Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
53/22.0JELSB-C.L1-3
Relator: RUI MIGUEL TEIXEIRA
Descritores: APREENSÃO DE VEÍCULO
DIREITO DE RETENÇÃO DO ESTADO
BENFEITORIAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/20/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: O art.º 11º Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro, prevê o pagamento das “benfeitoras que o Estado efectuou durante a utilização” de um veículo apreendido sendo que tal crédito, a existir é gerador de direito de retenção.
Tal preceito tem de ser alvo de uma interpretação restritiva pois só as benfeitorias necessárias e as úteis que não possam ser levantadas podem ser ressarcidas.
O Estado não está desobrigado a demonstrar a qualidade das benfeitorias que levou a cabo a fim de poder ver o seu direito de retenção afirmado judicialmente.
Tal não se basta com um mero ofício onde conste que levou a cabo benfeitorias sem mais.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem a 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I. Relatório
Inconformado com o despacho proferido em 21 de Dezembro de 2023, mediante o qual foi indeferida a entrega da viatura AR-..-ZX, a qual se encontrara apreendida, apresentou-se a recorrer perante este Tribunal da Relação de Lisboa, o arguido AA, com os sinais nos autos, formulando, após motivações as seguintes conclusões:
“1. Por despacho proferido a 07/09/2023, foi determinado o levantamento da apreensão do veiculo com matricula AR-..-ZX e entrega ao arguido ora recorrente, AA.
2. Contudo, em resposta a requerimento para entrega da viatura, formulado pelo arguido, vem o Douto Tribunal por despacho datado de 21-12-2023, contrariar a anterior decisão, nos termos que se transcrevem: “Notifique o arguido AA que ao abrigo do disposto no artigo 12.º Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro, o Estado goza de direito de retenção sobre a viatura, até que se mostre liquidada a quantia de €1.628,29 (mil, seiscentos e vinte e oito euros e vinte e nove cêntimos), em virtude da reparação a que a mesma foi sujeita, suportada pela Polícia Judiciária, motivo pelo qual se indefere o requerido”
3. Despacho este que não respeita a legislação em vigor, e como tal do qual se recorre,
4. O poder jurisdicional do tribunal, esgotou-se com a decisão de restituição da viatura, ao abrigo do artigo 178º nº 7 do Código do Processo Penal, sendo que as demais questões posteriormente invocadas pelo arguido e pelo Estado, são de natureza diversa e carecem de decisão devidamente fundamentada em acção especial de fixação de indemnização, conforme estipulado no artigo 13º do DL 31/85.
5. Nesse sentido vide, Acórdão TRE, processo 748/21.6PBSTR-A.E1, 10 de Outubro de 2023. http://www.gde.mj.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/fe8fc1734983805980258a4b0053c759?OpenDocument
6. Transcrevendo-se a parte do mesmo:
“V. Assim, contra a ordem contida num despacho judicial não é invocável – como se fosse privilégio do MP ou do Estado – um direito de natureza civilística que apenas se estabelece – como relação jurídica obrigacionista – entre credor e devedor e que não vincula um tribunal.
VI. Não há direito de retenção pois que não se trata de vulgar credor, sim de um despacho judicial determinativo. Nem há direito de retenção por ser ilícita a detenção do veículo.
VII. Com efeito, o despacho judicial que determinou a entrega do bem apreendido é uma ordem judicial e o seu não cumprimento não está a coberto de qualquer direito de retenção, sem se negar que se poderá manter a relação obrigacionista eventualmente resultante de benfeitorias. E isto quer significar que a ordem tem que ser cumprida, sem prejuízo da eventual manutenção da obrigação, com as consequências penais naturalmente resultantes do incumprimento dessa ordem.
VIII. Em suma, a inexistência de direito de retenção que se possa opor a ordem judicial torna ilegítima a recusa com a consequente conclusão de que o bem se mantém na posse da PJ ou da ESPAP de forma ilícita.
IX. E se a Mmª JIC decide, por despacho transitado, que o bem não é susceptível de ser declarado perdido a favor do Estado, a entrega desse bem tem que ser imediata e isso quer significar que o bem deve ser imediatamente restituído, sem prejuízo de a quantificação dos créditos ficar dependente de petição – por apenso aos autos principais – do proprietário do bem.
7. A decisão do tribunal sobre a revogação da apreensão nunca poderia ter em conta o pagamento de qualquer valor, por o mesmo ainda não ter sido apurado, naquela fase, nem ser possível prever a existência ou não de créditos a favor do Estado.
8. Trata se de decisões distintas, que em nada contende com a decisão já proferida e transitada quanto à revogação da apreensão do veículo, e que deve ser invocada pelo arguido nos termos do procedimento legal regulado no artigo 13º do Dec. Lei 31/85.
9. O D-Lei 31/85 não pode ser de aplicação cega, tem de ser proporcional e concordante com os factos reais, bem como com a situação real familiar do arguido, não podendo extravasar os limites do princípio fundamental da protecção da propriedade privada inscrito no artigo 62º e 205.º, ambos da Constituição da República Portuguesa,
10. A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição.
11. Não existe direito de retenção por parte da Polícia Judiciária, pois não se trata de vulgar credor, mas sim de um despacho judicial determinativo. Nem há direito de retenção por ser ilícita a detenção do veículo.
12. Com efeito, o despacho judicial que determinou a entrega do bem apreendido é uma ordem judicial e o seu não cumprimento não está a coberto de qualquer direito de retenção, sem se negar que se poderá manter a relação obrigacionista eventualmente resultante de benfeitorias que correrá por apenso nos termos do artigo 13º nº 2 do Dec. Lei 31/85.
13. Isto quer significar que a ordem tem de ser cumprida, sem prejuízo de eventuais manutenções da obrigação, com as consequências penais naturalmente resultantes do incumprimento dessa ordem.
Mais se acrescenta que:
14. Não existiu peritagem para entrega do veículo, como é obrigatório.
15. Consta dos autos no auto da Polícia Judiciária a Fls. 2093, que o veículo em questão, estava em boas condições, carroçaria BOM, pintura BOM, Suspensão BOM, caixa BOM, transmissão BOM, estofos BOM, vidros BOM, tablier BOM, pneus BOM.
16. Apesar de não constar nos autos, que tenha sido feita a avaliação do veículo nem a documentação fotográfica à data da sua apreensão, nos termos do art.º 2º, nº1 do Dec. – Lei nº 31/85 e 5º, nºs 1 a 5 do Dec.- Lei nº 11/2007, de 19/01. Existindo apenas quatro fotografias do veículo da parte exterior e uma fotografia das chaves do mesmo.
17. Tratou-se um veículo adquirido meses antes, num stand, com garantia e empréstimo, sendo impossível, necessitar de uma reparação da dimensão alegada.
Nestes Termos em que, sempre com o Douto Suprimento de V.Exas, Venerandos Desembargadores, deverá:
Ser dado total provimento ao presente recurso, revogando-se o despacho do qual se recorre e ordenada a imediata entrega da viatura ao arguido.
Fazendo-se a costumada justiça”
Ao assim recorrido respondeu o Ministério Público sustentando que:
“1. O direito de retenção de que é titular o Estado resulta directamente da lei e a conduta realizada pela Polícia Judiciária, através da ESPAP, não constitui qualquer violação do caso julgado formado pelo despacho que determinou o levantamento da apreensão.
2. Foi, aliás, precisamente a prolação desse despacho que originou a obrigação do Estado de restituir o veículo, e atenta a existência de um excedente a favor do Estado, face ao montante de despesas efectuadas com o veículo, superior à desvalorização ocasionada pelo uso da viatura, originou igualmente o direito de retenção como garantia daquele crédito.
3. O despacho recorrido limitou-se a cumprir a lei, em concreto, o Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro, e não constitui uma revogação do despacho que determinou o levantamento da apreensão porquanto versam situações jurídicas diversas.
não revogou o despacho que determinou o levantamento da apreensão. O despacho recorrido limitou-se a cumprir a lei, em concreto, o Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro, cabendo ao arguido, se assim o entender, desencadear o procedimento estabelecido no artigo 13.º desse diploma 1
Termos em que deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se dessa forma a decisão recorrida, só assim se fazendo JUSTIÇA!”
Os autos subiram a este Tribunal e nos mesmos teve vista o Ministério Púbico o qual referiu que “louvando-nos na resposta da Exmª Magistrada do Ministério Público junto da 1ª instância, emite-se, parecer no sentido da manutenção do despacho recorrido e pugna-se pela improcedência do recurso.”
Os autos foram a vistos e à conferência.
*
II– Do âmbito do recurso, do despacho recorrido e seus fundamentos.
O objecto do recurso deve ater-se às conclusões apresentadas pelo recorrente (cfr. Acórdão do STJ, de 15/04/2010, in www.dgsi.pt ): “Como decorre do artigo 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões(…)”, sem prejuízo, obviamente da eventual necessidade de conhecer oficiosamente da ocorrência de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410º, do Código de Processo Penal nas decisões finais (conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão nº 7/95, do STJ, in DR, I Série-A, de 28/12/95).
Considerando a ditas conclusões temos que o recurso tem como objecto a questão de se saber se existe fundamento para a não entrega do veículo ao requerente.
Vejamos, assim, o pertinente devir processual atento os elementos constantes do processo:
1 – Em 04.01.2023, a Polícia Judiciária, no âmbito dos autos principais, procedeu à apreensão do veículo de matrícula AR-..-ZX, de marca Opel, modelo Corsa, bem como à respectiva chave suplente e DUA;
2 – Em 24.01.2023 foi declarada a utilidade operacional da referida viatura passando esta a ser utilizada pela Polícia Judiciária;
3 – Por despacho de 07.09.2023, proferido pelo magistrado do Ministério Público, foi ordenado, ao abrigo do disposto no art.º 186º do C.P.P., o levantamento da apreensão da viatura AR-..-ZX;
4 - A Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I. P. remeteu missiva à ilustra mandatária do arguido referindo que teve despesas com “benfeitorias” no veículo no valor de 1661,97€ sendo que deduzidas a estas as depreciações legais apenas entregaria o veículo após pagamento da quantia de 1628,29€, dando conhecimento do teor de tal missiva e remessa ao Ministério Público.
5 - Em 18.12.2023 o Ministério Público promoveu: “Durante a fase de inquérito foi determinada a apreensão do veículo com a matrícula AR-..-ZX, por existirem indícios de que o mesmo tinha sido utilizado na prática de crimes e/ou que fosse produto da prática de tais crimes.
O aludido veículo ficou apreendido à ordem da Polícia Judiciária – Estado, tendo sido utilizado por esta entidade até ao levantamento da sua apreensão – utilização que se encontra legitimada pelo Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro.
Com o levantamento da apreensão, cumprindo o plasmado no disposto no artigo 11.º do mencionado diploma legal, a Polícia Judiciária comunicou que, no decurso da utilização da viatura, teve necessidade de proceder à sua reparação, e solicitou o pagamento da quantia de €1.628,29, a título de indemnização.
Tal quantia mostra-se discriminada no documento de fls. 4373, devendo a mesma ser liquidada pelo arguido. Caso não o faça, o Estado goza de direito de retenção sobre a viatura, conforme resulta do artigo 12.º do mencionado diploma.
Ou seja, enquanto o arguido AA não proceder ao pagamento daquela quantia, independentemente de já ter sido determinado o levantamento da apreensão, o Estado (Polícia Judiciária), fazendo uso de um direito, não devolve o veículo ao arguido.
Face ao exposto, não se mostrando paga a quantia de €1.628,29, promovo que se indefira o requerido por falta de cabimento legal.”
2 – Na sequência de tal promoção, em 21.12.2023, foi proferido o seguinte despacho (despacho recorrido): “Notifique o arguido AA que ao abrigo do disposto no artigo 12.º Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro, o Estado goza de direito de retenção sobre a viatura, até que se mostre liquidada a quantia de €1.628,29 (mil, seiscentos e vinte e oito euros e vinte e nove cêntimos), em virtude da reparação a que a mesma foi sujeita, suportada pela Polícia Judiciária, motivo pelo qual se indefere o requerido.”
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Do mérito do recurso
Em causa nestes autos está saber-se se a decisão de não proceder à entrega do veículo ao seu possuidor/proprietário é legitima atendendo à existência de um direito de retenção por parte do Estado.
Começaremos desde logo por dizer que o fundamento legal constante do despacho recorrido está errado.
Na verdade, o art.º 12º Decreto-Lei n.º 31/85, de 25 de Janeiro, não prevê o pagamento de benfeitorias. Menciona apenas o pagamento de despesas de remoção, taxas de recolha, multas e demais encargos não relacionados com a utilização da viatura pelo Estado. Nada disto é reclamado (ou sequer referido e suportado documentalmente).
O art.º 11º do diploma menciona, esse sim, as “benfeitoras que o Estado efectuou durante a utilização” sendo que tal crédito, a existir é gerador de direito de retenção.
Não assiste razão ao recorrente quando menciona que tendo já sido proferido despacho a determinar a entrega do veículo o Estado não pode exercer o direito de retenção. Tal não faz sentido. Na verdade, só depois de ser determinado a entrega do veículo é que o Estado pode saber qual o desgaste do caro de molde a calcular a indemnização e quais as despesas que teve com o veículo de molde a poder fazer o apuro de valores e reclamar, se disso for caso algum pagamento do proprietário do veículo antes apreendido.
Em termos simples tudo se processa da seguinte forma: um veículo é apreendido e colocado provisoriamente ao serviço do Estado. Durante a sua utilização o veículo deprecia-se e essa depreciação traduz-se num crédito para o proprietário do veículo desde que o veículo tenha de ser devolvido. Da mesma forma compete ao Estado manter o veículo e para tal pode ter de incorrer em despesas. Determinada a entrega do veículo o Estado elaborará uma sorte de conta corrente colocando o valor da depreciação do veículo durante a apreensão numa coluna e o valor das despesas havidas noutra coluna fazendo o apuro final.
Se tal apuro for a favor do Estado este goza de direito de retenção até o recebimento do que for devido.
Postas as coisas neste pé tudo pareceria que o Estado bem andou e o recurso deveria sucumbir.
Mas assim não é.
Na verdade, o exercício do direito de retenção por parte do Estado não desobriga o mesmo de provar a existência do Direito. Tal é a regra que resulta do art.º 342º nº 1 do Código Civil (“Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado).
Efectivamente, o que consta dos autos é que o Estado reclamou benfeitorias no veículo sem sequer alegar que benfeitorias são essas.
Aqui chegados existem duas questões.
Em primeiro lugar o Estado tem de provar que benfeitorias levou a cabo no veículo não sendo válido para prova das mesmas um simples ofício com um quadro que refere “benfeitorias”.
Em segundo lugar não é toda e qualquer benfeitoria que o Estado pode reclamar, isto não obstante a expressão legal do mencionado art.º 11º referir “benfeitoria” sem qualquer limitação.
Na verdade, o preceito tem de ser alvo de uma interpretação restritiva por ser patente que o legislador disse mais do que queria dizer.
Vejamos, atentando no regime legal da posse e da indemnização por benfeitorias.
As benfeitorias são as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa, envolvendo as necessárias, as úteis e as voluptuárias (artigo 216º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil).
As necessárias são as que visam evitar a perda, a destruição da coisa; as úteis as desnecessárias para a sua conservação, mas que lhe aumentam o valor; e as voluptuárias as que apenas servem para recreio de quem as faz (artigo 216º, n.º 3, do Código Civil).
Assim, em sentido jurídico, são benfeitorias os melhoramentos feitos em coisas por pessoas a elas ligados por alguma relação jurídica, resultante, por exemplo, de locação ou posse.
Só são de considerar benfeitorias necessárias em determinada coisa as despesas imprescindíveis para a sua conservação à luz de critérios objectivos de normalidade e de razoabilidade e na envolvência de uma gestão prudente do homem, valendo como índice o facto da sua não realização prejudicar o fim específico da coisa.
Por via do critério de delimitação negativa legalmente previsto, são benfeitorias úteis de uma coisa as despesas não imprescindíveis para a sua conservação, mas idóneas ao aumento do respectivo valor.
Os possuidores, de boa fé ou de má fé, têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito e a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem o seu detrimento (artigo 1273º, nº 1, do Código Civil).
E quando for impossível o levantamento das benfeitorias úteis para evitar o detrimento da coisa, têm os possuidores, de boa ou de má fé, o direito a indemnização pelo valor das benfeitorias segundo as regras do enriquecimento sem causa (artigo 1373º, nº 2, do Código de Processo Civil).
Dito isto parece óbvio que o Estado apenas tem direito a ser ressarcido das benfeitorias necessárias e das úteis e mesmo estas desde que não as possam levantar sem detrimento do bem.
O Estado não tem direito a ser ressarcido de quaisquer benfeitorias voluptuárias. Imagine-se que o Estado havia decidido colocar jantes cor de rosa no carro e forrar o seu interior de carpete rosa choque gastando uma quantia copiosa de dinheiro. Parece óbvio que não teria direito a ser ressarcido.
Ora, tendo presente que assim é, temos que o Estado não refere que benfeitorias fez de molde a se poder qualificar as mesmas e tendo presente que é ao Estado que compete fazer a prova do direito a que se arroga facilmente se conclui que o direito de retenção a que o Estado se arrogou, conquanto possa existir em abstracto, não está demonstrado no concreto.
E não estando demonstrado o despacho recorrido não pode subsistir tendo de ser substituído por outro que denegue o invocado direito de retenção e determine a entrega do veículo como solicitado.
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Dispositivo
Por todo o exposto, acordam os juízes que compõem a 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa e anular o despacho recorrido devendo o mesmo ser substituído por outro que, nada mais havendo, determine a entrega do veículo nos termos do despacho de despacho de 07.09.2023 proferido pelo magistrado do Ministério Público e referido no ponto 3 da matéria de facto referida neste acórdão e constante de 4153 dos autos principais.
Sem custas por delas estar isento o Ministério Público.
Notifique.

Acórdão elaborado pelo 1º signatário em processador de texto que o reviu integralmente sendo assinado pelo próprio e pelos Venerandos Juízes Adjuntos.

Lisboa e Tribunal da Relação, 20 de Março de 2024
Rui Miguel de Castro Ferreira Teixeira
Maria Antónia Dias Rodrigues Andrade
Ana Paula Grandvaux
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1. Nota do relator: as conclusões da resposta mostram-se inseridas no presente acórdão qua tale embora se considere que um segmento das mesmas poderá estar incompleto ou ter sido acrescido por lapso.
De qualquer forma, o Ministério Público junto deste Tribunal nada diz referindo-se à resposta como “clara” e, tratando-se de uma resposta (que não define o objecto do recurso) e sendo perceptível o sentido da resposta, optou-se por não convidar ao aperfeiçoamento.