Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01425/14 |
Data do Acordão: | 02/15/2017 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | VERBA TABELA DO IMPOSTO DE SELO PROPRIEDADE VERTICAL VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO |
Sumário: | I - Relativamente aos prédios em propriedade vertical, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), a sujeição é determinada pela conjugação de dois factores: a afectação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a € 1.000.000. II - Tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação. |
Nº Convencional: | JSTA000P21493 |
Nº do Documento: | SA22017021501425 |
Data de Entrada: | 12/02/2014 |
Recorrente: | FAZENDA PÚBLICA |
Recorrido 1: | A........, S.A. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 148/14.4BELLE
1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade denominada “A…………., S.A.” (adiante Impugnante ou Recorrida) anulou a liquidação de Imposto de Selo (IS) que lhe foi efectuada com referência ao ano de 2012 e a dezasseis prédios em regime de “propriedade vertical” (Por simplicidade de exposição, ), com fundamento em vício de violação de lei, porquanto, contrariamente ao que entendeu a Administração tributária (AT), para efeitos da incidência daquele imposto, o valor patrimonial tributário (VPT) a considerar não é o resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente, mas o VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões. 1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.): «a) A questão decidenda é a interpretação da verba 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS) aditada pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29/10; b) Com a alteração introduzida pela citada Lei, o IS passou a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo VPT constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1 000 000,00 (vide verba n.º 28 da TGIS); c) No CIS não há qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, pelo que terá que se aplicar o disposto no CIMI, para aferir da eventual sujeição a IS (Cfr. art. 67.º n.º 2 do CIS redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012); d) O art. 2.º n.º 1 do CIMI define o conceito de prédio; e) O art. 2.º n.º 4 do CIMI ressalva as fracções autónomas de prédios constituídos em regime de propriedade horizontal, as quais considera, excepcionalmente, como prédios; f) Ao contrário, sendo um prédio constituído em propriedade total com partes ou divisões susceptíveis de utilização independente, é o prédio no seu todo, e já não cada uma daquelas partes, que integra o conceito de “prédio”, para efeitos de IMI e de IS, por remissão do artigo 1.º, n.º 6 do CIS; g) É precisamente o que acontece no caso objecto da sentença recorrida, pelo que, o que deve relevar, para efeitos de tributação de IS (verba 28 da TGIS e artigo 1.º do CIS), é o somatório do valor patrimonial tributário de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente; h) Excedendo o referido somatório, o montante de € 1.000.000,00, como sucede no caso concreto, estavam reunidos os pressupostos definidos na norma de incidência; i) E, a tal não obsta o facto de cada andar/divisão constar separadamente na inscrição matricial, e com os respectivos valores patrimoniais tributários, pois tal discriminação apenas releva, para efeitos fiscais, face ao conceito de matrizes prediais constante do artigo 12.º do CIMI e na matéria regulada neste Código para a organização das matrizes; j) A imposição de organizar desta forma as matrizes deve-se à necessidade de relevar a autonomia que, dentro do mesmo prédio, cabe a cada uma das suas partes, as quais podem ser funcional e economicamente independentes, k) Esta autonomização apenas se justifica porque no mesmo prédio pode ocorrer a utilização para comércio ou habitação, com ou sem arrendamento, o que é determinante nas regras da avaliação fiscal no âmbito do CIMI, face aos diferentes coeficientes de afectação previstos no art. 41.º desse código; l) A douta sentença padece de erro de julgamento de direito, quando decidiu considerar, para efeitos de tributação da verba 28 da TGIS, como “prédio”, cada um dos andares/divisões susceptíveis de utilização independente de um prédio em propriedade total; m) Pois, o que releva é antes o somatório dos valores patrimoniais de tais andares/divisões, atento o disposto nos artigos 1.º, n.º 1 e n.º 6 do CIS e artigo 2.º do CIMI; n) Assim, o prédio inscrito na matriz predial urbana de Albufeira sob o artigo 5964, antigo 8892, composto por 16 unidades susceptíveis de utilização independente, é subsumível à verba n.º 28 da TGIS, em virtude do seu valor patrimonial tributário total exceder o valor de € 1.000.000,00, previsto naquele normativo legal. Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a douta sentença recorrida, mantendo-se as liquidações impugnadas, assim se fazendo Justiça». 1.3 A Impugnante apresentou contra-alegações, nas quais, para além de pugnar pela manutenção do decidido, pediu que, na procedência do recurso, fossem conhecidas as demais questões suscitadas na petição inicial e que a sentença considerou prejudicadas pela solução que deu à causa: «a) O artigo 12.º, n.º 3 do CIMI, dispõe o seguinte: “Cada andar ou parte susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário.”, daqui se retirando que a vontade do legislador foi a de autonomizar os andares ou divisões susceptíveis de utilização independente e que, por regra corresponderia cada um deles a um prédio urbano. b) A questão aqui decidenda é saber qual o valor patrimonial tributário relevante como critério para a incidência do imposto de selo, mormente se a incidência é sobre o somatório do valor patrimonial atribuído às diferentes divisões susceptíveis de utilização independente do prédio constituído em propriedade total, ou se por outro lado é o valor patrimonial atribuído a cada uma das suas 16 divisões de per si que deve ser considerado para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS. c) Por força da remissão operada pela verba n.º 28 da TGIS, o legislador determinou expressamente que o apuramento do valor para efeitos de Imposto de Selo se faz com base no valor patrimonial tributário para efeitos de IMI. d) Ao determinar no artigo 6.º da Lei 55-A/2012 de 29 Outubro que para efeito da verba 28.1 da TGIS o valor patrimonial tributário é o que é utilizado para efeito de IMI o legislador quis autonomizar o valor tributário das divisões susceptíveis de utilização independente de prédios urbanos em propriedade total, atribuindo-lhes individualmente um valor patrimonial tributário para efeitos de IMI. e) O legislador determinou expressamente, sem margem para dúvidas, que o valor patrimonial a ser considerado é o utilizado para efeitos de IMI e dúvidas não existem nos presentes autos que cada uma das 16 unidades susceptíveis de utilização independente tem um valor patrimonial tributário inferior a € 1.000.000,00, conforme ficou demonstrado pelo doc. 1 junto à Impugnação Judicial e bem assim do ponto 3 do probatório da Douta sentença. f) Ficou demonstrado que nenhuma das 16 unidades tinha um valor patrimonial tributário superior a € 1.000.000,00, após a avaliação geral do prédio em apreço no dia 12 de Dezembro de 2012, conforme consta do ponto 5 do probatório da Douta sentença. g) Sobre esta matéria versou a decisão do CAAD, no processo 50/2013-T, disponível em www.caad.org.pt, a qual em suma conclui que: “26. (...) Deste modo é ilegal e inconstitucional considerar como valor de referência seja o correspondente ao somatório dos VPT atribuídos a cada parte ou divisão. Desde logo, porque essa seria uma nítida violação do princípio da igualdade e proporcionalidade em matéria fiscal. (...) O legislador fiscal não pode tratar situações iguais de forma diferente, Ora, se o prédio se encontrasse em regime de propriedade horizontal, nenhuma das suas fracções habitacionais sofreria incidência do novo imposto. Por isso mesmo é que o artigo 12.º, n.º 3 do CIMI diz que “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial a qual discrimina igualmente o respectivo valor patrimonial tributário.” (...) Não pode a AT distinguir onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar a coerência do sistema fiscal, bem assim como o princípio da legalidade fiscal previsto no artigo 103.º, n.º 2 da CRP, e ainda os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade fiscal”. h) Assim, entendeu o CAAD que o acto de liquidação deveria ser anulado, levando em linha de conta na sua decisão, não só a letra da lei, mas também o espírito de legislador e a harmonização dos diferentes princípios legais do nosso sistema fiscal. i) Situação semelhante se passa relativamente ao prédio em apreço, com a agravante de aqui não se estar a falar de andares ou divisões para habitação, mas sim de 16 divisões destinadas única e exclusivamente ao turismo, encontrando-se na realidade afectas a serviços, como se demonstrou na impugnação, pelo que, bem andou o Tribunal “a quo” ao determinar a anulação dos actos de liquidação, porquanto cada uma das 16 divisões/unidades susceptíveis de utilização independente tem um valor patrimonial muito inferior a € 1.000.000,00, pelo que, não poderá ser aplicável ao prédio em apreço a verba 28 da T.G.I.S., discordando-se em absoluto do entendimento e argumentação da Fazenda Pública. j) Mesmo que assim não se entenda, o que se diz sem conceder e apenas por mera cautela de patrocínio, nos termos do artigo 149.º, n.º 3 do Código de Processo Administrativo, aplicável ex vi artigo 2.º alínea c) do CPPT, deverão V. Exas. proceder à apreciação do pedido relacionado com os restantes argumentos apresentado pela impugnante para fundamentar a ilegalidade do acto tributário, questões essas cujo conhecimento ficou prejudicado pela solução dada ao litígio. k) Determina a alínea a) do número 1 do artigo 6.º da Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro que “o facto tributário verifica-se no dia 31 de Outubro de 2012”, no caso em apreço trata-se de imposto relativo ao ano 2012. 1) No dia 31 de Outubro de 2012, data em que objectivamente, nos termos do artigo 6.º da Lei 55-A/2012 se verificaria o facto tributável, o prédio em apreço de que a impugnante é proprietária não era destinado a habitação, com valor patrimonial tributário, igual, ou superior, ao referido um milhão de euros pelo que estaria fora do âmbito de aplicação do normativo. m) Da conjugação do disposto no artigo 6.º e da verba 28 da TGIS, ambos do mesmo diploma legal: a Lei 55-A/2012 de 29 Outubro, resulta que, em relação ao ano 2012, o proprietário de prédio destinado a habitação, com VPT igual ou superior a € 1.000.000,00, à data de 31 de Outubro de 2012, veria tal imposto liquidado até 20 de Novembro do mesmo ano, devendo proceder ao seu pagamento até 20 de Dezembro de 2012 e no ano de 2013 a liquidação do imposto deve incidir sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efectuar nesse ano. n) Resulta da factualidade provada na Douta sentença do Tribunal “a quo”, ponto 1 do probatório, que a ora Recorrida, é proprietária de um prédio, inscrito na matriz sob o artigo 8890, composto por 16 unidades susceptíveis de utilização independente que receberam a numeração compreendida entre o número 1 e 16. o) Ou seja, o prédio em preço, apesar de se encontrar em propriedade total, corresponde a 16 unidades autónomas, destinadas a apartamentos turísticos, susceptíveis de utilização independente, e como tal avaliadas. p) Resulta também da factualidade provada na Douta sentença do Tribunal “a quo”, ponto 2, que o prédio integra-se no empreendimento “Apartamentos Turísticos …………. (fls. 75 dos autos). q) Sendo ainda relevante referir que, constando também da factualidade dada como provada (ponto 6), que as liquidações impugnadas foram efectuadas com referência ao ano de 2012. r) Após a avaliação geral, efectuada em 12 de Dezembro de 2012, o prédio passou a ter o VPT total de € 1.054.800,00. s) Resulta da lei que, com referência ao ano de 2012, para efeitos de cobrança de imposto de selo, o facto tributário verificar-se-ia à data de 31/10/2012. t) Em relação ao prédio em apreço, tal imposto não é devido porquanto à data da verificação do facto tributário (31 de Outubro de 2012) o prédio tinha um VPT total inferior a € 1.000.000,00 (um milhão de euros), ou seja, inexistia qualquer facto tributário, nos termos da legislação aplicável. u) Nos termos da Lei 60-A/2011, de 30 de Novembro, que alterou o D.L. 287/2003 de 12 de Novembro, mais concretamente no artigo 15.º-E, está definido o regime de notificação do valor patrimonial tributário apurado na avaliação geral, sendo que no caso dos presentes autos foi por meio de notificação electrónica. v) O sujeito passivo, após a notificação do resultado da avaliação geral poderá, em 30 dias, caso não concorde com o valor atribuído, promover uma segunda avaliação, nos termos do número 1 do artigo 15.º-F do mesmo diploma. w) O VPT resultante da avaliação geral apenas se torna definitivo, procedendo os Serviços à actualização da matriz decorridos que se mostrem 30 dias sobre a notificação do valor atribuído, caso não haja sido requerida segunda avaliação, de harmonia com o previsto no artigo 15.º-H do diploma supra referido. x) Resulta do supra exposto, e da factualidade dada como provada na Douta Sentença do Tribunal “a quo”, que as avaliações gerais datam de 18 de Dezembro de 2012, foram efectuadas por via electrónica e presumem-se recebidas, nos termos do número 2 do artigo 15.º E do mesmo diploma “no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte, quando aquele dia não seja útil”, daqui resultando que a notificação se presume recebida em 20 de Janeiro de 2013. y) Significa isto que, à data de 31 de Outubro de 2012, a ora Recorrida era proprietária de um prédio urbano, composto por 16 unidades susceptíveis de utilização independente, cujo VPT, nessa mesma data era de € 978.427,32, conforme consta da factualidade provada na Douta sentença. z) Por outro lado, em relação ao ano 2013, o imposto de selo ainda não podia ser liquidado àquela data de 21.03.2013, porquanto no diploma que criou o imposto o legislador estabeleceu duas realidades distintas, com o objectivo único de antecipar a cobrança deste novo imposto e assim se conseguir cumprir com as metas orçamentais impostas pela Troika com a arrecadação de uma receita extraordinária para o ano de 2012. aa) Isto porque, se, se aplicassem as regras do CIMI (regime geral) ao imposto criado, o mesmo seria devido pelo titular inscrito em 31 de Dezembro de 2012, e seria liquidado apenas em 2013, tornando, assim, manifestamente inútil, do ponto de vista dos objectivos orçamentais que lograva cumprir, a sua criação no ano de 2012. bb) É óbvio que o legislador não criou dois impostos iguais para o ano 2012, um que incidia sobre o proprietário em 31 de Outubro de 2012 e sobre o valor que o prédio tinha a tal altura, e um outro que incidia sobre o proprietário em 31 de Dezembro de 2012, devendo ser liquidado nos termos do CIMI em 2013, pois se assim fosse estaríamos a falar de uma o que significaria uma duplicação da colecta, o que não seria legal. cc) O imposto criado foi apenas um, e pretendeu-se, tão só, antecipar receitas que, nos termos normais, seriam recebidas em 2013, para 2012, daqui resultando que, nem por esta via, seria devido o imposto de selo pela ora Recorrida, ou seja, nem alegando Recorrente que se tratava de imposto a liquidar durante o ano 2012, pois como se provou à data de 31/10/2012 o prédio em apreço nos presentes autos tinha uma valor patrimonial inferior a € 1.000.000,00. dd) Nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, designadamente no seu artigo 8.º, n.º 1, o imposto é devido pelo proprietário do prédio à data de 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeitar e nos termos do artigo 113.º, n.º 1 do mesmo código, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita. ee) Ou seja, com referência ao ano 2013, apenas em 31/12/2013 se gera o facto tributário, nos termos dos supra referidos artigos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, significando isto que, apenas após a verificação do facto tributário, ou seja, apenas em 2014 a Autoridade Tributária poderá emitir notas de liquidação deste imposto, referentes a 2013, tendo como sujeito passivo o titular inscrito em tal data e o valor patrimonial que constar na matriz. ff) Se assim não fosse, verificar-se-ia, em relação ao ano de 2012, sem sombra de dúvida, uma duplicação do imposto cobrado o que não é admissível, nem legalmente possível. gg) Assim, uma vez que o prédio que ora se discute à data da liquidação do imposto devido pelo ano 2012 (31 de Outubro de 2012) não tinha um VPT igual ou superior a €1.000.000,00 (um milhão de euros), não poderá incidir, sobre o mesmo o imposto de selo constante do ponto 28 da Tabela. hh) Ainda que assim não se entenda, o que não se aceita e se diz por mera cautela de patrocínio, também pela via da afectação do prédio em apreço teria que se proceder à anulação das notas de liquidação em apreço. ii) No articulado da impugnação judicial apresentada pela ora Recorrida, mais precisamente nos artigos 44.º e seguintes da mesma, vem a ora Recorrida demonstrar que também por outras vias teriam as liquidações de ser anuladas. jj) A verba 28, que foi aditada à Tabela Geral do Imposto de Selo, é específica, e para o que nos interessa, aplica-se a prédios urbanos com afectação habitacional cujo valor patrimonial tributário constante da matriz nos termos do CIMI seja igual ou superior a € 1.000.000,00; kk) Resulta da caderneta predial junta à impugnação judicial apresentada como doc. 3 (e igualmente documento 1, referente à actual descrição do prédio) que o referido artigo urbano 8892 é de um prédio urbano de 4 pisos, destinado a indústria, em regime de propriedade total, constituída por 16 fogos, que são susceptíveis de utilização independente, cada um de per si tem o seu valor patrimonial tributário, e para cada uma das 16 zonas de utilização independente foi emitida uma nota de liquidação. ll) O prédio - Lote 10 (anterior Bloco 49) encontra-se classificado para efeitos turísticos, e faz parte do Empreendimento denominado “Apartamentos Turísticos ……………” sito na ……………, em ……………., Albufeira, tal como consta do ponto 2 do probatório da douta sentença. mm) Para o empreendimento Turístico supra, de que faz parte o prédio que ora se analisa, foram emitidas, pela Câmara Municipal de Albufeira, as licenças de utilização números 76 a 81, em 11 de Março de 1988, que destinavam os prédios a habitação. nn) A Câmara Municipal de Albufeira emitiu a licença normal, para habitação, e, paralelamente, desenvolveu-se o processo de classificação no Turismo, pois a legislação da altura não impunha a emissão de uma licença de utilização turística, como hoje. oo) Por ofício datado de 20 de Setembro de 1988 a Direcção Geral de Turismo autorizou a abertura do empreendimento como “Apartamentos Turísticos de 2.ª Categoria” – of. DGT/DSEAT/ATRS/ATC-22058 - (conforme doc. 20 junto à impugnação judicial). pp) Em 17 de Setembro de 1997, por aplicação do Decreto Regulamentar 34/97, o empreendimento foi “classificado, independentemente de quaisquer formalidades, como Apartamentos Turísticos ……….”, e em 28 de Dezembro de 2010, foi deferida a reconversão do empreendimento para Apartamentos Turísticos ……….. - SI-RJET n.º 986 - 22058 (tudo conforme doc. 21 junto à Impugnação Judicial). qq) Em 21 de Novembro de 2011, foi efectuada a última classificação, que se encontra válida até 21 de Novembro de 2015, tendo atribuído ao empreendimento, onde se localiza o prédio, o registo número 1172 (conforme doc. 22 constante da Impugnação). rr) Desde a sua edificação (1988) até aos dias de hoje, o prédio, inserido no Empreendimento Turístico em causa, nunca esteve afecto a habitação, estando apenas, e só, afecto à indústria hoteleira. ss) A Recorrente ao aplicar ao prédio para indústria hoteleira, propriedade da ora Recorrida, o previsto no artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro fê-lo erroneamente porquanto o referido prédio urbano não está abrangido pelo âmbito de aplicação objectiva do imposto, pois não se encontra, nem nunca se encontrou, afecto a habitação. tt) Há que atender ao conceito de “prédio com afectação habitacional”, utilizado pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, na sua redacção inicial, e interpretá-lo, sendo que o ponto de partida para tal interpretação terá de ter em consideração não só a letra da lei, mas também a sua integração sistemática com as normas do CIMI, porquanto é este o diploma indicado como de aplicação subsidiária na Lei n.º 55-A/2012 de 29/10, e bem assim o espírito do legislador. uu) No ordenamento jurídico tributário, designadamente no artigo 6.º do CIMI, são identificadas as seguintes “espécies” de prédios urbanos: habitacionais; comerciais, industriais ou para serviços; terrenos para construção; e outros, como categoria residual; e o n.º 2 do mesmo preceito, que ora se transcreve, diz: “Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”. (sublinhado nosso) vv) Para a interpretação desse conceito temos que conjugar o artigo 6.º, n.º 2 CIMI, com o artigo 41.º CIMI que determina que a afectação depende unicamente do tipo de utilização dos prédios edificados. ww) A expressão “com afectação habitacional” inculca uma ideia de funcionalidade real e presente, ou seja, um prédio cujo seu destino actualmente seja habitação, ou seja, um prédio com afectação habitacional, não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim, isto é não basta que seja um prédio habitacional, mas sim um prédio que tenha já efectiva afectação a esse fim. xx) O prédio em apreço sempre se destinou (e destina) à indústria hoteleira, como se demonstrou pela descrição de todo o processo competente junto das entidades administrativas competentes e bem assim pela actual classificação atribuída ao empreendimento turístico. yy) Terá que se interpretar o espírito do legislador, e a teleologia da norma, o intuito foi o de aplicar aos sujeitos passivos proprietários de prédios ditos de “luxo” (com valores patrimoniais tributários iguais ou superiores ao referido um milhão de euros), um imposto especial, destinado, efectivamente, a taxar o “luxo” e a reflectir, em prol da comunidade, o beneficio da existência de uma acrescida capacidade contributiva do titular do imóvel, tendo tido o cuidado, por exemplo, de isentar os prédios destinados a outros fins, por exemplo, comércio, indústria ou serviços, em que o seu valor patrimonial nada espelha a nível da “capacidade contributiva”, mas, eventualmente, apenas nível de “aptidão produtiva”, fazendo incidir o imposto somente sobre prédios destinados a habitação (com VPT acima de determinado valor e todos os prédios detidos por sociedades sedeadas nos chamados paraísos fiscais. zz) A ora Recorrida não era proprietária de qualquer prédio destinado a habitação, com valor patrimonial tributário, igual, ou superior, ao referido um milhão de euros pelo que estaria fora do âmbito de aplicação do normativo. aaa) Assim, por falta de preenchimento dos elementos objectivos do imposto deverá ser mantida a decisão recorrida e determinada a anulação das notas de liquidação impugnadas. Nestes termos, a argumentação da Recorrente não deverá proceder, devendo manter-se a sentença recorrida […]». 1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto, que enunciou a questão a dirimir como sendo a da «interpretação da norma de incidência objectiva constante da verba 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), na redacção da Lei n.º 55-A/2012, 29 Outubro por forma a determinar se é aplicável aos prédios urbanos constituídos por partes susceptíveis de utilização independente, tendo cada uma valor patrimonial tributário (VPT) inferior a € 1.000.000», emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «O conceito de prédio aplicável no domínio do Código do Imposto do Selo (CIS) é o definido no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) (art. 1.º n.º 6 CIS). 1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos. 1.6 Cumpre apreciar e decidir. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «1. A……………, SA, é proprietária do prédio inscrito na matriz predial urbana de Albufeira sob o artigo 5.964, antigo 8.892, composto por 16 unidades susceptíveis de utilização independente que receberam a numeração compreendida entre o número 1 e 16 – cfr. fls. 32-43 e 63-69 dos autos. 2. Este prédio integra-se no empreendimento «Apartamentos Turísticos ……………» – cfr. fls. 97-99 dos autos. 3. Em 5 de Janeiro de 2010, a Caderneta Predial Urbana do prédio referido em 1., que aqui se dá por integralmente reproduzida, tinha, no que ora interessa, o seguinte teor: 4. Em 10 de Fevereiro de 1988 foi apresentada a declaração Modelo 129 de Contribuição Predial relativa ao artigo 8.892 e às suas 16 divisões independentes – cfr. fls. 32 não numerada do apenso. 5. No dia 18 de Dezembro de 2012, foi promovida a avaliação geral do prédio inscrito na matriz sob o artigo 8.892 que determinou os seguintes valores patrimoniais tributários:
6. Consequentemente, em 21 de Março de 2013 foram emitidas as liquidações de Imposto de Selo números 2013.000287337, 2013.000287361, 2013.000287364, 2013.000287367, 2013.000287370, 2013.00027373, 2013.000287376, 2013.000287379, 2013.000287382, 2013.000287340, 2013.000287343, 2013.000287346, 2013.000287349, 2013.000287352, 2013.000287355 e 2013.000287358, relativas ao ano de 2012 e a cada uma das referidas divisões independentes, com atinência ao valor patrimonial respectivo referido no ponto anterior – actos impugnados –, no valor global de € 3.515,92, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas e que, no que ora interessa, tem a seguinte menção: “Valor patrimonial do prédio - total sujeito a imposto: 1.054.800,00” – cfr. fls. 46-61 dos autos 7. A………….., SA, efectuou o pagamento das liquidações identificadas no ponto anterior – cfr. fls. 46-61 dos autos». * 2.2 DE DIREITO 2.1.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR Na presente impugnação judicial está em causa a legalidade de acto de liquidação de Imposto de Selo efectuado relativamente ao ano de 2012 e a um prédio de que a Impugnante é proprietária. Na petição inicial, foi pedido ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que anulasse aquele acto com fundamento em vício de violação de lei, porquanto, na óptica da Impugnante, para efeitos de incidência em IS pela verba n.º 28 da respectiva Tabela Geral (verba que foi aditada pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), a AT não pode considerar, como considerou, o VPT resultante da soma dos VPT dos andares ou divisões susceptíveis de utilização autónoma e que têm afectação habitacional, mas apenas o VPT de cada um deles, que foi determinado separadamente. 2.2.2 DA INCIDÊNCIA OBJECTIVA PREVISTA NA VERBA 28.1 DA TABELA GERAL DO IMPOSTO DE SELO (NA REDACÇÃO DA LEI N.º 55-A/2012) A questão tem vindo a ser decidida de modo uniforme por este Supremo Tribunal Administrativo (Vide, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - Relativamente aos prédios em propriedade vertical, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), a sujeição é determinada pela conjugação de dois factores: a afectação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a € 1.000.000. II - Tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação. * * * Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. * Lisboa, 15 de Fevereiro de 2017. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado. |