de € 9.379,08 (nove mil, trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), com fulcro em facturas emitidas e não liquidadas. Apurou-se que, tendo em vista a sua liquidação, a mesma apresentou requerimento de injunção no Balcão Nacional de Injunções, solicitando o pagamento da demandada de uma quantia global de € 12.181,30 (doze mil, cento e oitenta e um euros e trinta cêntimos), com arrimo nas preditas facturas, no que despendeu, a título de taxa de justiça, o montante de € 102,00 (cento e dois euros). Comprovou-se que, no seguimento da força executiva reconhecida àquele requerimento, deu entrada da correspondente acção executiva, no que despendeu, a título de taxa de justiça, o montante de € 25,50 (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos), a título de honorários devidos à Sra. AE, o montante de € 74,97 (setenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos), e, a título de adiantamento de honorários devidos ao Ilustre Mandatário, o montante de € 700,01 (setecentos euros e um cêntimo).
Constituindo jurisprudência pacífica que “o pedido de indemnização civil a deduzir no processo penal, tem de ter como causa de pedir os mesmos factos que são também pressuposto da responsabilidade criminal e pelos quais o arguido se encontra acusado ou pronunciado no processo em que é formulado o pedido” (cfr., entre outros, o Ac. do TRG de 02/07/18, in www.dgsi.pt), sendo “o itinerário probatório (…) exactamente o mesmo no que toca aos factos que consubstanciam a responsabilidade criminal e a responsabilidade civil, havendo, apenas, que acrescentar que, em relação a esta há, ainda, que provar os factos que indicam o dano e o nexo causal entre o dano e o facto ilícito” (cfr. o Ac. do TRG de 08/02/18, in www.dgsi.pt), dúvidas não se nos colocando no sentido de o feito criminoso dos arguidos haver sido o que frustrou a possibilidade de cobrança coerciva do crédito da demandante. Nesse seguimento, compreendem-se como integrados no apontado nexo causal as despesas suportadas pela mesma no âmbito da acção executiva que instaurou – e, deste modo, a título de taxa de justiça, o montante de € 25,50 (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos), a título de honorários devidos à Sra. AE, o montante de € 74,97 (setenta e quatro euros e noventa e sete cêntimos) e, a título de adiantamento de honorários devidos ao Ilustre Mandatário, o montante de € 700,01 (setecentos euros e um cêntimo) – reservas não se nos suscitando no sentido da sua ressarcibilidade nesta sede, impondo-se aos arguidos o pagamento de uma indemnização que, globalmente, se atesta ascender a € 800,48 (oitocentos euros e quarenta e oito cêntimos). Outro tanto, salvo melhor opinião, não podemos sufragar quanto ao mais peticionado, ainda que igualmente relacionado com a demanda executiva – a saber, a quantia de € 649,99 (seiscentos e quarenta e nove euros e noventa e nove cêntimos), atinente ao remanescente dos honorários devidos ao Ilustre Mandatário, e a quantia de € 1.296,95 (mil, duzentos e noventa e seis euros e noventa e cinco cêntimos), relativa aos honorários finais da Sra. AE –, entendimento que julgamos impor-se face à circunstância de os autos de execução em causa se não encontrarem, ainda, findos, razão pela qual se alcança por que motivo se não encontram juntos a estes autos os comprovativos de tais despesas.
Sobejando, pois, a apreciação da ressarcibilidade, por parte dos arguidos, das quantias de € 10.477,89 (dez mil, quatrocentos e setenta e sete euros e oitenta e nove cêntimos) e de € 102,00 (cento e dois cêntimos), relativas, respectivamente, ao valor das facturas acrescido de juros moratórios vencidos cuja cobrança coerciva se gorou e ao valor da taxa de justiça paga aquando da apresentação do requerimento de injunção, somos a entender que, em ordem à sua conexão causal com o feito criminoso, se impunha apurar se a sociedade de que os arguidos eram sócios dispunha de activo para a sua liquidação, pois que, a assim não suceder, a dívida peticionada jamais iria ser paga por aquela, independentemente do crime cometido. Para tanto, importaria analisar em detalhe a sua contabilidade no período compreendido entre Janeiro e Outubro de 2017, com recurso aos balancetes referentes a cada um desses meses, e, bem assim, ao balancete de Dezembro de 2016 reportado ao encerramento do exercício – distinto daquele que se encontra junto aos autos.
Na verdade, unicamente a sua dissecação, por forma a compreender a evolução dos movimentos financeiros ocorridos durante esse período temporal, constitui meio de prova idóneo a comprovar a exequibilidade da pretensão da demandante, uma vez que a prestação de contas e a IES associados ao encerramento da actividade da sociedade – sendo tais documentos os que se encontram juntos aos autos –, não permite retirar qualquer ilação no apontado sentido. Não fora assim, e não nos teríamos limitado, como o fizemos supra, a consignar uma mera estranheza quanto a alguns dos movimentos financeiros perceptíveis na análise de semelhantes documentos, antes teríamos retirado as consequências que se impusessem. Com efeito, sabemos, por exemplo, que um stock avaliado em € 25.794,34 (vinte e cinco mil, setecentos e noventa e quatro euros e trinta e quatro cêntimos) foi alienado pela quantia de € 16.737,92 (dezasseis mil, setecentos e trinta e sete euros e noventa e dois cêntimos); o que não logramos depreender, sem o cotejo dos preditos balancetes, é por que razão assim sucedeu, sendo diversas as possíveis respostas a essa inconsistência, tais como a sobreavaliação inicial desse stock, a sua efectiva desvalorização durante o hiato temporal em questão ou a sua venda ao desbarato, animada do desiderato de subtrair à sociedade o quanto antes uma parte do respectivo activo, por forma a propiciar o seu encerramento em prejuízo do direito de crédito da assistente. O mesmo se diga quanto ao equipamento de transporte avaliado em €1.500,00 (mil e quinhentos euros), vendido pela quantia de €50,00 (cinquenta euros); ignoramos, desde logo, de que equipamento se trate e se, efectivamente, aquando da sua alienação, estando já integralmente amortizado, seria susceptível de ter rendido mais dinheiro à sociedade. E, conforme acima alinhado, podemos afirmar que, em Dezembro de 2016, o seu passivo e o seu activo se quedavam, respectivamente, em € 25.023,37 e em € 4.380,85 (quatro mil, trezentos e oitenta euros e oitenta e cinco cêntimos), desconhecendo-se por que forma ambos evoluíram até ao mês da dissolução.
Prevendo o art. 82.º, n.º 1 do Código Penal que, se não dispuser de elementos bastantes para fixar a indemnização, o tribunal condena no que se liquidar em execução de sentença, caso em que a execução corre perante o tribunal civil, servindo de título executivo a sentença penal, cremos, salvo melhor opinião, ser de fazer uso da enunciada possibilidade legal, reconhecendo-se, desde já, a procedência do peticionado no que concerne à quantia de € 800,48 (oitocentos euros e quarenta e oito cêntimos), mas, quanto ao mais, inexistindo elementos que permitam a fixação do concreto quantum indemnizatório devido: relativamente às restantes despesas havidas com a lide executiva, importa que esta conheça o seu termo, por forma a serem apuradas, com o rigor que se exige, os montantes efectivamente pagos pela assistente ao Ilustre Mandatário e à Sra. AE, e, no que concerne à falta de pagamento das facturas, respectivos juros e taxa de justiça liquidada pela apresentação do requerimento injuntivo, aferir da intercedência de um nexo de causalidade entre a impossibilidade de cobrança desses montantes, cujo total se cifra em € 10.579,89 (dez mil, quinhentos e setenta e nove euros e oitenta e nove cêntimos) e o feito criminoso dos arguidos. Assim, consideramos melhor servir os interesses das partes relegar para decisão ulterior a respectiva quantificação, a qual deverá ter em conta o termo dos autos de execução n.º 25336/17.8T8PRT, cujos termos correm no Juízo (J9) de Execução do Porto.»
O crime pelo qual os arguidos foram condenados é um crime de perigo abstrato que se consuma independentemente das consequências ou efeitos e visa tutelar a integridade da função administrativa nas suas diversas manifestações e a capacidade funcional da administração, exercida em conformidade com as exigências de legalidade e objetividade que num Estado de Direito devem presidir às funções públicas. Ao declarar ou atestar falsamente qualidade própria ou de terceiro da qual advenham efeitos jurídicos, o agente induz a autoridade ou funcionário a quem se dirige a praticar ato objetivamente viciado nos seus pressupostos, pondo em causa a própria administração e a sua imprescindibilidade para a realização ou satisfação de finalidades fundamentais, indispensáveis em qualquer sociedade organizada.
Porém, desta conduta não emerge o prejuízo da demandante que era credora de valores sobre a extinta sociedade de que os arguidos eram os únicos sócios. Na verdade, o crédito da demandante emerge das transações e relações comerciais pré-existentes ao ilícito criminal julgado nestes autos.
Assim, em 11/12/2017, quando a assistente teve conhecimento de que a sociedade de que era credora se encontrava extinta com a matrícula cancelada, poderia ter exigido o pagamento da sua dívida aos antigos sócios, aqui arguidos, o que podia ser viável até ao montante da responsabilidade destes, mas não em sede criminal, dado tal dívida não ser efeito do crime pelo qual os arguidos foram condenados nos presentes autos.
Pelo exposto, procedem os argumentos dos recorrentes no que respeita à inexistência de obrigação de indemnizar emergente do ilícito penal cometido pelos arguidos.


3. Decisão:

Tudo ponderado e tendo em vista os argumentos que foram aduzidos, acordam os Juízes no Tribunal da Relação do Porto:
- em alterar o teor da matéria de facto constante do ponto 9 da matéria de facto provada por forma a consignar apenas que : O total do passivo existente em 27/10/2017 era de pelo menos 23.358,33 (vinte e três mil, trezentos e cinquenta e oito euros e trinta e três cêntimos).
- Mais ordenam a supressão do facto constante ponto 11 da matéria de facto provada por conter ilações contrárias ao que consta do regime legal aplicável à dissolução e liquidação das sociedades comerciais.
- Confirmam a sentença recorrida no que respeita à condenação dos arguidos pelo crime de falsas declarações p.p. pelo art. 348-A do CP.
- Revogam a sentença recorrida na parte da condenação dos arguidos em montante a liquidar em execução de sentença e absolvem os arguidos do pedido de indemnização cível contra eles deduzido por “A..., Lda.”

O presente recurso é, pois, provido parcialmente.

Sem tributação.





Porto, 7/2/2024.
Paula Cristina Guerreiro
Pedro Vaz Pato
Pedro M. Menezes