Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03032/13.5BEPRT
Data do Acordão:01/12/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IRC
BENEFÍCIOS FISCAIS
Sumário:O art. 22.º n.º 3 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redação, do Decreto-Lei n.º 108/2008 de 26 de junho, em vigor no ano de 2009, permitia, a um sujeito passivo de IRC, deduzir à coleta, do exercício, imposto pago (através de retenção na fonte ou não) por um fundo de investimento mobiliário, sem que, previamente, na competente autoliquidação, tivesse de adicionar, a importância correspondente a esse imposto, aos demais valores constitutivos/integrantes da respetiva matéria coletável.
Nº Convencional:JSTA000P28775
Nº do Documento:SA22022011203032/13
Data de Entrada:11/12/2021
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.

A representação da Fazenda Pública (rFP) recorre de sentença, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 8 de junho de 2021, que julgou procedente impugnação judicial, apresentada por A…………, S.A., …, visando despacho de indeferimento parcial de reclamação graciosa, do ato de autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), referente ao exercício de 2009.
A recorrente (rte) produziu alegação e concluiu: «

A. Nos autos em referência, a douta sentença decidiu julgar a presente impugnação procedente, anulando-se o despacho impugnado.

B. Para fundamentar as conclusões alcançadas, estriba-se a douta sentença recorrida na seguinte argumentação, que aqui se sintetiza:

…não se acompanha o entendimento da AT, pois dispondo o artigo 62°, n.º 2 do CIRC, na redação vigente, que “sempre que tenha havido lugar a retenção na fonte de IRC relativamente a rendimentos englobados para efeitos de tributação, o montante a considerar na determinação da matéria colectável é a respectiva importância ilíquida do imposto retido na fonte", no caso em apreço o imposto retido diz respeito ao Fundo e não ao Impugnante, pelo que o valor a incluir como rendimento na sua esfera é apenas o valor efetivamente pago pelo Fundo.

De facto, o artigo 22.º pretende, em suma, tributar o respetivo fundo, isentando os participantes, sendo designado como “regime de tributação à entrada, isenção à saída”. Assim, estatuindo o art.º 22.º que a tributação é feita exclusivamente na esfera do fundo, os rendimentos a declarar não poderão incluir o imposto suportado por uma entidade terceira, in casu, o fundo.

C. Entende a Fazenda Pública que o douto tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, pelas razões que passa a elencar.

Ora,

D. Tendo em conta o artigo 22.º do EBF (à data dos factos), no que respeita às pessoas coletivas, aos sujeitos passivos singulares com atividade comercial, industrial ou agrícola e aos estabelecimentos estáveis em território nacional, os rendimentos pagos pelos fundos não beneficiavam de isenção, mas os impostos por eles pagos podiam ser deduzidos pelos sujeitos passivos a título de pagamento por conta.

E. Assim, face aos objetivos que presidiram ao mecanismo de tributação vertido no art. 22.º do EBF, óbvio é que a “tese” da sentença ora recorrida vem adulterar totalmente os propósitos prosseguidos com aquele regime legal.

F. De facto, se os argumentos da sentença estivessem correctos, estaríamos perante a cedência de redução de tributação aos participantes no fundo face aos investidores diretos em mercado de capital, os quais teriam de incluir o valor dos rendimentos brutos de natureza financeira recebidos, nos termos do art. 20.º, n.º 1, c) do CIRC e arts. 67.º e 94º, n.º 1 c) do mesmo diploma.

G. Mas o mesmo não sucederia com os titulares de unidades de participação que apenas seriam tributados pelos rendimentos líquidos, e teriam ainda a possibilidade de dedução de um imposto que não teria incidido sobre os seus proveitos e que fora suportado por terceiro.

H. O duplo benefício é evidente e acabaria por constituir um indevido estímulo à participação nos fundos, arruinando, de uma vez por todas, a desejada neutralidade.

I. Essa solução determinaria também uma redução da receita fiscal uma vez que a imputação do imposto pago pelo fundo na esfera do participante, desacompanhado da respetiva relevação como proveito, implica, em substância, que o rendimento respetivo não é tributado nem na esfera do fundo nem na esfera do titular da participação.

J. Face ao exposto, naturalmente se conclui que a interpretação do art.º 22.º do EBF, em função dos seus elementos histórico e teleológico, não consente a apreciação concretizada na sentença ora recorrida. Pelo contrário, todo o mecanismo estabelecido nessa norma implica uma clara relação entre os rendimentos do fundo e os dos participantes e entre a tributação de uns e outros, de forma a garantir a neutralidade da tributação.

K. De igual modo, o elemento sistemático não avaliza o entendimento da sentença.

L. Na verdade, quando o n.º 3 do art.º 22.º do EBF se refere ao pagamento por conta, alude a um conceito vertido e estabilizado no nosso ordenamento jurídico-fiscal, designadamente no art.º 33.º da LGT.

M. O pagamento por conta é uma entrega pecuniária antecipada efetuada no período de formação do facto tributário por conta do imposto devido a final, pelo que pressupõe obviamente um facto tributário, ainda que em fase de constituição, bem como uma tributação final incidente sobre o rendimento decorrente esse facto.

N. Inexistem quaisquer razões que permitam concluir que o legislador teve em conta uma noção diversa do pagamento por conta, noção essa que prescindiria da existência de um facto tributário na esfera do seu titular e da consequente tributação do rendimento ocasionado por esse facto.

O. Pois, ao permitir a imputação do imposto pago pelo fundo na esfera do participante, o legislador simplesmente reconhece o seguinte:

P. Que o rendimento pago ao participante pelo fundo mostra-se reduzido do imposto pago pelo próprio fundo, isto é, que o rendimento devido ao participante é maior do que o que lhe foi entregue;

Q. Que essa tributação, porque corresponde a uma ablação do rendimento devido ao participante, deve ser considerada no cálculo do IRC que este tenha a pagar sobre todos os rendimentos auferidos, designadamente aquele que lhe foi deduzido pelo fundo no momento do pagamento.

R. Assim sendo, atento o disposto, à data, no art.º 62º, n.º 2, do Código do IRC, o rendimento a considerar/englobar na determinação do Lucro Tributável do participante será o rendimento bruto, ou seja, a importância ilíquida do imposto retido na fonte, ainda que esta retenção tenha sido efetuada na esfera do Fundo.

S. Ou seja, os rendimentos dos fundos concorrem, na totalidade, como proveito que são, para a formação do Lucro Tributável, sendo o benefício consubstanciado na dedução à coleta do imposto retido ou devido nos termos do n.º 1, do art.º 22º, do EBF, à data.

T. A não ser assim, seria totalmente incompreensível que a própria sociedade gestora de fundos “B………… Gestão de Activos – Sociedade Gestora de Fundos de Investimentos, SA” indicasse, em sede da declaração mencionada no ponto A) dos factos provados, o valor de rendimentos ilíquidos pagos à impugnante, pelo que, tal declaração valida a “tese” da AT de que o rendimento sujeito a tributação é o rendimento bruto e não o líquido.

U. Em suma, o art.º 22.º do EBF (à data dos factos), ao contrário do referido na sentença, não prevê qualquer isenção dos rendimentos provenientes do Fundo para pessoas colectivas titulares de unidades de participação, nem prevê uma separação estrita entre os rendimentos destes e os do Fundo, uma vez que admite que os impostos pagos pelo Fundo são dedutíveis por aqueles a título de pagamento por conta.

V. Destarte, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença ora recorrida enferma em grave ERRO DE DIREITO APLICÁVEL, pelo que deverá ser revogada

Termos em que,

Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.»


*

A sociedade recorrida (rda) formalizou contra-alegações e concluiu: «

(a) Nem o Código do IRS, nem o Código do IRC prescrevem que o montante de imposto retido aos fundos de investimento ou por eles apurado autonomamente - que, nos termos do disposto nos números 2, 3 e 7 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, tem a natureza de imposto por conta na esfera dos participantes, os quais, obrigatoriamente (e como é o caso do Recorrido) ou, apenas por opção, procedam ao englobamento dos rendimentos que lhes são atribuídos -, seja acrescido para efeitos da determinação do rendimento sujeito a imposto;

(b) Tomando como exemplo o domínio do IRS, a remissão operada (cf. o número 3 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais e o artigo 78.º do Código do IRS) determina literalmente que o “imposto por conta” consiste numa dedução à coleta, conferindo direito ao reembolso da diferença eventualmente apurada, sendo que o artigo 22.º daquele código apenas previa, no número 6, a consideração dos rendimentos que dão direito a crédito de imposto por dupla tributação internacional pelas respetivas importâncias ilíquidas;

(c) O artigo 62.º do Código do IRC limita-se a prever a consideração dos rendimentos que dão direito a crédito de imposto por dupla tributação internacional e dos rendimentos sujeitos a retenção na fonte pelos respetivos montantes ilíquidos de imposto (estrangeiro ou retido na fonte), não sendo efetuada qualquer menção ao imposto retido a (ou pelos) fundos de investimento;

(d) Os rendimentos relevantes no caso concretamente em apreço não se enquadram em qualquer daquelas categorias, por (i) não conferirem direito a crédito de imposto por dupla tributação internacional, (ii) nem estarem sujeitos a retenção na fonte, o que resulta expressamente do disposto nos números 3 e 7 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais;

(e) A intenção do legislador, embora imperfeitamente expressa na lei, é a de permitir a dedução do montante apurado também em IRC, pretendendo-se ainda que em qualquer dos referidos domínios (IRS ou IRC), a dedução não fique limitada ao valor da coleta, pelo que da mesma pode resultar um valor a reembolsar;

(f) Nem em sede de IRS, nem em sede de IRC, se encontra expressamente prevista a obrigação de acrescer o valor em análise para efeitos da determinação do rendimento coletável, como pretende impor a Recorrente;

(g) No caso sub judice, coloca-se a questão de saber qual a natureza da ligação entre os rendimentos das unidades de participação e o montante do imposto suportado pelo fundo, que se cristaliza na esfera do participante como uma dedução, desde logo porque o rendimento por este recebido não contempla o montante pago a título de imposto pelo fundo, que é apenas, e só, da responsabilidade do mesmo (em conformidade com as regras subjacentes à tributação dos fundos de investimento ora em apreço, vigentes à data da situação sub judice);

(h) Estando em causa retenções na fonte ao nível do fundo, estas, conjuntamente com o imposto apurado pelo fundo relativamente a rendimentos por este obtidos, traduzem tributação ao nível do fundo, e não do participante;

(i) Acrescer o imposto suportado pelo fundo para efeitos da determinação do lucro tributável em IRC dos participantes corresponde a uma aplicação incorreta do regime que resulta da conjugação do Estatuto dos Benefícios Fiscais e do Código daquele imposto, que não poderá ser mantida nem admitida, sob pena de ilegalidade;

(j) Nem a lei, nem a economia do regime determinam que o montante de imposto suportado por fundos de investimento relativamente aos quais os sujeitos passivos de IRC obtenham rendimentos deve influenciar o seu lucro tributável, o que, aliás, iria de encontro à lógica que subjaz (ou subjazia, à data) à tributação dos fundos de investimento, caracterizada por uma tributação à entrada e isenção à saída;

(k) A retenção na fonte operada no caso sub judice, nos termos do citado preceito do Estatuto dos Benefícios Fiscais, não releva para os efeitos plasmados no número 2 do artigo 62.º do Código do IRC, pois que o imposto retido na fonte, (i) além de ter sido retido por uma entidade que não aquela cuja matéria coletável está a ser determinada atento o referido preceito legal, (ii) não está diante de um caso de substituição tributária;

(l) No presente caso, não se trata de uma retenção na fonte a operar em razão de uma relação de substituição tributária, pois a lei não impõe que seja exigida a prestação tributária a pessoa diferente do sujeito passivo, antes pelo contrário, determinando que o rendimento recebido pelo participante (no presente caso, o Recorrido) não englobe, naturalmente, o imposto retido (e a suportar) pelo fundo;

(m) Por contraposição, à tributação na esfera dos fundos de investimento está a isenção de tributação na esfera dos participantes, por forma a garantir um único nível de tributação, pelo que não tem sentido que o imposto cujo sujeito passivo é o fundo de investimento, deva concorrer para o apuramento da matéria coletável de uma entidade diferente, que é apenas detentora de unidades de participação, a quem é garantida, em caso de pagamento de rendimentos, uma isenção de tributação na sua esfera (tributação essa que foi efetuada, nos termos da lei, na esfera do fundo);

(n) Surge desprovida de sentido lógico, na medida em que não encontra qualquer correspondência com a letra da lei e, bem assim, com o espírito do legislador subjacente à criação das normas em causa, a intenção de acrescer, na operação de determinação da matéria coletável, imposto que, rigorosamente, não foi, nem haveria de ser, suportado pelo Recorrido (enquanto participante), e que foi efetivamente suportado por sobre quem recaia tal obrigação (o fundo), enquanto sujeito passivo do imposto;

(o) Cabe à Recorrente - e, também, à Autoridade Tributária - interpretar a lei de acordo com as regras comuns, ou seja, aquelas previstas nos números 2 e 3 do artigo 9.º do Código Civil, nos termos do qual o intérprete deve entender que o legislador se pronunciou nos termos pretendidos e, bem assim, consagrou as soluções que entendeu serem mais adequadas, pelo que, não tendo o legislador consagrado expressamente as soluções aventadas pela Fazenda Pública no presente processo no que concerne ao tratamento do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais - e, bem assim, não se prevendo na mesma o mínimo de correspondência verbal que permita outra conclusão -, terá de se concluir que a pretensão da mesma estará votada ao insucesso;

(p) Não pode, pois, colher a argumentação da Recorrente, ao considerar que a interpretação veiculada pelo Recorrido e, bem assim, pelo Tribunal a quo não pode prevalecer, porquanto o rendimento em causa deixa de ser tributado quer na esfera do fundo, quer na esfera do titular da participação, pois tal não é verdade, dado que o rendimento foi tributado na esfera do fundo, justamente porque vigora uma isenção, à saída, para os participantes, a qual foi pretendida pelo legislador;

(q) O que se pretende, por via do disposto no artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, sem prejuízo da imposta conjugação com os demais preceitos visitados supra, é que a tributação seja efetuada, exclusivamente, na esfera do fundo, pelo que os rendimentos distribuídos aos participantes (relevando, nesta sede, o Recorrido), que estes devem declarar, não poderão incluir imposto que foi suportado por uma entidade terceira (o fundo), não existindo qualquer normativo que previsse que o mesmo atua, com efeito, em substituição do primeiro;

(r) Verifica-se, assim, que a sentença recorrida não merece censura, devendo ser mantida na íntegra, devendo, por esse motivo, ser negado provimento ao recurso da Recorrente.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, deverá o presente recurso ser dado como improcedente, por não provado e, em consequência, manter-se válida na ordem jurídica a sentença proferida pelo Tribunal a quo, tudo com as legais consequências.

Em virtude de o valor da causa ser superior a € 275.000,00, requer-se a Vossas Excelências se dignem, nos termos do disposto no número 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, determinar a dispensa de pagamento das custas acima do referido valor.»


*

O Exmo. Procurador-geral-adjunto emitiu parecer, no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso.

*

Cumpridas as formalidades legais, compete-nos decidir.

*******

# II.

Na sentença recorrida, a título de julgamento factual, consta: «

A) Em 29/09/2011, a “B………… Gestão de Activos - Sociedade Gestora de Fundos de Investimentos, SA” emitiu declaração segundo a qual a aqui Impugnante auferiu os seguintes rendimentos (positivos e negativos), nos seguintes termos:


DECLARAÇÃO

Fundos de Investimento

Ano Fiscal 2009

Contribuinte: ………

Nome: A…………

A B………… Gestão de Activos Sociedade Gestora de Fundos de Investimentos. S.A., com sede na Avenida ………… ………, edifício …… 2744-…… Porto Salvo, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais, com o número de matrícula e de identificação fiscal ……… e o capital social de 6.720.691 Euros, declara, para os devidos efeitos previstos nos artigos 119º do Código do IRS, 120º do Código do IRC e 22º dos Estatutos de Benefícios Fiscais que, durante o ano em referência, por força do resgate e/ou pagamento de rendimentos de Unidades de Participação em Fundos, constituídos e a operar de acordo com a legislação nacional, por seu intermédio subscritas, o Contribuinte em epígrafe auferiu os rendimentos abaixo Indicados (positivos ou negativos).

Mais declara que, por força do resgate e/ou pagamento de rendimentos de Unidades de Participação em Fundos de Fundos constituídos e a operar de acordo com a legislação nacional, por seu intermédio subscritas, o mesmo Contribuinte auferiu os seguintes rendimentos abaixo Indicados (positivos ou negativos):

Fundos de Investimentos (Nacionais)

Total resgates (ilíquido) 16.340.058,35 EUR

Rendimentos ilíquidos Positivos: 1.487.887.80 EUR

Rendimentos ilíquidos Negativos 1.097.236,26 EUR

Imposto suportado pelo Fundo: 443.855,19 EUR

Lisboa, 29 de Setembro de 2011

- cf. fls. 403 do PA (RG) apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

B) Em 21/05/2012, a Impugnante deduziu reclamação graciosa da autoliquidação de IRC n.° 2010 250 0372413, do exercício de 2009, peticionando, designadamente, correções relativas a imposto suportado por fundos de investimento, nos seguintes termos:

III. Imposto suportado por fundos de investimento

16. O total do imposto suportado por fundos de investimento relativamente a cujas unidades de participação foram distribuídos rendimentos ao Reclamante ou que foram obtidos rendimentos no resgate de unidades de participação no exercício de 2009 ascendeu a € 443 855,19, conforme resulta da declaração comprovativa que se junta como Documento 8, e é analisado como segue.

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17. No entanto, por lapso o Reclamante apenas considerou como pagamento por conta, para efeitos do número 3 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o montante de € 48 805,76, que inscreveu no campo 28 do quadro 12 da declaração modelo n.º 22 desse exercício, conforme Documento 9.

18. O quadro seguinte resume os valores relevantes.

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19. Nesta sequência, o Requerente considera que, nos termos do número 3 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, é devida uma correção a seu favor, pela diferença entre os montantes referidos nos pontos anteriores, de € 395 049,43.

Nestes termos e nos demais de direito, solicita-se a V. Exa. que se digne deferir a presente reclamação, efetuando as correções acima identificadas, traduzidas na dedução no apuramento do lucro tributável do exercício de 2009 do valor global de € 61 064 681,90, bem como na consideração do imposto suportado por fundos de investimento relativamente a rendimentos distribuídos ao Reclamante ou que foram por ele obtidos no resgate de unidades de participação no mesmo exercício no montante adicional de € 395 049,43, resumidas no quadro seguinte:

[Imagem]

– cf. fls. 16 e ss do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

C) Por despacho de 18/09/2013, do Diretor da Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes foi projetado o indeferimento da reclamação graciosa, na parte em que a Impugnante formulava pedido de correções relativas a imposto suportado por fundos de investimentos, exarado na informação n.º 71-AIR1/2013, nos seguintes termos:

Com referência aos presentes autos de procedimento administrativo de reclamação graciosa que correm seus termos junto desta Unidade dos Grandes Contribuintes, instaurados sob o registo em epígrafe, somos, conforme segue, e ao abrigo da norma inserta no art.º 75º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, atenta a redação conferida pelo art.º 4º do Decreto-Lei n.º 6/2013, de 17 de janeiro, ao n.º 4 do art.º 6º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, a informar com correspondência ao "quadro-síntese" infra, para os termos e efeitos de Consideração Superior.

[Imagem]

Assim:

§ I. DA PARTE RECLAMANTE

1. A Contribuinte, ora Reclamante, sociedade comercial que usa a firma “A…………, SA”, NIPC ………, com domicílio fiscal em Praça ………, n.º …… - 4000-…… Porto vem, nos termos previstos na alínea f) do n° 1 do art.° 54° da Lei Geral Tributária, conjugada com o disposto nos art.°s 68° e 131° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ambos ex vi art° 137° do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, deduzir a presente reclamação graciosa do ato tributário de "autoliquidação" de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, com referência ao período de tributação correspondente ao ano civil de 2009.

[…]

§ II. DO PEDIDO E CAUSA DE PEDIR

4. Constitui objeto da presente informação o pedido de anulação parcial, do referido ato tributário de "autoliquidação" de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas referente ao período de tributação correspondente ao ano civil de 2009, consubstanciado na “Liquidação n.º 2010 250 0372413”, de cinco de Julho de 2007.

5. Destaque-se, que não suscita pedido de reconhecimento de juros indemnizatórios previstos no art.° 43° da Lei Geral Tributária.

E

6. A Reclamante, alega, em suma, que o referido ato tributário, aqui em contenda, terá que ser rectificado em termos do lucro tributável relativamente à “reposição de provisões p/crédito de cobrança duvidosa" de 2009 no montante de € 61 064 681.90, face à correção efectivada pela AF aos exercícios de 2007/2008 no mesmo montante, sob pena de estarmos perante uma dupla tributação. E que dever-se-á também proceder a “um ajustamento relativo ao saldo das provisões p/crédito de cobrança duvidosa” no montante de € 32 604 751,23 no apuramento do seu lucro tributável de 2009.

E que também o “imposto suportado por fundos de investimento relativamente a cujas unidades de participação foram distribuídos rendimentos ao Reclamante ou que foram obtidos rendimentos no resgate de unidades de participação no exercício de 2009” ascendeu a € 443 855,19.

Porém salienta que apenas considerou como pagamento por conta nos termos do art.° 22.°/3 do EBF, o montante de €48 805,76, inscrito no campo 28/Q.12 da Mod. 22, pelo que considera haver uma correcção a seu favor de € 395 049,43.

Pelo que,

7. Em seu entender, deve ser conferida a anulabilidade pelas importâncias contestadas supra, conforme melhor argumentado na sua petição inicial, constante de fls. 1 a 19 e seguintes dos autos, a qual, para os devidos efeitos, se dá aqui como integralmente reproduzida.

[…]

§ V.III. Imposto suportado por fundos de investimento

§ V.III.I. Dos argumentos da Reclamante

59. Aquando da entrega da Declaração Modelo 22 do exercício de 2009, deduziu à colecta, no campo 359 do quadro 10, o montante de € 48.805,76, correspondente ao imposto suportado pelo Fundo relativo aos rendimentos pagos ao A………… durante aquele exercício, conforme declaração emitida pela sociedade B………… Gestão de Activos, S.A. incluída no Dossier Fiscal.

60. O sujeito passivo argumenta, que o total do imposto suportado por fundos de investimento em 2009, imputável ao banco, remontou, não somente a € 48.805,76, mas sim a € 443.855,19, assim decomposto:

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61. A parte discutida respeita a imposto relativo às Unidades de Participação (UP’s) reembolsadas à requerente nos Fundos B………… Disponível, B………… Premium e B………… Obrigações, no montante global de € 395.049,43 (€ 443.855,19-€48.805,76).

§ V.III.II. Da apreciação de mérito

62. De destacar que, no âmbito da acção inspectiva ao exercício de 2009 o sujeito passivo solicitou, em requerimento dirigido ao Exmo Sr.° Director de Serviços da DSIT, o qual mereceu despacho favorável para apreciação do expandido em 2011-11-04, que lhe fosse reconhecido, no exercício de 2009, uma dedução à colecta de € 395,049.43, relativa ao imposto suportado por fundos de investimento concernente a rendimentos distribuídos ao banco ou que foram por ele obtidos no resgate de unidades de participação.

63. No entanto, no âmbito do requerimento apresentado, o sujeito passivo argumenta, que o total do imposto suportado por fundos de investimento em 2009, imputável ao banco, remontou, não somente a € 48.805,76, mas sim a € 443.855,19, assim decomposto:

64. De referenciar que a parte já deduzida pelo sujeito passivo respeita ao imposto suportado no âmbito do “Fundo B………… Rendimento Mensal”. As operações realizadas nos outros fundos correspondem a “operações de resgate”, das quais resultaram menos-valias no montante global de € 1.097.236,26.

65. A parte discutida respeita a imposto relativo às Unidades de Participação (UP’s) reembolsadas à requerente nos “Fundos B…………” e “B………… Obrigações”, no montante global de € 395.049,43 (€ 443.855,19-€ 48.805,76).

66. As UP’s adquiridas pelo banco em Fundos de Investimento, que tenham sido constituídos há mais de um ano e já tenham obtido rendimentos, têm incorporada a valorização derivada desses rendimentos, os quais foram sujeitos a tributação, pelo que o valor pago pelo banco tem implícito o imposto pago ou retido ao Fundo. Consequentemente, o resultado do resgate, pelo efeito da alienação das UP’s, tem associado a parte do imposto pago/retido até à data de aquisição das unidades de participação.

67. Sublinhe-se que estes fundos são patrimónios autónomos, geridos pela entidade B………… Gestão de Activos – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, SA, relativamente aos quais os participantes, detentores das UP’s, detêm parte proporcional do seu património correspondente ao número de unidades de participação detidas.

68. De acordo com o nº 3 do artº 22º do EBF, os rendimentos respeitantes a UP’s, obtidos por sujeitos passivos de IRC não estão sujeitos a retenção na fonte, sendo considerados como proveitos ou ganhos e o montante de imposto retido ou devido na esfera do fundo tem a natureza de imposto por conta, podendo ser deduzido à colecta nos termos da alínea f) do nº 2 do artº 83º do CIRC.

69. Saliente-se contudo, que, atento ao disposto no nº 2 do artº 62º do CIRC, sempre que tenha havido lugar a retenção na fonte de IRC, ainda que na esfera do Fundo, relativamente a rendimentos englobados para efeitos de tributação, o montante a considerar na determinação da matéria colectável, é a respectiva importância líquida de imposto retido na fonte.

70. Assim o imposto retido deverá ser considerado como proveitos ou ganhos para efeitos fiscais, contribuindo dessa forma para a determinação do lucro tributável.

71. In casu, mesmo que as operações de resgate em causa tenham gerado menos-valias resultantes da alienação das unidades de participação, tendo havido historicamente retenção de imposto ao Fundo, o mesmo repercute-se na esfera dos participantes, podendo ser deduzido à colecta, desde que incluído no lucro tributável.

72. No entanto, de acordo com a resposta do sujeito passivo ao pedido de elementos nº 23 vem o mesmo informar que o “imposto suportado por fundos de investimento não foi registado em proveitos enquanto tal”.

73. Como o resultado da operação de resgate é determinado por diferença entre o valor de alienação e o valor de aquisição das UP's, líquido do imposto já suportado pelo Fundo, o mesmo teria que ser considerado como uma componente positiva do resultado apurado nesta operação e, consequentemente, incluído no resultado líquido do exercício.

74. Pelo que da análise ao formulado, se entendeu que o valor do imposto reclamado pela requerente, no montante de € 395.049,76, não poderá ser deduzido à colecta, para efeitos de liquidação do IRC do exercício de 2009, por não ter sido considerado na determinação da matéria colectável, tal como previsto no n.º 2 do art.º 62.º do CIRC.

75. Assim, quanto ao imposto suportado por fundos de investimento € 395.049,43 de realçar que a argumentação apresentada mais não é do que a já apresentada em sede de requerimento apresentado, aquando da acção inspectiva. Não tendo sido apresentados novos elementos de direito ou de facto, que pudessem de alguma forma eventualmente alterar o sentido ou pôr em crise a fundamentação vertida no RIT, a mesma mantém perfeita actualidade.

§ VI. DA CONCLUSÃO

Em conformidade com tudo o anteriormente exposto, porquanto se demonstrar vedado a esta Unidade dos Grandes Contribuintes outro entendimento que não o até aqui referido, somos de propor que o pedido inserto nos autos seja parcialmente deferido em conformidade com o teor do "quadro-síntese” desde logo melhor identificado no introito desta nossa informação, com todas as consequências legais.

Mais se propõe que, igualmente em caso de Concordância Superior, se promova a notificação da Contribuinte, aqui Reclamante, de acordo com as normas insertas nos art.ºs 35° a 41°, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, através de ofício a remeter sob registo, para, querendo, no prazo de 15 (quinze) dias, exercer o seu direito de participação, na modalidade de audição prévia, sob a forma escrita, de acordo com o disposto no art.º 60° da Lei Geral Tributária, por sua vez conjugado com a regra contida no n.º 2 do art.º 100°, este do Código do Procedimento Administrativo, ex vi alínea c) do artº 2º também da Lei Geral Tributária.

É tudo quanto cumpre por ora informar.

À V. Superior Consideração.

- cf. fls. 434 e ss do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

D) Do despacho mencionado na alínea antecedente foi o Impugnante notificado por ofício datado de 20/09/2013 - cf. fls. 434 do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

E) Não tendo o Impugnante exercido o direito de audição, por despacho de 08/11/2013 foi aquele projeto convertido em definitivo - cf. fls. 419 do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

F) Do referido despacho foi o Impugnante notificado por ofício datado de 08/11/2013 - cf. fls. 418 do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

G) A presente impugnação deu entrada em 19/12/2013 - cf. fls. 3 do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.»


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De momento, neste processo e recurso, a única questão, com necessidade de ser solucionada, diz respeito à, correta, interpretação do disposto no artigo (art.) 22.º n.º 3 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redação, do Decreto-Lei n.º 108/2008 de 26 de junho, em vigor no ano de 2009 («3 - Relativamente a rendimentos respeitantes a unidades de participação nos fundos referidos no n.º 1, de que sejam titulares sujeitos passivos de IRC ou sujeitos passivos de IRS, que os obtenham no âmbito de uma actividade comercial, industrial ou agrícola, residentes em território português ou que sejam imputáveis a estabelecimento estável de entidade não residente situado neste território, os mesmos não estão sujeitos a retenção na fonte e são pelos seus titulares considerados como proveitos ou ganhos, e o montante do imposto retido ou devido nos termos do n.º 1 a natureza de imposto por conta, para efeitos do disposto no artigo 83.º do Código do IRC e do artigo 78.º do Código do IRS.»). Especificamente, avaliada a crítica dirigida, pela rte, à sentença recorrida, o dissídio reside no sentido da resposta a dar à pergunta, formulada no âmbito desta última, de saber “se na determinação da matéria coletável o participante deverá declarar o rendimento auferido, deduzido do imposto suportado pelo fundo, ou deverá declarar o rendimento auferido acrescido do imposto suportado pelo fundo, deduzindo após à coleta este imposto”, importando, em concreto, determinar se é errado o julgamento, do tribunal recorrido, com a afirmação de que assistia à impugnante (ora, rda) “o direito de deduzir à coleta o imposto suportado pelo Fundo, sem ter que acrescer tal montante aos proveitos ou ganhos, …”.

Consensualmente, o normativo coligido, enquadrado no capítulo do EBF respeitante aos “Benefícios fiscais ao sistema financeiro e mercado de capitais”, estatuía, em primeira linha, sobre o regime fiscal, específico, privativo, dos rendimentos auferidos pelos fundos de investimento mobiliário (e imobiliário), constituídos e a operarem de acordo, em conformidade, com a legislação nacional – cf. n.ºs 1 e 6 do art. 22.º do EBF.

Numa segunda linha, a mesma disposição legal incorporava regras, disciplinadoras, a observar na tributação, conexionada, mas, individual/privativa, dos sujeitos passivos de IRS e IRC, titulares de rendimentos respeitantes a unidades de participação (UP’s) naqueles fundos de investimento mobiliário (e imobiliário) – n.ºs 2 a 5 e 7, sendo que, para os sujeitos passivos de IRC, residentes em território nacional (como é o caso da impugnante/rda), impunha, objetivamente, as seguintes prescrições:

- os rendimentos auferidos (respeitantes a UP’s) não estavam sujeitos a retenção na fonte (por parte do fundo de investimento operante);

- os mesmos [rendimentos auferidos (respeitantes a UP’s)] eram (tinham de ser) pelos seus titulares (sujeitos passivos de IRC) considerados como proveitos ou ganhos;

- o montante do imposto retido ou devido (ao ou pelo fundo operante) revestia a natureza de imposto por conta, para os efeitos do disposto no art. 83.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), portanto, relevava, ao nível dos procedimentos e forma de liquidação (dos sujeitos passivos de IRC, titulares de rendimentos respeitantes a UP’s), enquanto dedução (à coleta).

Apresentado o cenário normativo, in casu, aplicável, de imediato, se identifica que o diferendo emergiu e subsiste, no que tange ao conteúdo e operação desta última prescrição/regra; enquanto a impugnante (rda) entende que lhe permite deduzir, sem mais, à coleta, do exercício de 2009, o valor, total, de € 443.855,19 (Em sede de autoliquidação, € 48.805,76 (Fundo B ………… Rendimento Mensal) e no âmbito de reclamação graciosa (dessa mesma autoliquidação), € 395.049,43.), correspondente ao imposto suportado, pelos Fundos B………… Disponível (€ 217.539,63), Rendimento Mensal (€ 48.805,76), Premium (€ 152.696,10) e Obrigações (24.813,70), com relação a UP’s de que, nos mesmos, era titular (No ano de 2009, geradoras de rendimento e/ou objeto de resgate.), a rte sustenta e pugna por que a impugnante, quanto a este aspeto, seja admitida a deduzir a versada importância à coleta de IRC de 2009, sob condição de aditar a mesma/igual importância, na qualidade de proveito/ganho, na determinação da matéria coletável/lucro tributável do exercício em causa (Não consta da factualidade apurada, mas, como tal não é disputado, subentendemos que a impugnante, no exercício de 2009 (autoliquidação), considerou como proveitos ou ganhos e/ou custos ou perdas, os rendimentos ilíquidos pagos pelos Fundos e mencionados no ponto A) dos factos provados.).

Na sua perspetiva, esta imposição decorre, destacadamente, da circunstância de o art.º 22.º do EBF (à data dos factos) não prever qualquer isenção dos rendimentos provenientes do Fundo para pessoas coletivas titulares de unidades de participação, nem uma separação estrita entre os rendimentos destes e os do Fundo, porque admitia que os impostos pagos pelo Fundo eram dedutíveis, por aqueles, a título de pagamento por conta, pelo que, se impunha o funcionamento da regra, de determinação da matéria coletável, inscrita no art. 62.º n.º 2 do CIRC (redação vigente em 2009) («2 - Sempre que tenha havido lugar a retenção na fonte de IRC relativamente a rendimentos englobados para efeitos de tributação, o montante a considerar na determinação da matéria colectável é a respectiva importância ilíquida do imposto retido na fonte.». [Corresponde, ipsis verbis, ao atual art. 68.º n.º 2 do CIRC.]), ou seja, a premissa de que, tendo havido lugar a retenção na fonte de IRC, o montante a considerar era a respetiva “importância ilíquida do imposto retido na fonte”. Por outras palavras, se bem interpretamos (toda a pertinente alegação), para a rte, a aplicação (e só ela é capaz de suportar a solução que preconiza) deste último dispositivo legal justificava-se, fundamental e decisivamente, por o art. 22.º do EBF (em 2009) prever que os rendimentos dos fundos de investimento mobiliário (e imobiliário) eram tributados, autonomamente, por retenção na fonte (Como decorre, além do mais, do teor da conclusão R., a rte assume, sem dúvidas, que a retenção invocada foi a “efetuada na esfera do Fundo”.), com o acrescento de que esse imposto retido (ou devido) tinha a natureza (legal) de pagamento por conta/”imposto por conta”, para efeitos de dedução à coleta.

Norteados e condicionados, pelo princípio, angular, de que as “normas que estabeleçam benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva” – cf. art. 10.º do EBF, julgamos o entendimento preconizado pela rte ofensivo do mesmo, ainda que, tentemos lê-lo como resultado da operação de uma forma (subjetiva) de interpretar o, nuclear, n.º 3 do art. 22.º do EBF, mediante a extensão de conceitos normativos presentes em outros segmentos (números) do mesmo normativo legal.

Como, acima, deixámos expresso, na sua literalidade, o art. 22.º n.º 3 do EBF (em 2009) era expresso, no sentido de que os rendimentos auferidos, por sujeitos passivos de IRC, respeitantes a UP’s, não estavam sujeitos a retenção na fonte, por parte do fundo de investimento (mobiliário) operante, motivo suficiente para, desde logo, retirar qualquer virtualidade/êxito à tentativa de substituir essa negação pela consideração, num cenário global (de pretensa ausência de separação estrita entre os rendimentos dos intervenientes e os dos Fundos), de se mostrar previsto o funcionamento desse mecanismo (de substituição tributária) (Cf. art. 20.º n.º 2 da Lei Geral Tributária (LGT).) na esfera jurídico-tributária do fundo de investimento interveniente.

Consequentemente, não determinando o art. 22.º do EBF, maxime o seu n.º 3, a imposição de retenção na fonte, por parte dos fundos de investimento, relativamente aos rendimentos entregues aos participantes, em particular, os sujeitos passivos de IRC, falta, objetivamente, um dos pressupostos legais para, in casu, fazer funcionar a previsão do art. 62.º n.º 2 do CIRC, o que, reflexamente, nos leva a concluir não ter o legislador visado implementar tal forma de cálculo da matéria coletável (dos sujeitos passivos de IRC participantes em fundos de investimento) no momento de operar a dedução à coleta facultada pela parte final do n.º 3 do art. 22.º do EBF.

Sintoma de que, no ano de 2009, assim tinha de ser interpretado e operado este dueto normativo, achamos na evolução legislativa posterior, com destaque para a reforma do regime de tributação dos organismos de investimento coletivo, preconizada pelo Decreto-Lei n.º 7/2015 de 13 de janeiro, que, com efeitos a partir de 1 de julho de 2015, além do mais, promoveu uma clara cisão e diferenciação, entre as tributações dos fundos de investimento mobiliário (e outros), instituída num renovado art. 22.º do EBF, e dos rendimentos pagos, por organismos de investimento coletivo, aos seus participantes, num novel e aditado art. 22.º-A do EBF.

Ora, quanto a esta última, o legislador foi perentório na afirmação da tributação dos rendimentos de UP’s em IRS ou IRC, sendo que, no caso dos distribuídos a titulares residentes em território português ou imputáveis a estabelecimento estável, aqui situado, a mesma se operava, agora, de forma expressa, “por retenção na fonte”; em cédula de IRC e para os respetivos sujeitos passivos, à taxa prevista no n.º 4 do art. 94.º do CIRC, com a clarificação de que a retenção tinha “a natureza de imposto por conta, exceto quando o titular beneficie de isenção de IRC que exclua os rendimentos de capitais, caso em que tem caráter definitivo”.

Acresce referir que, além desta manifesta diferenciação dos regimes vigentes em 2009 e após 1 de julho de 2015, ponderado o conteúdo dos n.ºs 9 e 10 do art. 7.º (“Regime transitório”) do Decreto-Lei n.º 7/2015 de 13 de janeiro («9 - A tributação dos rendimentos das unidades de participação ou das ações auferidos pelos participantes ou acionistas dos organismos de investimento coletivo, nos termos do novo artigo 22.º-A do EBF, na redação dada pelo presente decreto -lei, incide apenas sobre a parte dos rendimentos gerados a partir da data de início de produção de efeitos deste diploma, … .

10 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram -se distribuídos ou resgatados aos participantes, em primeiro lugar e até à sua concorrência, os rendimentos gerados até à data de início da produção de efeitos da redação dada pelo presente decreto-lei e que, até essa data, não tenham sido distribuídos ou resgatados, aplicando -se, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.ºs 2 a 5, 7, 10 e 14 do artigo 22.º, na redação anterior.»), julgamos ser evidente, para o próprio legislador, a necessidade de separar, distinguindo, a tributação dos rendimentos pagos aos participantes nos dois espectros temporais versados.
Ademais, no sentido da alteração do paradigma, a exposição de motivos do diploma legal em apreço esclarece: «

(…).

Neste contexto, a Assembleia da República, por uma larga maioria, decidiu autorizar o Governo a rever o regime fiscal dos organismos de investimento coletivo, através da generalização do método de tributação «à saída», passando a tributar em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas os rendimentos auferidos pelos investidores.

Adotando uma das principais tendências internacionais, o presente decreto-lei estabelece um regime que permitirá a fácil comparabilidade do desempenho dos organismos de investimento coletivo nacionais com os internacionais, aumentando a facilidade de divulgação internacional dos organismos de investimento coletivo portugueses, promovendo-se assim a poupança de longo prazo e o investimento em ativos com maior espetro de rendibilidade, uma vez que o fator fiscal passa essencialmente a ter impacto na esfera dos investidores.

(…).»

Em suma, o art. 22.º n.º 3 do EBF, na redação, do Decreto-Lei n.º 108/2008 de 26 de junho, em vigor no ano de 2009, permitia, a um sujeito passivo de IRC, deduzir à coleta, do exercício, imposto pago (através de retenção na fonte ou não) por um fundo de investimento mobiliário, sem que, previamente, na competente autoliquidação, tivesse de adicionar, a importância correspondente a esse imposto, aos demais valores constitutivos/integrantes da respetiva matéria coletável.

Estabelecida e afirmada esta conclusão, resta inscrever as seguintes notas:

- podendo a nossa interpretação do art. 22.º n.º 3 do EBF, para o ano de 2009, merecer o apontamento de possibilitar a dedução de um imposto que não incidiu sobre os rendimentos pagos aos titulares de UP’s e, ainda, foi suportado por terceiro, como resulta do, anteriormente, exposto e justificado esse era, então, o resultado do “regime fiscal” instituído para, de forma privativa, tributar os rendimentos dos detentores de UP’s em fundos de investimento, mobiliário, com uma pretendida marca de benefício fiscal, eventualmente, em medida exagerada, mas, porventura, com a expressão certa/adequada (para o legislador) a conseguir implementar e desenvolver os fundos de investimento, enquanto organismos de investimento coletivo (Em 2015, o legislador identifica estes como integrando “um domínio de primordial importância para a aplicação de poupanças e para a atração de investimento, designadamente investimento estrangeiro.” – ver, preâmbulo do Decreto-Lei n.º 7/2015…), capazes de facultarem e fomentarem o investimento conjunto, agregado, de capitais, servindo, assim, de alternativa, competente e concorrente, às comuns formas de investimento direto/individual;

- por outro lado, se desta forma de operar o versado dispositivo legal pode, em primeira linha, resultar “uma redução da receita fiscal” – cf. conclusão I., não podemos deixar de referenciar, lembrando, que esta é uma consequência inerente à concessão de benefícios fiscais – art. 2.º do EBF (Mesmo os “desagravamentos fiscais” (que não são benefícios fiscais) implicam deixar de cobrar-se receita (tributária) – cf. art. 4.º do EBF.), bem como, de trazer à colação a circunstância de, reconhecidamente, no ano de 2009, a tributação dos fundos de investimento estar estruturada numa lógica de “tributação à entrada e isenção à saída”, ou seja, acontecia, como regra, que as UP’s, constituídas há mais de um ano e já com rendimentos obtidos, quando eram adquiridas pelos participantes dos fundos de investimento, incorporavam a valorização induzida pela obtenção desses rendimentos, que foram, necessariamente, sujeitos a tributação, pelo que, o valor de aquisição das UP’s tinha incorporado o imposto pago ou retido ao fundo e, por consequência, o resultado de um sequente resgate tinha associado a parte do imposto pago/retido até à data de aquisição da UP’s, agora, alienadas; ou seja, os participantes nos fundos de investimento não deixavam de suportar alguma carga fiscal, pelo recurso aos mesmos.

Posto isto, a sentença recorrida não enferma do “grave ERRO DE DIREITO APLICÁVEL”, apontado pela rte.

Encontrando-se o valor desta causa fixado em € 395.049,43, nos termos e para os efeitos do art. 6.º n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais (RCP), julgamos justo e equilibrado, considerando, em particular, a complexidade deste recurso associada à novidade (jurisprudencial) da matéria tratada, dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que excede € 275.000,00, numa proporção diferente da totalidade.


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# III.

Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento ao recurso.

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Custas pela recorrente, dispensando-se, o pagamento do remanescente da taxa de justiça, em 75%.
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[texto redigido em meio informático e revisto]

Lisboa, 12 de janeiro de 2022. - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) - Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.