Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01232/16
Data do Acordão:05/31/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO
COIMA
MATRIZ PREDIAL
Sumário:Tendo o art. 216º da Lei nº 66-B/2013, de 20/12 (OE para 2013) revogado a al. i) do nº 1 do art. 13º do CIMI, foi extinta a obrigação declarativa de actualização da matriz, a cargo do sujeito passivo adquirente do prédio.
Nº Convencional:JSTA00070211
Nº do Documento:SA22017053101232
Data de Entrada:11/04/2016
Recorrente:A...
Recorrido 1:MINISTÉRIO PÚBLICO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF DO PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA ORDENAÇÃO
Legislação Nacional:CIMI03 ART13 N1 I ART37.
L 66 -B/2013 DE 2013/12/20 ART216.
CIMT03 ART49 N4 A.
RGCO ART1 ART3 N2 ART32.
RGIT01 ART3 B ART117 N2 ART24 N2.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A………………., com os sinais dos autos, recorre para o STA, da sentença que, proferida em 18/07/2014 (fls. 57 e ss.) pelo TAF do Porto, manteve a decisão administrativa de aplicação de coima, que tinha sido proferida em 23/11/2012, pelo chefe do Serviço de Finanças do Porto 2 e o condenara na coima de 220,00 euros, por infracção p. e p. pelos artigos 13°, n° 1, al. i), do CIMI e 117°, n° 2 e 24°, n° 2, ambos do RGIT.

1.2. E tendo o TAF do Porto proferido despacho, em 03/11/2014, de não admissão do recurso, o recorrente deduziu então reclamação desse despacho, para o Presidente do STA, que decidiu admiti-lo, por despacho datado de 11/10/2016.

1.3. O recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões seguintes:
«V — Conclusões
11. O recorrente, por escritura de compra e venda lavrada em 2011.07.29, adquiriu a fração autónoma designada pela letra C do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art.° 2915, da freguesia de Massarelos, concelho do Porto,
12. O referido negócio jurídico foi outorgado (com) gestores de negócios da entidade alienante, nos termos dos arts. 464° a 472° do CC.
13. Por instrumento notarial lavrado em 2012.05.25 a gestão de negócios referida no item anterior foi definitivamente ratificada, sendo que, embora com eficácia retroativa, a partir dessa data é que ocorreu o efeito translativo do direito de propriedade, nos termos do art. 268° do CC.
14. Em 2012.11.03 foi pelo SF levantado auto de notícia ao recorrente por falta de apresentação da declaração para atualização da matriz devido à mudança de proprietário, em 2011, por transmissão onerosa do imóvel identificado em II — 3., nos termos do art. 13°, n° 1, alínea i), do CIMI, tendo sido considerada como data de transmissão a da escritura de compra e venda - 2011.07.29, e não a da ratificação que, implicitamente, parece ter sido a aceite no despacho recorrido.
15. O despacho recorrido enferma de erro de direito em virtude de durante a vigência concomitante do art. 15°, n° 1, do DL n° 287/03, de 12 de novembro, e do art. 13°, n° 1, alínea i), do CIMI, na redação dada pelo DL n° 211/2005, de 7 de dezembro, normas já revogadas, a sua interpretação in casu teria que ser necessariamente conjugada e nunca de forma autónoma como se fez com referência ao citado art. 13°, n° 1, alínea i), por força dos elementos lógico e sistemático que devem estar subjacentes à interpretação da Lei, de acordo com as disposições contidas no art. 9° do CC, o que o despacho recorrido não observou.
16. A transmissão da identificada fração autónoma, ex vi do instrumento notarial de ratificação da gestão de negócios praticada na celebração da escritura de compra e venda subjacente, ocorreu depois da revogação do art. 15°, n° 1, do DL n° 287/03, de 12 de novembro, pelo que o recorrente não praticou a infração tributária de que é acusado - violação do art. 13°, n° 1, alínea i), do CIMI — por inutilidade desta norma, não obstante a manutenção temporária da sua vigência - mais de um ano após a revogação do aludido art. 15º — até à sua revogação semel pro semper nos termos do art. 216° da Lei n° 66-B/2012, de 31 de dezembro.»
Termina pedindo o provimento do recurso e que, em consequência, seja revogado o despacho recorrido, tendo em vista a extinção do respectivo processo de contra-ordenação por insubsistência do auto de notícia que lhe está subjacente.

1.4. Não houve contra-alegações.

1.5. O Magistrado do Ministério Público junto do STA emitiu o seguinte Parecer:
«FUNDAMENTAÇÃO
A obrigação declarativa de actualização da matriz, a cargo do sujeito passivo adquirente do prédio, foi extinta (art. 13° n° l al. i) CIMI revogado pelo art. 216° Lei n° 66-B/20 dezembro — Lei OGE 2013).
A extinção da obrigação do sujeito passivo adquirente justifica-se pelo facto de idêntica obrigação de comunicação, em suporte electrónico e com periodicidade mensal, ter passado a recair sobre os notários e outros funcionários ou entidades que intervêm em actos ou contratos que operem transmissões de bem imóveis (art. 49° n° 4 al. a) CTMT redacção da Lei n° 64-4/2008, 31 dezembro - Lei do OGE 2009).
Em consequência da citada revogação da norma (sem substituição por outra com redacção equivalente), extinguiu-se a obrigação declarativa nela prescrita, deixando a sua inobservância de constituir contraordenação punível com coima (arts. 1° e 3° n° 2 RGCO aprovado pelo DL n° 433/82, 27 outubro / art. 3° al. b) RGIT; art. 2° n° 2 C. Penal / art. 32° RGCO).
CONCLUSÃO
O recurso merece provimento (com a antecedente fundamentação).
A sentença impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão absolutório do arguido».

1.6. Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
2. Os factos
Na decisão recorrida julgaram-se provados os seguintes factos:
A). Em 03/11/2012 foi levantado o Auto de Notícia ao aqui Recorrente por falta de apresentação da declaração para a actualização da matriz devida à mudança de proprietário por transmissão onerosa ou gratuita do imóvel 131207-U-2915-C, referente ao ano de 2011, cujo termo da obrigação terminou em 27/09/2011, cf. fls. 2 dos autos.
B). O Recorrente, após notificado, apresentou defesa nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 9 a 34 dos autos.
C). Em 23/11/2013 o Chefe do serviço de finanças do Porto 2 proferiu decisão através da qual condenou a Recorrente na coima de € 220,00, em razão dos factos referido na alínea anterior, nos termos e com os fundamentos que constam de fls. 35 e 36 dos autos e que aqui se dão por reproduzidos.
D). Em 29/07/2011 foi celebrada escritura-pública de compras e vendas do imóvel identificado em A). na qual consta como outorgante-adquirente, entre outros, o aqui Recorrente, cf. fls. 11 a 31 dos autos.
E). Em 25/05/2012 a gestão de negócios, exercida na escritura-pública supra referida pelos seus primeiros outorgantes, foi ratificada integralmente e sem reservas, cf. fls. 33, 34 e 13.
F). O Recorrente foi notificado da decisão em 26/11/2012 e apresentou o presente recurso em 17/11/2012, cf. fls. 38 a 41 dos autos.

3. A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação judicial da decisão administrativa de aplicação de coima, com fundamento, em síntese, em que, resultando do n° 1 do art. 13° do CIMI que a inscrição de prédios na matriz e a actualização desta são efectuadas com base em declaração apresentada pelo sujeito passivo, então, independentemente da alteração ao art. 15° do DL que aprovou o CIMI, mantém-se sempre em vigor o disposto naquele nº 1 do dito art. 13°, o que significa que a inscrição dos prédios na matriz e a sua actualização (da matriz) são efectuadas com base na declaração apresentada pelo sujeito passivo, sendo que as alíneas seguintes apenas dizem respeito ao prazo de 60 dias a partir do qual é contada a ocorrência para efeitos de apresentação da declaração.
Além de que a circunstância de a 1ª avaliação ser, ou não, uma avaliação geral, não retira ao sujeito passivo a obrigação de proceder à entrega da declaração para efeitos de inscrição de prédios na matriz e a actualização desta. Se assim fosse a partir do momento em que entrou a vigor a citada Lei 60-A/2011 de 30/11, então o art. 13° n° 1 al. i) estaria revogado, o que não aconteceu.

4. Discordando do assim decidido, o recorrente interpõe agora recurso para o STA, o qual foi admitido após deferimento da reclamação apresentada para o sr. Presidente deste mesmo Tribunal.
Ora, adiantando razões, diremos que o recurso merece provimento, nos termos da fundamentação aduzida no douto Parecer do MP.
Na verdade, a al. i) do nº 1 do art. 13º do CIMI (na qual se dispunha que a inscrição de prédios na matriz e a actualização desta seriam efectuadas com base em declaração apresentada pelo sujeito passivo, no prazo de 60 dias contados a partir, no caso dos autos, da mudança de proprietário, por ter ocorrido uma transmissão onerosa ou gratuita de um prédio ou parte de prédio, excepto quando não houvesse lugar à primeira avaliação prevista nos artigos 37º e seguintes do CIMI) foi revogada pelo art. 216º da Lei nº 66-B/2013, de 20/12 (OE para 2013), tendo, assim, sido extinta a obrigação declarativa de actualização da matriz, a cargo do sujeito passivo adquirente do prédio.
E como no dito Parecer se sublinha, tal extinção da obrigação do sujeito passivo adquirente justifica-se pelo facto de idêntica obrigação de comunicação, em suporte electrónico e com periodicidade mensal, ter passado a recair sobre os notários e outros funcionários ou entidades que intervêm em actos ou contratos que operem transmissões de bem imóveis (cfr. a al. a) do nº 4 do art. 49° do CIMT, na redacção da Lei n° 64-4/2008, de 31/12 — OE para 2009).
Nestes termos, e sem necessidade de maiores desenvolvimentos, é de concluir que, em consequência da citada revogação da norma (sem que a mesma tenha sido substituída por outra com redacção equivalente), se extinguiu a obrigação declarativa nela prescrita, deixando a sua inobservância de constituir contraordenação punível com coima [cfr. os arts. 1° e 3°, n° 2, do RGCO, aprovado pelo DL n° 433/82, de 27/10; o art. 3°, al. b) do RGIT; e o art. 2°, n° 2 do CPenal, por força do disposto no art. 32° do RGCO].
Procedendo, pois, com esta fundamentação, o recurso.

DECISÃO
Nestes termos acorda-se em, dando provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e absolver o arguido da contra-ordenação que lhe foi imputada, por infracção p. e p. nos arts. 13°, n° 1, al. i), do CIMI e 117°, n° 2 e 24°, n° 2, ambos do RGIT, e pela qual foi condenado na coima de 220,00 euros.
Sem custas.

Lisboa, 31 de Maio de 2017. – Casimiro Gonçalves (relator) - Francisco Rothes – Aragão Seia.