Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0286/16
Data do Acordão:01/25/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
BENEFÍCIO DA EXCUSSÃO PRÉVIA
Sumário:I - Embora o responsável subsidiário goze do direito de se opor a que a execução dos seus bens se efectue enquanto não forem penhorados e vendidos todos os bens do devedor principal (benefício da excussão), a reversão da execução fiscal contra si pode efectuar-se em momento anterior a essa venda, desde que os bens penhoráveis do devedor principal (e eventuais responsáveis solidários) sejam fundadamente insuficientes para o pagamento da dívida exequenda e acrescido (artigos 23.º n.º 2 da LGT e 153.º n.º 2 do CPPT).
II - Assim, à face da LGT, concluindo-se pela «fundada insuficiência» de bens penhoráveis do devedor originário, pode ser decidida a reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens da responsabilidade subsidiária esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário.
III - Tal interpretação não se afigura violadora dos princípios da justiça, da capacidade contributiva, da igualdade ou da proporcionalidade.
Nº Convencional:JSTA000P21344
Nº do Documento:SA2201701250286
Data de Entrada:03/08/2016
Recorrente:A...
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:



A……………….., inconformado, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (TAF de Penafiel) datada de 4 de Dezembro de 2015, que julgou improcedente a oposição por si deduzida na qualidade de revertido no processo de execução fiscal nº 42192012010220 e apensos do Serviço de Finanças da Trofa, relativo a dívidas no valor de € 88.081,71, relativas a IVA, IRS e IRC do CLUBE DESPORTIVO ……….

Alegou, tendo concluído como se segue:
A- O acórdão recorrido professa uma tese que será possível aquilatar antes a excussão prévia a fundada insuficiência de bens penhorados do devedor principal e, bem assim, que tal circunstância não obstará à reversão.
B- Só quando é instaurado um processo de execução contra a sociedade (ou Clube), sujeito passivo da relação jurídica tributária, é que poderá instaurar-se um processo de execução fiscal contra o devedor subsidiário, e só nessa medida é que o responsável subsidiário poderá vir a responder tributariamente.
C- O processo de execução fiscal visando a cobrança coerciva de receitas tributárias, deve cumprir o fim da tributação que se encontra consagrado no art.° 5.° da LGT, isto é, a satisfação das necessidades financeiras do Estado, promovendo a justiça social, a igualdade de oportunidades e as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, respeitando os princípios da generalidade, igualdade, legalidade e justiça material, incumbência constitucionalmente prevista no art.° 81.° alínea b) e art.° 103.° n.° 1.
D- A responsabilidade subsidiária dos membros dos órgãos sociais encontra no art.° 23.° e 24.° da LGT os pressupostos essenciais para a sua concretização, os quais estão directamente relacionados com a natureza subsidiária que conforma e delimita o seu funcionamento.
E- O art° 23.° n.° 2 da LGT, é claro ao estabelecer que a reversão do processo de execução fiscal está dependente da «fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários sem prejuízo do benefício da excussão».
F- O beneficio da excussão prévia, tal como aparece também definido no regime jurídico da fiança, é o privilégio concedido aos responsáveis no sentido da excussão do património do devedor originário para cumprimento da dívida, objecto do processo, seja ele comum de execução seja de execução fiscal.
G- Trata-se de um privilégio porque essa responsabilidade não é solidária mas apenas subsidiária, a operar quando o devedor não cumpre e não tenha na sua propriedade bens que possam cobrir a dívida na totalidade ou os devedores solidários também não a cumpram.
H- Os pressupostos que deram causa à relação jurídica subjacente verificaram-se relativamente ao devedor originário e não relativamente ao responsável subsidiário.
I- Consequentemente, sendo o devedor originário, o Clube, o sujeito passivo da relação jurídica tributária de onde emerge uma obrigação consequência do facto tributário que lhe deu origem e serve de base, apenas ele deverá ser executado até onde for possível a penhora e a venda dos bens da sua propriedade, porque só o Clube deverá responder perante o fisco.
J- Os membros dos órgãos sociais apenas deverão ser chamados a título subsidiário, como resulta claramente enunciado no art.° 9º n.° 3 e no art.° 153.° n.° 2, ambos do CPPT, pelo que só terão de responder após a excussão do património do Clube, que é o verdadeiro devedor da dívida objecto tanto do procedimento tributário como do processo de execução fiscal.
K- A excussão é requisito necessário para que o responsável subsidiário do art.° 24.° da LGT possa ser parte legítima no processo de execução fiscal, pelo que se apresenta como estranha e extravasando a ratio da norma legal o entendimento que independentemente da excussão prévia do património do devedor originário já pode o processo de execução fiscal ser revertido contra o responsável subsidiário.
L- O posicionamento da sentença recorrida é, assim, contrário às normas legais previstas na LGT e no CPPT, em violação do princípio da legalidade, pois se o art.° 153°, n.° 2, do CPPT, faz depender a responsabilidade subsidiária da excussão do Património do Clube, devedor e sujeito passivo da relação jurídica tributária e, bem assim, da inexistência de bens do Clube, a melhor doutrina (DIOGO LEITE CAMPOS) alerta para o facto que não basta a fundada insuficiência após a penhora, sendo imperioso e imprescindível, para operar a reversão e a legitimidade dos responsáveis como executados no processo de execução fiscal, que após esta fase se efective a venda dos bens nos termos dos art.° 248.° do CPPT, até porque através da penhora ainda não se sabe qual o valor pelo qual os bens vão ser vendidos, que poderá ser superior ao valor base dos bens inscrito no auto, aferido nos termos do artº. 250.° n.° 1 alínea a) e b) do CPPT.
M- Por exemplo, bastará ver-se que nos imóveis o valor de venda nunca é inferior ao valor patrimonial constante na respectiva matriz, o qual nunca corresponderá ao seu valor real de mercado.
N- Apenas depois de penhorados e vendidos os bens do Clube que respondem pelo incumprimento da obrigação é que a administração fiscal poderá reverter a execução contra os membros dos órgãos sociais devido à subsidiariedade da sua responsabilidade e apenas pela diferença do valor conseguido pela venda dos bens do devedor originário e o montante total da dívida exequenda.
O- A jurisprudência invocada na decisão tem quase 10 anos, pelo que não podem os tribunais ficarem reféns de anteriores decisões, pois o sistema jurisdicional decisório deve evoluir numa dialéctica dinâmica e constante com o problema, uma vez que a jurisprudência configura o «momento da objectivação e estabilização de uma já experimentada realização problemático-concreta do direito» (Cfr. NEVES, Castanheira, in “Metodologia Jurídica. Problemas Fundamentais”, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, p. 158), que deverá ser capaz de assimilar novas experiências e novas intenções proclamadas pelas normas através das quais o direito nasce e se vai enriquecendo.
P- A tarefa do julgador não se pode limitar por facilidade prática a subsumir-se a uma mera repetição em concreto do legislador, conforme defende CASTANHEIRA NEVES (in “Metodologia Jurídica. Problemas Fundamentais”, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, p. 19), cumprindo-lhe desenhar o entendimento jurisprudencial acerca da responsabilidade tributária subsidiária prevista no art.° 24.° da LGT e deslindar a validade do pensamento sufragado pelo julgador como fonte mediata de direito fiscal.
Q- A douta Sentença recorrida segue uma linha jurisprudencial errada, que vem entendendo que o benefício da excussão prévia não é pressuposto da reversão da execução fiscal para o responsável subsidiário, quando no presente recurso se entende exactamente o inverso, isto é, que é pressuposto da reversão da execução fiscal.
R- Se no regime anterior à LGT, o art° 13.° do CPT carecia de constitucionalidade por fazer recair sempre sobre os responsáveis subsidiários o ónus da prova da sua inculpabilidade na insuficiência do património da sociedade, devedora originária de imposto, mesmo que tal inconstitucionalidade não tivesse sido acolhida pelo Tribunal Constitucional, parece que o entendimento do STA quanto ao art.° 239.° desse mesmo diploma estava em conformidade com os princípios que subjazem à responsabilidade subsidiária.
S- Isto é, a prévia excussão do património do devedor originário antes de operar a reversão.
T- O Pleno do STA, em sede de recurso de oposição de julgados, no Acórdão de 17 de Março de 2000, publicado no Apêndice ao Diário da República, de 8 de Novembro de 2001, entendeu que a excussão prévia do património do devedor originário de imposto era condição necessária e pressuposto essencial para operar a reversão contra o responsável subsidiário.
U- Este entendimento foi feito por uma razão de justiça para com os responsáveis subsidiários, de modo a compensar a injustiça operada pelo art.° 13.° do CPT (à data vigente).
V- Consequentemente, o entendimento que a reversão operará sempre, independentemente da prévia excussão do património do devedor originário, face ao qual o facto tributário se verificou, carece de fundamentação material que o suporte, apenas se alicerçando na alteração da letra da lei, mas que descura, por completo, a sua teleologia e a natureza subsidiária da responsabilidade.
W- Vejamos, o julgador argumenta que, uma vez revogado o CPT e alterada a redacção do conteúdo da norma respectiva na LGT - art.° 23.° n.° 2 - e no CPPT - art.° 153.º - e não estando patente a prévia excussão do património do devedor nessas previsões, a excussão está afastada como pressuposto da reversão, ainda que diga que mesmo depois de revertida a execução sempre haverá excussão do património do devedor.
X- Na linha de pensamento expendido pelo STA, o mesmo se poderia dizer relativamente ao art.° 239.° do CPT que revogou o CPCI e que alterou o conteúdo da redacção do art.° 146°, uma vez que na vigência deste último diploma, a prévia excussão do património do devedor era condição de legitimidade do responsável subsidiário, e assim, entrando em vigor o CPT e alterado a letra da lei da norma correspondente modificando a redacção, deveria também ter-se alterado o sentido da mesma, o que efectivamente não sucedeu como resulta do acórdão do STA de 17 de Março de 2000.
Y- Consequentemente, o n.° 2 do art.° 23.° da LGT bem como o art.° 153.° do CPPT, tal como também resultava da lei anterior e cujo sentido se deverá manter não obstante a redacção ser díspar, deverá ser interpretado, nos termos gerais de direito - art.º 11.° da LGT ex vi art. 9.° do CC - e no sentido de que deverão os bens do devedor originário ou dos responsáveis solidários serem excutidos previamente à reversão e esta terá lugar quando se concluir pela sua «fundada insuficiência» objectivada pela excussão.
Z- Neste sentido, veja-se o posicionamento de DIOGO LEITE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA (in “Lei Geral Tributária Comentada e anotada, 3.ª ed., Vislis Editores, Lisboa, Setembro de 2003, p. 135), que sustenta que «o n.° 2 do art.° 23.° consagra o benefício da excussão prévia. Este benefício já decorria do regime anterior (...) pelo que o n.° 2 tem um significado interpretativo. O benefício da excussão significa que antes de revertida a execução contra o responsável subsidiário, devem ter sido penhorados os bens e vendidos os bens do devedor principal e dos responsáveis solidários».
AA- E o resultado apurado pela excussão deverá ser deduzido ao valor da execução total e apenas esse deve ser revertido contra o responsável subsidiário, como defendem na obra citada DIOGO LEITE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, pois de outro modo, o responsável subsidiário tornar-se-ia solidariamente responsável com o devedor originário.
BB- Este é o cerne e a justificação da modificação operada pelo Decreto-lei 68/87 de 9 de Fevereiro relativamente aos regimes anteriores, consagrando a responsabilidade subsidiária, face à qual a excussão do património do devedor era condição necessária para a reversão da execução e, assim, a interpretação das normas reguladoras da responsabilidade deverá ser efectivada nesse sentido, tendo em consideração o espírito da norma e os princípios que a mesma comporta.
CC- A intenção do legislador com a referência «sem prejuízo do benefício da excussão» tende a ser no sentido dessa mesma excussão ser prévia à reversão implicando a venda dos bens do executado principal e, dessa forma, a legitimidade do responsável subsidiário como executado na diferença entre o montante devido e o valor conseguido com a venda dos bens penhorados.
DD- Neste sentido, veja-se o entendimento de JOSÉ ANTUNES RIBEIRO (in “Lei Geral Tributária Comentada e anotada”, Quid Juiris?, Lisboa, 2003, p. 47) que refere que «o benefício da excussão referido no n.° 2 impõe que a reversão não possa ter lugar, sem terem sido vendidos os bens que foram penhorados ao devedor originário».
EE- Esta posição na doutrina encontra apoio, pelo menos, implicitamente no n.° 3 do art.° 23.° da LGT que prescreve que «Caso, no momento da reversão não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado (...)».
FF- A prévia excussão do património do devedor, além de dever funcionar como pressuposto processual em sede de execução fiscal, por força do art.° 153.° do CPPT e do art.° 23.° n.° 2 da LGT, deve ser entendida como pressuposto essencial e imprescindível da própria responsabilidade dos membros dos órgãos sociais prevista no art. 24.° da LGT, independentemente da suficiência do patrimônio do devedor para o cumprimento da obrigação tributária.
GG- O entendimento de que a excussão não é prévia à reversão da execução fiscal contra o devedor subsidiário, atenta contra o princípio da justiça na medida em que a própria noção de «fundada insuficiência» é um conceito indeterminado que poderá funcionar desfavoravelmente contra o responsável subsidiário, aliada à circunstância da sua concretização se encontrar na disponibilidade da própria administração fiscal, não sendo «adequado a promover a real igualdade da sua aplicação (Cfr. CAMPOS, Diogo Leite de Campos; CAMPOS, Mónica Horta Neves de Leite de, in “Direito Tributário”, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2003, p. 121), e que se reflecte na violação do princípio da capacidade contributiva do responsável subsidiário à luz do art.° 4.° da LGT. Isto porque, ele mesmo já foi tributado em sede de IRS pelo exercício das suas funções, o que até poderá configurar uma situação de asfixia tributária que desembocará num impedimento objectivo de escolha e de livre exercício da actividade de administração/fiscalização numa sociedade (ou Clube no caso em apreço).
HH- Daqui resulta uma eventual dupla-responsabilidade por dívidas fiscais - pelas pessoais e pelas da sociedade (ou Clube) - o que é expressamente proibido pelo art.° 7° n.° 3 da LGT.
II- A solução propugnada pela douta Sentença recorrida coloca em causa o princípio da proporcionalidade - art.° 18.° n.° 2, com repercussões no art.° 266°, ambos da CRP, e nos art.° 55.° da LGT e art.° 46.° do CPPT - uma vez que os meios adequados para a prossecução do interesse público devem ser os que menos sacrifícios comportarem para os particulares.
JJ- A reversão antes da excussão do património do executado configura um mecanismo desproporcional de arrecadação de receitas públicas e de exigência coerciva do pagamento da dívida fiscal, restringindo os direitos do administrador/gerente como responsável subsidiário, para além do que seria necessário e adequado com vista à tributação subsidiária, transformando o responsável subsidiário em responsável solidário.
KK- Com tal entendimento, a administração fiscal acaba por ficar desonerada de executar cabalmente o património do devedor originário, uma vez que a execução já corre contra o responsável subsidiário, funcionando a reversão fiscal antes da excussão como se de um meio cautelar se tratasse, desenquadrado das providências cautelares consagradas no art.° 135.° do CPPT e permitidas pelo art.° 51.º da LGT, assente na «fundada insuficiência dos bens penhoráveis» quando até se deveria exigir a «comprovada insuficiência» a ser indagada pelo resultado da venda desses bens.
LL- Consequentemente, ao contrário do que vem decidido e sustentado pela douta Sentença do TAF de Penafiel, a reversão da execução só deverá ser efectivada depois de excutido o património do devedor originário com a consequente venda dos bens, o que está de acordo com o preceituado no art.° 153.° do CPPT, segundo o qual tem legitimidade como executado o responsável subsidiário que assume a qualidade de sujeito passivo do imposto nos termos do art.° 18.° da LGT, mas só quando o resultado dessa excussão for comprovadamente insuficiente para o cumprimento total da dívida (Cfr. CAMPOS, Diogo Leite de Campos; CAMPOS, Mónica Horta Neves de Leite de, in “Direito Tributário”, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2003, p. 394) e verificados os pressupostos do art.° 24.° da LGT, o que o tornará responsável apenas na diferença entre o montante total da obrigação exequenda e o resultado do produto da venda dos bens excutidos do devedor originário, só assim se respeitando os princípios que presidem à responsabilidade subsidiária.
MM- Pelo que deverá ser revogada a douta sentença recorrida, não podendo concluir-se de outra forma que não seja pela ilegalidade da reversão fiscal contra o Recorrente, por incumprimento do requisito de prévia excussão prévia.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogado a douta sentença recorrida.

Não foram produzidas contra-alegações.

O Ministério Público, notificado, pronunciou-se pela improcedência do recurso. Resumidamente, entende que estando devidamente demonstrada a fundada insuficiência do património do devedor originário para pagar a dívida exequenda e acrescido, nada obsta à efectivação da reversão, nem é condição para esta, a excussão prévia.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) O Serviço de Finanças da Trofa instaurou contra o executado originário, entre outros, os seguintes PEF (fls. 19 a 42):





B) O órgão de execução fiscal reverteu estes PEF contra o opoente por despacho de 02/12/2013 (fls. 19 a 42).
C) Contra o executado originário foi deduzido o processo especial de revitalização n° 3506/12.5 TBSTS em que foram reclamados créditos que ultrapassam sete milhões de euros (fls. 19 a 42).
D) No processo especial de revitalização foi concluído o processo negocial sem aprovação do plano de recuperação e em consequência prosseguiu o processo de insolvência n.° 3954/12.OTBSTS do 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso (fls. 11 a 13 e 19 a 42).
E) O executado originário foi declarado insolvente por sentença de 11/06/2013 proferida no processo n.° 3954/12.OTBSTS (fls. 11 a 13 e 19 a 42).
F) O executado originário tem os seguintes imóveis (fls. 14, 19 a 42 e 123 a 129)
F.1) Prédio urbano sito na ………….., Trofa, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 9873, avaliado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis (CIMI) em €132.960,33; e
F.2) Prédio urbano sito na ………………, Trofa, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 10998, avaliado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis (CIMI) em €1.064.433,50, descrito na Conservatória do Registo Civil, Predial, Comercial e Automóveis da Trofa sob o n.° 4441/20080612, da freguesia de ……………….
G) O executado originário tem ainda bens móveis avaliados em €25.000,00, valor indicado pelo oponente (fls. 14 e 19 a 42).
H) O prédio referido em F.2) tem os seguintes ónus e encargos (fls. 123 a 129):
H.1) Penhora registada pela Ap. 38 de 29/11/2011, a favor de B………… para garantia da quantia exequenda de €206.252,45;
H.2) Penhora registada pela Ap. 352 de 13/01/2012, a favor de C……………, SA, para garantia da quantia exequenda de €8.494,20;
H.3) Penhora registada pela Ap. 2172 de 16/03/2012, a favor da Fazenda Nacional para garantia da quantia exequenda de €99.019,30, dos PEF n.°s 4219201101033000 e 4219201101035541 e apensos, do Serviço de Finanças da Trofa, processos não abrangidos pelos PEF a que respeita esta oposição;
H.4) Penhora registada pela Ap. 300 de 30/05/2012, a favor da Fazenda Nacional para garantia da quantia exequenda de €140.345,91, do PEF n.° 4219200201029657 e apensos, do Serviço de Finanças da Trofa, processos não abrangidos pelos PEF a que respeita esta oposição;
H.5) Penhora registada pela Ap. 2673 de 15/06/2012, a favor da D……………., Ldª, para garantia da quantia exequenda de €65.188,76;
H.6) Hipoteca voluntária registada pela Ap. 297 de 06/06/2014, a favor da Fazenda Nacional para garantia da quantia de €1.100.000,00, no âmbito do processo de insolvência n.° 3954/12.OTBSTS, do 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso; e
H.7) Hipoteca voluntária registada pela Ap. 298 de 06/06/2014, a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS) para garantia da quantia de €120.528,66, no âmbito do processo de insolvência n.° 3954/12.OTBSTS, do 3.° Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso.
I) No processo de insolvência foi aprovado o plano de insolvência que prevê o pagamento do crédito da administração tributária de €794.757,83, em prestações mensais, com a prestação de garantia constituída por hipoteca do prédio referido em F.2) (fls. 110 a 129).
Nada mais se deu como provado.

Há agora que apreciar o recurso que nos vem dirigido.
A questão colocada no presente recurso já não é nova, encontrando-se suficientemente escalpelizada no acórdão datado de 12.10.2016, recurso n.º 0287/16, sendo certo que, além do mais, as conclusões das alegações são exactamente iguais em ambos os recursos.
Assim, por economia de meios, aderimos sem reservas ao que ficou ali decidido e que foi o seguinte:
4 – Questões a decidir
São as de saber se, como alegado, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao ter julgado improcedente a oposição, no entendimento de que a excussão dos bens do devedor originário não tem necessariamente de ser prévia ao acto de reversão e se tal entendimento viola os princípios da justiça, da capacidade contributiva e da proporcionalidade.
(…)
A lei tributária é clara quanto à atribuição à responsabilidade dos membros dos órgãos sociais prevista no artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT) de carácter subsidiário em relação às sociedades e entes fiscalmente equiparados originariamente devedores – cfr. o n.º 1 do artigo 24.º da LGT -, como o é ao fazer depender a reversão contra o responsável subsidiário da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários (artigo 23.º, n.º 2 da LGT) e ao atribuir-lhes o benefício da excussão.
Ora, o benefício da excussão traduz-se no direito do responsável subsidiário de se opor a que a execução dos seus bens se efectue enquanto não forem penhorados e vendidos todos os bens do devedor principal, mas não obsta a que a reversão da execução fiscal contra si possa efectuar-se em momento anterior a essa venda desde que os bens penhoráveis do devedor principal (e eventuais responsáveis solidários) sejam fundadamente insuficientes para o pagamento da dívida exequenda e acrescido (artigos 23.º n.º 2 da LGT e 153.º n.º 2 do CPPT) – cfr. o Acórdão deste STA de 22 de Junho de 2011, rec. n.º 167/11.
Assim, a completa excussão dos bens do devedor originário não é necessariamente prévia ao próprio acto de reversão - como sustenta alguma doutrina e alega o recorrente –, pois que a lei prevê que, caso no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei (cfr. o n.º 3 do artigo 23.º da LGT).
A Lei não faz, pois, depender a reversão, da prévia excussão dos bens do devedor originário. Fá-la depender, isso sim, da inexistência ou da fundada insuficiência de tais bens, fundada insuficiência esta que, de acordo com a lei (cfr. a alínea b) do artigo 153.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário – CPPT), se apura de acordo com os elementos constantes do auto de penhora ou outros de que o órgão da execução fiscal disponha. E assegura ao responsável subsidiário o benefício da excussão mediante a suspensão do processo executivo, desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.
Assim, à face da LGT, concluindo-se pela «fundada insuficiência» de bens penhoráveis do devedor originário, pode ser decidida a reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens do responsável subsidiário esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário – cfr. o Acórdão deste STA de 29 de Setembro de 2006, rec. n.º 0488/06.
Mais entende a lei que a declaração de insolvência do devedor originário não obsta à reversão da execução contra os responsáveis subsidiários, antes a impõe previamente à remessa dos processos à insolvência (cfr. o n.º 7 do artigo 23.º da LGT, aditado pela Lei n.º 64.º-B/2011, de 30 de Dezembro, e os Acórdãos deste STA de 2 de Julho de 2014, rec. n.º 1200/13, de 17 de Dezembro de 2014, rec. n.º 1199/13 e de 25 de Novembro de 2015, rec. n.º 1201/13).

Nenhuma censura merece, pois, o decidido, quando julgou, no caso dos autos, não padecer de ilegalidade o acto de reversão prévio à completa excussão dos bens do devedor originário no âmbito do processo de insolvência, assegurando-se-lhe o benefício da excussão através da suspensão do processo executivo até cumprimento integral do acordo de pagamento em prestações fixado no processo de insolvência, que suspenderá a execução fiscal até ao cumprimento desse plano ou no caso de incumprimento até ao momento em que se execute todo o património do executado originário.
6.2 Da alegada inconstitucionalidade
Alega ainda o recorrente que o entendimento de que a excussão não é necessariamente prévia à reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário atenta contra o princípio da justiça na medida em que a própria noção de «fundada insuficiência» é um conceito indeterminado que poderá funcionar desfavoravelmente contra o responsável subsidiário, aliada à circunstância da sua concretização se encontrar na disponibilidade da própria administração fiscal, não sendo «adequado a promover a real igualdade da sua aplicação» (Cfr. CAMPOS, Diogo Leite de Campos; CAMPOS, Mónica Horta Neves Leite de, in “Direito Tributário”, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2003, p. 121), e que se reflecte na violação do princípio da capacidade contributiva do responsável subsidiário à luz do art. 4.º da LGT. Isto porque, ele mesmo já foi tributado em sede de IRS pelo exercício das suas funções, o que até poderá configurar uma situação de asfixia tributária que desembocará num impedimento objectivo de escolha e de livre exercício da actividade de administração/fiscalização numa sociedade (ou Clube no caso em apreço). Que daqui resulta uma eventual dupla-responsabilidade por dívidas fiscais – pelas pessoais e pelas da sociedade (ou Clube) – o que é expressamente proibido pelo art. 7.º n.º 3 da LGT e que a solução propugnada pela douta Sentença recorrida coloca em causa o princípio da proporcionalidade – art. 18.º n.º 2, com repercussões no art. 266.º, ambos da CRP, e nos art.º 55.º da LGT e art. 46.º do CPPT – uma vez que os meios adequados para a prossecução do interesse público devem ser os que menos sacrifícios comportarem para os particulares, sendo que a reversão antes da excussão do património do executado configura um mecanismo desproporcional de arrecadação de receitas públicas e de exigência coerciva do pagamento da dívida fiscal, restringindo os direitos do administrador/gerente como responsável subsidiário, para além do que seria necessário e adequado com vista à tributação subsidiária, transformando o responsável subsidiário em responsável solidário e que com tal entendimento, a administração fiscal acaba por ficar desonerada de executar cabalmente o património do responsável subsidiário, funcionando a Reversão fiscal antes da excussão como se de um meio cautelar se tratasse, desenquadrado das providências cautelares consagradas no art. 153.º do CPPT e permitidas pelo art. 51.º da LGT, assente na «fundada insuficiência dos bens penhoráveis» quando até se deveria exigir a «comprovada insuficiência» a ser indagada pelo resultado da venda desses bens.
A solução propugnada pelo recorrente – e pela doutrina em que se apoia (citada e não citada: cfr. Vânia Patrícia Filipe Magalhães - O (des)privilégio do beneficium excussionis do responsável tributário subsidiário, in http://www.oa.pt/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?idsc=65580&ida=65523 –, é, indubitavelmente, porque mais restritiva no entendimento dos pressupostos da reversão, mais garantística dos interesses dos responsáveis subsidiários que a propugnada pela sentença recorrida e confirmada por este STA, sendo esta última, porque menos restritiva, menos garantística dos interesses dos particulares ou mais tolerante para com os legítimos interesses da Administração fiscal de tutela do seu crédito.
Não se entende, porém, contrariamente ao alegado, que a interpretação adoptada seja violadora dos princípios da justiça, da capacidade contributiva, da igualdade ou sequer da proporcionalidade, porquanto na ponderação de interesses a que procedeu o legislador tais meios terão sido tidos como necessários aos fins a prosseguir, não repugnando ver como justificada tal necessidade, ao menos se adoptados os critérios que para tal vem adoptando o Tribunal Constitucional relativamente aos regimes substantivos de responsabilidade subsidiária dos gerentes (cfr. os Acórdãos do TC citados no parecer do Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA). Como certo é que não “transforma” o responsável subsidiário em responsável solidário.

Pelo exposto, e sem necessidade de outros considerandos, se conclui que o recurso não merece provimento.

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.
D.n.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2017. – Aragão Seia (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.