Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03440/19.8BEPRT
Data do Acordão:03/08/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:GUSTAVO LOPES COURINHA
Descritores:PAGAMENTO POR CONTA
COIMA
Sumário:I - Apenas relativamente ao último pagamento por conta pode o sujeito passivo valer-se da faculdade de não cumprir a sua obrigação tributária.
II - Tal faculdade justifica-se por, nessa altura avançada do ano fiscal, já se conseguir com razoável fiabilidade estimar se tais pagamentos por conta são suficientes (ou não) para satisfazer o valor global do imposto relativo a esse ano.
Nº Convencional:JSTA000P30706
Nº do Documento:SA22023030803440/19
Data de Entrada:12/31/2020
Recorrente:A... SOCIEDADE DE ENSINO, LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


I – RELATÓRIO

I.1 Alegações
A... – SOCIEDADE DE ENSINO, LDA., melhor identificada nos autos, vem recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente o presente recurso por ela deduzido contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças do Porto 3, que a condenou no pagamento de uma coima no montante de € 2.468,19, decorrente da falta de entrega do Pagamento por Conta (IRC) em 31/7/2019, relativo ao período de tributação 201907, no montante global de € 8.145,86.
Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 62 a 73 do SITAF;
1. Salvo o devido respeito – que é muito – a douta sentença recorrida padece de erro devendo ser revogada.
2. Face aos factos dados como provados (que aqui se dão por integralmente reproduzido) não estão preenchidos os pressupostos da contraordenação pela qual veio a ser condenada.
3. Com base em documentos e factos provados não é possível subsumir a prática da contraordenação.
4. No ano de 2019 foi proferida decisão de fixação da coima, que foi notificada à Recorrente nesse mesmo ano com o teor, que consta dos autos.
5. A Recorrente veio invocar a ilegalidade do procedimento de contra-ordenação atenta a data da sua instauração, requerendo a dispensa de aplicação da coima e sem prescindir a atenuação da coima.
6. A douta sentença a quo fez “tábua rasa” de todos os argumentos esgrimidos.
7. Nos termos do artigo 2º do RGIT “constitui infracção tributária todo o facto típico, ilícito e culposo, declarado punível por lei tributária anterior”.
8. Atento o disposto no artigo 1.º do Regime Geral das Contra-Ordenações (RGCO), ex vi artigo 3º, alínea b) do RGIT
9. E o disposto no artigo 104.º, n.º1 do Código de IRC (CIRC) “As entidades que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como as não residentes com estabelecimento estável em território português, devem proceder ao pagamento do imposto nos termos seguintes: a) Em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável ou, nos casos dos nºs 2 e 3 do artigo 8.º, no 7.º mês no 9.º mês e no dia 15 do 12.º mês do respectivo período de tributação; (…)”
10. Por sua vez, dispõe o artº 105º do CIRC o seguinte: “1- Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos termos do n.º 1 do artigo 90.º relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar esses pagamentos, líquidos da dedução a que se refere a alínea e) do n.º 2 desse artigo. 2 - Os pagamentos por conta dos sujeitos passivos cujo volume de negócios do período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar esses pagamentos seja igual ou inferior a (euro) 500 000 correspondem a 80 % do montante do imposto referido no número anterior, repartido por três montantes iguais, arredondados, por excesso, para euros. 3 - Os pagamentos por conta dos sujeitos passivos cujo volume de negócios do período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar esses pagamentos seja superior a (euro) 500 000 correspondem a 95 % do montante do imposto referido no n.º 1, repartido por três montantes iguais, arredondados, por excesso, para euros. 4 — No caso referido na alínea d) do n.º 4 do artigo 8.º, o imposto a ter em conta para efeitos do disposto no n.º 1 é o que corresponderia a um período de 12 meses, calculado proporcionalmente ao imposto relativo ao período aí mencionado.“
11. No entanto, como decorre do disposto no artigo 107.º do CIRC “1 - Se o sujeito passivo verificar, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efetuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria coletável do período de tributação, pode deixar de efetuar o terceiro pagamento por conta. 2 - Verificando-se, face à declaração periódica de rendimentos do exercício a que respeita o imposto, que, em consequência da suspensão da terceira entrega por conta prevista no número anterior, deixou de ser paga uma importância superior a 20% da que, em condições normais, teria sido entregue, há lugar a juros compensatórios desde o termo do prazo em que a entrega deveria ter sido efetuada até ao termo do prazo para o envio da declaração ou até à data do pagamento da autoliquidação, se anterior” .
12. Por seu turno, estabelece o n.º 1 do artigo 114.º do RGIT que “A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido”, estabelecendo ainda a alínea f) do n.º 5 do mesmo preceito legal que “A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações de pagamento especial por conta” .
13. Ora, como decidido pelo STA no Acórdão de 07.03.2007, no rec. 0877/06 “(…) entendemos que, de harmonia com a tipificação da infracção tributária prevista na alínea f) do n.º 5 do artigo 114.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, a falta de prestação de pagamento por conta constitui uma “infracção de resultado” (não, simplesmente, “de perigo”). Com a falta de “pagamento por conta” há certamente o perigo de lesão do interesse protegido pela norma. Há realmente o perigo de a Administração Fiscal deixar de receber o imposto que lhe é devido. Mas o que é importante, na economia da norma de punição em foco, não é o perigo de lesão do interesse protegido. O que verdadeiramente importa, para a norma de punição, é o resultado, ou seja, a efectiva lesão do interesse protegido. Isto é: a presença de imposto devido que não tenha sido entregue”.
14. Ora, como dispõe a alínea b) do artigo 117.º do CIRC os sujeitos passivos de IRC, ou os seus representantes, são obrigados a apresentar declaração periódica de rendimentos, nos termos do artigo 120.º, tendo tal declaração que ser apresentada anualmente, por transmissão electrónica de dados, até ao último dia do mês de Maio, independentemente de esse dia ser útil ou não útil – cfr. n.º 1 do artigo 120.º do CIRC.
15. Retornando ao caso dos autos e como decorre do probatório, a aqui Recorrente vem acusada da prática de infracção contraordenacional prevista e punida pelo artigo 114.º n.º 2 e n.º 5 alínea f) do RGIT, atenta a infracção do artigo 104.º n.º 1 alínea a) do CIRC, isto é, pela falta de entrega do pagamento por conta que deveria ter ocorrido em Julho de 2019
16. Como tal, e repete-se por ser importante, a Recorrente incorreria na contra-ordenação pela qual vem acusada se em resultado da declaração periódica de rendimentos do exercício a que respeita o imposto (2019), se verificasse que deixou de ser paga uma importância superior a 20% da que, em condições normais, teria sido entregue.
17. Saliente-se que, à luz do estatuído pelo n.º 1 do artigo 17.º do CIRC, é permitido até aos contribuintes o não pagamento, desde que se considere que o valor já pago é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria colectável do período de tributação.
18. Ora, ocorrendo o prazo limite de pagamento para entrega da Mod. 22 de IRC no último dia do mês de Maio (cfr. alínea b) do artigo 117.º do CIRC) e tendo a decisão de fixação de coima sido proferida em 09-2019, à data da decisão ainda não dispunha o Serviço de Finanças dos elementos para poder concluir pela existência de infracção por parte da aqui Recorrente, não podendo considerar-se que àquela data a Recorrente incorreu na infracção pela qual vem condenada, procedendo desta forma o alegado.

I.2 – O Ministério Publico apresentou resposta ao recurso interposto apresentado pela recorrente A... – SOCIEDADE DE ENSINO - LDA., com o seguinte quadro conclusivo:
1ª – A recorrente foi condenada pela falta de entrega da primeira prestação tributária do pagamento especial por conta de IRC de 2019, que se venceu em 31/07/2019, prevista e punida pelos artigos 26 – nº 4, 79 e 114 – nº 2 e 5 – al) f) todos do RGIT e defende que não estão preenchidos os elementos do tipo da contraordenação pela qual foi punida, já que o prazo limite para entrega do Modelo 22 do IRC ocorrera em 31/05/2019, e que residualmente estão reunidos os pressupostos para aplicação do instituto da atenuação especial da coima face à inexistência de culpa grave.
2ª - Parece-nos que não estão reunidos os pressupostos para atenuação especial da coima aplicada, nos termos do nº 3, do art.º 18 do RGCO, aplicável por força do disposto no art.º 3º - al) b) do RGIT, porquanto existe prejuízo para a Fazenda Pública com a infração da arguida, tal como se defende na douta sentença recorrida, na medida em que a FP ficou privada do seu crédito, que poderia ter utilizado – e não utilizou, por motivo imputável ao contribuinte, ora recorrente.
3ª – E, por outro lado encontram-se preenchidos os elementos do tipo de contraordenação pela qual a arguida foi sancionada, pois em 31/05/2019 terminava o prazo para entregar o Modelo 22 do IRC de 2018 e não de 2019, e a arguida foi sancionada por não ter pago a 1ª prestação do PEC do IRC de 2019, que se venceu em 31/07/2019, pelo que em nosso entendimento não assiste nesta parte qualquer razão à recorrente.
4ª - Ora, da prova produzida e dos factos julgados como provados, resulta que os elementos do tipo de contraordenação pela qual a arguida foi sancionada encontram-se preenchidos, e não resulta que a FP não tenha sofrido prejuízo com a infração da recorrente, pelo que é motivo suficiente para a arguida não poder beneficiar do instituto da especial atenuação da coima, razão pela qual o recurso tem de ser julgado improcedente.

I.3 - Parecer do Ministério Público
Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo:
A... Sociedade de Ensino, L.da., apresenta o presente recurso, da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a qual julgou improcedente o recurso interposto, e manteve integralmente a decisão do Chefe do Serviço de Finanças do Porto 3, que a condenou no pagamento de uma coima no montante de € 2.468,19, decorrente da falta de entrega do Pagamento por Conta, em 31/7/2019, relativo ao período de tributação 201907, no montante de € 8.145,86.
O Ministério Público junto da 1ª Instância apresentou resposta ao recurso interposto pela arguida, pronunciando-se pela improcedência do recurso em termos juridicamente corretos, com os quais concordamos e que nada temos a acrescentar ao mesmo.
Assim, entendemos que deve ser proferida decisão no sentido da improcedência do recurso, com a manutenção da sentença recorrida.

I.5 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – De facto
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto a fls. 42 a 51 e seguintes do SITAF:
1. A sociedade comercial “A... – SOCIEDADE DE ENSINO, LDA.”, Contribuinte Fiscal nº ..., até 31/7/2019, não efectuou a entrega do Pagamento por Conta (IRC), correspondente ao período 201907, que importava em € 8.145,86.
2. A Arguida, ora Recorrente, apurou, no exercício de 2018, um volume de negócios de € 2.287.473,87, e uma colecta de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, no montante de € 26.095,18, conforme documento a fls. 11 dos autos que se dá por reproduzido.
3. Dá-se por reproduzido o auto de notícia de fls. 16.
4. Por decisão condenatória que consta a fls. 23/24, e se dá por reproduzida, foi fixada uma coima no montante de € 2.468,19, porquanto a ora Recorrente, em 31/7/2019, não entregou o primeiro Pagamento por Conta, referente ao período de tributação 201907, em violação ao disposto no artigo 104º, nº 1, alínea a), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, infracção prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos artigos 114º, n º 2, e nº 5, alínea f), e 26º, nº 4, do Regime Geral das Infracções Tributárias.
5. A Arguida, ora Recorrente, não actuou com o cuidado a que estava obrigada, face às circunstâncias apuradas, bem sabendo que o seu comportamento era proibido e punido por lei.

II.2 – De Direito
I. O presente recurso incide sobre a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o qual julgou improcedente o recurso interposto pela recorrente - A... – SOCIEDADE DE ENSINO, LDA – mantendo a decisão do Chefe de Finanças de Porto, que lhe aplicou coima no valor de € 2.468,19 decorrente da falta de entrega do Pagamento por Conta de IRC de 2019, que se venceu no dia 31/7/2019, relativo ao período de tributação 201907, no montante global de € 8.145,86.

A douta decisão considerou a conduta da aqui recorrente sujeita a contra-ordenação prevista nos termos das disposições conjugadas dos artigos 114º, n.º 2, e n.º 5, alínea f), e 26.º, n.º 4, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias (doravante, RGIT).

II. Com o assim decidido, discorda a Recorrente, alegando, em síntese, que “…a Recorrente incorreria na contra-ordenação pela qual vem acusada se em resultado da declaração periódica de rendimentos do exercício a que respeita o imposto (2019), se verificasse que deixou de ser paga uma importância superior a 20% da que, em condições normais, teria sido entregue.

Mais alega que não estão preenchidos os pressupostos de facto e de direito para que seja julgada por verificada a infracção e consequentemente a referida coima, pelo que invoca “…a ilegalidade do procedimento de contra-ordenação atenta a data da sua instauração, requerendo a dispensa de aplicação da coima e sem prescindir a atenuação da coima.

III. Face aos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela Recorrente, as questões que cumpre decidir subsumem-se a saber se a decisão vertida na sentença que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida deve ser ou não revogada, a saber:

- se estão ou não preenchidos os elementos do tipo da contra ordenação pela qual a recorrente foi punida;

- se estão preenchidos os requisitos para aplicação do instituto da atenuação especial da coima.

IV. Comecemos por analisar a questão do preenchimento (ou não) do tipo contra-ordenacional aqui em discussão, constante do artigo 114.º, n.º 2 e n.º 5, alínea f) do RGIT, que estabelece: “Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da prestação tributária:

f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações de pagamento especial por conta.

Ora, comecemos por sublinhar que, na sistemática do Código do IRC, o pagamento por conta configura, como a denominação logo indica, um adiantamento do imposto devido a final. E, na cronologia do imposto, o valor devido a final é apurado por auto-liquidação, em Maio do ano subsequente ao ano em causa.

Acresce que, nos termos do respectivo Código, os pagamentos por conta de IRC devem ter lugar em Julho, Setembro e Dezembro do próprio ano a que respeitam (artigo 104.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRC), podendo o último destes pagamentos não ser realizado pelo sujeito passivo, nas condições previstas no artigo 107.º, n.º 1 do Código do IRC.

E entendemos que é precisamente a respeito da interpretação a dar a este dispositivo – que contem uma faculdade conferida ao sujeito passivo de não proceder ao pagamento por conta – que se centra o presente recurso, sustentando o Recorrente que, não sendo devido o pagamento por conta, a sua realização não pode ser sujeita a norma contra-ordenacional nem ao pagamento da correspondente coima.

Sem razão, como se verá.


V. Dispõe o artigo 107.º, n.º 1 do Código do IRC o seguinte: “Se o sujeito passivo verificar, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efetuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria colectável do período de tributação, pode deixar de efetuar o terceiro pagamento por conta.
Pois bem, aquilo que resulta – e julgamos que cristalinamente – do artigo aqui em causa é que apenas o último dos pagamentos por conta devidos (o respeitante a Dezembro do ano a que respeitam tais pagamentos) pode deixar de ser efectuado; apenas relativamente a um tal pagamento por conta pode o sujeito passivo valer-se de tal faculdade de não cumprir a sua obrigação tributária, e tal estriba-se, precisamente, em, nessa altura avançada do ano fiscal, já se conseguir com razoável fiabilidade estimar se tais pagamentos por conta são suficientes (ou não) para satisfazer o valor global do imposto relativo a esse ano.
Para que não sobrem dúvidas: os vários pagamentos por conta não configuram deveres tributários sujeitos à livre decisão do contribuinte em pagá-los ou não, mas antes obrigações tributárias incondicionais, exceto nos condicionalismos limitado do artigo 107.º, n.º 1 do Código do IRC e exclusivamente quanto ao último dos pagamentos por conta; aliás, se assim não fosse, a pretendida razão do Recorrente forçaria à inevitável conclusão da absoluta inutilidade do respectivo regime de pagamentos por conta e inviabilidade de aplicação da supra transcrita norma contra-ordenacional constante do artigo 114.º, n.º 5, alínea f) do RGIT.
É por não alcançar o escopo do artigo 107.º do Código do IRC – de onde nasce a obrigação tributária – que o Recorrente fundamenta indevidamente o seu recurso, alegando a não obrigação de realizar o pagamento por conta relativamente ao qual se verificou o incumprimento.
Como bem andaram os serviços – e o respectivo Chefe do Serviço de Finanças – e como logo se dá nota na Informação que acompanha os autos administrativos e sustenta a aplicação da coima junto do Tribunal: “3 - O contribuinte não efectuou o 1.º pagamento por conta (Julho) que é sempre obrigatório” (sublinhado nosso).
Por fim, apenas sublinhar que o n.º 2 do artigo 107.º do Código do IRC se reporta exclusivamente à exigibilidade de juros compensatórios a favor do Estado, sendo tal norma absolutamente irrelevante em sede contra-ordenacional, nos termos em que aqui sucede.
É, por conseguinte, absolutamente rigoroso o enquadramento jurídico, assim como é correta a aplicação da consequente coima correspondente ao ilícito identificado pelos Serviços.
Donde, em resposta à primeira questão, importa concluir que se encontram integralmente preenchidos os elementos do tipo da contra-ordenação pela qual a recorrente foi punida, não podendo ser concedido provimento ao recurso nesta parte.

VI. Quanto à segunda questão – requisitos para aplicação do instituto da atenuação especial da coima, previsto no artigo 32.º, n.º 3 do RGIT – e apesar de a Recorrente se limitar a verter cinco palavras em contestação da sentença recorrida: “sem prescindir a atenuação da coima”, entendemos que, também aqui, andou bem a sentença recorrida.
Por isso, limitamo-nos a remeter para o teor da sentença recorrida, para sustentar a não procedência do recurso a este respeito: “A Recorrente sustentou que estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 32º, nº 2, do Regime Geral das Infracções Tributárias para a atenuação especial da coima, pois reconheceu a sua responsabilidade e assumiu tal responsabilidade
O artigo 32º, nº 2, do Regime Geral das Infracções Tributárias, prevê “Independentemente do disposto no n.º 1, a coima pode ser especialmente atenuada no caso de o infractor reconhecer a sua responsabilidade e regularizar a situação tributária até à decisão do processo.”.
Em conformidade com o estatuído no preceito transcrito, independentemente do prejuízo efectivo que se verificou pelo atraso na entrega da prestação tributária, pode atenuar-se especialmente a coima se a falta revelar um diminuto grau de culpa e a situação for regularizada até à decisão do processo.
Como ensina o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26/10/2011, Processo nº 85/11, ¯A atenuação especial da coima prevista no nº 2 do art. 32º do Código de Procedimento e Processo Tributário exige a verificação cumulativa de dois pressupostos: o reconhecimento, por parte do infractor, da sua responsabilidade e a regularização da situação tributária até à decisão do processo.
Conforme decorre da defesa apresentada no presente recurso a Recorrente não reconheceu a sua responsabilidade, apesar de o alegar, pois considerou não estarem cumpridos os pressupostos para a aplicação da coima, uma vez que não perspectivava apresentar lucro tributável no exercício de 2019.
Neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25/9/2019, Processo nº 03071/15.1BESNT, no qual se lê: "I – O reconhecimento da responsabilidade ocorre mediante o pagamento da prestação tributária em falta e das custas, e o recurso apresentado, nos termos do art. 80.º n.º 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, o qual se esgota em discordância quanto aos limites e montante da coima aplicada.".
Destarte, não se encontram reunidos os pressupostos para que a coima seja especialmente atenuada, ao abrigo do disposto no artigo 32º, nº 2, do Regime Geral das Infracções Tributárias.” (sublinhados nossos)
Assim, por falta da verificação do condicionalismo de que depende a aplicação deste regime, e atenta a natureza exclusivamente de Direito do presente recurso, nada mais há a fazer do que concluir, com base nos factos consolidados no Probatório, no sentido da não aplicação do mesmo ao presente caso.
Donde, também por aqui, o presente Recurso não merece provimento.


III. CONCLUSÕES
I - Apenas relativamente ao último pagamento por conta pode o sujeito passivo valer-se da faculdade de não cumprir a sua obrigação tributária.
II - Tal faculdade justifica-se por, nessa altura avançada do ano fiscal, já se conseguir com razoável fiabilidade estimar se tais pagamentos por conta são suficientes (ou não) para satisfazer o valor global do imposto relativo a esse ano.


IV. DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Supremo Tribunal em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 8 de Março de 2023. – Gustavo André Simões Lopes Courinha (relator) - Anabela Ferreira Alves e Russo - José Gomes Correia.