Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0344/16
Data do Acordão:01/25/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
Sumário:É o processo de oposição à execução fiscal, e não o de impugnação judicial ou os meios de impugnação graciosos previstos para o procedimento tributário, o meio processual adequado para o executado discutir em juízo a legalidade do acto de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário.
Nº Convencional:JSTA000P21346
Nº do Documento:SA2201701250344
Data de Entrada:03/17/2016
Recorrente:A...
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A……………, inconformado, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela (TAF de Mirandela) datada de 29 de Abril de 2015, que, por erro na forma do processo, absolveu a Administração Tributária da instância, em que aquele, na qualidade de revertido, deduziu impugnação judicial contra o despacho que indeferiu o recurso hierárquico apresentado do despacho de Reversão contra os responsáveis subsidiários da executada “B…………., Lda” proferido pelo Chefe de Finanças Adjunto no Serviço de Finanças de Vila Real.

Alegou, tendo concluído como se segue:
1° O recorrente não se conforma com a decisão de rejeição liminar da Impugnação, porquanto se considera que ocorreu incorreto julgamento da matéria de facto, assim como fez o Tribunal recorrido uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, como adiante se vai demonstrar.
2° No caso concreto, e no modesto entendimento do recorrente, a Impugnação Judicial pode ser utilizada como meio adequado de reacção.
3° Ora, a impugnação insere-se no chamado processo judicial tributário, que tem por função a tutela plena, efectiva e em tempo útil dos direitos e interesses legalmente protegidos em matéria tributária — art. 96° do CPPT.
4° Em regra surge na sequência de um acto tributário com o qual o contribuinte não está de acordo, no todo ou em parte, por considerar ter ocorrido uma ilegalidade.
5° Através da impugnação, o contribuinte procura obter a anulação total ou parcial dos actos tributários que considera ilegais e, conseguir assim, conforme se refere na Lei Geral Tributária a “imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio” — Art.° 100° da LGT.
6° O acto de reversão é acto administrativo tributário. — Cfr. artigos 148° do Novo CPA, art.° 77°, n.° 2 e 3 da LGT e art.° 60° CPPT.
7° Os fundamentos previstos para a impugnação judicial encontram-se no n.° 1 do artigo 102.° do C.P.P.T..
8° Assim sendo, o contribuinte que interpõe uma impugnação judicial pretendendo a anulação total ou parcial do acto tributário deve invocar, designadamente, um dos seguintes fundamentos: a) errónea qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários; b) Incompetência; c) Ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida; c) preterição de outras formalidades legais (Cfr. Art.° 99.° do CPPT).
9° Não se trata de uma enunciação taxativa, mas meramente exemplificativa, o que quer dizer que o contribuinte poderá sempre invocar outro tipo de ilegalidades.
10° O impugnante alegou, para além de outros fundamentos, o vício de fundamentação do acto tributário.
11° De facto, a decisão da reversão no processo de Execução, do ponto de vista formal, tem por base um Despacho de Reversão do órgão de execução, despacho este que exige legalmente, nos termos dos artigos 23°, n.° 4, 77°, n.° 1 LGT e 268, 3 CRP fundamentação.
12° Dos Fundamentos, conforme consta dos autos, emerge a inexistência da essencial fundamentação, uma vez que no despacho de reversão não encontramos referência factual, com a devida prova documental, relativamente ao exercício da gerência de facto da pessoa coletiva/devedora originária, e não encontramos a necessária referência de que o revertido ou a Insolvente tenham adquirido qualquer bem.
13° Como condição do requisito constitutivo do direito à Reversão encontramos a gerência, e encontramos ainda a necessidade de o responsável subsidiário adquirir bens “em qualquer altura”.
14º Estes pressupostos têm de ser comprovados pela Administração Tributária, ou pelo exequente, sob pena de Falta de Fundamentação (Cfr. Art.° 99º, al. c), do CPPT).
15° A ATA desleixou e postergou o dever de prova (cfr. art.74°, nº 1 da LGT) a par do dever geral de fundamentação (cfr. arts. 23°, n.° 4 e 77º da LGT), pelo que é ilegal a Decisão de reversão, por inexistirem os pressupostos formais legitimantes do acto tributário, designadamente o previsto no art.° 180º, n.° 5 do CPPT, ocorrendo violação clara do dever de fundamentação.
16° Face à falta de fundamentação, ao impugnante não lhe é possível conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo Autor do ato, daí estarmos perante um vício da fundamentação.
17º E esse vício de fundamentação é suscetível de à luz da al. c) do art. 99° do CPPT afetar a validade intrínseca do ato materialmente administrativo, em que se traduz o ato de reversão da execução fiscal.
18° O que tudo conduz à anulabilidade do ato por vício de forma, e sendo anulado não poderá manter-se na Ordem Jurídica.
19° Pelo exposto, a Impugnação Judicial será igualmente meio adequado para alegar o tipo de ilegalidades cometidas, e designadamente a ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida (Cfr. Art.° 99º, al. c))
Sem prescindir,
20º O impugnante nunca foi citado da Liquidação, sabendo-se que a citação dos devedores subsidiários exige expressamente que a mesma revista a modalidade de pessoal — Artº 191º, n.° 3, al. b), do CPPT.
21° A citação feita ao responsável subsidiário deve ser obrigatoriamente acompanhada dos elementos essenciais da liquidação e respectiva fundamentação nos termos legais, pelo que o conhecimento dos elementos a que se refere o n° 4, do art° 22, da L.G.T., permite que o executado, como revertido, discuta a legalidade das liquidações, nos mesmos termos do devedor originário.
22° Não tendo sido notificados, ficou o responsável subsidiário impedido de o fazer convenientemente.
23° A citação dos responsáveis subsidiários deve conter os elementos essenciais da liquidação (ou liquidações) que está subjacente à execução fiscal, incluindo a respectiva fundamentação, a fim de lhes assegurar a possibilidade de reclamarem graciosamente ou impugnarem contenciosamente.
24° Sem tais indicações, o acto tributário não será eficaz relativamente aos responsáveis subsidiários (cfr.art° 77, n°6, da L.G.T.; art° 36, n°1, do C.P.P.T.).
25° A citação do impugnante, enquanto responsável subsidiário não reúne os requisitos legais previstos no mencionado art°22, n°4, da L.G.T.
26° Assim é, porquanto o acto de citação sob exame não inclui a fundamentação das liquidações que constituem a dívida exequenda, atento o conteúdo da fundamentação sumária previsto no aludido art°77, n°2, da L.G.T.
27° No caso “sub judice”, os elementos notificados ao revertido são insuficientes (faltando a fundamentação das liquidações que constituem a dívida exequenda, conforme impõem os citados art°22, n°4, e 77, n°2, da L.G.T.), por si só, para que o mesmo possa impugnar as liquidações exequendas de forma esclarecida e cabal.
28° De facto, o impugnante nunca foi citado da fundamentação dos termos legais, como supra alegado, e tal como exige o art.° 22°, n.° 4 da LGT.
29° E inexistem informações sobre o cumprimento dos critérios previstos no art.° 180°, n.° 5 do CPPT, o que são informações oficiais referentes a questões de conhecimento oficioso no processo.
30° O que tudo se constituem como Nulidades Insanáveis do processo de execução fiscal, nos termos do art.° 165°, n.° 1, al. a) do CPPT e art.° 98°, n.° 1, b), n.° 2 e 3 do CPPT.
31° Acarretando prejuízo para a defesa do contribuinte, nulidade que se invoca para as devidas e legais consequências.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve a decisão recorrida na parte aqui impugnada ser revogada, substituindo-a por outra que determine a procedência do presente recurso, conforme alegado e concluído, seguindo-se os demais termos legais, assim se fazendo a costumada e boa
JUSTIÇA.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público, notificado, pronunciou-se pela improcedência do recurso. Entende que, não estando em causa a legalidade do acto de liquidação da dívida exequenda, o meio processual a utilizar para atacar o indeferimento do recurso hierárquico só poderia ser a acção administrativa especial. Por outro lado entendeu não ser possível a convolação na forma de processo adequado, pois, entre outras razões tendo em conta que aos pedidos concretamente formulados correspondem formas de processo diversas e nunca caberia ao julgador escolher qual a forma processual a seguir.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Há agora que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
Tal como consta da petição inicial, o recorrente "revertido nos autos referenciados instaurados pelo Serviço de Finanças de Vila Real, após citação do Despacho de Indeferimento do Recurso Hierárquico apresentado por referência ao Despacho de Reversão proferido pelo chefe de Finanças Adjunto no Serviço de Finanças de Vila Real, e que determinou a reversão contra os responsáveis subsidiários da Executada "B……………, Lda", vem, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 99.º, alíneas a), c) e d) do CPPT, interpor impugnação judicial, (...) Da decisão de indeferimento do recurso hierárquico por referência à reversão proferida (...)"
Formula os seguintes pedidos: "a) Declarar a Nulidade Absoluta, ou caso assim não se entenda a Nulidade Relativa, por falta de fundamentação, do acto materialmente administrativo, em que se traduz o acto de reversão da execução fiscal; II b) Revogar o despacho recorrido, julgando procedente a presente Impugnação Judicial, com as devidas e legais consequências".
Como correctamente se explicou na sentença recorrida, o meio próprio para impugnar o despacho de reversão é a oposição à execução fiscal e não a impugnação judicial.
Este Supremo Tribunal, tal como referido naquela sentença, tem repetido à exaustão em dezenas de acórdãos que o meio adequado a desferir ataque ao despacho de reversão proferido no âmbito da execução fiscal é a oposição à execução fiscal, louvando-se, para tanto, no disposto na lei processual, cfr. artigo 204º, n.º 1, al. b) do CPPT.
Como se depreende da leitura atenta da petição inicial apresentada pelo recorrente, e destas alegações de recurso, o mesmo pretendeu atacar o despacho de reversão lançando mão de um meio de impugnação gracioso reservado para o procedimento tributário. Efectivamente o recurso hierárquico, cfr. arts. 66º e 67º do CPPT, encontra-se inserido e regulado, como meio impugnatório que é, no Título II do CPPT que regula o procedimento tributário, por sua vez, a reversão da execução fiscal, encontra-se inserida e regulada na subsecção II, artigos 153º a 161º, do Título IV do mesmo código que regula o processo de execução fiscal que, nos termos do disposto no artigo 103º da LGT, se trata de um processo de natureza judicial, cfr. ainda o artigo 97º, n.º 1, al. o) do CPPT no que toca à oposição à execução fiscal.
Ou seja, não pode o recorrente pretender impugnar uma decisão proferida no âmbito de um processo judicial por via dos meios impugnatórios graciosos previstos para o procedimento tributário.
Com utilidade para a presente questão, já este Supremo Tribunal se pronunciou diversas vezes sobre o uso da reclamação graciosa, outro meio impugnatório procedimental, cfr. artigos 68º e ss. do CPPT, no sentido de o mesmo ser inadmissível para efeitos de impugnar a reversão ocorrida no âmbito da execução fiscal, cfr. entre outros o acórdão datado de 29.06.2016, recurso n.º 01392/15.
Portanto, daqui resulta, assim, que o despacho de reversão não é impugnável por via de qualquer um dos meios de impugnação graciosa previstos para o procedimento tributário.
E, não o sendo, também a impugnação judicial deduzida na sequência da decisão do recurso hierárquico não é meio processual idóneo para discutir a questão da “legalidade” da reversão operada em execução fiscal.
Assim, no caso concreto, o recorrente cometeu um duplo erro na escolha dos meios de que lançou não para impugnar o despacho de reversão em questão, primeiro, impugnou tal despacho por via de um meio impugnatório gracioso destinado ao procedimento tributário e depois, veio escolher um meio processual desadequado à impugnação judicial do mesmo despacho.
Temos, portanto, que concluir que se verifica um erro insuprível na forma de processo, tal como se assinalou na sentença recorrida.

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente, devendo ter-se em consideração que o mesmo beneficia de apoio judiciário.
D.n.
Lisboa, 25 de Janeiro de 2017. – Aragão Seia (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.