Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0591/16
Data do Acordão:01/25/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:IRS
CATEGORIA
MAIS VALIAS
RENDIMENTOS EMPRESARIAIS
Sumário:No âmbito de ganhos decorrentes de mais-valias imobiliárias, por força da transferência de bens do património empresarial para o âmbito do património pessoal do empresário, em caso de cessação da actividade, na categoria B de IRS estão abrangidos apenas os resultantes da alienação de imóveis afectos ao exercício da actividade empresarial.
Nº Convencional:JSTA00069991
Nº do Documento:SA2201701250591
Data de Entrada:05/11/2016
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A.......E B.........
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF AVEIRO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IRS
Legislação Nacional:CIRS ART29 ART10 ART114.
CIVA ART3 ART33.
CPPT ART61.
CIRC ART43
Referência a Doutrina:ANDRÉ SALGADO MATOS - CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE RENDIMENTO DAS PESSOAS SINGULARES ANOTADO - INSTITUTO SUPERIOR DE GESTÃO 1ED PÁG280.
FREITAS PEREIRA - TRATAMENTO FISCAL DA TRANSFERÊNCIA DE BENS IMÓVEIS ENTRE O PATRIMÓNIO PRIVADO E O PATRIMÓNIO EMPRESARIAL DUMA PESSOA SINGULAR - CTF N367 - JULHO - SETEMBRO 1992 PÁG8-26.
RUI DUARTE MORAIS - SOBRE O IRS 2ED PÁG87 PÁG144-146.
JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO - IRS INCIDÊNCIA REAL E DETERMINAÇÃO DOS RENDIMENTOS LIQUIDOS - 2007 PÁG188-249.
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A……….. e B……….., com os demais sinais dos autos, contra a liquidação de IRS do ano de 2004, no montante de € 20.097,88.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A……… e mulher B…………. contra a liquidação de IRS referente ao ano de 2004.
II. A factualidade dada por assente demonstra que o impugnante marido requereu o averbamento em seu nome de vários prédios, em virtude da sua cessação de actividade ocorrida em 30/03/2004.
III. A AT considerou que tal situação configurava uma transferência de bens afectos à actividade empresarial para o património particular, tributável nos termos do artigo 3.º e do n.º 3 do artigo 29º, ambos do Código do IRS.
IV. Os impugnantes discordam de tal entendimento.
V. O Tribunal entendeu que a afectação de bens imobiliários ao património particular não integra o conceito de transmissão, não sendo sujeito a tributação em sede de IRS, dado que as normas invocadas pela AT não prevêem tal situação.
VI. Porém, o artigo 3.º determina quais os rendimentos sujeitos a IRS pela categoria B, designadamente a transferência para o património particular de bens afectos à actividade da empresa individual, enquanto o artigo 29.º prevê o modo da determinação do rendimento colectável nos casos em que se verifique tal afectação.
VII. Devido ao “carácter predominante” da categoria B, as mais-valias realizadas no âmbito de uma actividade empresarial ou profissional são tributadas na esfera daquela mesma categoria.
VIII. Em caso de transferência do património profissional ou empresarial para o património particular, o rendimento da categoria B - mais-valia - é apurado no momento da afectação.
IX. Nestes termos, incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento de direito ao decidir que a afectação de bens do activo da empresa ao património particular não se encontra sujeita a tributação em sede de IRS, em clara violação do artigo 3.º n.º 1 alínea a) e n.º 2 alínea c) e do artigo 29.º n.º 3, todos do Código do IRS, normas essa que deveriam ser ter sido aplicadas e interpretadas no sentido de que, quando ocorrer a transferência de bens do activo da empresa individual para o património particular, essa transferência está sujeita a tributação em sede da categoria B do IRS, no momento da afectação, correspondendo o valor dos bens ao valor de mercado dos mesmos à data da transferência.
Termina pedindo a procedência do recurso e a revogação da sentença recorrida.

1.3. Em contra-alegações, os recorridos pugnam pela improcedência do recurso e pela inconstitucionalidade do nº 3 do art. 29º do CIRS, por violação dos princípios da legalidade e da tipicidade fiscal (arts. 106º, nº 2 e 167º da CRP).

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«Recurso interposto pela Fazenda Pública, sendo recorridos A…………. e B………..:
A questão controvertida é relativa à interpretação efetuada dos artigos 3.º n.º 1 al. a) e n.º 2 al. c), e 29.º do C. do I.R.S., disposições que se defende ser ao caso de aplicar e que, tendo ocorrido uma transmissão de bens, se apura um rendimento da categoria B.
Com Rui Duarte Morais (Sobre o IRS, 2014, p. 133), vai defender-se no sentido de se enquadrarem na categoria B apenas os ganhos resultantes da alienação de imóveis afetos ao exercício de atividades empresariais e que, no caso não tendo tal ocorrido, é de afastar a tributação em sede de I.R.S..
Concluindo:
Parece que o recurso interposto pela F.P. é de improceder, sendo de manter o decidido.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
1 - Os impugnantes foram objeto de uma ação inspetiva relativamente ao exercício de 2004 conforme resulta do relatório constante do PA de fls. 6 a 11 e que aqui se dão por reproduzidas e que deu lugar a uma correção em sede IRS no valor de € 20.097,88.
2 - Os fundamentos para a correção em sede IRS encontram-se explanados no relatório identificado em 1), e cujos extratos a seguir se transcrevem: “(…) Até ao ano de 2000, no âmbito da actividade exercida, o sujeito passivo esteve colectado na categoria C do IRS sem contabilidade organizada, entregando para o efeito o anexo B1 da Mod.3 do IRS. (...) No ano de 2001, com a criação do regime simplificado de tributação, verificou-se que, face ao volume de negócios apresentado no ano anterior (...), o mesmo não ficou abrangido pelo referido regime simplificado, tendo apresentado relativamente à actividade desenvolvida nesse mesmo ano, o anexo C (anexo apresentado por sujeitos passivos com contabilidade organizada).
(…) no ano de 2002, dado não ter optado por contabilidade organizada, nem ter ultrapassado no ano anterior qualquer dos limites estabelecidos no nº 2 do artº 28º do CIRS, passou a partir dessa data a ficar enquadrado no regime simplificado de tributação, relativamente à actividade desenvolvida de compra e venda de bens imobiliários. (…) Além da actividade desenvolvida, verificou-se que o sujeito passivo possui ainda rendimentos de pensões, rendimentos de capitais e ainda rendimentos prediais. (…) Exercício de 2004, (…) Afectação de existências a uso particular, (...) O facto descrito no ponto II.2 do presente relatório, configura uma situação de afectação de existências (prédios urbanos) da sua actividade empresarial a uso particular, a qual leva à determinação de um rendimento enquadrável na categoria B de IRS, ficando desde logo sujeito a tributação. Com efeito, de acordo com a) do nº 1 do artº 8º do CIRS, tal afectação é considerada um rendimento da categoria B do IRS. (…) Estabelece o nº 3 do artº 29º do CIRS, que “no caso de transferência para o património particular do sujeito passivo de bens afectos à sua actividade empresarial e profissional, o valor dos bens corresponde ao valor de mercado dos mesmos à data da transferência”. (...) Verifica-se assim que o valor da realização, será o correspondente ao valor do mercado de cada prédio à data da transferência ou afectação para o património particular, valor este que deveria ter sido atribuído pelo sujeito passivo. (…) verificou-se contudo, que tais rendimentos não foram declarados pelo sujeito passivo na declaração mod.3 entregue para o ano de 2004. (...) Por não ter sido declarado tal montante, e de acordo com o artº 29º n.3 do CIRS, o valor a atribuir a estas existências é o valor de mercado, mas tendo em conta que o prédio onde se situam as referidas fracções é recente (construído em 1998), tendo ainda em conta que, por força da recente reforma do património os valores patrimoniais dos referidos prédios foram actualizados à data de 31/12/2003, na falta de outros valores, vamos considerar esses montantes como valores de mercado para tributar esta operação.
(...) Tal como vimos no ponto II.3.2 do presente relatório, dado o sujeito passivo a partir do ano de 2001 não ter optado pelo regime de contabilidade organizada, nem ter ultrapassado qualquer dos limites estabelecidos no nº 2 do artº 28º do CIRS, passou a ficar enquadrado no regime simplicado de tributação. (...) Sendo a afectação a uso particular assimilável a uma venda, e considerando o disposto nos nºs 1 e 2 do artº 31º do CIRS, a determinação do rendimento tributável resulta da aplicação do coeficiente de 0,2 ao valor das vendas de mercadorias e produtos, pelo que o valor da correcção proposta ao rendimento tributável na categoria B do IRS no ano de 2004 é de 48.417,21, (…)”.
3 - Em 10.05.2010 o ora impugnante, requereu ao Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Espinho o averbamento em seu nome dos prédios identificados a fls. 15 do PA e que aqui se dá por reproduzida.
4 - O impugnante cessou a sua atividade de “compra e venda de imóveis”, em 30.03.2004, (facto admitido por acordo).
5 - A petição inicial foi remetida via postal ao Serviço de Finanças de Espinho com data de 24.08.2006, cfr. fls. 1 destes autos.

3.1. Enunciando como questão a decidir a de saber se ocorre a alegada violação do disposto no nº 3 do art. 29º do CIRS, a sentença responde afirmativamente e conclui pela procedência da impugnação, considerando o seguinte:
— A Administração Tributária (AT) fundamenta a liquidação impugnada no entendimento de que tendo o impugnante A…….. cessado a atividade de “compra e venda de bens imobiliários”, em 30/3/2004 e tendo, em 3/5/2004 requerido o averbamento em seu nome dos prédios em causa, então esse requerimento consubstanciou uma afectação ao património particular, e como tal, um acto enquadrável no nº 3 do art. 29º do CIRS, sendo que o valor da “realização” seria o valor de mercado e com enquadramento em sede de tributação de IRS no âmbito do regime simplificado.
— Os impugnantes sustentam, porém, que o eventual “ganho” decorrente da apontada afectação só se tornaria exigível no momento da ulterior alienação dos bens a terceiros conforme dispõe a alínea b) do nº 3 do art. 10º do CIRS.
— Das citadas normas não é possível concluir que a afectação de bens imobiliários em causa ao património particular integre o conceito de transmissão com a consequente tributação em sede IRS, sendo que em sede de IRS (e designadamente no art. 29º do CIRS) não se encontra uma ficção da transferência onerosa de bens, como se prevê para efeitos de tributação em IVA, quando ocorre a cessação de atividade como se pode ver do teor do art. 33º, nº 1, al. a) e do art. 3º, nº 3, al. f), ambos do CIVA.
— Não ocorreu, pois, qualquer transmissão de bens, no sentido jurídico do conceito e também não decorre da lei qualquer presunção de transmissão para situações idênticas à dos autos.
— Quanto ao pedido de juros indemnizatórios, também formulado pelos impugnantes, estando paga a liquidação, é de proceder, visto o disposto no art. 61º do CPPT.

3.2. Discordando, a recorrente Fazenda Pública invoca, como se viu, que é no art. 3º do CIRS que se determina quais são os rendimentos sujeitos a IRS pela categoria B, aí se incluindo a transferência para o património particular de bens afectos à actividade da empresa individual, enquanto que o art. 29º do mesmo CIRS apenas prevê o modo da determinação do rendimento colectável nos casos em que se verifique tal afectação.
Pelo que, dado o “carácter predominante” da categoria B, as mais-valias realizadas no âmbito de uma actividade empresarial ou profissional são tributadas na esfera daquela mesma categoria, sendo que em caso de transferência do património profissional ou empresarial para o património particular, o rendimento da categoria B - mais-valia - é apurado no momento da afectação.
A questão a apreciar prende-se, portanto, com a interpretação do disposto na dita al. c) do nº 2 do art. 3º do CIRS.
Vejamos.

3.3. De acordo com o disposto na al. a) do nº 1 do art. 3º do CIRS (Rendimentos da categoria B) consideram-se rendimentos empresariais e profissionais os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária.
E nos termos da al. c) do nº 2 do mesmo artigo 3º (na redacção à data), também se consideram rendimentos desta categoria B «c) As mais-valias apuradas no âmbito das actividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais, definidas nos termos do artigo 43º do Código do IRC, designadamente as resultantes da transferência para o património particular dos empresários de quaisquer bens afectos ao activo da empresa e, bem assim, os outros ganhos ou perdas que, não se encontrando nessas condições, decorram das operações referidas no n.º 1 do artigo 10.º, quando imputáveis a actividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais».
Por sua vez, o art. 29º do mesmo CIRS, sob a epígrafe (Imputação), dispõe (na redacção à data):
«1 - Na determinação do rendimento só são considerados proveitos e custos os relativos a bens ou valores que façam parte do ativo da empresa individual do sujeito passivo ou que estejam afetos às atividades empresariais e profissionais por ele desenvolvidas.
2 - No caso de afetação de quaisquer bens do património particular do sujeito passivo à sua atividade empresarial e profissional, o valor de aquisição pelo qual esses bens são considerados corresponde ao valor de mercado à data da afetação.
3 - No caso de transferência para o património particular do sujeito passivo de bens afetos à sua atividade empresarial e profissional, o valor dos bens corresponde ao valor de mercado dos mesmos à data da transferência.
4 - O valor de mercado a que se referem os números anteriores, atribuído pelo sujeito passivo no momento da afetação ou da transferência dos bens, pode ser objeto de correção sempre que a Autoridade Tributária e Aduaneira considere, fundamentadamente, que o mesmo não corresponde ao que seria praticado entre pessoas independentes.»

3.4. Naquele referido nº 2 do art. 3º do CIRS domina, pois, um princípio de atracção ou de predominância da categoria B (ficam abrangidos nesta categoria rendimentos previstos noutras categorias, desde que esses mesmos rendimentos sejam conexos com a actividade comercial, industrial, agrícola, silvícola, pecuária ou profissional, pelo que o lucro para este efeito relevante assentará no resultado global daquela actividade empresarial, perdendo, portanto, autonomia os diversos tipos de proveitos que contribuem para a respectiva formação).
Por sua vez, o art. 29º do CIRS é norma que regula a determinação do rendimento colectável da dita categoria B: e para essa determinação apela-se, no caso dos bens a que se aplica o disposto nos n.ºs 2 e 3, ao respectivo valor de mercado à data da afectação (de bens do património particular para a actividade profissional ou empresarial) ou transferência (de bens do património empresarial para o âmbito do património pessoal do empresário), sendo esse, portanto, o valor fiscalmente relevante para efeitos contabilísticos de amortização dos bens e de mais-valias, de bens que, estando afectos à actividade empresarial, vêm a ser transferidos para o património particular do sujeito passivo. (() Cfr. André Salgado de Matos, Código Do Imposto Sobre O Rendimento Das Pessoas Singulares (IRS) Anotado, Instituto Superior de Gestão, 1ª ed., 1999, Nota 2 ao art. 32º, p. 280.)
Sobre esta matéria, Freitas Pereira(() Tratamento Fiscal Da Transferência de Bens Imóveis Entre o Património Privado e o Património Empresarial De Uma Pessoa Singular», CTF nº 367 (Julho-Setembro 1992), pp. 8-26.) adverte que embora não possa falar-se propriamente «do património da empresa individual como realidade diferente da do património pessoal do empresário em nome individual (...) para efeitos contabilísticos e fiscais essa separação existe e tem importantes reflexos», além de que, apesar de a redacção do nº 1 do art. 29º do CIRS poder «dar a ideia da existência de bens afectos às actividades desenvolvidas pela empresa individual que não façam parte do activo da mesma (...) tal não é possível excepto quanto a bens não afectos de modo exclusivo a essas actividades.» Também assim sucedendo no caso de entradas no património privado vindas do património empresarial, pois que «tal facto não pode deixar de ter relevância, se for caso disso, para o apuramento de um resultado empresarial. Há, então, que aplicar os princípios gerais subjacentes à determinação desse resultado». Daí que a mais-valia profissional ou empresarial deva ser tributada (excepto se estiver isenta) «aquando da transferência para o património privado. No momento da venda do bem, a mais-valia privada é, desse modo, a única a ser tributada, se for caso disso.»
Em suma, conclui este autor, «Verifica-se aqui que a transferência para o património privado de um activo empresarial delimita também o que é rendimento empresarial e o que não o é, com a significativa diferença de que, neste caso, ao contrário do que acontece com as mais-valias ou menos-valias ligadas a transferência do património privado para o património empresarial, não há lugar a qualquer diferimento da tributação do rendimento empresarial para um momento ulterior, no que se tiveram em conta certamente as características próprias do apuramento dos rendimentos numa actividade empresarial», sendo que a cessação de actividade, havendo imóveis afectos ao exercício desta, apenas operará dentro do condicionalismo previsto no art. 114º do CIRS.
E assim é, na verdade. Sendo, aliás, por força deste princípio da separação patrimonial e por a transferência para o património particular não ser fiscalmente neutra (dado que são diferentes as consequências contabilísticas e fiscais do facto de um bem estar ou não afecto ao património empresarial de um sujeito passivo individual), que a mesma poderá originar um rendimento (melhor, a ficção legal da realização de um rendimento) tributável (cfr. art. 3º, nº 2, al. c) do CIRS), considerando-se, portanto, também, neste caso, como proveito o ganho (ainda que ficcionado) obtido com a afectação de quaisquer bens ao activo de uma empresa individual e sendo que o mesmo tipo de questões se coloca na situação inversa, em que tendo o sujeito passivo procedido a afectação de imóveis à sua actividade, haja terminado tal afectação (por lhe ser dado outro destino ou ter cessado a dita actividade). (() Rui Duarte Morais, Sobre o IRS, 2ª ed., pp. 87 e 144 a 146. )
Todavia, como igualmente ponderam Rui Duarte Morais (() Loc. cit.) e Xavier de Basto, visto que no art. 43º do CIRC se definem «as mais valias objecto de tratamento especial em IRC como as valorizações realizadas em bens do activo imobilizado da empresa, bens que, por um período superior a um ano, sejam necessários e estejam afectos à respectiva produção», então, «[p]ara que portanto possa existir uma mais-valia tributável para um sujeito passivo integrado no regime simplificado, é necessário que o bem em que essa mais valia se realiza esteja afecto à sua actividade e exerça na “empresa” as funções de um bem do activo imobilizado». (() José Guilherme Xavier de Basto, IRS: Incidência Real E Determinação Dos Rendimentos Líquidos, 2007, pp. 188 e 429.)
No caso, o impugnante A…….. requereu em 10/5/2004 o averbamento, em seu nome, de determinados prédios (que figuravam como existências no âmbito da sua actividade empresarial), em consequência da declaração de cessação de actividade (em 30/3/2004) de compra e venda de bens imobiliários.
Ora, uma vez que, no âmbito de ganhos decorrentes de mais-valias imobiliárias, por força da transferência de bens do património empresarial para o âmbito do património pessoal do empresário, em caso de cessação da actividade, na categoria B de IRS estão abrangidos apenas os resultantes da alienação de imóveis afectos ao exercício da actividade empresarial e, no caso, os ditos imóveis não detêm essa natureza (a própria AT os classificou como existências – cfr. o nº 2 do Probatório, mas sem que, em relação aos mesmos se tenha evidenciado a obtenção de outros proveitos gerados pela apontada transferência para o património particular), é de confirmar a decisão recorrida.

DECISÃO
Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Fazenda Pública.

Lisboa,25 de Janeiro de 2017. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.