Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0774/15.4BEBRG
Data do Acordão:03/09/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:POSTO DE ABASTECIMENTO DE COMBUSTÍVEIS
DESPACHO
AUTORIZAÇÃO
LOCALIZAÇÃO
Sumário:É correcta a decisão que considera não estarem verificarem os pressupostos para a autorização de localização de um posto de abastecimento de combustíveis ao abrigo do disposto no Despacho SEOP 37-XII/92 quando da matéria de facto assente resulta que inexistia um “troço de arruamento urbano com, pelo menos, 250m de extensão”.
Nº Convencional:JSTA00071688
Nº do Documento:SA1202303090774/15
Data de Entrada:01/31/2023
Recorrente:AA (E OUTROS)
Recorrido 1:INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:DESPACHO SEOP 37-XII/92
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1 – AA e BB, ambos com os sinais dos autos, propuseram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAF de Braga) acção administrativa contra a Estradas de Portugal, S.A., igualmente com os sinais dos autos, na qual formularam o seguinte pedido:

«[…]

Nestes termos, D. e A., deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e, em consequência, deve:

a) anular-se o despacho proferido em 19 de Novembro de 2014 pela Exma. Senhora Gestora Regional da Gestão Regional de Viana do Castelo das Estradas de Portugal, no âmbito do procedimento de licenciamento n.º ..., que indeferiu a pretensão aí formulada pelos Autores;

b) condenar-se a Ré a praticar acto administrativo que defira a pretensão formulada pelos Autores no âmbito do procedimento de licenciamento n.º ..., designadamente, atribuindo-lhes o licenciamento para abertura e exploração de posto de combustível, bem como os demais pedidos formulados por eles nesse procedimento;

c) condenar-se a Ré a pagar aos Autores indemnização que, por força dos factos alegados nos arts. 106.º a 115.º deste articulado, vier a ser fixada em decisão ulterior ou vier a ser liquidada em execução de sentença, condenando-se a Ré no pagamento de custas e de procuradoria condigna.

[…]».

2 – Por sentença de 29.09.2021 foi a acção julgada totalmente improcedente.

3 – Inconformados com aquela decisão, os AA. interpuseram recurso para o TCA Norte, que, por acórdão de 16.09.2022, negaram provimento ao recurso e confirmaram a sentença.

4 – Desta última decisão foi interposto pelos AA. recurso de revista para este STA, o qual foi admitido por acórdão de 12.01.2023.

5 – Os Recorrentes apresentaram alegações que remataram com as seguintes conclusões:

«[…]

Vem o presente recurso interposto do Douto Acórdão proferido nos autos, na parte em que confirmou a douta sentença proferida nos autos, julgando improcedente a acção.

As áreas de serviço distinguem-se dos postos de abastecimento de combustível, na medida em que as áreas de serviço são explorações implantadas em terrenos do domínio público, devidamente concessionados, ao passo que os postos de abastecimento são explorações implantadas em terrenos particulares (propriedade privada).

A exploração que os Autores projectaram destina-se a ser instalada num prédio urbano que lhes pertence, tal como resulta do ponto 1 dos factos provados, o que significa que está aí em causa um posto de abastecimento de combustíveis, e não uma área de serviço.

O ponto 5.2 do Despacho SEOP 37-XII/92 e as distâncias nele previstas aplicam-se a áreas de serviço (implantadas em terrenos do domínio público), mas já não aos postos de abastecimento simples.

Uma vez que a pretensão dos Autores se destina a ser implantada em propriedade privada e, nessa medida, constitui um posto de abastecimento de combustível simples (e não uma área de serviço, pelas razões já expostas), a norma do ponto 5.2 do Despacho SEOP 37-XII/92, porque aplicável apenas a “áreas de serviço”, não se poderia ter por aplicável ao caso dos autos, que visa a instalação de um posto de combustível simples.

Áreas de serviço e postos de abastecimento são realidades diferentes, o que exclui a interpretação de que os postos de abastecimento são subtipos da categoria “áreas de serviço”.

E se assim é (e não se vê como assim não possa ser), terá de se concluir que a restrição do ponto 5.2 do Despacho SEOP 37-XII/92 aplica-se apenas e áreas de serviço, e já não a postos de abastecimento.

Estando em causa, no procedimento administrativo em análise nos autos, um pedido de licença para instalação de um posto de abastecimento de combustível, a restrição do ponto 5.2 do citado despacho não é aplicável a estes últimos, o que significa que, ao indeferir a pretensão dos Autores com fundamento nessa disposição regulamentar, o acto impugnado violou o ponto 5.2 do Despacho SEOP 37-XII/92, o que o torna anulável.

Note-se que, como referido em sede de interposição do presente recurso, as conclusões vertidas na douta decisão recorrida, a este respeito, têm inegável impacto nos pedidos de licenciamento ou de viabilidade prévia ainda submetidos ao referido Despacho SEOP 37-XII/92, na medida em que tornam aplicável a todos os postos de abastecimento simples a instalar as distâncias previstas no ponto 5.2 do referido Despacho (quer estejam implantados em vias rápida ou auto-estradas – as comummente designadas áreas de serviço -, quer estejam implantados nas imediações de vias primárias ou secundárias, nacionais ou municipais – os normalmente denominados de postos de abastecimento ou bombas de gasolina).

A confirmar-se a tese do Douto Acórdão recorrido e a jurisprudência nele vertida, futuras instalações de postos de combustível simples, apreciadas ao abrigo do Despacho SEOP 37-XII/92, ainda que localizados em vias secundárias, maxime municipais, terão de respeitar a distância de 250,00 metros relativamente à intersecção mais próxima, apesar de estarem em causa vias com reduzida velocidade de circulação – muitas vezes 50 ou 90 Km/hora -, realçando-se que o terreno onde se pretende instalar o posto de abastecimento simples tem 89,50m da intersecção mais próxima, em que ultrapassa a distância mínima de visibilidade de acordo com as Nomas P2-78 da JAE (7.3.2 do Despacho SEOP 37 – XII/92).

Daí que, na perspectiva dos Recorrentes, a fim de dirimir definitivamente tal querela, se imponha admitir o presente recurso como revista excepcional, ao abrigo do disposto no art. 672.º, n.º 1, al. b) do Cód. Proc. Civil, aplicável por remissão do art. 1.º do CPTA.

Ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou, além de outras, o ponto 5.2 do Despacho SEOP 37-XII/92, o que impõe a procedência da revista, com a consequente revogação da douta decisão recorrida, na parte em que entendeu ser aplicável à pretensão dos Autores a restrição prevista na referida norma regulamentar, e prolacção, em sua substituição, de Douto Acórdão que conclua pena não aplicação à pretensão dos Autores do ponto 5.2 do Despacho SEOP 37-XII/92 e, por inerência, pela procedência da acção.

Os Recorrentes discordam, ainda, da interpretação e aplicação do ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92 feita na douta decisão recorrida, pelas razões que passam a expor:

O prédio dos Autores está implantado em solo urbanizado ou edificado e afecto em plano territorial à urbanização ou edificação.

Por outro lado, e pese embora esse diploma se aplique à colocação de publicidade, resulta expressamente da disposição da al. c) do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 105/98, de 24 de Abril, que são aglomerados urbanos as áreas como tal definidas em planos municipais de ordenamento do território. De acordo com o PDM de Ponte de Lima, o prédio dos Autores está implantado em zona de “aglomerados urbanos não abrangidos por planos de urbanização”, nomeadamente, em área qualificada como “Área Predominantemente Habitacional Unifamiliar” cfr. doc. n.º 6, junto com o requerimento dos Autores de 08/06/2017.

Para além disso, na certidão que constitui o doc. n.º 5, junto com o requerimento dos Autores de 08/06/2017, é o próprio Município de Ponte de Lima a afirmar expressamente que o prédio dos Autores “confina com a Rua ... e localiza-se dentro de Aglomerado Urbano com ocupação marginal de edificações numa extensão de, pelo menos, duzentos e cinquenta metros”.

Assim, o local em questão está integrado em aglomerado urbano.

Ao concluir em sentido inverso, o Douto Acórdão recorrido violou o ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92

A mesma conclusão se chega quanto à circunstância de saber se a localização do prédio dos Autores tem uma ocupação marginal de edificações que lhe confira um carácter de arruamento

Sobre essa matéria, para além da certidão emitida pela Câmara Municipal de Ponte de Lima (que atestou, expressa e inequivocamente esse facto), o relatório da DGT acima referido é também tabelar e não deixa margem para dúvidas, já que se afirma (pág. 22) o seguinte: “(…) no que respeita à ocupação dos espaços reportada ao ano de 2015, verifica-se pela observação das várias imagens apresentadas, em particular a figura 2, que a parcela de terreno em questão, ainda sem ocupação, nas áreas vizinhas apresenta diversas construções, acessos, muros/vedações, etc., nomeadamente, na envolvente a Norte, a Sul e a Este junto à E.N. ...01 (Rua ...), que estão incluídos no mesmo aglomerado urbano da parcela em causa e, desse modo, por perímetro urbano definido e delimitado de acordo com a Planta de Ordenamento do PDM de Ponte de Lima.”

Por fim, se dúvidas houvesse, a própria toponímia (Rua ...) é suficiente para deixar claro que estamos na presença de um arruamento.

Estando preenchidos, como efectivamente estão, os dois pressupostos de que depende a aplicação do ponto 5.3 do despacho em referência, terá forçosamente de se concluir que o facto de o prédio dos Autores distar menos de 5,00 quilómetros do posto de combustível mais próximo não poderia constituir fundamento para o indeferimento da pretensão destes.

Ao concluir em sentido contrário, o acto recorrido violou o referido ponto do Despacho SEOP 37-XII/92, vício extensível ao douto acórdão recorrido, por contender com essa disposição regulamentar.

A tal conclusão não obsta o alegado pela Ré nas suas doutas alegações. Relativamente ao facto de se estar perante um poder discricionário (por força da locução “pode”, contida no citado ponto 5.3 do despacho), um tal argumento não poderá colher por duas razões:

Desde logo, porque um tal facto constitui uma inovação face à fundamentação contida no acto impugnado, o que obsta a que um tal facto possa ser invocado como fundamento para o indeferimento da pretensão dos Autores.

Ainda que assim se não entendesse, o indeferimento da pretensão dos Autores não assentou no exercício de um poder discricionário (ou seja, num juízo de oportunidade feito pela Ré na fundamentação do acto recorrido), mas antes na violação de concretos pontos do Despacho acima referido, o que significa que, não tendo a Ré fundamentado a sua posição no exercício de um poder discricionário, mas na violação de disposições regulamentares, está obviamente ao alcance deste Tribunal anular o acto impugnado, caso conclua que a pretensão dos Autores não viola quaisquer disposições do Despacho SEOP.

Assim, estaria vedado ao Tribunal apreciar o juízo discricionário da Administração, caso esta dele fizesse uso, mas já não está escrutinar se a pretensão dos Autores viola disposições regulamentares, nos termos invocados na fundamentação do acto impugnado, e anular o acto impugnado, caso conclua que tais ilegalidades não existem.

Aqui chegados, terá de se concluir que o acto impugnado padece dos vícios que lhe são assacados pelos Autores, o que significa que, ao decidir como decidiu, a douta decisão recorrida violou, além de outras, a disposição o ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92.

Deve, pois, ser revogada, na parte em que entendeu não ser aplicável à pretensão dos Autores a norma do ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92, e substituída, nessa parte, por Douto Acórdão que conclua que a pretensão dos Autores é abrangida pelo regime do ponto 5.3 do referido despacho, com a consequente procedência integral da acção.

Por fim, o Tribunal recorrido entendeu que a acção não poderia proceder, em virtude de inexistir o parecer a que alude o ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92.

Também aí a douta decisão não está isenta de censura, pelas razões que se passa a expor:

É inquestionável que, tendo sido questionado pelos Autores, o Município de Ponte de Lima emitiu tomada de posição em que manifestou nada ter a opor à pretensão daqueles, o que equivale a dizer, que foi cumprido o requisito previsto no ponto 5.3 do referido Despacho SEOP.

Mas ainda que assim não fosse, um tal facto não imporia o indeferimento da pretensão dos Requerentes, mas, tão-somente, o convite dos Requerentes a juntar esse documento, atento o disposto no art. 108.º, n.º 1 do Cód. Proced. Administrativo.

Ao decidir em sentido contrário, a douta decisão recorrida violou o ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92 ou, no limite e caso assim se não entenda, o disposto no art 108.º, n.º 1 do Cód. Proced. Administrativo.

Deve, pois, ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue a acção procedente, nos termos peticionados.

O pedido de viabilidade para a instalação de um simples posto de abastecimento de combustíveis foi entregue, pelos Autores, ao abrigo do regime do ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92 ponto 5.3, em conformidade com o ponto 6.1.1, atendendo ao art. 2.º - “Nas restantes estradas fixam-se apenas condicionamentos de ordem técnica e reduzem-se as formalidades administrativas ao mínimo indispensável. Tudo se tornará mais simples e expedito” - nos termos das competências atribuídas pelo Dec. Lei 13/71 – (*entretanto revogado)

O acto impugnado e a decisão recorrida fazem exigências aplicáveis aos pedidos de viabilidade de concessão da exploração de áreas de serviço, quando está em causa um pedido de viabilidade de posto de abastecimento de combustíveis simples.

O Município de Ponte de Lima emitiu certidão em que confirma a existência de edificações marginais ao longo da EN ...01 – Rua ... -, numa distância superior a 250 metros.

Emitiu, ainda, parecer favorável (não vê inconveniente na implementação do posto de abastecimento).

A Infraestruturas de Portugal concedeu licença para construção de acessos e vedações para o referido terreno, para instalações de comércio, indústria e serviços, tendo o registo ....

Atendendo à instalação de um posto de abastecimento de combustíveis simples com dimensões reduzidas, a referida licença para acesso a um comércio tem de ser respeitada pela Infraestruturas de Portugal.

O referido local tem licença para os acessos a vários serviços emitida pelas Infraestruturas de Portugal, pelo que não faz sentido questionar agora a segurança rodoviária.

O parecer da Direcção Geral do Território vem confirmar as informações prestadas pela Câmara Municipal de Ponte de lima, através de certidões e declarações, nos termos do ponto 5.3, já que:

Nos postos de abastecimento simples não são impostas nenhumas distâncias como nas estações de serviço, como refere o ponto 5.2 e ponto 7.3.1.

O ponto 5.2 e o ponto 7.3.1 refere apenas Áreas de Serviço (que estão em terreno expropriado aos particulares em vias rápidas ou auto-estradas), sendo que, no caso dos autos, não está em causa uma área de serviço, mas um posto de abastecimento.

Os postos de abastecimento são caracterizados por serem licenciados em estradas nacionais, com cruzamentos entre ruas ou estradas desclassificadas ou municipais, de pequenas dimensões com ofertas simples ao utente.

As áreas de serviço são cartelizadas por serem licenciadas em auto-estradas e vias rápidas, fora dos entroncamentos com grandes dimensões e agregam vários serviços.

Por fim, o art. 3.º, al. d) do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, define aglomerado urbano como a área como tal delimitada em plano municipal de ordenamento do território ou, na sua ausência, a delimitada nos temos do 62 do DL n.º 794/76 de 5 de Novembro.

Tendo em conta a junção das Declarações e Certidões certificadas passadas pela Câmara Municipal de Ponte de Lima, apresentados pelos Autores, ao abrigo do ponto 5.3; tendo em conta o parecer emitido pela DGT a pedido da Infraestruturas de Portugal, ao abrigo do ponto 5.3; tendo em conta que o pedido de viabilidade se refere a um simples posto de abastecimento na EN ...01, e não a uma Área de Serviço em nenhuma via rápida ou auto-estrada, os autos reúnem, s.m.o., todos os elementos necessários à prolação de decisão de mérito, que condene o Réu na prática de acto que defira a pretensão dos Autores.

A tal facto não obsta a desistência da instância feita pelos Réus, relativamente a parte do pedido da al. b), na medida em que, desse segmento do pedido, foi apenas eliminada a expressão “designadamente, atribuindo-lhes o licenciamento para abertura e exploração de posto de combustível, bem como os demais pedidos formulados por eles nesse procedimento”, mantendo-se o demais peticionado, ou seja: “condenar-se a Ré a praticar acto administrativo que defira a pretensão formulada pelos Autores no âmbito do procedimento de licenciamento n.º ...”.

Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente, com a consequente revogação do Douto Acórdão recorrido e prolacção, em sua substituição, de Douto Acórdão que esteja em conformidade com as conclusões acima formuladas,

com o que se fará Justiça!

[…]».

6 – A Entidade Demandada e aqui Recorrida contra-alegou, concluindo da seguinte forma:

«[…]

Não houve discordância das partes quanto à matéria de facto e a aplicação do direito à realidade subjacente, vem detalhada e explicitada, dando a conhecer a bondade da fundamentação da valoração da prova e com a indicação das normas legais tidas em consideração.

Pelo que, inexiste uma necessidade clara da admissão do recurso para se atingir o desiderato de se fazer uma melhor aplicação do Direito.

A sentença de primeira instância fez boa aplicação do Direito, nos termos que foram confirmados e devidamente fundamentados pelo Tribunal Central Administrativo no Acórdão recorrido.

A distinção que os Recorrentes fazem entre área de serviço e posto de abastecimento de combustíveis com base na distinção entre a titularidade pública e a propriedade privada do terreno onde se pretende fazer a instalação não é exata, não encontra fundamento no Despacho SEOP 37-XII/92.

Tal distinção entre área de serviço e posto de abastecimento de combustíveis faz-se com base nos equipamentos existentes e nos serviços prestados.

As áreas de serviço mais simples, são postos de abastecimento de combustíveis.

A interpretação de 5.2 Despacho SEOP 37-XII/92 não pode ficar-se por uma interpretação meramente literal, que desatenda ao enquadramento e explicações constantes do preâmbulo deste despacho e dos outros preceitos do mesmo, em especial 5.1, em que se estabelece o afastamento mínimo entre áreas de serviço e postos de abastecimento de combustível, e 3.1, em que, de forma expressa se inclui o posto de abastecimento de combustível entre as áreas de serviço, como se explica no aresto do Tribunal a quo.

Bem andou este Tribunal ao decidir como decidiu, que, aos elementos literal e sistemático da interpretação, ainda acrescentou, na fundamentação produzida, os elementos histórico e teleológico, que reforçam a interpretação do mesmo preceito 5.2 no sentido da sua aplicação à realidade subjacente.

O licenciamento de um posto de abastecimento de combustíveis não resulta de forma direta e imediata da manifestação da pretensão dos requerentes, perante a administração rodoviária, de o instalarem em propriedade privada, como pretendem os Recorrentes.

Há, desde logo, que verificar e observar condições relativas à segurança rodoviária, à capacidade da estrada, à fluidez de tráfego, ao apoio a prestar aos utentes da estrada, à sustentabilidade dos negócios (concorrência), etc., como bem se refere na decisão de primeira instância e o Tribunal a quo confirmou.

Acresce que, o licenciamento de um posto de abastecimento de combustíveis exige, ainda, a intervenção de mais entidades, para além da administração rodoviária; v.g. o município relativamente às matérias de urbanização e edificação, e a Direção Geral de Geologia e Energia quanto ao licenciamento e fiscalização de instalações de armazenamento de produtos do petróleo e das instalações de abastecimento de combustíveis líquidos e gasosos derivados do petróleo, designadas por postos de abastecimento de combustíveis.

Portanto, bem andou o Tribunal a quo quando decidiu, ao aplicar 5.2, como fez.

Sem prejuízo de o julgamento desta matéria resolver o litígio, como sustenta o Tribunal a quo, este ainda se pronunciou quanto a 5.3, ao conceito de aglomerado urbano, para decidir no sentido de que o terreno dos autores não está dentro de um aglomerado urbano.

Os Recorrentes, na realidade, não discordam da interpretação do ponto 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92,

Discordam é que, da apreciação das provas, não tenha resultado julgamento no sentido de que o terreno em que pretendem implantar o posto abastecimento de combustíveis se localiza dentro de aglomerado urbano, aplicando-se assim a dispensa constante da parte final do primeiro parágrafo do preceito.

Pelo que, a sua pretensão não pode ser objeto do presente recurso (artigo 150.º, n.º 4 do CPTA).

Ainda assim, não existe erro na apreciação das provas.

O aresto recorrido, explica que os Apelantes não comprovaram, o que lhes competia; que o lanço de estrada junto do qual se situa o seu terreno atravessava um aglomerado urbano, e bem assim, que a ocupação marginal de edificações conferia a esse troço de estrada o caráter de arruamento numa extensão de pelo menos, 250 metros.

Acrescia, ainda, aos Apelantes o ónus de demonstrar, nos termos do segundo parágrafo de 5.3, que o seu projeto de posto de abastecimento de combustíveis tinha sido sujeito a apreciação da Câmara Municipal territorialmente competente, e que tinha merecido desta a emissão de um parecer favorável, o que não fizeram.

O Tribunal recorrido explica: “Como bem se dá conta na decisão recorrida e resulta do probatório, os Apelantes não providenciaram pela junção aos autos de nenhum documento emitido pela Câmara Municipal de Ponte de Lima que possa ser tido como constituindo um parecer, nos termos do disposto no Código do Procedimento Administrativo, sendo insofismável a exigência desse parecer favorável no âmbito do procedimento em causa nestes autos”.

Quanto à pronúncia da Direção Geral do Território, junta aos autos, o Douto aresto recorrido explica dela resultar “… que o terreno dos autores está parcialmente inserido em área predominantemente agrícola, pelo que não pode, portanto, ser urbanizado ou sujeito a utilização para fins que não sejam agrícolas”.

Pelo que, bem andou o TCA Norte ao confirmar a sentença proferida pelo TAF de Braga.

Nestes termos, e nos mais de Direito,

Deve, em apreciação preliminar sumária, decidir-se no sentido de que não estão preenchidos os pressupostos estabelecidos no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, relativos à interposição de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo;

Não sendo assim decidido, deve o presente recurso improceder totalmente, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida,

Assim se fazendo

JUSTIÇA

[…]».

Cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação

1. De facto

A decisão arbitral recorrida deu como provados os seguintes factos:

«[…]

AA e BB, ora Autores, são comproprietários de um prédio rústico (“terreno de cultivo com oliveiras e ramada”), sito no Lugar ... ou ..., na freguesia ... (...), no concelho de Ponte de Lima, inscrito na matriz predial sob o número ...27 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número ...34, confinando com a Rua ...) [cf. Certidão Predial junta aos autos, pelos Autores, e cujo teor, na parte que importa, aqui, se dá por reproduzido].

O prédio identificado em 1) localiza-se a uma distância de 89,50 metros da intersecção mais próxima (entre a Rua ... e a Rua ...) [cf. factualidade admitida por acordo (cf. pronúncia dos Autores em 04-04-2018)].

Em 28 de abril de 2014, AA e BB, ora Autores, dirigiram à Gestora da Gestão Regional de Viana do Castelo, na qualidade de comproprietários do prédio identificado em 1), um “pedido de viabilidade de concessão relativo à Instalação de um Posto de Combustíveis, a construir na freguesia ..., Concelho de Ponte de Lima, Distrito de Viana do Castelo, sito à margem da E.N. ...01, ao km .......” [cf. documentos (docs.) constantes de fls. 1/18 do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

Ao km ......., da E.N. ...01, na freguesia ... (...), concelho de Ponte de Lima, existe rede pública de abastecimento de água e de distribuição de energia elétrica com condicionantes (falhas) [cf. Ofícios da EDP e do Município de Ponte de Lima juntos aos autos, respetivamente, em 30-10-2016 e em 01-11-2016, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

Ao km ......., da E.N. ...01, na freguesia ... (...), concelho de Ponte de Lima, existe uma rede de transportes públicos e de telecomunicações com condicionantes (falhas) [cf. Certidões juntas aos autos, pelos Autores, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

A área prevista para a instalação do posto de combustíveis referido em 3) – na freguesia ... (...), concelho de Ponte de Lima, distrito de Viana do Castelo, sito à margem da E.N. ...01, ao km ....... – abrange os seguintes espaços, a saber: (i) “área predominantemente habitacional unifamiliar” de “aglomerados urbanos não abrangidos por planos de urbanização”, em “espaço urbano e urbanizável” (cerca de 1411,66 m2), e (ii) “área predominantemente agrícola não incluída na RAN” em “espaço não urbano” (cerca de 800,79 m2) [cf. Ofício da Direcção-Geral do Território junto aos autos, em 22-11-2017, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

A área prevista para a instalação do posto de combustíveis referido em 3) – na freguesia ... (...), concelho de Ponte de Lima, distrito de Viana do Castelo, sito à margem da E.N. ...01, ao km ....... - situa-se em 36,2% fora de aglomerado urbano, sendo que a parte situada dentro de aglomerado urbano é em área predominantemente habitacional unifamiliar [cf. Ofício da Direcção-Geral do Território junto aos autos, em 22-11-2017, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

A área prevista para a instalação do posto de combustíveis referido em 3) – na freguesia ... (...), concelho de Ponte de Lima, distrito de Viana do Castelo, sito à margem da E.N. ...01, ao km ....... – localiza-se a 3,7 km do posto de abastecimento mais próximo [cf. factualidade não impugnada].

Em 17 de março de 2015 – decorrida a tramitação procedimental –, a Gestora Regional de Viana do Castelo proferiu Despacho (que revogou e substituiu o seu anterior despacho de 19 de Novembro de 2014), cujo teor se reproduz, a saber:

«[…]

Em 7 de janeiro de 2015 deu entrada nesta Gestão Regional o recurso hierárquico interposto por AA, dirigido ao Presidente do Conselho de Administração da Estradas de Portugal, S. A. ao abrigo do disposto nos artigos 166. º, 167. º, n. ° 1 e 168.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, “…do despacho de 19 de novembro de 2014, proferido pela Exma Senhora Gestora Regional de Viana do Castelo das Estradas de Portugal, que indeferiu o pedido de licenciamento para a construção de um posto de abastecimento de combustíveis.”

O requerimento de interposição do recurso não reproduz fielmente o que foi originariamente requerido,

Com efeito, os interessados apresentaram, de acordo com a letra do seu requerimento, “... o pedido de viabilidade de concessão relativo à instalação de um Posto de Abastecimento de Combustíveis, a construir na freguesia ..., concelho de Ponte de Lima, Distrito de Viana do Castelo, sito à margem da EN ...01, ao km ...…” (lado direito);

A fundamentação apresentada no ato, ora recorrido. consistiu na indicação de a pretensão contrariar o disposto nos “... pontos 5.1, 5.2 e 7.3.1 do Despacho SEOP 37-XII/92. de 27 de novembro…":

Cujo alcance e fundamentação os interessados bem conhecem, atento a que não foi esta a primeira vez que apresentaram a referida pretensão na vigência do mesmo enquadramento fático e jurídico-normativo:

Sem embargo, por ter competência e estar em tempo, designadamente nos termos das disposições conjugadas dos artigos 138.º e 141.º nº 1, do Código do Procedimento Administrativo, do artigo 58 ª do Código do Processo nos Tribunais Administrativos e dos artigos 142.º, n.ºs 1 e 2, e 147.º do Código do Procedimento Administrativo, para que não reste qualquer dúvida quanto à fundamentação do ato, fica expressamente revogado o despacho recorrido, por mim proferido em 19 de novembro de 2014;

E, em sua substituição, decido o seguinte:

Os postos de abastecimento de combustíveis estão sujeitos a licenciamento da EP – Estradas de Portugal, S.A. nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea c) e 11.º, alínea c) do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, e das normas constantes do Despacho SEOP 37-XII/92, de 27 de novembro;

Os interessados vieram “…solicitar…pedido de viabilidade da concessão relativa à instalação de um posto de abastecimento de combustíveis, a construir na freguesia ..., concelho de Ponte de Lima, distrito de Viana do Castelo, sito à margem da EN ...01, ao km ..., do lado direito”;

O regime jurídico atrás referido não prevê o que vem requerido, isto é, a decisão do “pedido de viabilidade da concessão relativa à instalação de um posto de abastecimento de combustíveis”;

Pelo que, o objecto do requerido é impossível, por falta de previsão legal;

E, em consequência, nunca poderá ser deferido;

Acresce que, o local em apreço não cumpre o afastamento mínimo - de 5 km - do posto de abastecimento de combustíveis, situado na mesma estrada, ao km 36+460, lado E+ D (esquerdo e direito):

Que, portanto, dista 3,7 km do local em relação ao qual os interessados pretendem saber da viabilidade da instalação de um novo posto de abastecimento de combustíveis (cfr., em especial, 5.1. do Despacho SEOP 37-XII/92, de 27 de novembro):

Acresce que, o prédio indicado pelos interessados, em relação ao qual requereram o pedido de viabilidade, está descrito na Conservatória de Registo Predial de Ponte de Lima, sob o número ...20, freguesia ... (...) e inscrito na matriz sob o artigo ...27 (rústica);

Este prédio localiza-se a uma distância de 89,50 metros da intersecção mais próxima;

Neste caso, por a velocidade de projeto no local ser de 50 km, por hora, é exigível a distância mínima de 250 metros da intersecção mais próxima (cfr. em especial, 5.2. do Despacho SEOP 37-XII/92, de 27 de novembro);

Demais, tendo em vista garantir as condições de segurança e a manutenção de um nível de serviço adequado, não é permitida a implantação do equipamento em locais, entre outras proibições, com distâncias inferiores às fixadas no ponto 5.2. (cfr., em especial, 7.3.1. do Despacho SEOP 37-XII/92, de 27 de novembro);

Nestes termos, com os apontados fundamentos vai indeferido o requerido.

[…]».

...” [cf. documento (doc.) constante de fls. 79/80 e verso do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

Tem-se aqui presente o teor de todos os documentos constantes dos autos e do Processo Administrativo-Instrutor (PA) [cf. documentos (docs.) constantes dos autos e do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

[…]».

2. De Direito

2.1. Os Recorrentes e AA. formularam perante a Entidade Recorrida um “pedido de viabilidade de concessão” para a instalação de um posto de abastecimento de combustíveis a implantar num prédio rústico de que ambos são comproprietários, localizado na freguesia ..., Concelho de Ponte de Lima, Distrito de Viana do Castelo, sito à margem da E.N. ...01, ao km ..., lado direito (pontos 1 e 3 da matéria de facto assente).

O pedido foi indeferido por despacho da Entidade Demandada de 17.05.2015, com fundamento no incumprimento do afastamento mínimo de 5Km de outro posto de abastecimento, tal como exigido pelo ponto 5.1. do Despacho SEOP 37-XII/92, e por incumprimento da distância mínima de 250m da intersecção mais próxima (estando o terreno a uma distância de 89,50m da dita intersecção), a qual constitui uma regra de segurança da implantação daquelas infra-estruturas, pontos 5.2, 5.3 e 7.3.1 do Despacho SEOP 37-XII/92.

O TAF de Braga — julgou a questão agora recorrida como se de um pedido de condenação à prática de acto devido se tratasse — e concluiu que a pretensão formulada pelos AA. contrariava o disposto no ponto 5.1. do Despacho SEOP 37-XII/92 (distância mínima exigida face a outros postos de combustíveis) e o 5.2. do mesmo despacho, que exige uma distância mínima de 250m face a intersecções e nós de ligação da via onde se pretende implantar o posto de combustíveis. Na sentença ainda se discutiu a possibilidade de o terreno respeitante à futura implantação do posto de combustíveis poder estar abrangido pela regra do 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92 (dispensa de distância mínima entre postos de combustíveis quando localizados em lanços de estradas nacionais que atravessem aglomerados urbanos), mas concluiu-se que ainda que tal sucedesse, sempre a pretensão dos AA. seria inviável por causa do não cumprimento da regra do 5.2 do referido despacho. Assim, o TAF de Braga julgou a acção improcedente quanto a todos os pedidos.

Na sequência do recurso interposto pelos AA. para o TCA Norte, a decisão não se alterou. No essencial, o TCA Norte considerou que não havia erro de julgamento da sentença ao considerar aplicável ao pedido formulado pelos AA. os pontos 5.1. e 5.2. do Despacho SEOP 37-XII/92. Os Recorrentes defendiam que aquelas exigências se limitavam a áreas de serviço e não podiam ser impostas ao licenciamento de meros postos de combustíveis, tendo o TCA Norte concluído que se impunham a ambos tipos de equipamentos. E o TCA Norte concluiu igualmente que independentemente de a factualidade poder ser enquadrada no ponto 5.3. do Despacho SEOP 37-XII/92, sempre o acto que recusara a viabilidade do pedido estaria correcto, uma vez que, segundo a matéria de facto assente, que não vinha impugnada, no caso não era observada a distância de segurança à intersecção imposta pelo ponto 5.2. do Despacho SEOP 37-XII/92, pelo que tal era suficiente para não acolher a pretensão dos Requerentes e AA.. E, com estes fundamentos, negou provimento ao recurso.

Ora, a decisão recorrida deve, no essencial, manter-se, apesar de algumas precisões na fundamentação, como iremos ver. Vejamos.

2.2. A primeira e principal questão que vem suscitada no âmbito do presente recurso consiste em saber se o referido Despacho SEOP 37-XII/92 é ou não aplicável ao acto de licenciamento em questão, ou seja, ao licenciamento de um posto de combustível simples localizado numa estrada nacional. Os Recorrentes argumentam que aquele despacho apenas é aplicável a áreas de serviço, o que constitui um objecto diverso daquele que consta do pedido de viabilidade da concessão por eles apresentado. As Instâncias – lembre-se – secundaram a argumentação da Entidade Demandada no sentido de considerar que o referido “posto de abastecimento de combustíveis” consubstanciava a tipologia mais simples ou básica de áreas de serviço prevista no mencionado Despacho SEOP 37-XII/92.

Vejamos qual a interpretação correcta.

2.2.1. Começamos por recordar que a obrigação de obter uma licença, no caso, da então Junta Autónoma de Estradas, para o estabelecimento de um posto de abastecimento de combustíveis na “zona (limítrofe) de uma estrada” constava já do artigo 10.º, n.º 1 alínea c) do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro. Na vigência deste diploma apenas se estabeleciam expressamente como condicionantes para a emissão do acto licenciador a preservação da via (estrada) e da “perfeita visibilidade do trânsito”, o que conferia à entidade licenciadora uma margem ampla de livre valoração (discricionariedade), sempre justificada pela necessidade de garantir a segurança da infra-estrutura e do respectivo uso pelos utentes. Além desta regra geral, o referido licenciamento deveria observar as “normas para a instalação de postos de abastecimento de combustíveis junto das estradas nacionais”, aprovadas por despacho da Ministro das Obras Públicas, de 9-7-1960.

Posteriormente, foi aprovado o Despacho MES 167/85, publicado no DR II.ª Série de 19.07.1985, no qual se pode ler o seguinte no respectivo preâmbulo: “(…) É reconhecida a conveniência de melhorar e ampliar a assistência a prestar aos utentes das estradas nacionais, a qual se tem limitado até agora, de forma organizada, à rede de postos de abastecedores de combustíveis, cuja instalação e exploração se encontram reguladas por normas aprovadas pelo despacho do Ministro das Obras Públicas de 9-7-60. Importa, assim, implementar a criação de áreas de serviço com equipamento adequado às actuais exigências de tráfego, regulamentando, porém, a sua instalação por forma a garantir a regularidade e qualidade de assistência, evitando a proliferação anárquica de empreendimentos marginais (…)”.

As “áreas de serviço” eram, na terminologia deste Despacho MES 167/85, “as instalações, marginais à estrada, contendo equipamentos e meios destinados a prestar apoio aos utentes e aos veículos”, e agrupavam-se em diferentes classes:

[IMAGEM]

A classe das áreas de serviço era determinada em função do tráfego médio diário anual previsível no ano horizontal, 20 anos após a entrada em serviço e de acordo com a seguinte tabela:

Classe A – mais de 20.000 veículos/dia;

Classe B – de 20.000 a 10.000 veículos/dia;

Classe C – de 10.000 a 5.000 veículos/dias;

Classe D – menos de 5.000 veículos/dia.

Entre outras regras com interesse para o que nos cabe julgar no âmbito do presente recurso importa ainda destacar que era imposta, pelas regras deste Despacho, uma distância mínima entre áreas de serviço e entre estas e postos de combustíveis já existentes de, pelo menos, 5 km, mesmo quando localizados dentro do perímetro urbano (ponto 5.3. do Despacho MES 167/85); e que as ditas áreas de serviço teriam de respeitar uma distância mínima de 1km em relação a intersecções e nós de ligação (ponto 5.4. do Despacho MES 167/85). Nos pontos 13 e 14 do Despacho MES 167/85 previa-se ainda a salvaguarda da manutenção em exploração dos postos de combustível já em operação, licenciados nos termos do despacho ministerial 9-7-60 MOP, sem prejuízo da possibilidade da respectiva reconversão e adaptação às regras das áreas de serviço.

O Despacho MES 167/85 seria depois revogado pelo Despacho SEVC 9/89-XI, publicado no DR, II.ª Série de 19.07.1989, em cujo respectivo preâmbulo se pode ler o seguinte: “(…) reconhecida a conveniências de se melhorar e actualizar a regulamentação em vigor relativa à instalação e exploração de áreas de serviço, aprovada pelo Despacho MES 167/85, de 18-6, e de postos de abastecimento de combustíveis junto das estradas nacionais, aprovada por despacho do MOP de 9-7-60 e disposições complementares, e tendo em conta que postos de abastecimento de combustíveis mais não são do que áreas de serviço reduzidas à sua expressão mais simples, determinou-se a revisão daqueles diplomas e a sua fusão num documento único, com as indispensáveis adaptações à realidade actual e às necessidades de assistência a prestar aos utentes das estradas nacionais (…)” (destaque e sublinhado nosso).

No ponto 1.1. deste Despacho SEVC 9/89-XI pode ler-se que “as presentes normas destinam-se à localização, à instalação e à exploração de áreas de serviço e postos de abastecimento de combustíveis, sendo aplicáveis, a partir da data da sua aplicação, nas estradas nacionais, excepto auto-estradas concessionadas” e no ponto 1.2. dispunha-se que “a instalação e exploração de simples postos de abastecimento de combustíveis obedecerá às disposições constantes dos n.ºs 5.7., 6.12, 6.13, 8.10, 9.1, 10.2, 10.5, 10.6 e 11.2 (…)”. Quer isto dizer que, apesar da integração das regras de licenciamento das áreas de serviço e dos simples postos de abastecimentos de combustíveis num único instrumento normativo regulamentar, os licenciamentos eram disciplinados por regras não inteiramente coincidentes, sendo essas regras menos exigentes para os licenciamentos de simples postos de abastecimento de combustíveis.

Assim, o 5.7. dispunha o seguinte: Nos lanços de estradas nacionais que atravessam aglomerados urbanos, onde a ocupação marginal de edificações lhes confere o carácter de arruamento urbano, numa extensão de pelo menos 250m, poderão ser licenciados simples postos de abastecimento de combustíveis” e, neste caso, não se aplicavam as exigências de distância face a outras áreas de serviço e postos de abastecimento pré-existentes (pontos 5.1, 5.2 e 5.5), bem como as distâncias de afastamento em relação a intersecções e nós de ligação (ponto 5.3).

O Despacho SEVC 9/89-XI seria revogado pelo disposto no Despacho SEOP 37-XII/92, publicado no DR II.ª Série de 22.12.1992. No essencial para o que importa decidir no caso concreto, cumpre destacar que desaparece a referência expressa a uma “limitação” das regras aplicáveis ao licenciamento de postos de combustíveis, equiparável ao ponto 1.2. do Despacho SEVC 9/89-XI, mas não desaparece a referência expressa à diferença entre áreas de serviço e postos de abastecimento de combustíveis. Com efeito, para além da salvaguarda dos licenciamentos efectuados ao abrigo das normas regulamentares anteriores (ponto 5.1.1. do Despacho SEOP 37-XII/92), o Despacho dispõe no ponto 7.7. que “nos termos previstos no n.º 11.1 das presentes normas [as exigências de diverso tipo constantes das presentes normas deverão ser consideradas como mínimas, só podendo ser reduzidas em casos excepcionais devidamente justificados], os postos de abastecimento a estabelecer nas condições referidas no n.º 5.3. [nos lanços de estradas nacionais que atravessam aglomerados urbanos, onde a ocupação marginal de edificações lhes confere o carácter de arruamento numa extensão de, pelo menos, 250 m, poderão ser licenciados simples postos de abastecimento de combustíveis, sem qualquer limitação de distância entre si. Todavia, o respectivo projecto deverá obter parecer prévio favorável da Câmara Municipal] poderão obedecer a exigências reduzidas, a definir em cada caso, sem prejuízo das condições legais de segurança e fluidez de tráfego, e inclusive obrigatoriamente de instalações sanitárias e sistemas de informação e SOS”.

Deste último despacho normativo – o Despacho SEOP 37-XII/92 – cabe ainda destacar que as áreas de serviço passam a ser classificadas apenas em três classes (A, B e C), com correspondente redução de características exigíveis, integrando a Classe C apenas o posto de abastecimento com acesso e estacionamento próprios, instalações sanitárias e sistema de informação SOS, o que coincide com as exigências impostas aos simples postos de abastecimento de combustíveis licenciados ao abrigo do 5.3. ex vi do disposto no ponto 7.7. do Despacho SEOP 37-XII/92.

Pode ainda complementar-se, para melhor interpretação do direito a aplicar ao caso, que a revogação do Despacho SEOP 37-XII/92 pelo novo regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 87/2014, de 29 de Maio, regulamentado pela Portaria n.º 54/2015, de 27 de Fevereiro, mostra que a distinção entre o licenciamento de implantação de áreas de serviço e de postos de abastecimento de combustíveis se manteve e que as condicionantes impostas, quer quanto à distância relativamente a outros postos de combustíveis, quer quanto a intersecções na via também. As regras apenas são diferentes quanto se trate de postos de combustíveis ou áreas de serviço localizadas na rede viária municipal ex vi do regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 260/2002, de 23 de Novembro. Neste caso, o licenciamento das áreas de serviço e dos postos de abastecimento de combustíveis passa a ser da competência dos municípios (artigo 3.º) e são eles a fixar as regras para a respectiva localização/implantação.

Conclui-se, portanto, deste percurso pela sucessiva regulação normativa dos licenciamentos relativos à localização de postos de abastecimento de combustíveis o seguinte a respeito das condicionantes vigentes à data em que foi formulado pelos Recorrentes o pedido de viabilidade da concessão da licença aqui controvertida: i) as áreas de serviço e os simples postos de combustíveis não são necessariamente equivalentes em termos de regulamentação de exigências, pois aos segundos (e exclusivamente em relação a estes) podem ser consideradas/aplicadas regras menos exigentes quanto à respectiva localização, sempre que os mesmos estejam localizados em “lanços de estradas nacionais que atravessem aglomerados urbanos, onde a ocupação marginal de edificações lhes confira o carácter de arruamento numa extensão de, pelo menos, 250m”; ii) não obstante o Despacho SEVC /89-XI ter integrado na mesma regulamentação as áreas de serviço e os postos de abastecimento de combustíveis, estes podem, como antes se destacou, continuar a beneficiar de regras menos exigentes, em certos casos (pontos 5.3, 7.7 e 11.1 do Despacho SEOP 37-XII/92).

2.2.2. Assim, o que é essencial para o correcto julgamento do caso é verificar se: i) foi ou não dado como assente que o projecto apresentado pelos Recorrentes é susceptível de ser subsumido ao disposto nos pontos 5.3., 7.7 e 11.1 do Despacho SEOP 37-XII/92, ou seja, se se localiza ou não em “arruamento que atravessa aglomerado urbano com uma extensão mínima de 250m”; e, em caso de resposta positiva, ii) se os 250m de distância mínima face a intersecções e nós de ligação previstos no ponto 5.2. do Despacho SEOP 37-XII/92 pode ou não integrar-se no conjunto de exigências aptas a ser reduzidas em casos excepcionais devidamente justificados, caso em que a motivação do acto que considera inviável o pedido de licenciamento teria de fundamentar o pedido sobre este ponto.

2.2.3. Relativamente à primeira questão, a matéria de facto assente na sentença não a endereça de forma directa, pois nesta parte da decisão de primeira instância apenas foi dado como assente que: i) a área prevista para a instalação do posto de combustíveis em causa se situa em 36,2% fora de aglomerado urbano, sendo que a parte situada dentro de aglomerado urbano é em área predominantemente habitacional unifamiliar (ponto 7 da matéria de facto); e que ii) a área prevista para a instalação do posto de combustíveis referido abrange “área predominantemente habitacional unifamiliar” de “aglomerados urbanos não abrangidos por planos de urbanização”, em “espaço urbano e urbanizável” (cerca de 1411,66 m2), e “área predominantemente agrícola não incluída na RAN” em “espaço não urbano” (cerca de 800,79 m2) (ponto 6 da matéria de facto).

Porém, no corpo da fundamentação da sentença pode também ler-se o seguinte: “(…) o prédio dos Autores não se localiza num local com as características de vivência e de ocupação do espaço próprias de um aglomerado urbano, como resulta claro das diversas fotografias que estão juntas aos autos (…)”, porque, como se acrescenta um pouco mais à frente na fundamentação daquela decisão judicial,“(…) as fotografias juntas aos autos deixam claramente ver e perceber que se trata de edificações que não se encontram propriamente junto à estrada nacional e que estão dispersas. Aliás, a planta topográfica também deixa ver um povoamento disperso, que obriga inclusivamente ao emprego de guardas de segurança, não existindo um alinhamento mínimo entre prédios que confiram o carácter de arruamento a este troço da estrada. Mais, essa ocupação marginal teria que conferir o carácter de arruamento, vincando-se assim as caraterísticas urbanas ao local, isto é, tal arruamento teria de servir para o trânsito dentro do aglomerado urbano e teria de ser demonstrado que o trânsito de passagem se fazia por outra via. Dentro dos aglomerados urbanos, o trânsito era, ao tempo em que foi proferido o despacho, tanto pedonal com automóvel - não é claramente o caso do local em que se encontra o prédio dos Autores (…)”.

Resulta daqui que, à data em que foi proferida a decisão, o troço da estrada em que se pretendia implantar o posto de combustível em causa não se subsumia à previsão do ponto 5.3. do Despacho SEOP 37-XII/92, ficando assim igualmente excluída a possível aplicação, in casu, do regime excepcional dos pontos 7.7. e 11.1, pelo que, não poderia deixar de aplicar-se a regra do 5.2, o que justificava o acerto da decisão de improcedência da acção.

E o TCA também não divergiu desse juízo quando considerou que “(…) era necessário que os Apelantes tivessem comprovado que o lanço de estrada junto do qual se situa o seu terreno atravessava um aglomerado urbano, e bem assim, que a ocupação marginal de edificações conferia a esse troço de estrada o caráter de arruamento numa extensão de pelo menos, 250 metros (…)” e que “(…) da prova apresentada, reafirma-se, não se pode concluir que existisse um aglomerado urbano, para efeitos do disposto no ponto 5.3.do aludido despacho (…)”. O que significa que acompanhou o juízo do TAF de Braga nesta parte, razão pela qual julgou correctamente o recurso improcedente.

Os Recorrentes alegam nos pontos 15 a 21 e 38 das respectivas conclusões matéria que pretende infirmar o juízo das Instâncias a respeito da localização do prédio e apresentam novos elementos que apenas poderiam ser atendidos no âmbito de uma reapreciação dos factos, algo que cai fora do âmbito dos poderes de cognição deste STA no âmbito do presente recurso ex vi do disposto no artigo 12.º, n.º 4 do ETAF e do artigo 150.º, n.ºs 3 e 4 do CPTA.

2.2.4. Em suma, mesmo a admitir-se — na interpretação mais favorável aos requerentes do pedido — que o conceito de “aglomerado urbano” é utilizado no ponto 5.3. do Despacho SEOP 37-XII/92 com um sentido “autónomo” daquele que lhe é atribuído pela legislação de regulação do solo, como admitiram também ambas as instâncias, sempre ficaria prejudicada a sua aplicação por a realidade fáctica não compreender, à data do pedido, as restantes características impostas no referido 5.3 do Despacho SEOP 37-XII/92 (designadamente, a existência de um troço de arruamento urbano com, pelo menos, 250m de extensão), como resultou da documentação em imagens junta aos autos, nos trechos das decisões antes transcritos.

Por essa razão, a solução do caso concreto só poderia ser a que lhe foi dada pelas Instâncias, no sentido de julgar improcedente a acção.

III – Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelos Recorrentes.

Lisboa, 9 de Março de 2023. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - Carlos Luís Medeiros de Carvalho - Ana Paula Soares Leite Martins Portela.