Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0217/20.1BELLE
Data do Acordão:06/08/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRS
COMPETIÇÃO DESPORTIVA OFICIAL
PRÉMIO
Sumário:I - No âmbito de uma modalidade desportiva relacionada com a criação e selecção de pombos-correio para competição, a Columbofilia, sendo que, eventos como o descrito nos autos são competições columbófilas em que os prémios são atribuídos em função da classificação dos participantes, na sequência da confrontação desportiva dos respectivos pombos-correio inscritos, traduzindo a classificação final e consequente obtenção dos prémios pelos participantes, o resultado dos treinos realizados, a capacidade física e de orientação dos pombos-correios inscritos e não de qualquer factor sorte, não sendo possível encontrar similaridades entre a actividade de criação e treino de pombos-correio para prestação de provas em concurso columbófilo com, por exemplo, a actividade de um comprador de rifas ou a de um participante num concurso patrocinado por uma empresa comercial no qual alguns dos seus clientes são escolhidos aleatoriamente para receberem um prémio monetário ou um prémio em espécie.
II - A categoria B dos rendimentos sujeitos a tributação em I.R.S. goza de uma característica especial que consiste no seu carácter predominante, relativamente aos rendimentos de qualquer outra categoria, pois que, depois da reforma de 2000, nos rendimentos líquidos da nova categoria B integram-se todos os proventos obtidos ou conexos com a respectiva actividade desenvolvida, sendo que a predominância significa pois que todos os rendimentos, de todas as naturezas, que se possam imputar à actividade profissional ou empresarial.
III - Tendo como pano de fundo o facto de estar em causa uma modalidade desportiva relacionada com a criação e selecção de pombos-correio para competição, a Columbofilia, que se traduz, além do mais, na participação em eventos como o descrito nos autos, o qual permite auferir os valores em disputa nas quatro primeiras corridas descritas e bem assim, quanto à última corrida, 50% do valor líquido apurado no leilão dos pombos, além de que os titulares das equipas premiadas, tal como descrito no RIT, receberam os prémios correspondentes aos valores aí indicados, aumentando, nessa medida, o seu poder aquisitivo, ainda que possa tratar-se de uma participação esporádica, deparamos com uma actividade que tem de ser tributada, sendo que resulta assertivo o enquadramento dos prémios atribuídos às equipas referidas como rendimentos inseridos na categoria B do IRS nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 3º do Código do IRS, enquanto rendimentos profissionais, até por integrarem - “1323 Desportistas” - a lista de actividades cujo exercício dá origem a rendimentos profissionais (art. 151º do Código do IRS - Anexo I).
Nº Convencional:JSTA000P29508
Nº do Documento:SA2202206080217/20
Data de Entrada:10/15/2021
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A....... - ASSOCIAÇÃO DESPORTIVA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, datada de 10-06-2021, que julgou procedente a pretensão deduzida por “A…….. - Associação Desportiva” no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com os actos de liquidação de retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e juros compensatórios (JC), no montante total de € 132.938,33 e de € 140.698.54, referentes aos anos 2016 e 2017, respectivamente.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

I) Decidiu o Meritíssimo Juiz “a quo” pela procedência dos autos de Impugnação, anulando a referida liquidação por considerar que: “A Impugnante, enquanto Associação de direito privado sem fins lucrativos, ao organizar competições desportivas, de caracter amador, relacionadas com a columbofilia, não se pode, num juízo de verosimilhança, considerar no exercício de uma actividade de prestação de serviços, vocacionada para a obtenção de lucros, bem como tal não se presume nem deriva dos concorrentes que apresentam os pombos a competição nas provas [amadoras e desportivas, saliente-se], por aquela organizadas. Nem, em rigor, se entende como o pagamento de “prémios” num concurso aberto a uma multiplicidade de concorrentes se pode considerar uma actividade de natureza comercial ou empresarial.”;

II) Salvo melhor e douta opinião, não pode a FP concordar com tal conclusão;

III) Socorrendo-nos dos ensinamentos de J.L. Saldanha Sanches segundo os quais “A teoria do rendimento-acréscimo patrimonial abrange, na sua formulação mais ampla, todo e qualquer ganho obtido num certo período de tempo, independentemente da forma pela qual se tenha verificado. (…) O Código acolhe assim, uma concepção mais ampla de rendimento e abandona os requisitos formais que acompanham a tributação cedular”.

IV) Nestes termos, a categoria B de IRS abrange rendimentos provenientes de uma enorme diversidade de prestações de serviços…

V) … que, para efeitos das actividades previstas no art.º 151º do CIRS, inclui os desportistas;

VI) Sendo possível, até, verificar-se um acto isolado com rendimento proveniente de uma única prática desportiva;

VII) A previsão da incidência alargada da categoria B de IRS e as características abundantemente descritas no RIT da proveniência dos rendimentos em causa nos presentes autos, afastam a possibilidade de tributação de tais “prémios” em sede de Imposto de Selo e levam ao seu enquadramento na norma de incidência real prevista no art.º 3º n.º 1 alínea b) do CIRS;

VIII) Com efeito, na Tabela Geral de Imposto de Selo encontram-se taxativamente enumerados os actos, factos e situações jurídicas sujeitos a IS;

IX) A verba 11.2 prevê, entre outros, prémios de quaisquer sorteios ou concursos;

X) O art.º 159º n.º 1 da Lei do Jogo, aprovada pelo DL 422/89 e sucessivas alterações, enuncia os jogos de fortuna ou azar como aqueles cujo resultado assenta exclusiva ou fundamentalmente na sorte;

XI) Os concursos organizados pela Impugnante não correspondem a essa característica por resultarem da prévia preparação e treino dos pombos com vista à obtenção de classificação no designado derby, não da pura sorte dos participantes;

XII) Assim, não se encontram sujeitos à previsão da verba 11.2.2 da TGIS os rendimentos descritos no Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que aqui damos por transcrito mas antes à tributação em IRS nos termos ali devidamente fundamentados;

XIII) Ao decidir pela procedência do pedido, incorreu o Mmº Juiz a quo em erro de julgamento, violando a douta sentença recorrida o disposto nos art.ºs 3º n.º 1, b) e o art.º 71º nº 5 ambos do CIRS.

Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida e julgado a Impugnação improcedente como é de inteira JUSTIÇA.”

A Recorrida “A……… - Associação Desportiva” não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em apreciar a bondade da posição da AT quando aponta que, em função da prestação desportiva dos pombos-correio em competições ou concursos columbófilos, o prémio que os seus criadores possam auferir tem enquadramento na categoria B do IRS nos termos do art. 3º nº 1 al. b) do Código do IRS.


3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

1. A Impugnante é uma Associação de direito privado sem fins lucrativos que organiza e desenvolve a prática de actividades desportivas e culturais no âmbito da prática da columbofilia – não controvertido;

2. A Impugnante foi sujeita a procedimento inspectivo, aos exercícios dos anos 2016 e 2017, realizado pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Faro ao abrigo da ordem de serviço n.º OI20180001 – cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial;

3. Em 25 de Novembro de 2019, foi elaborado, no âmbito do supra referido procedimento inspectivo, relatório de inspecção tributária (RIT), pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Faro, do qual se extrai, designadamente, o seguinte excerto:

[IMAGEM]

(…)

[IMAGEM]

- cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial;
4. Em 9 de Dezembro de 2019, foi emitida em nome da Impugnante a liquidação de retenções na fonte de IR n.º 2019 641000840, no valor de € 118.683,33, acrescida de juros compensatórios no valor de € 14.255,00, referente ao ano 2016, no valor total a pagar de € 132.938,33 – cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
5. Em 9 de Dezembro de 2019, foi emitida em nome da Impugnante a liquidação de retenções na fonte de IR n.º 2019 641000842, no valor de € 130.250,00, acrescida de juros compensatórios no valor de € 10.448,54, referente ao ano 2017, no valor total a pagar de € 140.698,54 – cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial;
6. Em 16 de Setembro de 2015, a Impugnante solicitou à Autoridade Tributária informação sobre a sujeição de IVA [Imposto sobre o Valor Acrescentado] e IRC [Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas], bem como a retenção de IRS pelo pagamento dos “prémios” atribuídos a residentes e não residentes, ou eventual Imposto do Selo e IVA, bem como pela compra dos pombos e respectivo leilão – cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial;
7. Em resposta datada de 30 de Setembro de 2015, a Autoridade Tributária informou a Impugnante do seguinte: “[r]elativamente aos prémios informa-se o seguinte em sede de imposto do selo: 1) Os rendimentos resultantes de prémios do bingo/rifas/jogo do loto/prémios de sorteios e concursos são tributados em imposto do selo. 2) O momento do nascimento da obrigação tributária (facto gerador) é aquele em que o prémio for atribuído. 3) O encargo do imposto recai sempre sobre o beneficiário. 4) Quem liquida e entrega o imposto nos cofres do Estado é a entidade que concede os prémios. 5) As taxas a aplicar sobre os valores ilíquidos dos prémios são as seguintes: 25% (bingo)/35% (restantes), acrescendo 10% quando atribuídos em espécie. 6) Os montantes dos prémios devem ser anunciados líquidos de impostos, pelo que, independentemente da taxa, o beneficiário recebe sempre o prémio pelo montante anunciado (…)” – cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial;
8. Em 2015 e 2016, a Impugnante procedeu ao pagamento do Imposto do Selo sobre os “prémios” pagos nesses anos - facto que se extrai do documento n.º 8 junto com a petição inicial;
9. No procedimento inspectivo realizado à Impugnante, pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Faro ao exercício do ano 2015, iniciado em 25 de Janeiro de 2017, não foram efectuadas correcções em sede de retenções na fonte de IRS sobre os “prémios” pagos - facto que emerge do documento n.º 9 junto com a petição inicial.

II- B - DOS FACTOS NÃO PROVADOS
Compulsados os autos, analisados os articulados e atenta a prova documental constante dos mesmos, não existem quaisquer factos com relevância para a decisão, atento o objecto do litígio, que devam julgar-se como não provados.

II- C – FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Os factos acima enunciados encontram-se, todos eles, comprovados pelos documentos acima discriminados, que não foram impugnados pelas partes nem há indícios que ponham em causa a sua genuinidade e foram tidos em consideração por haverem sido articulados pelas partes ou por deles serem instrumentais [cfr. artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil].

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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de apreciar a bondade da posição da AT quando aponta que, em função da prestação desportiva dos pombos-correio em competições ou concursos columbófilos, o prémio que os seus criadores possam auferir tem enquadramento na categoria B do IRS nos termos do art. 3º nº 1 al. b) do Código do IRS.

Nas suas alegações, a Recorrente refere que a teoria do rendimento-acréscimo patrimonial abrange, na sua formulação mais ampla, todo e qualquer ganho obtido num certo período de tempo, independentemente da forma pela qual se tenha verificado, sendo que o Código acolhe assim, uma concepção mais ampla de rendimento e abandona os requisitos formais que acompanham a tributação cedular, verificando-se que a categoria B de IRS abrange rendimentos provenientes de uma enorme diversidade de prestações de serviços que, para efeitos das actividades previstas no art.º 151º do CIRS, inclui os desportistas, sendo possível, até, verificar-se um acto isolado com rendimento proveniente de uma única prática desportiva.
Assim, a previsão da incidência alargada da categoria B de IRS e as características abundantemente descritas no RIT da proveniência dos rendimentos em causa nos presentes autos, afastam a possibilidade de tributação de tais “prémios” em sede de Imposto de Selo e levam ao seu enquadramento na norma de incidência real prevista no art.º 3º n.º 1 alínea b) do CIRS, pois que na Tabela Geral de Imposto de Selo encontram-se taxativamente enumerados os actos, factos e situações jurídicas sujeitos a IS e a verba 11.2 prevê, entre outros, prémios de quaisquer sorteios ou concursos, enunciando o art.º 159º n.º 1 da Lei do Jogo, aprovada pelo DL 422/89 e sucessivas alterações os jogos de fortuna ou azar como aqueles cujo resultado assenta exclusiva ou fundamentalmente na sorte e os concursos organizados pela Impugnante não correspondem a essa característica por resultarem da prévia preparação e treino dos pombos com vista à obtenção de classificação no designado derby, não da pura sorte dos participantes, de modo que, não se encontram sujeitos à previsão da verba 11.2.2 da TGIS os rendimentos descritos no Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que aqui damos por transcrito mas antes à tributação em IRS nos termos ali devidamente fundamentados.

Que dizer?
Para acolher a pretensão da ora Recorrida neste âmbito, a decisão recorrida ponderou que “… A Impugnante, enquanto Associação de direito privado sem fins lucrativos, ao organizar competições desportivas, de carácter amador, relacionadas com a columbofilia, não se pode, num juízo de verosimilhança, considerar no exercício de uma actividade de prestação de serviços, vocacionada para a obtenção de lucros, bem como tal não se presume nem deriva dos concorrentes que apresentam os pombos a competição nas provas [amadoras e desportivas, saliente-se], por aquela organizadas.
Nem, em rigor, se entende como o pagamento de “prémios” num concurso aberto a uma multiplicidade de concorrentes se pode considerar uma actividade de natureza comercial ou empresarial.
O que passaria logo por se entender que as pessoas singulares ou colectivas, que no âmbito de uma actividade amadora - factor que não se mostra controvertido -, se encontram no âmbito de uma prestação de serviços, sabendo-se que nos termos do artigo 1154.° do Código Civil, “contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”;
Sob pena, de se estender a prestação de serviços aos próprios concorrentes em si, os atletas [rectius, os pombos], cuja prestação nas provas dará, ou não, o direito à percepção dos “prémios”.
O que mostra a eventualidade dos “prémios”, que não constituem uma contraprestação ou remuneração pela participação do columbófilo na prova, dado serem atribuídos aos mais bem classificados, não havendo qualquer pagamento ou prémio monetário aos restantes. …”.

Pois bem, perante a realidade em equação, resulta manifesto que a leitura do Tribunal “a quo” mostra-se redutora em relação ao alcance da situação em concreto.

Numa primeira linha de análise, temos que o Regulamento Oficial Final Evento Desportivo 2016 (31 de Março de 2016) relativamente à A……….. contemplava no seu ponto 6, além do mais, que “Os valores a pagar conforme estipulado no documento dos valores em disputa, na primeira (Monforte), segunda (Portalegre), terceira (Évora) e quarta (Castelo Branco) corrida, serão prémios líquidos (imposto 35% a ser pago pela organização)
Neste ponto, cabe notar que se apurou que em 16 de Setembro de 2015, a Impugnante solicitou à Autoridade Tributária informação sobre a sujeição de IVA [Imposto sobre o Valor Acrescentado] e IRC [Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas], bem como a retenção de IRS pelo pagamento dos “prémios” atribuídos a residentes e não residentes, ou eventual Imposto do Selo e IVA, bem como pela compra dos pombos e respectivo leilão, sendo que em resposta datada de 30 de Setembro de 2015, a Autoridade Tributária informou a Impugnante do seguinte: “[r]elativamente aos prémios informa-se o seguinte em sede de imposto do selo: 1) Os rendimentos resultantes de prémios do bingo/rifas/jogo do loto/prémios de sorteios e concursos são tributados em imposto do selo. 2) O momento do nascimento da obrigação tributária (facto gerador) é aquele em que o prémio for atribuído. 3) O encargo do imposto recai sempre sobre o beneficiário. 4) Quem liquida e entrega o imposto nos cofres do Estado é a entidade que concede os prémios. 5) As taxas a aplicar sobre os valores ilíquidos dos prémios são as seguintes: 25% (bingo)/35% (restantes), acrescendo 10% quando atribuídos em espécie. 6) Os montantes dos prémios devem ser anunciados líquidos de impostos, pelo que, independentemente da taxa, o beneficiário recebe sempre o prémio pelo montante anunciado (…)” – cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial, o que significa que a ora Recorrida procedeu à integração da situação nos termos expostos e fez público anúncio da situação de acordo com o exposto no Regulamento.

Neste domínio, não é posta em crise a relevância da actuação da AT quanto à matéria agora apontada, impondo-se apenas avaliar da bondade do procedimento posterior, de acordo com o qual a AT afasta-se do enquadramento apontado na resposta acima descrita.

Ora, o posicionamento entretanto assumido emerge da Informação Vinculativa, Processo nº 4204/2017, sancionada por despacho superior de 05-07-2018, que veio definir em novos moldes o enquadramento tributário dos prémios atribuídos no âmbito de competições desportivas columbófilas.

Nessa Informação, foi ponderado, além do mais, que:
“…
O antigo artigo 12º do Código do IRS, que previa a tributação dos prémios de quaisquer lotarias, rifas e apostas mútuas, totoloto, jogos de loto e bingo, bem como as importâncias ou prémios atribuídos em quaisquer sorteios ou concursos, efetivamente pagos ou postos à disposição foi alterado pela entrada em vigor da Lei do Orçamento de Estado para 2010, passando a tributação dos prémios de jogo a ser efetuada em sede de Imposto de Selo. O regime legal em vigor, definido pelo Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, com as sucessivas alterações legislativas, de entre as quais se realça o Decreto-Lei n.º 10/95, de 19/01, que procedeu à reformulação da Lei do Jogo define, no seu artigo 1.º, os jogos de fortuna ou azar como aqueles «(…) cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.». No que respeita às modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar, o art.º 159.º, nº 1, da Lei do Jogo define-as como as "operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico.", considerando-se como tal, nomeadamente, rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos.
Advém das normas supra referidas que o elemento determinante para a qualificação de determinada operação como sendo afins dos jogos de fortuna ou azar reside, fundamentalmente, no fator sorte. Sucede que, não obstante a utilização, nos Regulamentos apresentados, dos termos "concurso" e "prémio", os eventos promovidos pela requerente inserem-se no âmbito da prática de uma modalidade desportiva relacionada com a criação e seleção de pombos-correio para competição, a Columbofilia. Com efeito, estes eventos são competições columbófilas em que os prémios são atribuídos em função da classificação dos participantes, na sequência da confrontação desportiva dos respetivos pombos-correio inscritos. Nessa conformidade, a classificação final e consequente obtenção dos prémios pelos participantes resultará dos treinos realizados, da capacidade física e de orientação dos pombos-correios inscritos e não de qualquer fator sorte. Ora, não estando a obtenção dos prémios condicionada pelo fator sorte, relacionando-se antes com o desempenho de cada pombo-correio na competição, não pode a operação em causa qualificar-se como modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar, não se podendo enquadrar na categoria de prémios de jogo. Assim, e ainda que os rendimentos recebidos sejam designados de “prémios” e que estes sejam obtidos no decurso de uma prova denominada de “concurso”, com esta iniciativa pretende-se premiar o mérito desportivo dos candidatos/atletas, não se vislumbrando que o fator “sorte” possa influir no resultado final. Não é, pois, possível encontrar similaridades entre a atividade de criação e treino de pombos-correio para prestação de provas em concurso columbófilo com, por exemplo, a atividade de um comprador de rifas ou a de um participante num concurso patrocinado por uma empresa comercial no qual alguns dos seus clientes são escolhidos aleatoriamente para receberem um prémio monetário ou um prémio em espécie.
No primeiro a obtenção do prémio depende da perícia, do treino, da aptidão, das qualidades do criador e do pombo, no segundo depende de um jogo de sorte e azar, depende exclusivamente de situações aleatórias que não são controláveis. …”.

Neste domínio, entende-se que a AT tem razão quando aponta que estamos no âmbito de uma modalidade desportiva relacionada com a criação e selecção de pombos-correio para competição, a Columbofilia, sendo que, eventos como o descrito nos autos são competições columbófilas em que os prémios são atribuídos em função da classificação dos participantes, na sequência da confrontação desportiva dos respectivos pombos-correio inscritos, traduzindo a classificação final e consequente obtenção dos prémios pelos participantes, o resultado dos treinos realizados, a capacidade física e de orientação dos pombos-correios inscritos e não de qualquer factor sorte, não sendo possível encontrar similaridades entre a actividade de criação e treino de pombos-correio para prestação de provas em concurso columbófilo com, por exemplo, a actividade de um comprador de rifas ou a de um participante num concurso patrocinado por uma empresa comercial no qual alguns dos seus clientes são escolhidos aleatoriamente para receberem um prémio monetário ou um prémio em espécie.

Tal significa que a questão nuclear no âmbito do presente recurso é a de apreciar a bondade da posição da AT quando agora aponta que, em função da prestação desportiva dos pombos-correio em competições ou concursos columbófilos, o prémio que os seus criadores possam auferir tem enquadramento na categoria B do IRS nos termos do art. 3º nº 1 al. b) do Código do IRS.

Nesta sequência, cabe notar que na construção do conceito de rendimento tributário, o Código do I.R.S. adopta a concepção de rendimento-acréscimo, segundo a qual a base de incidência deste tributo abrange todo o aumento do poder aquisitivo do contribuinte, incluindo nela, de um modo geral, as receitas irregulares e ganhos fortuitos, os quais também devem ser considerados manifestações de capacidade contributiva.

Por outro lado, a categoria B dos rendimentos sujeitos a tributação em I.R.S. goza de uma característica especial que consiste no seu carácter predominante, relativamente aos rendimentos de qualquer outra categoria, pois que, depois da reforma de 2000, nos rendimentos líquidos da nova categoria B integram-se todos os proventos obtidos ou conexos com a respectiva actividade desenvolvida, sendo que a predominância significa pois que todos os rendimentos, de todas as naturezas, que se possam imputar à actividade profissional ou empresarial.

A partir daqui, tendo como pano de fundo o facto de estar em causa uma modalidade desportiva relacionada com a criação e selecção de pombos-correio para competição, a Columbofilia, que se traduz, além do mais, na participação em eventos como a A……., o qual permite auferir os valores em disputa nas quatro primeiras corridas descritas e bem assim, quanto à última corrida, 50% do valor líquido apurado no leilão dos pombos, além de que os titulares das equipas premiadas, tal como descrito no RIT, receberam os prémios correspondentes aos valores aí indicados, aumentando, nessa medida, o seu poder aquisitivo, ainda que possa tratar-se de uma participação esporádica, deparamos com uma actividade que tem de ser tributada, sendo que, tendo a AT, de forma cabal, afastado a pertinência de tal tributação em sede de imposto de selo, resulta assertivo o enquadramento dos prémios atribuídos às equipas referidas como rendimentos inseridos na categoria B do IRS nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 3º do Código do IRS, enquanto rendimentos profissionais, até por integrarem - “1323 Desportistas” - a lista de actividades cujo exercício dá origem a rendimentos profissionais (art. 151º do Código do IRS - Anexo I).

Assim, a posição da AT não merece censura, o que equivale a dizer que a ora Recorrida estava obrigada a reter imposto sobre os prémios que seja devedora à taxa em vigor à data do pagamento ou colocação à disposição do rendimento, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 101º do Código do IRS, sendo irrelevante o facto da ora Recorrida desenvolver uma actividade desportiva amadora no sentido de excluir, por si só, a tributação dos prémios em causa em sede de IRS, dado que, quem é tributado é quem recebe o rendimento, sendo que o facto de só alguns participantes os receberem na medida em que venceram competições ou se classificaram numa determinada posição na corrida, em nada altera a sujeição a imposto, situação que, naturalmente, determina a procedência deste recurso, a revogação da sentença recorrida e a baixa dos autos ao TAF de Loulé para ser apreciado o mais suscitado no âmbito da presente impugnação.


4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, revogar a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos ao TAF de Loulé para ser apreciado o mais suscitado no âmbito da presente impugnação.

Custas pela Recorrida, com dispensa de taxa de justiça nesta Instância de recurso, uma vez que não contra-alegou.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 8 de Junho de 2022. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.